Acórdão nº 0371/18.2BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 27 de Setembro de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA DO CÉU NEVES
Data da Resolução27 de Setembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam os Juízes no Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO 1. A……………….., Magistrado do Ministério Público, com a categoria de Procurador-Adjunto, residente na rua ……….., nº ………., ………., em ……, pediu a este Supremo Tribunal Administrativo [STA] a «suspensão de eficácia» do decidido no acórdão do Plenário do Conselho Superior do Ministério Público [CSMP] datado de 16.01.2018, que em sede de reclamação do acórdão da Secção Disciplinar do mesmo Conselho, datado de 07.11.2017, lhe aplicou a «pena disciplinar de 19 meses de inactividade», reduzindo em 1 mês a pena do acórdão reclamado.

Para tanto, alegou que a decisão punitiva cuja eficácia pretende ver suspensa, padece de «erros manifestos» nos seus pressupostos de facto, e de direito, que a sua imediata execução acarretar-lhe-á prejuízos de difícil reparação, e, até, uma situação de facto consumado, sendo que, além disso, os danos daí resultantes, para si, são superiores aos eventualmente resultantes para o interesse público - cfr artºs 114º e 120º do CPTA.

* A Secção do Contencioso do STA, por acórdão datado de 24.05.2018, indeferiu o pedido cautelar formulado, por não verificação do requisito fumus boni iuris.

* Inconformado, o requerente interpôs o presente recurso jurisdicional para o Pleno do STA.

Apresenta para o efeito as seguintes conclusões de recurso: «1.) O aqui recorrente apresentou uma versão alternativa dos factos que forçosamente tem de preencher o conceito de “dúvida razoável” quanto à razão pela qual apôs, em processos da sua competência, assinaturas electrónicas que não foram acompanhadas do correspondente despacho, sendo que essa sua versão, ao contrário do que foi decidido no acórdão recorrido, é coerente e razoável, pelo que infirma a motivação que foi pressuposta na decisão punitiva; 2.) O aqui recorrente apresentou uma versão alternativa dos factos que forçosamente tem de preencher o conceito de “dúvida razoável”, seja quanto ao modo como o jornalista ………… teve conhecimento de que tinha sido deduzida acusação no inquérito nº …………, seja acerca do que o levou a aceder, através do CITIUS, a esse processo, e a versão por ele apresentada é coerente e razoável, uma vez mais ao contrário do que foi decidido no acórdão recorrido, pelo que infirma o que a esse respeito foi dado como provado, e pressuposto, na decisão punitiva; 3.) Nos autos existem indícios que apontam em sentidos opostos e da análise de cada um dos dois conjuntos de indícios não é possível afirmar, com segurança e em consciência, que os indícios que apontam no sentido de o aqui recorrente poder ter praticado os factos que lhe são imputados tenham maior valor probatório e, por isso, devam prevalecer sobre os indícios que apontam em sentido diverso; 4.) Por haver uma situação dúvida razoável sobre os segmentos sindicados dos pontos 1, 75 e 77 da fundamentação de facto da decisão punitiva - não só porque a prova coligida no processo disciplinar não permite fundar ou formular uma convicção segura, de certeza apodítica da prática dos factos aí imputados ao arguido, como também pela existência de versões alternativas, coerentes e razoáveis, por este apresentadas - é inequívoco existir erro nos pressupostos de facto da decisão punitiva, o qual inquinou a subsunção nela feita ao direito aplicável, pois não revelando a conduta do aqui recorrente “falta de honestidade, grave insubordinação ou (...) conduta imoral ou desonrosa”, jamais poderia ter sido subsumida, como indevidamente foi, na alínea b) do nº 1 do artº 184º do E.M.P., a que corresponde a pena de aposentação compulsiva ou de demissão - o que se traduz num erro grosseiro (no sentido de palmar, ostensivo ou manifesto) nos pressupostos de direito dessa mesma decisão; 5.) Porque a prova testemunhal e documental produzida no processo disciplinar, e na qual se funda a decisão punitiva, não se mostra dotada do grau de certeza e de segurança exigidos nesta matéria, para além de toda a dúvida razoável, não permitindo formar uma convicção segura para a sustentação da imputação/efetivação de responsabilidade disciplinar ao aqui recorrente, para além de existir erro sobre os seus pressupostos de facto, foram feridos os princípios da presunção da inocência do arguido e do “in dubio pro reo” - o que também se reconduz à assacada violação do princípio da justiça; 6.) Porque todos estes vícios da decisão punitiva são cominados com a anulação peticionada na acção principal, fica demonstrada a elevada (para não dizer quase certa) probabilidade de vir a ser julgada procedente a pretensão formulada nesse processo, o que equivale à verificação do requisito do fumus boni iuris, nos termos prescritos no art. 120º, nº 1, do CPTA; 7.) Ao entender coisa diversa, o Tribunal a quo incorreu num erro de julgamento, porquanto não fez uma correcta interpretação e aplicação do princípio da legalidade da prova, e antes contrariou o enquadramento legal, doutrinal e jurisprudencial que se tem por correcto, com o que violou os princípios constitucionais da presunção de inocência do arguido e do in dubio pro reo; 8. O Tribunal a quo desconsiderou as explicações alternativas que o aqui recorrente apresentou para a conduta infraccional que lhe fora imputada, bem como que estas conduzem a uma situação de dúvida razoável, quando correctamente analisadas as provas recolhidas no âmbito do processo disciplinar e devidamente valorados os demais indícios, bem como quando considerou que para a condenação ocorrida (e, como tal, para a insindicabilidade da decisão punitiva) bastava um mero juízo de plausibilidade acerca da materialidade dos factos que lhe foram imputados, e não um juízo de certeza, capaz de afastar a tal dúvida razoável; 9. O Tribunal a quo errou ainda quando considerou que se antevê difícil o êxito da acção principal - e, por essa razão, não verificado o fumus boni iuris - com base no argumento de que o sucesso está dependente da prova da «factualidade subjectiva uma vez que neste tipo de processo, de natureza sancionatória, basta existir a dúvida razoável - que no caso existe e advém de factualidade objectiva».

* O CSMP, ora recorrido, contra-alegou, vindo a formular as seguintes conclusões: «A. O douto acórdão recorrido, ao julgar a ação cautelar improcedente, decidiu com acerto todas as questões que o Tribunal devia apreciar, com correta apreciação dos factos, interpretação e aplicação do Direito; B. Conforme se decidiu no douto acórdão recorrido, não se verifica o fumus boni iuris pois não existe probabilidade de procedência da ação de impugnação do ato suspendendo com base nos pretensos vícios que o requerente lhe atribui; C. Concretamente, o ato suspendendo não enferma de erro nos pressupostos de facto por ter dado como provados os factos descritos nos pontos 1 e 77 da matéria de facto assente, na sua vertente subjetiva, única que o recorrente questiona; D. Pois infere-se com toda a segurança da conduta do recorrente que ao praticar os factos objetivos que assume, simulando despachos nos processos para ocultar os atrasos que tinha, agiu sempre voluntária e conscientemente, com propósitos que sabia serem desadequados ao seu estatuto de magistrado do Ministério Público, conforme se considerou provado; E. E nem isso, fica posto em causa pelo facto de o recorrente invocar que só queria evitar que o número de baixas mensal no ……… de ……….. não contrariasse o elevado número de entradas, e assim evitar também problemas com os seus superiores hierárquicos; F. Pelo que o douto acórdão recorrido, ao considerar que a intenção extraída pelo ato suspendendo como motivadora da conduta do recorrente se mostra lógica e perfeitamente de acordo com as regras da experiência comum, não é merecedor de qualquer censura, sendo de todo improcedentes as críticas que o recorrente lhe faz; G. O ato suspendendo também não enferma de erro nos pressupostos de facto por ter dado como provados os factos descritos nos pontos 75 da matéria de facto assente; H. Com efeito, o próprio recorrente admite parcialmente os factos: que teve a conversa telefónica com o jornalista, sobre o processo de que não era titular, ao qual acedeu ilegitimamente através do CITIUS, tendo confirmado ao jornalista que o inquérito já tinha despacho final; I. Mais resulta de toda a prova produzida, apreciada na sua globalidade, de forma crítica e conjugada, de acordo com as regras da experiência comum que o requerente efetivamente deu conhecimento ao jornalista de que tinha sido deduzida acusação naquele processo; J. Portanto, também neste aspeto, o ato suspendendo não enferma de erro nos pressupostos de facto, não existindo qualquer divergência entre os pressupostos de que o CSMP partiu para proferir a decisão punitiva no ato suspendendo e a sua efetiva verificação na situação em concreto; K. E por isso, foi com todo o acerto que assim se entendeu no douto acórdão recorrido, pelo que também neste aspeto não incorreu no erro de julgamento que o recorrente lhe atribui; L. No douto acórdão recorrido fez-se a sindicância da fixação dos factos que se impunha ser feita, e o que sucedeu foi que em resultado dessa sindicância o Tribunal não deu razão ao recorrente; M. O recorrente vem agora invocar uma pretensa violação dos princípios da presunção da inocência do arguido e in dubio pro reo, mas não suscitou essas questões no requerimento inicial, razão por que não foram objeto de apreciação no douto acórdão recorrido e também não o poderão ser agora em sede de recurso de revista; N. Com efeito, o Tribunal de recurso já não pode apreciar a prova para saber se em face dela persistem dúvidas inultrapassáveis sobre os factos, apenas poderia sindicar se na decisão sob recurso o julgador teve essas dúvidas e perante elas não observou o princípio in dubio pro reo; O. Sucede que no caso dos autos a apreciação da prova desde logo não suscitou quaisquer dúvidas ao CSMP, e...

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