Acórdão nº 15398/16.0T8LSB.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 21 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelANA PAULA CARVALHO
Data da Resolução21 de Junho de 2018
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na 6ª Seção do Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO O Estado Português intentou acção declarativa com processo comum contra as rés VILANORTE – CONSTRUÇÕES, LDA. e AVTS – SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES, LDA. pedindo que: a) Se declare a nulidade e a ineficácia do contrato de compra e venda celebrado pelas Rés, por escritura pública lavrada no 24.º Cartório Notarial de Lisboa, sito na Avenida da República, nº 15, 1.º andar, em Lisboa, perante o notário Licenciado Jorge Artur de Oliveira Lopes, em 06 de Setembro de 2006; b) Se ordene o cancelamento do registo de aquisição de 1/10 do imóvel descrito na 5.ª Conservatória de Registo de Lisboa, na ficha n.º 747/2001/0221, da freguesia de Benfica, a favor da Ré AVTS – Sociedade de Construções, Lda., levado a efeito pela inscrição AP. 28 de 2006/09/07.

Para tanto, alega, em síntese, que: - no dia 30.01.2001, foi celebrado um contrato de compra e venda entre o Estado e a R. Vilanorte, tendo por objecto uma parcela de terreno com a área de 4.277 m2, a destacar do prédio descrito na 5.ª CRP de Lisboa sob o n.º 1904 e na 6.ª CRP de Lisboa sob o n.º 176, parcela de terreno essa que se encontra hoje descrita na 5.ª CRP de Lisboa sob o n.º 2747; - por sentença transitada em julgado em 13.02.2006, foi o referido contrato declarado nulo e ordenado o cancelamento do registo de aquisição a favor daquela Ré; - no dia 06.09.2006, foi celebrado um contrato de compra e venda entre as ora RR., pelo qual a R. Vilanorte vendeu à Ré AVTS 1/10 avos do prédio descrito na CRP sob o n.º 2747; - a R. AVTS tinha perfeito conhecimento que a R. Vilanorte não era legítima proprietária do bem transaccionado.

Conclui que o contrato de compra e venda celebrado em 06.09.2006 é nulo, por consubstanciar uma venda de bens alheios, já que teve por objecto um prédio propriedade do Estado.

As rés contestaram, separadamente, propugnando pela sua absolvição do pedido, porquanto e em suma: - a acção de nulidade do contrato de compra e venda de 30.01.2001 não vincula a R. AVTS, que nela não foi parte, e uma vez que o registo provisório dessa acção caducou ope legis em 15.07.2005, pelo decurso do prazo de 3 anos, sem que tivesse sido renovado; - nem na data do contrato de compra e venda celebrado entre as rés (06.09.2006), nem na data do registo de aquisição a favor da Ré AVTS, existia qualquer facto a si oponível, que invalidasse o acto de aquisição; - o A. registou a propriedade do prédio descrito na CRP sob n.º 1904 por meio de justificação administrativa, à qual recorreu abusivamente, pelo que o A. não é proprietário desse prédio, sendo certo que o mero registo não é constitutivo de direitos; - a presente acção foi intentada passados mais de 3 anos sobre o registo de aquisição onerosa a favor da R. AVTS; - os legais representantes das rés, que intervieram no contrato de compra e venda de 06.09.2006, não sabiam da data do trânsito em julgado da sentença proferida na acção referida, sendo que, nessa data, a propriedade do terreno estava registada em nome da R. Vilanorte, pelo que se presumia que o direito existia como lhe pertencendo; - a postura do Estado relativamente ao contrato que celebrou com a 1.ª R. revela má-fé, na modalidade de venire contra factum proprium, e constitui abuso de direito, já que o Estado pretende prevalecer-se de supostas ilegalidades a que o próprio deu azo.

O autor respondeu por escrito, concluindo como na petição inicial.

Foi dispensada a audiência prévia, tendo-se proferido despacho saneador (no qual se julgou improcedente a excepção dilatória da incompetência material do tribunal), identificou-se o objecto do processo e enunciaram-se, concretamente, os temas da prova, com reclamação por parte das rés, parcialmente atendida (fls. 305 a 308).

Procedeu-se à realização da audiência final, com observância do formalismo legal, e foi elaborada a sentença que julgou a acção procedente, com o seguinte dispositivo: «. a) declaro a nulidade e a ineficácia do contrato de compra e venda celebrado pelas Rés, por escritura pública lavrada no dia 06.09.2006, perante o notário Licenciado Jorge Artur de Oliveira Lopes, a fls. 125 a 126v, do Livro n.º 23-A; b) ordeno o cancelamento do registo de aquisição de 1/10 do prédio urbano descrito na 5.ª Conservatória de Registo de Lisboa, sob o n.º 2747, a favor da Ré AVTS – Sociedade de Construções, Lda., levado a efeito pela inscrição AP. 28 de 2006/09/07.

Custas pelas RR.» * Não se conformando, a ré Avts – Soc. de Construções, Lda. apresentou recurso de apelação, em que pugna pela revogação da sentença.

A apelante formula as seguintes conclusões aperfeiçoadas das alegações de recurso: « A. DAS NULIDADES DA SENTENÇA 1ª Nos presentes autos, o Autor pretende estender , à Recorrente, os efeitos da sentença do processo 9/2002 - acção de declaração de nulidade de aquisição de imóvel , que correu entre o Autor e a co-Ré Vilanorte.

  1. A partir dessa sentença, o Autor pretende declarar nula a escritura pública de aquisição de 06.09.2006, celebrada entre a co-Ré Vilanorte e a Recorrente, quanto a 1/10 do mesmo imóvel.

  2. Com relevância para a boa decisão da causa, foi invocada, pela Recorrente, a inexistência do registo da acção declarativa 9/2002, por caducidade do registo provisório que ocorreu em 15.07.2005 – art.ºs 8º a 12º da respectiva cont., vd. ib. art.º 31º da réplica e recl. do desp. saneador.

  3. Perante factos plenamente provados nos docs. 1 (certidão), docs 3 e 9, (despachos da conservadora), da contest., o tribunal a quo limita-se a dar como provado que foi anotada a caducidade do registo, omitindo qualquer referência, quer à provisoriedade do registo da acção que caducou, enquanto tal, e determinou a falta de registo da acção, quer à data em que ocorreu a caducidade.

  4. A sentença recorrida deixa ainda de conhecer da questão da ausência de registo da sentença acção 9/2002, nas datas, da aquisição pela Recorrente e do respectivo registo (06.09.2006 e 07.09.2006).

  5. Mais, invocou a Recorrente, que a sentença do processo nº 9/2002, nunca foi registada quanto ao 1/10 adquirido pela recorrente, facto, também plenamente provado, a partir do doc. 1, p.8 e do, doc. 9, p.3 despacho da contest. da Recorrente.

  6. Ficou por conhecer a questão da inoponibilidade da sentença do processo 9/2002, à Recorrente, por, inexistência do registo da acção (derivada da caducidade do registo provisório), não registo da sentença, nem antes, nem depois da aquisição da Recorrente, não ter sido parte nessa acção, (facto invocado no art.º 28º da contestação da Recorrente e plenamente provado por certidão - doc. 3 da p.i.).

  7. Omitiu ainda o tribunal a questão da falta de qualquer título de propriedade a favor do Autor, no que respeita ao objecto da escritura de 06.09.2006- matéria alegada e impugnada na contestação (art.ºs 7º e ss, 20º e 21º) 9ª Deixou o tribunal a quo de julgar, as questões do abuso de direito e da má fé, a título subsidiário, por o Autor ter invocado, como fundamentos do proc. 9/2002, factos falsos e que se se tivessem verificado, seria o Autor o causador dos vícios do negócio[1] e estar em incumprimento do contrato-promessa (confr. alegação dos artºs. 49º e ss. da contestação).

  8. As omissões da sentença, supra, determinam a sua nulidade, nos termos do art.º 615º, 1, al. d)- 1ª parte, do CPC, violando também os artos 5º e 608º, 2, do CPC e 333º, 1, do CC.

  9. Nos presentes autos, apenas está em causa a determinação do direito de propriedade de 1/10 do terreno e não da sua totalidade, pelo que não cumpre ao tribunal conhecer do restante, como o fez, constituindo nulidade nos termos do artº 615º, 1, als. d) e e), do CPC.

    B - Do Objecto Do Processo 12ª O objecto do processo, conforme já reclamado, não é decidir, se o imóvel, era, ou não, propriedade alheia, mas sim, determinar se o Autor pode ser reconhecido como proprietário com base na sentença do processo 9/2002, quanto à parte de 1/10 adquirida pela Recorrente em 6.9.2006, «destruindo» esta aquisição.

  10. A sentença recorrida, erradamente, dá como assente a vexata quaestio, ou seja, o invocado direito de propriedade do Autor sobre a parte de 1/10 adquirida pela Recorrente – quando foi matéria impugnada (artºs 7º e ss, 20º e 21º da sua contestação), e reclamada a propósito dos temas de prova, logo é incorrecta a sua inclusão como pressuposto do tema de prova 1.

  11. A decisão recorrida, ao dar como assente e provado o direito de propriedade do Autor, quanto ao 1/10 adquirido pela Recorrente, está a estender a eficácia do caso julgado da sentença do processo 9/2002 à Recorrente, violando o direito de defesa da Recorrente (previsto no art. 3º,1, do CPC e 20º, 1, da Const. e os art.ºs 621º e 622º do CPC, a contrario), que não foi parte dessa acção, nem interveio na discussão processual.

  12. Deste modo, deveria a questão do direito de propriedade sobre 1/10 ser apreciada pelo tribunal, antes de se lançar na averiguação da data em que ocorreu o conhecimento do trânsito em julgado pela Recorrente – temas de prova 1 e 2.

  13. Como supra se referiu, é inoponível essa sentença à Recorrente, quanto aos fundamentos da acção, pois não foi parte, e quanto à parte decisória, por não existir registo da acção, nem da sentença, quanto à parte adquirida pela recorrente. (vide, certidão histórica e despacho da Conservadora in doc. 9, p. 3, de 31.1.2007, ref. Aps. 14,15,16 e 17, de 7.1.2007, transcrito supra, alegação 38, al.u)).

  14. Inexistindo direito de propriedade sobre 1/10, do Autor, oponível à Recorrente, o tema 1 de prova tem de ser afastado, pois baseia-se num pressuposto jurídico inexistente, tal como já se havia reclamado aquando da respectiva fixação.

  15. Deste modo, a matéria dos 1º e 2º temas de prova, referente ao conhecimento do trânsito em julgado da sentença 9/2002, encerra, em si, uma contradição, quanto à Recorrente, porquanto não existe, nem trânsito em julgado, nem caso julgado, quanto a si.

  16. Não havendo, nem trânsito julgado, nem caso julgado, decorrente do processo 9/2002...

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