Acórdão nº 659/16.7T8VNG.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Julho de 2018

Magistrado ResponsávelFÁTIMA GOMES
Data da Resolução12 de Julho de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I. Relatório 1. AA intentou a presente acção declarativa comum contra BB pedindo:

  1. OS CONTRATOS DE COMPRA E VENDA OUTORGADOS PELA RÉ PARA AQUISIÇÃO DA FRACÇÃO DESIGNADA PELA LETRA “AZ” DO PRÉDIO CONSTITUIDO EM PROPRIEDADE HORIZONTAL SITO NA RUA ..., DA UNIÃO DE FREGUESIAS DE ... E ..., CONCELHO DE VILA NOVA DE GAIA INSCRITO NA MATRIZ URBANA SOB O ARTIGO 7796 DA DITA UNIÃO DE FREGUESIAS E DESCRITO NO REGISTO SOB O Nº 137 DA FREGUESIA DE ..., BEM COMO DO VEÍCULO AUTOMÓVEL COM MATRICULA ...-GJ-..., MARCA FIAT, SER DECLARADOS NULOS POR SIMULADOS E AINDA DECLARADOS VÁLIDOS OS CONTRATOS DE COMPRA E VENDA (DISSIMULADOS) DO MESMO IMÓVEL E DO MESMO VEÍCULO AUTOMÓVEL, PELO AUTOR.

  2. SER CANCELADO O REGISTO DE AQUISIÇÃO DA SOBREDITA FRACÇÃO AUTÓNOMA A FAVOR DA RÉ, PELA AP. 2094 DE 2010/11/05 DA CONSERVATÓRIA DO REGISTO PREDIAL DE MAFRA E AINDA O REGISTO DE AQUISIÇÃO DO VEÍCULO ...-GJ-... TAMBÉM A FAVOR DA RÉ; C) SER AVERBADO O REGISTO DE AQUISIÇÃO A FAVOR DO AUTOR DA SOBREDITA FRACÇÃO DESIGNADA PELAS LETRAS “AZ” E DO VEÍCULO AUTOMÓVEL ...-GJ-....

SEM PRESCINDIR E POR MERA CAUTELA DE PATROCINIO, D) SEMPRE DEVERÁ O AUTOR SER DECLARADO O LEGITIMO DONO E PROPRIETÁRIO DA SOBREDITA FRACÇÃO DESIGNDADA PELAS LETRAS “AZ” E DO VEÍCULO AUTOMÓVEL ...-GJ-..., SEJA POR EFEITO DE SUB-ROGAÇÃO DE VALORES PROPRIOS DO AUTOR, SEJA POR RECONHECIMENTO DE QUE TAIS BENS FORAM ADQUIRIDOS POR SI E NÃO PELA RÉ, E CONSEQUENTEMENTE DEVERÁ SER ORDENADO O CANCELAMENTO DO REGISTO DE AQUISIÇÃO DA SOBREDITA FRACÇÃO AUTÓNOMA A FAVOR DA RÉ, PELA AP. 2094 DE 2010/11/05 DA CONSERVATÓRIA DO REGISTO PREDIAL DE MAFRA E AINDA O REGISTO DE AQUISIÇÃO DO VEÍCULO ...-GJ-... TAMBÉM A FAVOR DA RÉ E AINDA AVERBADO O REGISTO DE AQUISIÇÃO A FAVOR DO AUTOR DA SOBREDITA FRACÇÃO DESIGNADA PELAS LETRAS “AZ” E DO VEÍCULO AUTOMÓVEL ...-GJ-....”.

Alegou, em síntese, que viveu em união de facto com a Ré entre Janeiro de 2004 e finais de 2012, sendo que, para salvaguardar o seu património de eventuais execuções judiciais decorrentes de dívidas contraídas no âmbito de um negócio de trespasse que havia celebrado, transferiu os saldos de depósitos bancários de que era exclusivo titular e proprietário para uma conta bancária aberta unicamente em nome da Ré, tendo depois adquirido uma fracção autónoma e um veículo automóvel com os fundos provenientes desses depósitos bancários; bens esses que ficaram na titularidade exclusiva da aqui Ré, por acordo com esta, de forma a subtraí-los de eventuais penhoras por parte dos seus credores. Mais alega que, aquando da aquisição dos referidos imóvel e veículo automóvel, a Ré sabia (e confessou-o já no âmbito de processos judiciais) que o dinheiro que serviu para pagamento dos respectivos preços pertencia exclusivamente ao Autor, tendo acordado com este que os transferiria para seu nome logo que tal lhe fosse solicitado; o que não cumpriu.

A Ré contestou, essencialmente alegando que o preço da aquisição do veículo automóvel e do imóvel foi pago com dinheiro exclusivamente seu (resultante da venda de bens que detinha no Brasil), impugnando a factualidade vertida na petição inicial.

2.

Foi realizada a audiência prévia, na qual foi proferido despacho saneador com indicação do objecto do litígio e enunciação dos temas da prova, sem reclamações – cfr. acta de fls. 124 a 126.

Foi realizada a audiência de discussão e julgamento, com observância de todas as formalidades legais, conforme consta das respectivas actas.

Foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e, em consequência, absolveu a Ré BB dos pedidos contra ela formulados pelo Autor AA.

Inconformado com a decisão, dela interpôs o A., ora recorrente, recurso per saltum para o STJ.

3.

Das conclusões do recurso, consta (transcrição): “DO PEDIDO PRINCIPAL, 1.ª) Perante os factos julgados provados, a Merª Juiz a quo considerou que a Ré BB figurou nos negócios em questão como mera testa de ferro ou homem de palha do aqui recorrente, este sim o verdadeiro interessado na aquisição daqueles bens (imóvel e a viatura), a qual só figurou formalmente nos contratos para que os credores não executassem esse património e que a ré nunca teve intenção de assumir o domínio sobre os referidos bens.

  1. - Mostram-se assim preenchidos dois dos elementos que caracterizam a simulação - a divergência entre a vontade real e a vontade declarada, e ainda a intenção de enganar e aqui também prejudicar terceiros (credores do autor). Todavia, considerou a Merª Juiz a quo que faltou comprovar que a entidade vendedora (quer do imóvel, quer do veículo automóvel em apreço) tivesse participado no conluio, no acordo simulatório.

  2. ) Chegados aqui, e não desconhecendo a divergência da nossa doutrina e jurisprudência, quanto a esta questão em concreto, que aliás a Merª Juiz a quo reconheceu e citando na douta sentença recorrida acórdãos dissonantes, entendemos ao contrário desta, que in casu para se decretar a simulação dos negócios, não é necessário a intervenção dos vendedores (do imóvel e do veículo automóvel) no acordo simulatório (conluio), ou seja a exigência de um «acordo simulatório tripartido».

  3. ) Dito isto, nesta questão em particular, e por a situação factual ser em tudo semelhante à dos presentes autos, acompanhamos de perto o entendimento sufragado pelos Calendas Juízes Conselheiros Orlando Afonso (relator), Távora Victor e Silva Gonçalves no acórdão deste Mais Alto Tribunal, datado de 03/12/2015, no processo 2936/07.09TBBCL.G1.51, publicado in www.dgsLpt., que citamos nas nossas alegações.

  4. ) Voltando ao nosso caso, entre outros, deu-se como provado que: ( ... ) 15 - Estando a ré na detenção das sobreditos quantias e vivendo maritalmente com o autor, este utilizou aqueles fundos para adquirir a fracção designada pela letra "AZ", do prédio constituído em propriedade horizontal sito na Rua ..., Vila Nova de Gaia, inscrito na matriz urbana sob o artigo 77962 da União de Freguesias de ... e de ..., que corresponde ao prédio anteriormente inscrito na matriz urbana sob o artigo 49692 da freguesia de ... e descrito na 2Q conservatória do registo predial de ... sob o n.º 1372 da freguesia de ..., bem como do veículo automóvel "Fiat Línea" com matricula ...-GJ-..., de 2008; 16 - Tais aquisições ficaram tituladas em nome da ré, mediante a promessa desta em os colocar em seu nome logo que o autor o solicitasse; 17 - Aquele veículo Fiat línea" e a fracção sita na Rua ... (Gaia) foram adquiridos pelo autor com o seu dinheiro, embora colocados em nome da ré; (. . .) 23 - Dinheiro (depositado na conta detida exclusivamente pela ré), esse, que serviu para pagamento do preço, despesas e impostos inerentes à aquisição da sobredita fracção designada pela letra “AZ", do prédio constituído em propriedade horizontal sito na Rua ... Vila Nova de Gaia, bem como do veículo automóvel "Fiat Línea" com matricula ...-GJ-...; 24 - Com intuito de enganar os eventuais credores do autor, mais propriamente a sociedade "Lavazza”; 25 - A ré sabia que, para além do dinheiro que serviu de pagamento dos preços e despesas inerentes à aquisição do sobredito veículo e imóvel pertencer exclusivamente ao autor, foi o autor quem pretendeu adquirir aqueles bens para si, integrando-os no seu património; 26 - Apesar disso, a ré declarou nos documentos que titulam a aquisição daqueles bens que os adquiriu para si- quando assim o não pretendia; 27 - Os ditos bens foram adquiridos pelo A., com o seu próprio dinheiro, limitando-se a Ré a figurar como adquirente.

  5. ) Pelo que concluímos, tal e qual os Calendas Juízes Conselheiros que daqui não se pode retirar como o fez a Merª Juiz a quo que os negócios jurídicos simulados eram de todo alheios às entidades vendedoras e, mesmo que o fosse, o acordo simulatório entre o autor e a Ré é bem patente.

  6. ) No caso do imóvel, é tão patente o acordo simulatório, que era do conhecimento do mediador imobiliário, o Sr. CC, representante da vendedora, que interveio no negócio da aquisição do imóvel, como resulta da douta motivação da decisão da matéria de facto quando se escreveu: “ (…) Já a testemunha CC, que foi mediador do negócio de compra e venda do apartamento de ...', em Vila Nova de Gaia, foi categórica em afirmar que mostrou aquele imóvel ao Autor e Ré, tendo sido sempre o Autor quem tratou de todas as questões respeitantes a este negócio (foi ele quem o contactou para ver a fracção, quem negociou o preço, quem colocou todas as questões respeitantes à mesma, etc.). Também mencionou que, naquela visita à fracção, o Autor lhe transmitiu que era ele quem estava a adquirir o apartamento e que era ele quem o iria pagar com dinheiro exclusivamente seu (embora depositado numa conta bancária titulada unicamente pela Ré), mas que a aquisição ficaria em nome da Ré porque tinha um litígio com uma empresa de café e não podia ter bens em nome de/e. Disse ainda que a Ré estava presente e assistiu a esta conversa...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT