Acórdão nº 2877/11.5TBPDL-D.L2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelROSA TCHING
Data da Resolução07 de Junho de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA *** I – Relatório 1. Por apenso à ação declarativa que AA instaurou contra BB S.A., veio a autora requerer providência cautelar de arresto, pedindo que fosse decretado o arresto de dois créditos no âmbito de processos judiciais e de saldo existente na conta bancária titulada pela mesma requerida.

Alegou, para tanto e em síntese, que, na qualidade de advogada, prestou serviços de advocacia à requerida, que esta não liquidou, e que mercê da aplicação à requerida, pelo Banco de Portugal, de medida de resolução, nos termos do RGICSF, existe justo receio da perda da garantia patrimonial do seu crédito.

2. Foi proferida decisão que decretou o arresto, até o limite conjunto de € 190.000,00, a) do crédito no montante de € 90.000,00 dos autos 767/14.9T8PDL que corre termos no Juízo Local de Ponta Delgada – Juiz 2 e b) do saldo bancário na conta titulada pelo requerido com o IBAN: PT...

3. Inconformada com esta decisão, dela recorreu a requerida para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por acórdão proferido em 06.12.2017, julgou improcedente a apelação, mantendo a decisão recorrida.

4. Inconformada com este acórdão, a requerida dele interpôs recurso de revista excecional para o Supremo Tribunal de Justiça, terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões, que se transcrevem: «A. Dos pressupostos de admissibilidade do presente recurso 1° A admissibilidade do presente recurso de revista excecional tem como fundamento a contradição com acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, a saber: a inadmissibilidade legal da presente providência, com fundamento na aplicação ao Requerido, pelo Banco de Portugal, de medida de resolução, nos termos do RGICSF.

  1. A questão fundamental de direito no acórdão recorrido e no acórdão fundamento é a mesma, a saber: se, na pendência de medidas aplicadas pelo Banco de Portugal, destinadas à salvaguarda da solidez financeira da instituição de crédito, dos interesses dos depositantes ou da estabilidade do sistema financeiro, é legalmente admissível o requerimento de providências cautelares de arresto por credores individuais.

  2. Quanto às razões subjacentes e respetiva finalidade, a medida de resolução aplicada ao ora Recorrente afigura-se estruturalmente idêntica à medida em causa no acórdão fundamento ( providência extraordinária de designação de administradores provisórios e providência extraordinária de dispensa temporária do cumprimento pontual de obrigações anteriormente contraídas).

  3. Acresce que a questão que mereceu decisões contraditórias foi apreciada no domínio da mesma legislação, uma vez que o quadro normativo em questão, ressalvadas alterações pontuais na redação dos preceitos legais em causa, é substancialmente idêntico.

  4. Ademais, o acórdão fundamento transitou em julgado.

    B. Da nulidade do acórdão recorrido 6.° A decisão recorrida está, desde logo, ferida de nulidade, por não especificar os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, na parte relativa à questão da inadmissibilidade legal da providência (artigo 615.°, n.° 1, alínea b), do CPC).

  5. Sobre a questão da inadmissibilidade legal do arresto, o Tribunal recorrido refere que a questão já se encontraria resolvida no acórdão proferido a fls. 267, louvando-se, por conseguinte, na respetiva fundamentação.

  6. Constata-se, no entanto, que o acórdão de fls. 267 não incide sobre a concreta questão de admissibilidade suscitada pelo Recorrente, pelo que nunca poderia fazer caso julgado formal sobre essa questão, porque não a conhece, como, além do mais, a remissão feita pelo acórdão recorrido para aquela decisão gera, na prática, uma ausência de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (por assentar numa remissão para um "acórdão em branco").

  7. Note-se, inclusivamente, que tal acórdão de fls. 267 nunca poderia fazer caso julgado em relação ao Recorrente, porquanto, quando o mesmo foi proferido, o ora Recorrente não tinha qualquer intervenção no processo, tanto que, tão-pouco, em momento algum, foi notificado daquela decisão.

  8. Ainda que se entendesse que não estaria em causa a nulidade prevista na alínea b) do artigo 615.° do CPC - o que não se concede -, a decisão seria, naquele segmento, pelo menos ambígua ou obscura, tornando-a ininteligível, nos termos e para os efeitos do artigo 615.°, n.° 1, alínea c), do CPC.

    C.

    Subsidiariamente, da violação de lei substantiva 11.° Ao confirmar a sentença que decretou o arresto dos bens do Requerido, a decisão recorrida violou, porque não observou, o disposto no RGICSF, em especial, os artigos 145.°-G, 145.°-L, n.° 2 e 7.

  9. O propósito nuclear da medida de resolução aplicada e, consequentemente, da atividade desenvolvida, no seu âmbito, pelo BANIF, é o de que permaneçam na esfera do BANIF os recursos ainda existentes, evitando que saiam beneficiados alguns credores em detrimento dos demais.

  10. Doutro modo, criar-se-ia uma disfunção na estabilidade do sistema financeiro e, porventura, um prejuízo ao próprio erário público, na medida em que tal poderia precipitar a intervenção do Estado (leia-se, a revogar a autorização para o exercício da atividade bancária, com a consequente entrada imediata em liquidação – antes de reunidas as condições fácticas e materiais para o efeito).

  11. Se todos os credores lançassem mão de providências cautelares análogas à dos presentes autos, pondo assim em causa o património atualmente existente do Requerido, o Banco de Portugal apressar-se-ia a revogar a autorização para o exercício da atividade bancária, como forma de tutela da generalidade dos credores, facto que acarretaria a imediata entrada do Banco em liquidação (artigo 22.°, n.° 5, do RGICSF).

  12. Ora, na medida em que, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 145.°-L, n.° 7, do RGICSF, as obrigações em causa nos presentes autos não se inscrevem no universo de obrigações cujo cumprimento possa ser entendido como indispensável à preservação e valorização do ativo do BANIF, o respectivo cumprimento não é legalmente exigível.

  13. Por essa razão, a presente providência cautelar de arresto é estrutural e funcionalmente incompatível com o quadro legal instituído, e que visa a salvaguarda dos interesses dos depositantes, investidores e do próprio sistema financeiro - interesses supra-individuais que devem prevalecer sobre a pretensão da Requerente.

  14. Em face do exposto, por contrariar a medida de resolução aplicada e, em particular, a inexigibilidade do cumprimento de obrigações do BANIF (artigos 145.°-G, 145.°-L, n.° 2 e 7, do RGICSF), deve concluir-se que o presente procedimento cautelar de arresto é legalmente inadmissível, o que impõe a revogação do acórdão recorrido e a sua substituição por outro que revogue a providência cautelar decretada».

    Termos em que requer seja dado provimento ao presente recurso, e em consequência, seja revogada a decisão ora recorrida e a sua substituição por outra que revogue a providência cautelar de arresto.

    5. A requerente contra-alegou, terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões, que se transcrevem: « O recurso deve ser liminarmente indeferido 1. Não estão reunidas as condições formais e substanciais exigidas para admissibilidade do Recurso de Revista Excepcional; 2. A instrução dos processos judiciais tem de ser feita com documentos certificados, nomeadamente quanto àqueles que consubstanciam os requisitos essenciais de admissibilidade do procedimento em questão, enquanto que o Recorrente instruiu as suas alegações com uma cópia extraída da internet do suposto acórdão-fundamento, que não reúne a necessária autenticidade; 3. Acresce que o Recorrente instruiu, também, as suas alegações com fotocópia simples da Sentença proferida no Processo n° 3.368/15.0T8LSB que nenhuma relação tem com o acórdão-fundamento, nem com o acórdão recorrido, e, por conseguinte, deve ser mandada desentranhar; 4. Decorre expressamente do artigo 672°, n° 1, alínea c) do CPC, que constitui requisito essencial de admissibilidade do Recurso de Revista Excepcional que o acórdão-fundamento tenha transitado em julgado, o que o Recorrente não demonstrou; 5. Não basta que o Recorrente assuma e/ou diga nas sua alegações que aquele acórdão já transitou, teria de o ter provado juntando a respectiva certidão; 6. O recurso deve, assim, ser liminarmente indeferido em virtude de não se encontrar instruído com os elementos essenciais à verificação da sua admissibilidade; O Caso Julgado 7. O Acórdão recorrido, ao apreciar a questão da inadmissibilidade legal da providência do arresto, suscitada pelo Recorrente, considerou "Trata-se de questão resolvida no Acórdão proferido nestes autos a fls. 267 que ordenou expressamente que os autos prosseguissem para apuramento dos factos controvertidos uma vez que indiciariamente os mesmos poderiam integrar os pressupostos legais do arresto valendo aqui o caso julgado formal nos termos do artigo 620° do CPC.

    " (sublinhado nosso); 8. Este Acórdão de fls. 267 é o Acórdão da Relação de Lisboa de 17-01-2017 -Apelação n° 2877/11.5TBPDL-D - que "concedendo provimento à apelação", interposta pela ora Recorrida da decisão que havia indeferido liminarmente o procedimento cautelar, revogou "a decisão recorrida, devendo o s autos prosseguir a sua tramitação.".

    9. Este Acórdão constitui caso julgado formal nos presentes autos, quanto à questão da admissibilidade legal do arresto, com todas as consequências legais, como aliás expressamente o reconheceu o Acórdão recorrido, conforme acima já referido.

    10. Assim, dúvidas não podem existir de que o "thema decidendum" do Recurso de Revista Excepcional foi já resolvido pelo Acórdão de fls. 267 - Acórdão da Relação de Lisboa de 17-01-2017, Apelação n° 2877/11.5TBPDL-D - que determinou a admissibilidade do arresto requerido contra o Recorrente BANIF, não obstante e apesar da Medida de Resolução aplicada ao...

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