Acórdão nº 82/15.0T8ALJ.G1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA ABREU
Data da Resolução25 de Outubro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO AA, intentou a presente acção com processo comum contra, BB - Companhia de Seguros, S.A., pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de €37.409,84, acrescida de juros de mora desde a citação até integral e efectivo pagamento.

Articulou, com utilidade, que o seu marido faleceu na sequência de um acidente de viação, tendo a sua entidade patronal transferido para a Ré, além do mais, a responsabilidade pelo pagamento de um prémio de seguro, em caso de morte do mesmo, porém, a Ré furta-se ao pagamento do valor convencionado.

Regularmente citada, a Ré contestou defendendo não ser devido qualquer pagamento à Autora, porquanto, no momento do acidente, o sinistrado estava alcoolizado, com uma taxa de álcool no sangue de 1,8 g/l, como se veio a detectar na autópsia o que, nos termos previstos no contrato de seguro celebrado, exclui a cobertura do risco de morte.

Foi suscitada a intervenção principal de CC que foi admitida a intervir nos autos ao lado da Autora, sua mãe.

O processo prosseguiu os seus regulares termos que culminou com a prolação de sentença que, julgando a acção totalmente improcedente, absolveu a Ré do pedido.

Inconformadas com a decisão proferida, dela recorreram a Autora e a Interveniente principal, de apelação, para o Tribunal da Relação de …, tendo-se aí, por acórdão de 25 de Janeiro de 2018, julgado improcedente o recurso, confirmando-se a decisão recorrida.

É contra esta decisão que a Autora/AA e a Interveniente principal/CC, se insurgem, formulando as seguintes conclusões: “1. Vem o presente recurso interposto do douto acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de … nos presentes autos que confirma a sentença proferida pela 1ª Instância, julgando a ação totalmente improcedente, e em consequência absolvendo a Recorrida, do pedido.

  1. Inconformadas com o assim decidido, vem interposto o presente recurso de revista excecional, na medida em que se verifica uma verdadeira oposição de julgados e bem assim está em causa uma questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica se torna necessária para uma melhor aplicação do direito, Vejamos: 3. Os fundamentos para a revista excecional encontram cobertura legal no art. 672.° do Novo Cód. de Proc. Civ., estabelecendo-se em tal dispositivo fundamentos das mais diversas ordens, desde a oposição de julgado ao tratamento e análise de questões que pela sua singularidade, complexidade ou particular relevância social, sejam necessárias para uma melhor aplicação e compreensão do direito.

  2. No que diz respeito ao fundamento da al. c) ele queda-se pela junção de certidão do acórdão-fundamento com a respetiva nota de trânsito em julgado o que, já nas al. a) e b) os fundamentos são das mais diversas ordens, sendo que os primeiros visam garantir uma melhor aplicação do direito e segundos prendem-se com razões de particular relevância social.

  3. No que concerne à al. a) dado tratar-se de verdadeira cláusula geral, caberão no eu âmbito nomeadamente situações que surjam e sejam tratada com frequência, e em alguns casos de forma diversa questões de difícil solução e debatidas de forma controversa na doutrina e na jurisprudência ou ainda cuja solução suscita dúvidas e bem assim que sejam suscetíveis de afetar relevantes interesses gerais de uma comunidade, ou seja, se vocacionem a uma melhor aplicação do direito.

  4. No caso sub judice, sempre se verificam os requisitos das als. a) e c) do n.º 1 do art. 672.º que legitima a revista excecional e que passaremos a expor.

  5. As Recorrentes intentaram ação judicial, pedindo a condenação da Recorrida a pagar-lhes a quantia de €37.409,84, acrescida de juros de mora desde a citação e até efetivo e integral pagamento, por morte de DD cuja vida se encontrava segura pelo contrato de seguro do ramo vida grupo apólice n.º 9220 - 50029126, 8. A Recorrida furta-se ao pagamento do valor convencionado, porquanto o sinistrado aquando da autópsia apresentava uma taxa de álcool no sangue de 1,8 g/l, o que - considera a Recorrida nos termos do contrato de seguro celebrado, exclui a cobertura do risco de morte.

  6. Considerou o Tribunal a quo que “da interpretação das cláusulas acordadas pelas partes não resultam dúvidas que caso a morte ocorra por virtude de acidente em que o segurado esteja sob efeito de álcool é suficiente para fazer operar a cláusula de exclusão, sendo irrelevante a perigosidade da curva, ou o cansaço do segurado”.

  7. O que veio a ser confirmado na íntegra, em sede de recurso de apelação, pelo Tribunal da Relação de …: «uma cláusula que estabeleça que "a cobertura do risco das Pessoas Seguras não é válida nos casos em que seja provocada por acidente em que a Pessoa Segura esteja em estado de alcoolemia” não considera excluídos do risco morte apenas os acidentes que sejam consequência de embriaguez, mas também aqueles em que a pessoa segura esteja em estado de alcoolemia, prescindido, assim, do nexo de causalidade entre o acidente e a alcoolemia».

  8. A questão essencialmente ali discutida prende-se com a cláusula de exclusão atinente à condução sob influência do álcool e nexo causal.

  9. O caso dos autos não é novo, querendo com isto dizer-se que o mesmo já foi objeto de apreciação judicial no acórdão já transitado em julgado proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, processo n.º 1135/10.7TVLSB.L1.S1, relator Granja da Fonseca de 11-12-2012, bem como no acórdão já transitado em julgado proferido pelo Tribunal da Relação de …, processo n.º 288/06.3TBVLN.G1, relator António Sobrinho de 14-05-2009, entre muitos outro, os quais contrariam o acórdão ora recorrido.

  10. Na verdade, as mencionadas ações judiciais tiveram por base a mesma questão jurídica e que está em causa nestes autos.

  11. Ora, a desconformidade urge quando, na mesma questão de direito - cláusula de exclusão atinente à condução sob influência do álcool e nexo causal - a sentença proferida nestes autos pela primeira instância e o douto acórdão do Tribunal da Relalão de … de que se recorre determinam que o simples facto de a pessoa segura conduzir em estado de alcoolemia é suficiente para afastar a cobertura do seguro, prescindindo do nexo de causalidade entre o acidente e a alcoolemia, contrariamente ao que havia sido decidido no acórdão pretérito.

  12. Desta feita, parece-nos evidente, com respeito por opinião diversa que terá de ser a situação submetida a esse Venerando Supremo Tribunal de Justiça para que de uma vez por todas clarifique a questão jurídica com as implicações legais daí adveniente e por essa via seja também alcançada a segurança e certeza jurídicas que por agora parece não existir.

  13. Contudo mesmo que não se entende se - o que não se concede - que tal factualidade se reconduziria à al. c) do n.º 1 do art. 672.º do Cód. de Proc. Civ., sempre a mesma será reconduzível à al. a) do referido normativo, na medida em que a resolução desta questão porá termo às decisões contraditórias sobre a mesma realidade jurídica e por tal ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

  14. Como é consabido, o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça está limitado à apreciação de questões de Direito, pois que o Supremo não conhece de facto, pelo que, o manancial probatório em que esse Venerando Supremo se moverá, é aquele que provier das instância, seja da 1ª instância, seja da Relação em caso de reapreciação da prova, o qual poderá ser retificado, tendo por base as diversas questões de Direito, quer do ponto de vista subjetivo quer do ponto de vista substantivo, que presidiram à sua apreciação e valoração, quer pelo Tribunal de 1ª Instância quer pelo Tribunal recorrido.

  15. Considerou o Tribunal a quo, que depende estreitamente da redação que, em concreto, tiver a cláusula delimitadora do objeto do contrato de seguro, não restando dúvidas que da interpretação das cláusulas acordadas pela partes se mostra suficiente para fazer operar a cláusula de exclusão, o facto de a morte ter ocorrido por virtude de acidente em que o segurado esteja sob efeito de álcool, sendo irrelevante a perigosidade da curva ou o cansaço do segurado.

  16. Rejeitando deste modo, a necessidade de provar a existência de nexo de causalidade adequada entre tal condução e a eclosão do acidente, 20. E muito embora o Tribunal da Relação considere que a Recorrida não alegou factos capazes de estabelecer o nexo causal entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente, entende que o mesmo não seria necessário, uma vez que as partes definiram o limite de exclusão da cobertura contratual por referência ao volume da alcoolemia legalmente consentido pela lei a quem conduzir veículos automóveis, não se colocando nesta sede a questão do nexo de causalidade entre o efeito do álcool ingerido pelo sinistrado e a eclosão do acidente.

  17. No entanto, mais uma vez afirmamos que, a nosso ver, será sempre necessário provar a existência de nexo causalidade adequada entre a taxa de alcoolemia e o acidente ocorrido.

  18. Está em causa um contrato de seguro de ramo vida em cuja apólice consta uma cláusula segundo a qual não se considera coberto pelo seguro o risco morte provocado por acontecimentos (doenças ou acidente) sobrevindo à pessoa segura em virtude do consumo de bebida alcoólica-.

    23. A doutrina expendida em matéria de seguros facultativos de danos próprios aplica-se, mutatis mutandis aos seguros de vida como o que está em discussão nos autos.

  19. Em obediência ao princípio da liberdade de estipulação contratual consagrada no artigo 405º, n.º 1 do Código Civil, saber se existe ou não exclusão de determinado sinistro da cobertura de um seguro é algo que depende da redação que, em concreto, estiver contida na cláusula delimitadora do objeto do contrato de seguro e da sua interpretação.

  20. No caso em concreto, a partes estipularam que a seguradora não garante o pagamento das importâncias seguras, caso a morte da pessoa segura “ … seja provocada por: a) Acto criminoso ou actividade dolosa, incluindo qualquer acto intencional que cause prejuízos...

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