Acórdão nº 0229/17.2BELSB 0649/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 15 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelCARLOS CARVALHO
Data da Resolução15 de Novembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.

A………….., devidamente identificado nos autos, instaurou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa [doravante «TAC/L»] providência cautelar contra o “MINISTÉRIO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS” [abreviada e doravante «MNE»], peticionando a suspensão de eficácia do despacho do Ministro dos Negócios Estrangeiros, datado de 06.01.2017, que lhe aplicou a sanção disciplinar de despedimento.

  1. O «TAC/L», por decisão de 31.01.2017 [inserta a fls. 34 a 36 dos autos - paginação «SITAF» tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário], julgou-se incompetente em razão do território e remetido os autos ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra [doravante «TAF/S»] este, por decisão datada de 20.10.2017 [cfr. fls. 525 a 560], veio a julgar totalmente procedente a pretensão cautelar, mercê da verificação dos requisitos previsto no art. 120.º do CPTA [na redação introduzida pelo DL n.º 214-G/2015, de 02.10 - redação essa a que se reportarão todas as demais citações de normativos daquele Código sem expressa referência em contrário], e suspendeu a eficácia do referido despacho conforme peticionado.

  2. Inconformado, o Requerido cautelar interpôs recurso jurisdicional para o Tribunal Central Administrativo Sul [«TCA/S»], o qual, por acórdão de 19.04.2018 [cfr. fls. 613 a 644], concedeu provimento ao recurso por entender não verificado o requisito do fumus boni iuris previsto no n.º 1 do art. 120.º do CPTA, e, revogando a decisão recorrida, julgou improcedente a pretensão cautelar.

  3. Invocando o disposto no art. 150.º do CPTA o Requerente cautelar, agora inconformado com o acórdão proferido pelo «TCA/S» veio interpor o presente recurso jurisdicional de revista apresentando o seguinte quadro conclusivo que se reproduz [cfr. fls. 663 e segs. e fls. 730 e segs.

    ]: «…

    1. Ambas as Instâncias, Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra e Tribunal Central Administrativo do Sul, decidiram divergentemente no que se refere à consideração de o despacho sancionatório proferido pelo MNE se mostrar inquinado de vício de lei por erro sobre os pressupostos de facto na parte em que considerou que o aqui Recorrente prestou falsas declarações e, por violação do direito de defesa em sede disciplinar.

    2. O Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra decidiu no sentido de dar-se por verificado o requisito do “fumus boni juris”, o que fez com uma fundamentação juridicamente convincente, e o Tribunal Central Administrativo do Sul decidiu que não se dá por verificado esse mesmo requisito.

    3. Conclui-se que a decisão proferida pelo Tribunal Central Administrativo do Sul incorre em erro de julgamento, ao considerar válido e eficaz o despacho sancionatório, pela incorreta apreciação da matéria de facto provada e aplicação do art. 202.º, n.º 1 da LTPF.

    4. Razão pela qual se justifica a admissão do presente recurso de revista para uma melhor aplicação do direito.

    5. No que concerne à questão da prestação de falsas declarações aquando dos requerimentos de atestados de residência solicitados em 27.12.2011, 25.02.2014 e 03.02.2015 emitidos respetivamente pelas Juntas de Freguesia ………, ………. e ………., conclui o Acórdão recorrido: “à data em que foram emitidos os atestados de residência o Recorrido A………….. prestou falsas declarações para instruir o requerimento de inscrição de B…………. na ADSE, assumindo para ambos uma situação jurídica de união de facto, que não tinham por falta de preenchimento das condições legais”.

    6. Sucede que esta conclusão expressa no Acórdão recorrido, não valorou a alínea t) da matéria dada como provada pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que se passa a citar: “t) No âmbito do Processo n.º 777/16.1T8OER, que correu termos na Secção Cível da Instância Local de Oeiras, Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, foi proferida sentença, em 07.08.2016, que declarou que o requerente e B………… vivem, desde 08.06.2012, em “união de facto”.

    7. Ora, entende o Acórdão recorrido que à data do pedido de inscrição feito pelo aqui Recorrente, em 12.06.2015, o aqui Recorrente e B…………. não viviam em “união de facto” há pelo menos dois anos, ou seja, pelo menos desde 12.06.2014.

    8. Sendo facto provado que por sentença transitada em julgado, datada de 07.08.2016, foi judicialmente reconhecida a “união de facto” entre ambos desde 08.06.2012.

    9. Pelo que, quando o Recorrente procedeu ao pedido de inscrição de B…………. na ADSE, viviam em união pelo menos desde 08.06.2012, isto é há cerca de 4 anos, o que é suscetível de infirmar o juízo efetuado quanto ao facto de o Recorrente ter prestado falsas declarações para obter os atestados de residência que juntou com o requerimento de inscrição de B………….. ADSE, incorrendo o Acórdão proferido em erro de julgamento.

    10. No que concerne à violação do direito de defesa no procedimento disciplinar, decidiu o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que apesar de a lei não estabelecer expressamente a suspensão do procedimento disciplinar caso o arguido, aqui recorrente, requeira aos serviços de Segurança Social a nomeação e pagamento da compensação de patrono, ao contrário do que sucede nas ações judiciais em que tal suspensão se encontra prevista no artigo 24.º, n.º 4 da Lei de Acesso ao Direito, esse direito é violado quando requerido, no quadro do sistema de acesso ao direito, o processo prossiga a sua tramitação, sendo proferida decisão final antes de a nomeação ter lugar, pelo que o Ministério dos Negócios Estrangeiros deveria ter acautelado o direito de defesa do aqui recorrente, por via da suspensão do procedimento disciplinar, logo que este juntou ao procedimento prova em como requereu à Segurança Social a constituição a nomeação de advogado de modo a garantir o exercício do referido direito.

    11. Dispondo o art. 202.º, n.º da LGTFP que “o trabalhador pode constituir advogado em qualquer fase do processo, nos termos gerais de direito”.

    12. O aqui Recorrente, aquando da apresentação da defesa juntou requerimento de nomeação e pagamento da compensação de patrono para intervir no procedimento disciplinar, que veio a ser deferido em momento posterior à decisão do processo disciplinar.

    13. No Acórdão recorrido é entendido que “a constituição de advogado, em qualquer fase do processo disciplinar é configurada na lei a título de faculdade que assiste ao trabalhador”. “(…) Estando no domínio do direito do trabalhador a obter informação e consulta jurídica no âmbito do processo disciplinar contra si instaurado, na vertente de direito de defesa assistida e não de patrocínio judiciário obrigatório”.

      Podendo o trabalhador optar por se fazer representar por um profissional especializado ou defender-se a si próprio e, tendo o aqui Recorrente apresentado defesa por si próprio em 09.06.2016 após a notificação da notificação da acusação em 30.05.2016 mostra-se observado o disposto no art. 214.º, n.º 1, da LGTFP conforme alíneas d) e e) da matéria dada como provada.

    14. Sucede que o aqui recorrente não optou por se defender a si próprio, fê-lo em cumprimento do prazo para o efeito, deixando explicitamente que pretendia fazer-se representar por profissional especializado, tendo juntamente com a defesa apresentado comprovativo de requerimento de proteção jurídica e, conforme resulta da alínea f) do probatório, em 10.06.2016 (dia imediatamente a seguir à apresentação da defesa) o Recorrente enviou, por email, informação dirigida à Senhora Instrutora do processo disciplinar frisando a junção do documento de proteção jurídica, nomeadamente da nomeação de patrono, dizendo que o mesmo se encarregará da “defesa a esta acusação logo que a sua nomeação seja confirmada pela Ordem dos Advogados”.

    15. Não dispondo o aqui Recorrente de condições financeiras para suportar o pagamento dos honorários de um advogado, mas pretendendo exercer o direito a constituir advogado consagrado no art. 202.º, n.º 1 da LGTFP, terá de solicitar, aos serviços da Segurança Social, a nomeação e pagamento da compensação de patrono, pelo que o processo disciplinar deverá aguardar a decisão deste pedido, pois só deste modo é garantido ao arguido o exercício do referido direito.

    16. Ora, nos termos do art. 13.º, n.º 2 da C.R.P. “Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual”.

    17. Resultando da inobservância do disposto no art. 202.º, n.º 1 da LGTFP o aqui Recorrente foi prejudicado em razão da sua situação económica e instrução, por não ter condições financeiras de custear os honorários de um advogado e por não ter formação jurídica que lhe tenha permitido apresentar defesa adequada, conforme se conclui da alínea g) dos factos dados como provados, reproduzidos no Acórdão recorrido, em que se refere, reportando-se à instrução do processo disciplinar: “O arguido demonstra um deficiente entendimento do princípio do contraditório e do respetivo direito de defesa, comportamento aliás recorrente na sua atuação com a Administração. Notificado para se pronunciar sobre os factos que lhe são imputados e juntar ou requerer os meios de prova sobre a matéria, optou por apresentar algumas testemunhas cuja audição, atendendo a que não têm contacto com o arguido desde antes de 2011, é manifestamente impertinente e desnecessária”.

    18. Tendo o Tribunal Central Administrativo do Sul, incorrido em erro de julgamento, pela incorreta apreciação da matéria de facto provada e aplicação do art. 202.º, n.º 1 da LTPF …».

  4. O aqui recorrido «MNE» contra-alegou [cfr. fls. 688 e segs.

    ], concluindo da seguinte forma: «… I. O recurso revista apresentado pelo ora Recorrente não deve ser admitido por não se verificarem os pressupostos previstos no artigo 150.º do CPTA, Porquanto: A. É consabido que o recurso de...

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