Acórdão nº 444/14.0JACBR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelISABEL SÃO MARCOS
Data da Resolução03 de Maio de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. Relatório 1.

No Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, Juízo Central Criminal de Leiria, Juiz 1, e no âmbito do Processo n.º 444/14.0JACBR, o arguido AA foi julgado e, a final, condenado, por acórdão de 01.03.2017, como autor material e em concurso real de um crime tentado de homicídio simples, previsto e punido pelos artigos 131.º, 22.º, números 1, e 2, alíneas a), b), e c) do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão, e de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo artigo 86.º, número 1, alínea c), do RJAM, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão, e em cúmulo jurídico na pena conjunta de 4 (quatro) anos de prisão efectiva.

  1. Inconformados com esta decisão, o Ministério Público e o arguido AA interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra que, por acórdão de 25.10.2017, decidiu: a) Negar provimento ao recurso interposto pelo arguido AA; b) Conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público, e, em consequência, revogar o acórdão recorrido quanto ao enquadramento penal dos factos relativamente aos crimes de homicídio simples tentado, previsto e punido pelos artigos 131.º, e 22.º, números 1 e 2 alíneas a), b) e c) do Código Penal, cuja decisão substituiu nessa parte, pela condenação do arguido AA por um crime de homicídio simples, tentado, agravado pelo uso de arma de fogo, previsto e punido pelos artigos 131.º, 22.º, 23.º números 1 e 2, 73.º número 1 alíneas a) e b), do Código Penal e artigo 86.º, números 3 e 4, do RJAM na pena de 5 anos de prisão; c) Em cúmulo jurídico desta pena com a pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão, imposta pelo crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo artigo 86.º, número 1 alínea c) do RJAM, condenar o arguido pena única de 5 (cinco) anos e 8 (oito) meses de prisão.

  2. Irresignado com esta decisão, o arguido AA interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo extraído da motivação que apresentou as seguintes conclusões: “1 - A conduta do recorrente não revela que tenha praticado tais actos do artigo 131º e 22º, nº 1 e 2, alíneas a), b), c) do C.P, pelo que não revela especial censurabilidade ou perversidade, sendo ainda certo que o recorrente não actuou com surpresa nem praticou actos de execução.

    2 - Aliás é manifesto, não haver na factualidade dada como provada elementos suficientes para se concluir pela prática de um crime de um homicídio qualificado, pelo que se impõe concluir ter havido notória e errónea apreciação da prova, que de todo em todo convence através do depoimento da vítima (CD 13.02.2017, 9:39 inicio 00.33.50 das declarações do ofendido e já descrito e transcrito).

    3 - Na factualidade dada como provada resulta que o ofendido não se sentiu ameaçado nem havia para ele qualquer agressividade, o que existiu foi apenas uma troca de palavras, pois "virou-lhe as costas e foi buscar uma bebida" (6:04 declarações já transcritas do ofendido) 4 - Num quadro de circunstancialismo que deveria ter sido devidamente equacionado e tido na vida conta pelo próprio tribunal, o que não aconteceu.

    5 - Sendo manifesta a existência dos vícios do artigo 410º, nº2, do CPP, mormente insuficiência da matéria fáctica e erro notório na apreciação da mesma, há ainda a referir que o douto acórdão recorrido, violou o disposto nos artigos 131º e 132.º, alínea g) e h) do CP, subsumindo erroneamente os factos a um homicídio tentado, quando essa factualidade projectava, uma absolvição sendo ainda certo ter havido também violação do artigo 71º,1, e 2 do mesmo CP já que no quantum da pena não se atendeu devidamente aquele conjunto de circunstâncias que não fazendo parte do crime depõem a favor do agente.

    6 - O Exmo. Dr. Juiz da 1.ª instância, averiguada ou não a existência dos factos, e existindo os mesmos, a interpretação que se lhes deve atribuir, é preciso que, a sua legalidade ou constitucionalidade não seja colocada em causa.

    7 - O juiz é o garante do direito e do estado de direito, é pois evidente que constitui matéria de direito, tudo o que se decida e se discuta ou possa discutir no processo acerca da existência e validade das normas jurídicas, sua aplicação aos factos, interpretação delas entre outras.

    8 - Quanto à matéria dada como provada, no tribunal da 1ª instância, a mesma foi nos termos do artigo 127.º do Código do Processo Penal, o que viola os direitos do arguido, pois não ficou provado que o mesmo tenha praticado o previsto no artigo 22.º do C.P 9 - Conforme refere o Exmo. Sr. Dr. Juiz do Tribunal e conforme o mesmo refere as fls.20 do douto acórdão "provou-se que... (...) o arguido AA perseguindo o ofendido BB, do interior do Renault 19, fez 6 disparos com arma de fogo de calibre 7,65mm Browning que atingiram a viatura do BB, sendo que uma das balas trespassou o vidro traseiro do habitáculo dos passageiros que estilhaçou com continuidade para o encosto de cabeça do banco traseiro do lado esquerdo (vestígio 5, fls. 60) com progressão para a frente do referido habitáculo até à pega no aro da porta da frente do lado esquerdo.

    Agiu da forma descrita, munindo-se da referida arma, cujos disparos eram susceptíveis de causar a morte, o que só não aconteceu por razões alheias à vontade do arguido... ".

    10 - Da prova produzida em audiência de julgamento, em momento algum se retira dos testemunhos produzidos que o recorrente praticou tais actos preparatórios e tal acto de tentativa de homicídio.

    11 - Nem sequer se provou que tenha sido o veículo do arguido, assim como que foi o arguido que disparou.

    12 - Também em momento algum o Exmo. Dr. Juiz fez referência à arma, análise da mesma e respectivos invólucros, pelo que não se encontrou provada a utilização da mesma e daquela arma apreendida em casa da ex. sogra do arguido o e também co-arguida no processo.

    13 - Segundo o Colectivo da Relação de Coimbra, aquando da motivação por parte do Exmo. Sr. Procurador-Geral adjunto, para os efeitos do art.º 416º nº 1 do CPP, o qual se pronunciou pela ALTERAÇÃO NÃO SUBSTANCIAL DOS FACTOS, nos termos do art.º 358º nº 1 e 3 do CPP, incorrendo o acórdão na nulidade do art.º 379º nº 1 a) b) e c) do CPP o qual importava suprir.

    14 - O arguido não se pronunciou da alteração da qualificação jurídica dos factos, pois primeiro o arguido manteve o que alegou a quando das suas motivações, mas se assim não fosse, a alteração jurídica foi NÃO SUBSTANCIAL, pelo que o tipo de Alteração não substancial é aquela que representando uma modificação dos factos acusados ou constantes da pronúncia, não têm por efeito a imputação de um crime diverso nem a das penas aplicáveis.

    I5 - Desde que não haja alteração substancial ou parcial dos factos, em julgamento, o tribunal pode qualificar juridicamente os factos de modo diverso do que foi entendida na acusação. (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 22 de Abril de 1992, processo n.º 42609) 16 - Sendo que na situação prevista no artigo 409.º do Código de Processo Penal, tal só impede que o tribunal de recurso aplique ao agente a sanção correspondente ao crime mais grave, mas não impede que o mesmo tribunal modifique a qualificação jurídico-criminal, dentro do âmbito definido pelo artigo 402.º, não limitado, nos termos do artigo 403º, ambos do Código de Processo Penal (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 19 de Setembro de 1990, Actualidade Jurídica, nº 10-11, processo n.º 40 924).

    Por tal facto o arguido confiante no Tribunal da relação de Coimbra, não se pronunciou pois ao tribunal está vedado a "reformatio in pejus".

    17 - No entanto não foi isso que se verificou, pois ao arguido foi: - Negado o provimento ao recurso interposto por si.

    -conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo ministério publico, e em consequência, foi revogado o acórdão recorrido quanto ao enquadramento penal dos factos relativamente aos crimes de homicídio simples, tentado, agravado pelo uso da arma de fogo, p e p pelos art.º 131º e 22º 23º nº1 e 2, 73º nº 1 al) a) e b) do CP e art.º 86º nº 3 e 4 do RJAM na pena de 5 anos de prisão.

    - Nos termos do art.º 77º nº 1 e 2, 40º e 71º nº 1 e 2 do CP reformulando o cúmulo jurídico desta pena, com a pena do crime de detenção de arma proibida p. p pelo art.º 86º nº 1 al c) do RJAM de 1 ano e 6 meses de prisão, condena-se o arguido na pena única de 5 anos e 8 meses de prisão, mantendo o tudo mais decidido no douto acórdão.

    18 - Como se pode analisar o arguido está a ser penalizado por uma pena mais penosa decidindo para lá dos poderes de cognição, enfermando assim a decisão de nulidades, já elencadas 19 - O arguido ao colocar as passagens concretas em que fundou a sua impugnação está por si só a indicar COMO OS FACTOS SE PASSARAM e não a retirar para si qualquer vantagem.

    Porque ao transcrever o depoimento do ofendido Armando Pinto está a provar que não foi o arguido que disparou nem foi o arguido que foi no veiculo, pois o ofendido, NÃO IDENTIFICOU QUEM IA ATRAS DE SI.

    20 - Ao referir o Colectivo de juízes que não é forma de impugnar, o que é certo é que o arguido nas suas motivações indica os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida (declarações do ofendido) indicando o recorrente em que momento (hora dia e minutos do CD em que se encontram as declarações).

    21 - Como Pode o Exmo. Colectivo entender de forma diversa quando o arguido indica as passagens e o Exmo. Dr. Juiz do Tribunal de 1ª instância decidiu de forma diversa do que está no depoimento do ofendido, indo o mesmo para além do que está no seu poder de cognição e de livre arbítrio violando o in dubio pro reo assim como os direitos constitucionais do arguido a um julgamento sem pré- valoração e preconceito? 22 - E que no caso e segundo o texto do Colectivo de juízes na página 19 in fine "se a testemunha diz que [é] "branco" o juiz não pode dar como provado que é "preto''.

    23 - Neste caso, a Testemunha/ofendido disse que não tinha visto, e o Dr. Juiz deu como provado que...

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