Acórdão nº 13809/16.4T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Setembro de 2018
Magistrado Responsável | SOUSA LAMEIRA |
Data da Resolução | 13 de Setembro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO l.
AA e mulher, BB, instauraram acção declarativa comum contra Banco CC, S.A., alegando, em resumo, que: O BANCO DD, à data dos factos, era detido totalmente pela Sociedade EE, SA (EE) e tinham ambos o mesmo presidente de conselho de administração.
Desde, pelo menos 1993, que o BANCO DD estava registado como intermediário financeiro.
Tinha o dever de categorizar os autores como investidores não qualificados.
O BANCO DD, repetindo uma operação de 2004, em 2006 lançou uma operação de emissão de obrigações subordinadas EE 2006, a 10 anos, cujos valores captados serviram para reforçar os rácios de capital do BANCO DD.
Foram dadas instruções aos funcionários para não ser entregue aos clientes a nota informativa do produto e para ser vendido como um sucedâneo de um depósito a prazo.
Os autores acreditaram tratar-se de investimento seguro, 100% garantido.
Em 18 de Abril de 2006, a autora mulher subscreveu o boletim de subscrição de uma obrigação EE 2006, no valor de € 50.000, pensando tratar-se de uma variante de depósito a prazo mas melhor remunerado.
Não foi dada aos autores nota informativa da operação, mas os funcionários do banco informaram que se tratava de produto sem qualquer risco, que o banco garantia o retorno dos valores em causa e que os podiam resgatar em qualquer altura, o que convenceu os autores.
Aos autores não foi dito nem sabiam que o empréstimo só poderia ser reembolsado a partir de 8 de Maio de 2016; se o soubessem, não teriam aceitado subscrever o produto, o que era do conhecimento dos funcionários do banco.
Os valores mobiliários em causa não estavam à data depositados em qualquer conta de valores mobiliários escriturais do BANCO DD ou da EE.
O BANCO DD não forneceu informação sobre a relação que tinha com a EE.
O BANCO DD violou os deveres de protecção e de informação, induzindo os autores a contratar em erro nos termos em que o fizeram.
Concluem pedindo a condenação do réu a pagar aos autores a quantia de € 53.834,05, acrescida de juros de mora, à taxa legal, até integral pagamento. 2.
O R. contestou, alegando resumidamente, que a petição inicial é inepta o direito dos autores está prescrito, ao abrigo do artº 324º do CVM, pois tiveram conhecimento da alegada subscrição abusiva desde início de 2009.
A autora mulher subscreveu uma Obrigação EE 2006, tendo perfeito conhecimento do produto em causa, tendo-lhe sido explicada a sua natureza, condições de remuneração, reembolso e liquidez.
Sabia que não estava a contratar um depósito a prazo ou sequer um produto equivalente.
Foi informado ao autor que a única forma de obter liquidez antes do prazo de 10 anos seria através de cedência das obrigações a um terceiro.
Os autores receberam sempre o extracto mensal no qual figuram as obrigações na sua carteira de títulos e receberam os cupões de juros e nunca efectuaram qualquer reclamação.
Nega que o banco réu tenha garantido o pagamento da emissão das obrigações.
Conclui pedindo a improcedência da acção.
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Os autores responderam por escrito às excepções.
Procedeu-se ao saneamento dos autos conforme fls. 126 a 128.
Observado o legal formalismo, realizou-se a audiência de julgamento A final foi proferida sentença que julgou a acção improcedente, absolvendo o R. do pedido, (cfr. fls. 171 a 179).
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Inconformados os Autores AA e mulher, BB interpuseram recurso de apelação, para o Tribunal da Relação do …, que, por Acórdão de 20 de Fevereiro de 2018, decidiu julgar procedente a apelação e revogando a sentença recorrida decidiu: «em julgar procedente a apelação, revogando-se a decisão recorrida e condenado o Réu Banco CC, S.A, a pagar aos AA. AA e BB a quantia de € 53.834,05 (cinquenta e três mil, oitocentos e trinta e quatro euros e cinco cêntimos), acrescidos dos competentes juros, nos termos concretamente pedidos, desde a data da citação até ao efectivo e integral pagamento».
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O réu Banco CC, S.A.
interpôs Recurso de Revista para o Supremo Tribunal de Justiça e, tendo alegado, formulou as seguintes conclusões: 1.
A decisão recorrida, tendo revisto a decisão sobre a matéria de facto quanto ao facto g) dos factos não provados na primeira instância, vem depois a condenar o Banco-R. por responsabilidade civil na qualidade de intermediário financeiro, por prestação de informação falsa, concretamente a constante daquele facto, na colocação de instrumento financeiro junto dos AA.
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Para tanto, o douto aresto verifica o cumprimento dos gerais pressupostos da responsabilidade civil, e concretamente a ilicitude - que identifica com a dita falsidade de informação -, a culpa - que se presume nos termos gerais do art.º 799º do CCiv. e 314º do CdVM - e o dano-correspondente ao valor da prestação não cumprida pela entidade emitente! 3.
Já quanto ao nexo de causalidade, o douto acórdão, caracterizando esta como uma responsabilidade contratual, limita-se a invocar a sua presunção, por extensão da presunção de culpa do art.º 799º, aliás, a par da presunção também da ilicitude - na esteira de posição do Prof. Menezes Cordeiro.
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Olvida o Tribunal recorrido que tal posição doutrinária assenta na aproximação à solução histórica francesa da faute, quando o sistema acolhido no nosso Código Civil tem origem germânica, e portanto em pouco toca aqueloutro.
Mais, 5.
Do texto do art.º 799º nº- 1 do C.C. não resulta qualquer presunção de causalidade. E, de resto, nos termos do disposto no art.º 344º do Código Civil, a inversão de ónus depende de presunção, ou outra previsão, expressa da lei! 6.
E não se alcançam razões (que o acórdão recorrido também não adianta...) que justifiquem que a presunção própria da censura ético-jurídica da conduta do agente deva ser estendida à relação consequencial entre o facto e o dano.
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Ainda que se admitisse a solução de extensão de presunção de culpa à causalidade, a verdade é que não é adequada aos casos de incumprimento de prestações contratuais acessórias, apesar do cumprimento da prestação principal.
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De todo o modo, no âmbito da responsabilidade contratual, presumindo-se a culpa, caberá a quem alega o direito demonstrar a ilicitude, o nexo causal e o dano, que em caso algum se presumem! 9.
Mesmo que se admitisse a dita presunção, toda e qualquer presunção é teoricamente passível de ser levada a cabo no âmbito do contrato em que se verifique o incumprimento-dito de outro modo, não se pode, nem tanto defende qualquer Doutrina, partir do incumprimento de um contrato para presumir a ilicitude e causalidade da responsabilidade no âmbito de outro contrato, distinto daquele efectivamente incumprido.
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Ora, o que assistimos é que a decisão recorrida parte do incumprimento da obrigação de reembolso pela entidade emitente da emissão obrigacionista, para depois fazer presumir a ilicitude, culpa e causalidade no âmbito de um diferente contrato - o de intermediação financeira! 11.
Vale isto por dizer que o incumprimento alegado não é apto a desencadear a tão desejada presunção! 12.
O Tribunal a quo violou, portanto, por errónea interpretação e aplicação, o disposto nos artºs 344º, 563º e 799º todos do Código Civil! Conclui pedindo a procedência do presente recurso, e em consequência, que seja revogada a decisão recorrida absolvendo-se...
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