Acórdão nº 03297/06.9BELSB 0191/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução14 de Novembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul na acção administrativa especial com n.º 3190/09 1. RELATÓRIO 1.1 O Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (adiante Recorrente ou Entidade demandada) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo do acórdão por que o Tribunal Central Administrativo Sul, julgando procedente a acção administrativa especial deduzida pela sociedade acima identificada (a seguir Recorrida ou Autora), (i) anulou o despacho por que o ora Recorrente indeferiu o pedido de transmissibilidade dos prejuízos fiscais resultante de operação de fusão, formulado ao abrigo do disposto no art. 69.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (Na redacção em vigor até à republicação do Código operada pelo Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de Julho.

) (CIRC) e (ii) condenou o ora Recorrente a praticar o acto de deferimento do referido pedido de transmissibilidade dos prejuízos fiscais, sem prejuízo da fixação de um plano específico da dedução desses prejuízos, em conformidade com o n.º 4 do referido artigo, apresentando alegações de recurso, com conclusões do seguinte teor: «

  1. Ao ter deliberado anular o despacho n.º 917/2006-XVII de 20.07.2006 do SEAF e condenado o mesmo à prática do acto decisório de deferimento do pedido de transmissibilidade dos prejuízos fiscais, por verificação dos pressupostos legais contidos no art. 69.º do CIRC, sem prejuízo da fixação de um plano específico de dedução desses prejuízos, o, aliás, douto Acórdão recorrido incorreu em nulidade, por excesso de pronúncia, cfr. al. d) do n.º 1 do art. 615.º do CPC, bem como, fez uma incorrecta interpretação e aplicação do art. 69.º do CIRC, na redacção à data aplicável aos factos, bem como, dos arts. 71.º n.º 2 e 95.º n.º 5 do CPTA, motivo pelo qual não se pode manter.

  2. Antes de mais, ao ter condenado o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais a praticar novo acto que reconheça à Autora o direito de ver ser deferido o pedido de transmissibilidade dos prejuízos fiscais, por verificação dos pressupostos legais contidos no art. 69.º do CIRC, sem prejuízo da fixação de um plano específico de dedução desses prejuízos, o Acórdão recorrido foi para além do pedido formulado pela então A., tendo condenado a AT à prática de um acto devido que não tinha sido pedido pela mesma A.

  3. Efectivamente, o pedido que consta da p.i. apresentada pela então A. e ora recorrida é um simples pedido de anulação do acto do SEAF, não tendo a mesma formulado qualquer pedido de condenação da AT à prática do acto recusado, cfr. art. 66.º do CPTA.

  4. Donde, o acórdão recorrido é, antes de mais, nulo, por excesso de pronúncia, cfr. al. d) do n.º 1 do art. 615.º do CPC.

    Ainda que assim não se entenda, sem conceder: Quanto ao segmento decisório de saber se é sindicável pelo Tribunal o juízo da Administração Fiscal quanto à existência de razões económicas válidas: E) O Acórdão ora recorrido considerou, contrariamente ao que a entidade demandada havia invocado, que a questão de saber se a operação de fusão foi efectuada por razões económicas válidas podia ser sindicada pelo Tribunal remetendo nesta questão para o já deliberado no Acórdão do STA de 27.11.2013, proferido no processo n.º 01159/09.

  5. Ora, embora o Acórdão ora recorrido tenha remetido para a jurisprudência constante do Acórdão de 27.11.13, também é certo que o mesmo STA também já entendeu, cfr., entre outros, Acórdão da 2.ª Sec., do STA, de 12/07/06, proc. n.º 1003/05, que saber se houve “razões económicas válidas” ou se a fusão “se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva” é matéria de discricionariedade técnica, com uma longa margem de livre apreciação da Administração, que poderá originar soluções diferentes, consoante o interesse que a Administração privilegie” e que, “este seu juízo não pode ser fiscalizado pelos tribunais. A menos que ocorresse erro grosseiro ou manifesta desadequação ao fim legal”.

  6. Assim, contrariamente ao entendido pelo Acórdão recorrido, também parte da jurisprudência vem entendendo que, o saber se a operação de fusão realizada foi efectuada por razões económicas válidas envolve juízos de valor inseridos numa grande margem de liberdade de apreciação da AT, uma vez que estamos no campo da chamada discricionariedade técnica.

  7. Deste modo, não só o juízo emitido pela AT, de considerar que a operação não foi efectuada por razões económicas válidas, não é, salvo erro grosseiro ou manifesta desadequação ao fim legal, sindicável pelo Tribunal, como também, porque o acto que a A. pretende que o Tribunal condene a AT a emitir envolve valorações próprias do exercício da actividade administrativa, não sendo identificável uma única solução como legalmente possível, não pode, salvo o devido respeito, o Tribunal substituir-se à AT e determinar o conteúdo do acto a praticar pela mesma, cfr. art. 71.º n.º 2 e 95.º n.º 5 do CPTA.

  8. Donde, devendo os conceitos de “razões económicas válidas” e o de “se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva”, definir-se como indeterminados e cujo preenchimento cabe à Administração, a valoração que foi feita no despacho impugnado no que concerne à ausência de “razões económicas válidas” necessárias ao deferimento do pedido de dedução de prejuízos, releva de considerações de interesse público, pelo que, o juízo a esse respeito formulado escapa à fiscalização dos tribunais, só podendo os mesmos controlar o acto administrativo por existência de erro grosseiro ou manifesta desadequação ao fim legal.

  9. Ora, lido o Acórdão ora recorrido, constata-se que o mesmo entendeu apreciar da bondade do acto impugnado, da validade substancial tecendo considerações sobre o contexto jurídico-económico em que a operação decorreu, mais, dando apenas relevo a um “Estudo Demonstrativo do Impacto Positivo do Acto Projectado na Estrutura Produtiva”, considerações estas que foram muito para além da indagação sobre a existência do erro grosseiro ou da desadequação ao fim legal.

  10. Termos pelos quais, quanto ao 1.º segmento decisório do Acórdão ora recorrido há que concluir que o mesmo não só fez uma errada interpretação do n.º 2 do então art. 69.º do CIRC, como também, extravasou dos poderes que a lei processual lhe confere nos artigos 71.º n.º 2 e 95.º n.º 5 do CPTA, tendo-se substituído, sem que para tanto detivesse competências, à AT, na apreciação e valoração do que são razões económicas válidas.

  11. Pelo que, o Acórdão recorrido, neste segmento, não se pode manter devendo ser, desde logo, revogado e ser mantido o acto impugnado.

    Quanto ao segmento decisório de saber se, no caso em concreto, a fusão foi realizada por razões económicas válidas M) O acto de fusão tem de envolver não só o interesse económico das entidades envolvidas na fusão, mas também deve revestir-se de interesse público e não pode ter como objectivo a diminuição da carga tributária, por parte da sociedade incorporante.

  12. Ora, na análise da operação de fusão por incorporação em que a então A., ora recorrida, é parte e, na apreciação do interesse económico da mesma, a AT considerou que o contributo fornecido pela sociedade incorporada, que tinha um passivo superior ao activo e que apenas tinha prejuízos fiscais para transmitir não podia deixar de sobrecarregar a incorporante no seu objectivo de reorganização e de viragem de resultados futuros.

  13. Donde, tendo a AT eleito como critério para avaliação de uma empresa, o do património líquido, para estabelecimento de um limite de dedução de prejuízos fiscais nas situações de fusão de empresas, não podia, salvo o devido respeito, o Tribunal “a quo” ficar alheado da realidade espelhada no balanço, à qual deveria ter dado o devido relevo, devendo concluir que a fusão não era realizada por razões económicas válidas, mas por simples razões fiscais.

  14. Pelo que, face ao invocado, ainda que a ora recorrida pretenda que a eliminação de estruturas é razão económica válida, assume toda a legitimidade e adequação ao fim legal a posição da AT que concluiu, com base nos motivos atrás referidos, que não ficou demonstrado que a operação em causa tivesse efeitos positivos na estrutura da ora recorrida, pelo contrário, os resultados positivos ao longo do período projectado decorrem exclusivamente, ou quase exclusivamente, da contribuição da incorporante. Ou seja não existe, nas palavras do Ac. do STA, de 5/07/06, interesse sacrificado – perda da receita fiscal, proporcional ao interesse salvaguardado – ganhos macro económicos obtidos com a fusão.

  15. Face a esta conclusão, também é certo que à AT era legítimo concluir, como o fez, que o facto de a incorporada ter legado à incorporante um património negativo, inviabilizaria qualquer plano de deduções, nos termos do Despacho n.º 79/2005-XVII, de 15/04, do SEAF.

  16. Contudo, não foi a aplicação de tal despacho que motivou o indeferimento do pedido de transmissão de prejuízos fiscais. A referência a esta orientação administrativa constituiu, ao invés, mais um acréscimo para alertar para as consequências decorrentes da transmissão de um património líquido negativo.

  17. Assim esta invocação não pode ser vista, como parece ter sido pelo acórdão recorrido, como um fundamento autónomo para o indeferimento do pedido da então A.

  18. De facto, o que motivou o indeferimento foi o facto de a entidade demandada ter considerado, no âmbito da sua discricionariedade técnica, que a fusão não se revestia de razões económicas válidas face à transmissão, por parte da incorporada, B………… de um património líquido negativo.

  19. Termos pelos quais, quanto ao 2.º segmento decisório do Acórdão ora recorrido há que concluir que o mesmo fez uma errada interpretação e aplicação do dos n.ºs 2 e 4 do então art. 69.º do CIRC, aos factos, motivo pelo qual não deve ser mantido.

    Termos pelos quais e, com o douto...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT