Acórdão nº 246/10.3TBLLE.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Setembro de 2018

Magistrado ResponsávelANTÓNIO JOAQUIM PIÇARRA
Data da Resolução13 de Setembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Relatório I – AA, residente em Quarteira, instaurou acção declarativa, com processo ordinário, contra BB residente em Quarteira, CC – Unipessoal, Lda., com sede em Mafamude, e BB, SA, com sede em Lisboa, alegando, em síntese, que: É casado com a ré BB, a favor de quem emitiu uma procuração, em Fevereiro de 2007, com o objetivo de lhe conferir poderes para o representar em tribunais e escrituras, no âmbito de questões relacionadas com o património do ex-marido daquela e respetivos progenitores.

Fazendo uso dessa procuração, a ré BB vendeu à ré CC, no dia 27 de Novembro de 2008, pelo preço de € 150 000,00 o seu prédio urbano, correspondente a um edifício térreo, com quatro divisões, garagem e logradouro, com piscina, sito no Lugar de ......, freguesia de Quarteira, concelho de Loulé, descrito na Conservatória do Registo Predial desse concelho sob o nº...... e inscrito na matriz sob o artº9..6.

Com a escritura pública da venda foi simultaneamente celebrado um contrato de mútuo oneroso entre as rés CC e BB, garantido por hipoteca sobre o aludido prédio.

Não teve conhecimento da venda e da constituição da hipoteca, não recebeu qualquer quantia relativa ao preço da venda do prédio, onde continuou a residir.

Com tais fundamentos, concluiu por pedir que: a) se considere ineficaz e inexistente, ao abrigo dos artigos 269.º e 268.º, ambos do Código Civil, o contrato de compra e venda constante da escritura de compra e venda exarada em 27-11-2008, a fls. 140 a 143 do Livro .... do Cartório Notarial da Dr.ª Notária EE, sito na ....... n.º ..., ...andar, sala..., na cidade do Porto (consubstanciado no doc. n.º 19 anexo à petição inicial); b) se considere ineficaz e inexistente o contrato de mútuo oneroso com hipoteca celebrado através desse instrumento notarial, na parte em que onera, por hipoteca, o referido prédio urbano do autor; c) se declare nulo e sem qualquer efeito o aludido contrato de compra e venda, por violação de normas imperativas legais; d) se declare a nulidade subsequente do contrato de mútuo oneroso, na parte em que onera, por hipoteca, o prédio urbano do autor; e) se declare a resolução da escritura de compra e venda de 27-11-2008, por falta de pagamento do preço, por falta de entrega do bem ao comprador e por o autor continuar a residir no mesmo, nos termos do artigo 886.º do Código Civil, e em consequência também a resolução do contrato de mútuo oneroso, na parte em que onera, por hipoteca, o prédio urbano do autor; f) se ordene o cancelamento de todos e quaisquer registos prediais e inscrições prediais, designadamente aquisições e hipotecas que incidam sobre o identificado prédio do autor e que sejam incompatíveis com o direito de propriedade plena do autor sobre o dito prédio; g) ou, caso não sejam atendidos os pedidos antes referidos, a condenação de todas as rés a pagar-lhe solidariamente, a título de preço pelo prédio, a quantia que resultar da avaliação do dito prédio, por perícia colegial a realizar, no âmbito dos presentes autos.

As rés contestaram, autonomamente, contrapondo diferente versão e concluíram pelo infundado do petitório do autor, tendo ainda a ré CC deduzido reconvenção, visando obter a condenação daquele a pagar-lhe a quantia de € 20 000,00 relativa aos prejuízos que sofreu com a interposição e o registo da acção.

O autor apresentou réplica, pugnando pela improcedência da reconvenção.

Em sede da audiência preliminar, foi rejeitada a deduzida reconvenção e saneou-se a causa, após o que se elencou a matéria de facto assente e se organizou a base instrutória.

Na sequência da normal tramitação processual, foi realizada a audiência final e lavrada sentença, datada de 27.11.2016, que, na procedência da acção, decidiu o seguinte:

  1. Anula-se o contrato de compra e venda celebrado entre as 1ª e a 2ª rés por escritura de compra e venda que teve por objecto o prédio urbano sito em ....... ou ...... (actualmente Rua .......), freguesia de Quarteira, concelho de Loulé, inscrito na respectiva matriz sob o artigo n.º 9...6 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé com o nº ...... da freguesia de Quarteira; B) Declara-se ineficaz o contrato de mútuo onerado com hipoteca celebrado em 27/11/2008, entre a ré BB e a ré “CC Unipessoal, Lda”, na parte em que onera o prédio urbano sito em ....... ou ...... (actualmente Rua .......), freguesia de Quarteira, concelho de Loulé, inscrito na respectiva matriz sob o artigo n.º9..6 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé com o nº ...... da freguesia de Quarteira; C) Determina-se o cancelamento de todos e quaisquer registos prediais e inscrições prediais que incidam sobre o prédio urbano sito em ....... ou ...... (actualmente Rua .......), freguesia de Quarteira, concelho de Loulé, inscrito na respectiva matriz sob o artigo n.º 9....6 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé com o nº ...... da freguesia de Quarteira e que sejam incompatíveis com o direito de propriedade do Autor sobre o referido prédio, designadamente, a aquisição registada pela Ap. ... de 14.11.2008 (provisória) e a Ap. ... de 9.12.2008 (definitiva) a favor da Ré “CC Unipessoal, Lda”, e a hipoteca registada a favor da Ré BB pela Ap. ... de 14.11.2008 (provisória) e Ap. ...de 9.12.2008 (definitiva).

    Discordando dessa decisão, apelou a ré BB, impugnando de facto e de direito, com total êxito, tendo a Relação de Évora, na sequência das alterações operadas na matéria de facto, revogado a sentença e decidido julgar a acção improcedente e absolver as rés de todos os pedidos.

    Agora inconformado, interpôs o autor recurso de revista, finalizando a sua alegação, com as extensas, complexas e redundantes conclusões que se transcrevem: 1 - Por escritura pública de compra e venda, outorgada no dia 27 de Novembro de 2008, no Cartório Notarial privativo da BB, sito na Rua ......., nº ...., no Porto, BB por si na qualidade de autorizante e na qualidade de procuradora e em representação de AA declarou vender a “CC – Unipessoal, Ldª.”, que declarou aceitar, pelo preço de cento e cinquenta mil euros, já recebido, o prédio urbano, destinado a habitação, correspondente a um edifício térreo, com quatro divisões, garagem e logradouro, com piscina, sito no Lugar de ......, freguesia de Quarteira, concelho de Loulé, descrito na Conservatória do Registo Predial desse concelho sob o nº ...... e inscrito na matriz sob o artº. 9...6.

    2 - O A. não deu instruções à Ré BB para vender esse prédio.

    3 - Sendo o A. ao tempo casado com a Ré BB uma procuração do A. para a Ré BB (então sua esposa) tinha de ter poderes específicos para os actos de alienação, e a procuração referida nas als. C) e D) dos factos provados não tem esses poderes específicos, é dúbia, e em lado nenhum tem poderes específicos para vender e nem tem em lado algum a palavra “vender”.

    4 - O A. não recebeu qualquer valor referente ao preço da compra e venda a que estes autos se reportam.

    5 - Aliás, e conforme docs. de fls. 832 a 840, 785 e 786, 823, 841 a 858, 859 a 867 e 874 destes autos, no acto da escritura realizada em 27/11/2008 a Ré BB recebeu do Sr.FF, legal representante da Ré CC, e para pagamento do preço um cheque de 125.000,00€ (da DD.), cheque este que a Ré BB endossou e entregou novamente ao ditoFF legal representante da Ré CC, o qual por sua vez o depositou numa conta do Banif titulada pela firma “.... S. A.”, firma esta onde por sua vez o dito FF legal representante da Ré CC, era ao tempo também Presidente do Conselho de Administração e seu legal representante, e assim se apropriando o Sr.FF, legal representante da Ré CC, de forma criminosa e em perfeito enriquecimento sem causa, da referida quantia de 125.000,00€.

    6 - Em 27/11/2008 o valor do mercado do prédio do A. referido em A) dos factos considerados provados era na ordem dos 225.188,00€.

    7 - O Tribunal da Relação de Évora teve em conta para considerar não provados os factos constantes das referidas alíneas S, V, X, CC e DD o depoimento da testemunha GG, ao qual o Tribunal de 1ª instância não tinha dado qualquer credibilidade e nem se escorado no mesmo para fundamentar a sua resposta à matéria de facto.

    8 - Não se pode, e logo “a priori”, dar qualquer credibilidade ao depoimento da testemunha GG – advogada de profissão – esta nem sequer se dignou para puder depor como testemunha previamente solicitar à Ordem dos Advogados a necessária dispensa/levantamento do sigilo profissional a que está obrigada e pese embora tenha referido que não prestou qualquer serviço, ou seja, o serviço prestado foi “pro bono”, gratuito, e por amizade, tal não a libertava de previamente requerer a necessária dispensa/levantamento do sigilo profissional, e do teor do depoimento por si prestado não restam dúvidas que a assistência/serviço que prestou seja ao ora A. seja à então ainda mulher deste a Ré BB, foi de natureza jurídica e enquadrando-se na actividade profissional de advogada desenvolvida pela testemunha GG.

    9 - E seguem-se, a título de exemplos, excertos do depoimento da testemunha Drª GG, dos quais é evidente a sua falta de credibilidade: a) “aquilo que eu percebi na altura é que entre a comunidade alemã havia um grande burburim por causa das vendas judiciais, seja pelas Finanças seja pelos Bancos e era onde toda a gente queria investir, achavam que os apartamentos estavam a ser vendidos por tuta e meia, cinquenta mil, quarenta mil, vinte mil.” (- o que é pública e notória mentira à data de 12 e 13 de Fevereiro de 2007, quando é feita a procuração referida nas als. C) e D) dos Factos considerados provados); b) ([Advogado do A.]: referiu que a procuração não foi para a venda da casa, que era uma procuração para a mulher puder investir no lugar dele quando ele estava no estrangeiro?) Resposta da Testemunha – “Eu percebi que era para gerir a casa como um bem comum do casal … e também porque a comunidade alemã andava com este burburinho de investimentos em Portugal, e também se houvesse uma oportunidade de negócio...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
1 temas prácticos
1 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT