Acórdão nº 1/15.4GAMTS.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelMANUEL AUGUSTO DE MATOS
Data da Resolução06 de Junho de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - RELATÓRIO 1.

Requereu o Ministério Público o julgamento, em processo comum com intervenção do tribunal colectivo, dos arguidos: AA, [...], actualmente detido no Estabelecimento Prisional do Porto, sujeito à medida de coacção prisão preventiva à ordem dos presentes autos; BB, [...]; CC, [...] DD, [...] EE, [...] imputando: - aos arguidos AA, BB e EE a prática de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artigo 21º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro: - ao arguido CC a prática de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artigo 21º e 24º, alínea b), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro; - ao arguido DD a prática de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artigo 26.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro.

Realizado o julgamento, foi deliberado: Absolver a arguida EE da prática de um crime de tráfico de substâncias estupefacientes, p.p. pelos artigos 21º do Dec. Lei n.º 15/93, de 22.01., pelo qual vinha acusada.

Condenar - o arguido AA, numa pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão pelo cometimento, em co-autoria material, de um crime de tráfico de substâncias estupefacientes, p.p. pelo artigo 21º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro; - a arguida BB, numa pena de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão pelo cometimento, em co-autoria material, de um crime de tráfico de substâncias estupefacientes, p.p. pelo artigo 21º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro; - o arguido CC, numa pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão pelo cometimento, em autoria material, de um crime de tráfico de menor gravidade, p.p. pelos artigos 21º, n.º 1 e 25º, ambos do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro; - o arguido DD, numa pena de 10 (dez) meses de prisão pelo cometimento, em autoria material, de um crime de traficante-consumidor, p.p. pelos artigos 21º, n.º 1 e 26.º, ambos do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro.

- Suspender a execução da pena de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão aplicada à arguida BB, por igual período de tempo, sujeitando-a às supra enunciadas regras de conduta e regime de prova nos moldes definidos.

- Suspender a execução da pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão aplicada ao arguido CC, por igual período de tempo, sujeitando-o às supra enunciadas regras de conduta e regime de prova nos moldes também definidos.

- Substituir a concreta pena de 10 (dez) meses de prisão aplicada ao arguido DD pela Pena de Prestação de Trabalho a Favor da Comunidade (PTFC), num total de 300 (trezentas) horas, sujeitando o arguido às regras de conduta discriminadas.

2.

Inconformado, recorre o arguido AA, extraindo da respectiva motivação as seguintes: «CONCLUSÕES: a. O acórdão deve ser declarado nulo por restrição ilegal ao direito de defesa ao impedir o arguido de ser presente na audiência e de prestar o consentimento pessoal perante uma importante comunicação de alteração dos factos.

b. Determinando o tribunal que o arguido não estaria presente por motivo do não transporte do mesmo devido à greve dos serviços prisionais.

c. É também nulo o julgamento e o acórdão porque o tribunal decidiu denominar como uma alteração não substancial dos factos a amputação da maior parte da acusação, atribuindo o início dos factos a partir de 22.11.206.

d. Para assim tornear a evidência da aplicação do princípio constitucional do ne bis in idem.

e. Bem sabendo que o crime era o mesmo e que os únicos e escassos factos de que decidiu tomar conhecimento continuando a julgar o arguido eram indissociáveis dos demais anteriores.

f. Inclusive os produtos e objectos apreendidos aquando das buscas que não determinou em que data foram adquiridos.

g. O tribunal errou assim porque, acolheu uma interpretação inconstitucional da lei processual, a saber que ninguém pode ser julgado duas vezes pela prática do mesmo crime.

h. Desse modo acolhendo e aplicando efectivamente uma interpretação inconstitucional dos artigos 358º e 359º do CPP a saber que, em processos concomitantes, em que se desconhece a data certa do início do crime de tráfico de estupefacientes, pode o arguido ser julgado no mesmo período duas vezes pelo mesmo crime através da separação de factos da mesma natureza e indissociáveis dos demais, a que se atribuem datas diferentes, através da amputação da acusação pública, que fere o artigo 29º nº 5 da Constituição da República portuguesa e o princípio da legalidade.

i. Errou ainda na medida da pena, tratando o recorrente de forma injusta e em iniquidade, atenta a fundamentação e os factos provados atribuídos aos demais co-arguidos em muito maior número e zonas de disseminação que o único facto a si atribuído.

j. Iniquidade que, mesmo tendo em conta e sabendo que o recorrente era consumidor de haxixe desde os 16 anos, assim mesmo lhe aplicou uma pesada pena prisão efectiva de 5 anos e 6 meses de prisão.

k. Mais errou na qualificação que decidiu quanto à substância da comunicação que através de uma decisão surpresa e desleal sem a presença e o consentimento pessoal do arguido definiu como mera alteração não substancial dos factos.

I. Bem sabendo que, ao contrário, se tratou de uma forma pragmática e inadmissível de tornear a evidência da impossibilidade de tomar conhecimento dos factos pela prática pelo arguido duas vezes pelo mesmo crime. Assim continuando a julga-lo em ilegalidade.

m. Finalmente é nulo o acórdão por erro na ponderação da situação real e presente do recorrente quanto aos factos e sobretudo quanto aos elementos factuais de natureza subjectiva, prejudicando-o objectivamente pelo silêncio ao impor-lhe a não presença em julgamento na data em que proferiu a comunicação da alteração dos factos seguida de imediato da leitura do acórdão.

n. E quanto à sua vida pessoal, não atendendo a que é, ainda jovem e tem tido excelente comportamento prisional; uma pena tão pesada na sua medida significa objectivamente que o recorrente, nada entenderá, ao constatar que os demais co-arguidos por factos mais graves e numerosos permaneceram em liberdade.

o. Acolhendo um conceito de consolidação da prevenção geral que apenas assentou em presunções destituídas de factos reais na zona da sua residência.

p. Feriu assim o acórdão os arts. 61º nº 1, als. a) e c); 97º nº 5; 118º; 119º al. c); 358º a contrario sensu; 359º nº 2; 374º nº 2 in fine; 379º nºs 1, als. a) e c); 410º nºs 1 e 3; do CPP; 70º; 71º, 72º nº 1 e 772 do C. Penal; art. 29º nº 5 e 204º da CRP e art. 6º nº 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

Devendo ser revogado e declarado nulo o julgamento e/ou o acórdão pelos motivos de direito expostos e os autos reenviados para novo julgamento. E ser o arguido de imediato libertado.

Ou, finalmente, seja a decisão condenatória reformulada e diminuída, a pena cumulada nos termos e segundo as opções explicitadas pela defesa. Não devendo a pena cumulada ser em todo o caso superior a 4 anos e 3 meses de prisão suspensa na sua execução com regime de prova.» 3.

Respondeu o Ministério Público, dizendo: «O arguido, ora recorrente, AA, foi condenado como autor material de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artº 21.°, n.º 1 do D.L. n.º 15/93, de 22/1, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão.

Inconformado com esta decisão, o arguido interpôs o presente recurso, que abrange matéria de direito.

Impugna o recorrente a decisão proferida, por entender que o acórdão deve ser declarado nulo "por restrição ilegal ao direito de defesa ao impedir o arguido de ser presente na audiência e de prestar o consentimento pessoal perante uma importante comunicação" e ainda porque "decidiu denominar como uma alteração não substancial dos factos a amputação da maior parte da acusação, atribuindo o início dos factos a partir de 22/11/2016." Por isso, pede seja revogado e declarado nulo o acórdão recorrido, ou a não ser assim entendido, com fundamento em erro na aplicação do direito quanto à medida da pena seja esta reduzida para 4 anos e 3 meses de prisão, suspensa na sua execução.

Não é este o nosso entendimento.

Depois de analisada a acta da audiência final e o douto acórdão recorrido, não vislumbramos a existência de qualquer nulidade.

É certo que o arguido não estava presente, falta que não lhe é imputável, mas também é certo que estava devidamente representado pelo seu ilustre defensor.

Este foi devidamente notificado do teor do despacho prévio à leitura do acórdão e nada requereu.

Não se compreende as nulidades agora arguidas...

Nos termos do art.º 40.°, n.º 1 do Cód. Penal, as finalidades das penas são a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, não podendo em caso algum a pena ultrapassar a medida da culpa ( n.º 2 do mesmo art.º 40.°).

Por sua vez a determinação da medida concreta da pena é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção (art.º 71.°, n.º 1 do Cód Penal).

E o n.º 2 do art.º 71.º do Cód. Penal enumera alguns dos factores mais relevantes de carácter geral, atendíveis para a graduação das penas.

A suspensão da execução da pena de prisão tem lugar, atento o disposto no art.º 50.°, n.º 1 do Cód. Penal, se a simples censura do facto e a ameaça daquela pena forem bastantes para afastar o arguido da criminalidade, satisfazendo simultaneamente as necessidades de reprovação e prevenção do crime.

No acórdão recorrido são expressamente referidos os fundamentos da medida da pena quanto à personalidade do agente e à conduta do agente anterior e posterior aos factos.

A pena está devidamente graduada, é equilibrada e justa, não havendo razões para ser reduzida.

Face à matéria de facto dada como provada, a qual se encontra devidamente fundamentada e justificada a prova que lhe serviu de suporte, bem como a exposição de facto e de direito que fundamentam a decisão, entendemos que o Tribunal «a quo» não podia deixar de condenar o recorrente, como condenou.

Em conclusão: 1- O acórdão recorrido não padece das...

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