Acórdão nº 5491/09.1TVLSB.L2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelSOUSA LAMEIRA
Data da Resolução24 de Maio de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO l.

AA e BB que, falecido na causa, deu lugar à habilitação dos seus sucessores, a aqui autora e CC, DD e EE, FF e GG, intentaram o presente incidente de liquidação contra Município de Lisboa, alegando, em síntese, que: Foi proferido acórdão pelo Supremo Tribunal de Justiça em 22.09.2005, que condenou o réu a pagar aos autores «a título de indemnização, a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença e que corresponda à diferença entre o valor do terreno se lhe tivesse sido dado o destino constante da escritura de doação e o valor que passou a ter com o destino que, na realidade, lhe veio a ser dado».

Ora, na escritura de doação de 18.11.1983 as partes atribuíram ao terreno doado o valor de 500.000$00 (€ 2.493,99), valor este correspondente ao valor do terreno doado se lhe tivesse sido dado o destino constante da escritura de doação «equipamento a executar pela Câmara ou a seu mando e execução do HH, ou outro plano de realojamento de natureza social», valor que, actualizado a Junho de 2006, é de € 11.442,31. No terreno doado foram localizados vários lotes para construção, onde estão construídos edifícios de luxo e de construção e preço de padrão médio/alto, estimando os autores que os edifícios implantados no terreno doado tenham áreas de construção superiores a 150.000 m2; os autores “comprometem-se a rectificar as referidas áreas de construção face aos alvarás de licenças de construção emitidos pela CML para os lotes localizados no terreno doado”.

Na zona do terreno doado e em zonas vizinhas têm estado a ser transaccionados lotes de terreno para construção com características semelhantes, por valores superiores a € 1.000,00m2 de edificabilidade.

O valor que o terreno doado passou a ter, com o destino que lhe veio a ser dado, deve ser calculado à razão pelo menos de 800 €/m2 das áreas de construção dos edifícios nele implantados, passando, assim, o terreno a ter, com o destino que lhe veio a ser dado, um valor de € 120.000.000,00, sendo a diferença entre o valor que o terreno passou a ter com o destino que na realidade lhe veio a ser dado e o valor do tereno se lhe tivesse sido dado o destino constante da escritura de doação, de € 119.988.557,69. Concluem pedindo que se liquide tal quantia em € 119.988.557,69, “acrescidos de juros de mora, à taxa legal, desde 2005.10.06 - data do trânsito em julgado do Ac. STJ, de 2005.09.22 –, até integral pagamento, e de juros à taxa de 5% ao ano, desde o trânsito em julgado do presente incidente até integral pagamento”. 2.

Contestou o Réu Município de Lisboa alegando que a quantia a fixar deve ser balizada pelo instituto do enriquecimento sem causa, alcançando o valor indemnizatório justo e equitativo.

No contrato de doação a que os autos se referem foi estabelecida uma relação entre as partes com dois motivos: a construção de equipamentos e a execução do II, que pressupunha o realojamento de natureza social, por um lado e, por outro, o loteamento da parte restante da Quinta …, propriedade dos requerentes, depois de retirada a parte respeitante à doação.

Assim, o valor do terreno terá de ser aferido tendo em consideração as determinantes constantes da escritura de doação, nunca podendo o requerido proceder à restituição do valor pretendido pelos requerentes, que não corresponde ao valor por si recebido pelo destino que deu ao terreno doado. Conclui dever o valor indemnizatório em que venha a ser condenado, “não ultrapassar nunca o valor que de facto e de direito o R. se locupletou nos termos doutamente decididos pelo Acórdão de 22 de Setembro de 2005”, devendo os juros a aplicar ser contados apenas da data do trânsito em julgado da decisão do incidente.

  1. Procedeu-se ao saneamento do incidente e à selecção da matéria de facto provada e da que constitui a base instrutória, conforme consta de fls. 1193 e 1196, tendo sido deduzidas reclamações, que foram desatendidas por despacho de fls. 1243 a 1245.

    Produzida a prova, incluindo a prova pericial, foi proferida decisão final do incidente, a fls. 1610 e seguintes, que julgou totalmente procedente o incidente de liquidação e, em consequência, decidiu “ (…) fixar o valor da indemnização fixada no acórdão do STJ de 22.09.2005, e, por conseguinte, a quantia a pagar pelo R. aos AA em € 119.988.557,69 (cento e dezanove milhões novecentos e oitenta e oito mil quinhentos e cinquenta e sete euros e sessenta e nove cêntimos), acrescida dos juros de mora vincendos, desde a presente data e até integral pagamento, às taxas legais que vierem a vigorar”.

    Interposto recurso desta decisão, veio a ser proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa o acórdão de 30 de Junho de 2011, a fls. 2261 e seguintes, que decidiu julgar «(…) parcialmente procedente a apelação do Réu, anulando-se o julgamento sobre a matéria de facto, e sequencialmente a sentença recorrida, devendo o julgamento ser repetido na sua totalidade tendo em atenção os parâmetros supra enunciados, cumprindo-se assim cabalmente o decidido pelo STJ, ficando prejudicado o conhecimento das demais questões».

    Deste acórdão foi requerida aclaração pelo réu, conforme fls. 2307 a 2314, que foi indeferida por acórdão de fls. 2327 a 2328.

    Pelos autores foi interposto recurso para o STJ, que não foi admitido, conforme decisão de fls. 2332; foi apresentada reclamação da não admissão do recurso, julgada procedente (fls. 2450 e 2451).

    Subidos os autos ao STJ, julgou o mesmo (por decisão de fls. 2551 e seguintes) não ser possível conhecer do objecto do recurso interposto e, consequentemente, declarou extinta a instância recursiva. Deduzida reclamação para a conferência, veio a mesma a ser julgada improcedente conforme acórdão de fls. 2620 e seguintes.

    Retomado o processo no tribunal de primeira instância, foi proferido o despacho de fls. 2632, que convidou as partes “a formularem, querendo, novos quesitos para prova pericial, que se adequem aos termos da questão controvertida tal como definida no douto acórdão”, bem como indicarem os “peritos que pretendem ver nomeados para a equipa colegial”.

    Na sequência dessa notificação o réu apresentou o requerimento de fls. 2651 a 2661, formulando, pelos fundamentos que aí invoca, “novos quesitos a aditar à Base Instrutória para a prova novamente a produzir e, consequentemente, também para a Perícia Colegial” – quesitos 1º a 30º; mais peticiona que se elimine a alínea C) dos factos assentes e que se rectifique a alínea D).

    Os autores, notificados, apresentaram os quesitos enunciados a fls. 2665 e 2666, dirigidos aos peritos.

    Foi proferido o despacho de fls. 2700 a 2701, em que se decidiu, nomeadamente: - determinar a alteração do art. 1º da base instrutória; - determinar o aditamento à matéria assente da alínea G); - determinar o aditamento à Base Instrutória do quesito 5º; Por despacho de fls. 2704 o tribunal fixou o objecto da perícia conforme daí consta, proferindo posteriormente o despacho de fls. 2731 que determinou a eliminação do objecto da perícia do quesito 1º formulado pelos autores.

    Procedeu-se à realização de prova pericial cujo relatório consta de fls. 2934 a 2964.

    Realizou-se audiência final, conforme resulta das atas de fls. 2992 e seguintes e 3003 e seguintes, tendo as partes apresentado alegações de direito por escrito.

    Na sessão de julgamento de 02-11-2015, foi proferido o despacho de fls. 2995-v e 2996, que indeferiu pretensão do réu, formulada em audiência, com vista à junção aos autos de prova documental, por via de notificação da SGAL.

    Interposta apelação autónoma foi tal despacho mantido por acórdão do TRL de 07-12-2016.

    Em 16 de março de 2016 proferiu-se sentença que concluiu como segue: «Tudo ponderado e em face do exposto, julgo o presente incidente de liquidação parcialmente procedente, por parcialmente provado e, em consequência, fixo o valor da indemnização devida pelo R. aos AA. em € 54.963.344,42 ( cinquenta e quatro milhões, novecentos e sessenta e três mil, trezentos e quarenta e quatro euros e quarenta e dois cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos desde a notificação para o presente incidente de liquidação e até integral pagamento, às taxas legais.

    Condeno AA. e R. nas custas na proporção do decaimento ( artigo 527º, nº 2, CPC)».

  2. Inconformadas, apelaram ambas as partes para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, por Acórdão de 6 de Julho de 2017, decidiu «julgar improcedentes as apelações interpostas pelos autores e pelo réu, mantendo-se a sentença recorrida.

    Custas por ambas as partes, na proporção do respectivo decaimento.

    Mais se decide que a taxa de justiça devida pelos apelantes – autores e réu – e tendo por referência a fase do recurso, será a que resulta da aplicação da tabela I-C anexa ao Regulamento das Custas Processuais, devendo a diferença ser considerada aquando da realização da conta» 4.

    Inconformado, o Réu, Município de Lisboa, recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça e, tendo alegado, formulou as seguintes conclusões: 1.

    O presente Recurso é interposto ao abrigo do estatuído no artigo 854°., do C.P.C., na medida em que, o Acórdão em crise, relativamente ao qual se interpõe o presente Recurso, decide sobre a Oposição deduzida contra Liquidação em Execução de Sentença/Acórdão. É interposto dentro do prazo estatuído na primeira parte do n°. 1 do artigo 638°, do C.P.C., com subida nos próprios autos, nos termos do n°. 1, do art°. 675° e ao mesmo ao mesmo deve ser atribuído efeito suspensivo, atento o disposto no art°. 676° do C.P.C., na medida em que o Réu/Recorrente se prestou a entregar caução, mediante Garantia Bancária no âmbito do Recurso para Relação de Lisboa até que fosse proferido Acórdão final, transitado em julgado, sobre os recursos para aquele Tribunal da Relação ou para o Supremo Tribunal de Justiça relativamente ao Acórdão da Relação que viesse a ser proferido.

  3. No caso do Acórdão de que se recorre não restam dúvidas que houve voto de vencido (ainda que com o mesmo não se concorde), pelo que, desde logo, não se...

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