Acórdão nº 3004/17.0T8OAZ.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Setembro de 2018

Magistrado ResponsávelRODRIGUES PIRES
Data da Resolução11 de Setembro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. 3.004/17.0 T8OAZ.P1 Comarca de Aveiro – Juízo Local Cível de Oliveira de Azeméis Apelação Recorrente: B… Recorrido: “C…, S.A.” Relator: Eduardo Rodrigues Pires Adjuntos: Desembargadores Márcia Portela e Maria de Jesus Pereira Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto: RELATÓRIOO autor B…, residente em Rua …, n.º …, …, …, Santa Maria da Feira, propôs a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra a ré “C…, S.A.”, com sede no Largo …, n.º .., Lisboa, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de 19.600,00€, acrescida dos respetivos juros de mora, contados à taxa legal desde 16.2.2017 até integral e efetivo pagamento, bem como no valor mensal nunca inferior a 1.453,73€, a título de privação do uso do veículo, desde a data do sinistro até efetiva regularização deste, bem assim nas custas e honorários do mandatário que tiver de suportar com a presente demanda.

Alegou, em síntese, que celebrou com a ré um contrato de seguro do ramo automóvel, tendo por objeto seguro o automóvel de matrícula .. – QO - .., incluindo a cobertura de danos próprios e proteção jurídica.

No dia 15.1.2017 foi interveniente num acidente de viação, tendo solicitado à ré que o indemnizasse pelo dano sofrido, sendo que a mesma considerou o veículo em situação de perda total, propondo-lhe o pagamento de 15.000,00€, deduzidos da franquia no montante de 250,00€, recusando ainda a proteção jurídica, alegando estar a mesma excluída do contrato.

Essa proposta foi por si recusada, posto que o valor seguro era 19.850,00€, o qual foi arbitrado pela própria ré aquando da subscrição da apólice, sendo que jamais lhe foi comunicado que, em caso de sinistro, o valor coberto seria diverso. Por outro lado, nunca em momento algum foi comunicada ao autor a exclusão da cobertura de proteção jurídica, pelo que deverá a mesma ser tida por excluída do contrato, apesar de em qualquer circunstância a mesma ser absolutamente proibida, porquanto desproporcional e ofensiva da boa-fé.

Acresce que o veículo se encontra imobilizado desde a data do sinistro e, por isso, deve ser indemnizado pelo prejuízo que daí para si decorre, o qual contabiliza, desde a data do sinistro até ao presente (25.7.2017), em 5.894,92€.

A ré contestou, defendendo-se desde logo por exceção, invocando a ilegitimidade do autor para a demanda, em face da reserva de propriedade que sobre o veículo seguro incide a favor do Banco D…, S.A.

Aceitando-se que à data do sinistro se encontrava em vigor o contrato de seguro que o autor invoca, uma vez efetuada a peritagem ao veículo, veio a constatar que o valor deste, à data do sinistro, não ultrapassava os 15.000,00€, inferior ao valor do capital máximo seguro.

Nessa sequência, promoveu a correção do valor seguro para o capital de 15.000,00€ e procedeu ao estorno do prémio de seguro, na respetiva proporção.

Para além disso, disponibilizou ao autor uma viatura de substituição desde 23.1.2017 até 8.2.2017, sendo que a obrigação de disponibilização daquela cessa com a informação da posição com vista à regularização dos danos verificados e, além disso, a cobertura facultativa de viatura de substituição tem como limite, em qualquer hipótese, 30 dias de privação de uso.

A cobertura de proteção jurídica não é aplicável “in casu”, uma vez que a ré não é pessoa segura, nem parte contrária, nem terceiro.

O autor foi informado pelo mediador responsável pela proposta de seguro de todas as condições das coberturas contratadas e suas exclusões e deu o seu acordo às condições gerais e particulares do contrato, disponibilizadas via internet.

Concluiu pela improcedência parcial da ação.

O autor impugnou o teor do documento – condições particulares do contrato – junto aos autos pela ré, porque o mesmo possui uma data posterior à data ocorrência do sinistro.

Também refere que jamais subscreveu as condições gerais do contrato de seguro, nem o respetivo conteúdo lhe foi comunicado ou explicado, nem a aposição da sua assinatura na proposta de seguro substitui o dever de informação e comunicação que sobre a ré recai.

Por outro lado, considera que a ré age em manifesto abuso de direito ao invocar que o valor venal do bem não é coincidente com o valor seguro.

Dispensada a realização da audiência prévia, julgou-se improcedente a exceção dilatória de ilegitimidade ativa, fixou-se o objeto do litígio e enunciaram-se os temas da prova.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com observância de todas as formalidades legais.

Foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente, tendo condenado a ré a pagar ao autor a quantia de 8.640,00€, acrescida de juros vencidos a partir da citação, calculados à taxa legal de 4%, sem prejuízo de outras que eventualmente venham a vigorar.

Inconformado com o decidido, interpôs recurso o autor, que finalizou as suas alegações com as seguintes conclusões: A/ No caso dos autos, o Tribunal negou ao A. o peticionado valor do veículo por referência ao valor da apólice, que, na primeira anuidade, em que ocorreu o sinistro, era de €19.850,00, a deduzir uma franquia de €250,00, por entender que à data o veículo teria um valor não superior a €15.000,00. Mas, mais ao diante, o Tribunal esclarece que o veículo foi adquirido pelo montante de €18.000,00, em consonância, aliás, com o contrato de crédito de fls. 11 a 13; B/ O Tribunal deu como não provado que tivesse sido a Ré a indicar o valor seguro. Não se compreende como possa ser o segurado a indicar o valor numa situação como a dos autos, em que se está diante de uma cobertura de danos próprios e, como tal, deveria o veículo ter sido sujeito a verificação prévia por parte da Ré – se o não foi, esta, apenas, de si se pode queixar. De resto, se a Ré veio ulteriormente a alterar o valor de modo unilateral (o que, a nosso ver lhe está vedado, dado se tratar de um contrato), não se compreende como não possa ter sido ela a estabelecer o valor inicial que deu corpo à apólice, em consonância, aliás, com o confessado em 11º da contestação. Assim, salvo o devido respeito, o facto alinhado sob o nº. 25º da Sentença deverá ser considerado provado; C/ Mas, salvo mais avisada reflexão, pouco importa, até, que se considere ou não provado tal facto, pois, está confessado no artigo 11º da contestação os capitais e coberturas que foram contratadas e, esses, são os indicados pelo A. no seu articulado inicial.

D/ Ora, funda-se o Tribunal para afastar a responsabilidade da Ré no pagamento do valor contratado no princípio do indemnizatório, dado que o valor do bem não seria superior a €15.000,00, todavia, a nosso ver e, salvo o devido respeito, sem razão, já que, a diferença entre um e outro não é irrazoável e, por outro lado, aquele valor foi contratado, como, repete-se, confessado em 11º do articulado de defesa da Ré – tal entendimento é o sufragado no Aresto de 18.04.2013, do Tribunal da Relação de Lisboa proferido no processo nº. 2212/09.2TBACB.L1-2 e assim disponível na internet; E/ Deste modo, no caso dos autos, está afastado o sobredito princípio, dado que o interesse seguro foi acordado e o valor acordado não se mostra, como se disse, manifestamente infundado.

F/ Aliás, ainda que assim se não entendesse, sempre teria de se atender ao valor de compra, como valor de substituição – neste sentido Ac. do TRL de 15-12-2016, proferido no processo 67/15.7T8TVD.L1-.2, assim disponível na internet; G/ O valor a atender para efeitos indemnizatórios nunca poderia ser o valor a que chegou a sentença em crise, antes, o valor contratado entre as partes, sendo que, as seguradoras não podem, sob pena de abuso de direito (art. 334 do CC) na modalidade do venire contra factum proprium, opor aos tomadores o valor real depois do sinistro ter ocorrido para evitarem sobre indemnizações, se antes de celebrarem o contrato nada fizeram para o apurar, como o que evitaria celebrar o contrato com sobresseguro (e com os inerentes sobreprémios), apesar de o poderem ter feito com facilidade, se tivessem actuado com um mínimo de diligência que a boa fé lhes impunha (art. 227 do CC); H/ A entender-se de outro modo, no que se não concede, o valor de substituição...

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