Acórdão nº 3057/11.5TBPVZ-C.P1.S3 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Julho de 2018

Magistrado ResponsávelJOSÉ RAINHO
Data da Resolução03 de Julho de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

+ Acordam no Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção): I - RELATÓRIO Foi oportunamente declarada, no Tribunal Judicial da então Comarca da Póvoa de Varzim, a insolvência de AA e de BB.

Na sequência, fez o Administrador da Insolvência operar, por carta de 26 de Junho de 2012 e sob a invocação da alínea h) do nº 1 do art. 121º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), a resolução em benefício da massa insolvente do contrato celebrado (em 9 de Março de 2011) entre os Insolventes e a CC, Lda.

, mediante o qual aqueles haviam vendido a esta o prédio rústico descrito nos autos.

A CC, Lda. veio então, por apenso aos autos de insolvência, instaurar contra a Massa Insolvente, representada pelo Administrador, ação declarativa sob a forma ordinária, peticionando o seguinte: Por via principal: - A declaração da nulidade e ineficácia da resolução; - Sem prescindir, a revogação da resolução; - O reconhecimento, para todos os efeitos, de que é dona do prédio rústico em causa.

Subsidiariamente: - A condenação da Ré a reconhecer que o preço da venda do imóvel foi de €175.000,00; - A condenação da Ré na restituição à Autora dessa quantia, acrescida de juros, por se tratar de um crédito sobre a Massa, nos termos do art. 51º, nº 1, alínea i) do CIRE; - O reconhecimento do direito de retenção sobre o prédio até reembolso.

Alegou para o efeito, em síntese, que a declaração de resolução não continha fundamentação de facto, pelo que era nula e ineficaz. Por outro lado, o preço da venda não foi o declarado na respetiva escritura (€65.000,00), mas sim o de €175.000,00, preço este que a Autora pagou efetivamente aos vendedores. Deste modo, a ser mantida a resolução, goza do direito, contra a massa insolvente, à restituição do que pagou (e seus juros), assim como goza de direito de retenção sobre o prédio até total restituição.

Contestou a Ré.

Entre o mais, suscitou a exceção da caducidade, dizendo que o direito à impugnação da resolução estava extinto quando a ação foi proposta, isto pelo decurso do prazo estabelecido no art. 125º do CIRE.

Mais impugnou parte da factualidade alegada pela Autora, alegando que o preço ajustado e pago foi o escriturado de €65.000,00.

Prosseguindo os autos a sua marcha, veio a ser julgado improcedente o pedido principal e feito seguir o processo para apreciação do pedido subsidiário. A final foi proferida sentença (fls. 394 e seguintes), cujo dispositivo é do seguinte teor (na parte que aqui importa): «(…) decide este tribunal: Em julgar procedente o pedido subsidiário formulado pela aqui autora, “CC, Lda.”, contra a ré, “Massa Insolvente de AA e BB” e, consequentemente:

  1. Condenar a ré a reconhecer que o preço efectivamente pago pela autora aos insolventes e por estes recebido, pela aquisição do prédio aludido em a) da matéria assente, foi de € 175.000,00 (cento e setenta e cinco mil euros); e condenada a ré a restituir à autora tal quantia, acrescida de juros de mora à taxa legal desde 09-03-2011; b) Condenar a ré a reconhecer que a autora goza de direito de retenção sobre o mesmo prédio, que se consubstancia na prevalência do crédito aludido em a) do dispositivo ser pago, relativamente ao produto de tal prédio, com prevalência sobre os demais credores.» Inconformada com o assim decidido, apelou a Ré, pugnando pela revogação da sentença.

    Após incidências processuais que não interessam ao caso, veio a Relação do Porto (acórdão de 16 de Janeiro de 2018, constante de fls. 644 a 672) a decidir o recurso da seguinte forma: «Por todo exposto acordam os Juízes que compõem este Tribunal em julgar parcialmente procedente a apelação e em alterar a sentença recorrida pela forma seguinte: Em julgar procedente o pedido subsidiário formulado pela aqui recorrida/autora, “CC, Lda.”, contra a recorrente/ré, “Massa Insolvente de AA e BB” e, consequentemente:

  2. Condenar a recorrente / ré a reconhecer que o preço efectivamente pago pela recorrida/ autora aos insolventes e por estes recebido, pela aquisição do prédio aludido em a) da matéria assente, foi de 175.000,00 € (cento e setenta e cinco mil euros); e condenada a recorrente/ ré a restituir à recorrida/ autora tal quantia; b) Condenar a recorrente / ré a reconhecer que a recorrida / autora goza de direito de retenção sobre o mesmo prédio, que se consubstancia na prevalência do crédito aludido em a) do dispositivo ser pago, relativamente ao produto de tal prédio, com prevalência sobre os demais credores.

  3. Absolver a recorrente / ré do pagamento de juros de mora sobre a referida quantia de 175000,00 € à recorrida /autora.» É agora a vez da Ré Massa Insolvente se manifestar inconformada com o assim decidido, na parte que lhe é desfavorável.

    Fê-lo sob a interposição de revista excecional.

    A competente formação de juízes admitiu a revista excecional.

    + Da respetiva alegação extrai a Recorrente as seguintes conclusões: A. Depois das várias decisões que recaíram sobre o prosseguimento dos autos, a decisão final deste Tribunal foi no sentido do prosseguimento dos mesmos.

    1. A Recorrente apenas teve provimento quanto ao não pagamento dos juros, sendo negada razão à Recorrente em toda a restante matéria.

    2. Não se conformando a Recorrente com a decisão proferida, nomeadamente em virtude de contrariar um acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, sem que tenha sido proferido acórdão uniformizador de jurisprudência com ele conforme, bem como estando em causa questões cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, se torna claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, vem a Recorrente interpor recurso, nos termos da alínea c) e a) do n.º 1 do artigo 672.º do CPC.

    3. O Tribunal a quo confirmou a condenação da Ré/Recorrente a reconhecer que o preço efetivamente pago pela autora aos insolventes e por estes recebido, pela aquisição do prédio aludido em a) da matéria assente, foi de € 175.000,00 (cento e setenta e cinco mil euros); e condenou a ré a restituir à autora tal quantia; E. Confirmou ainda a condenação da Ré/Recorrente a reconhecer que a autora goza de direito de retenção sobre o mesmo prédio, que se consubstancia na prevalência do crédito aludido em a) do dispositivo ser pago, relativamente ao produto de tal prédio, com prevalência sobre os demais credores.

    4. A Recorrente já em sede de alegações em primeira instância e mais tarde no recurso, suscitou questão de que a A/Recorrida juntou ao processo a escritura pública referente à compra e venda do imóvel objecto da resolução (Doc. 1 junto com a P.I.). Escritura essa que refere que o valor do negócio realizado entre a A/Recorridos e os insolventes foi de 65.000,00 €.

    5. De que tal documento autêntico tem força probatória plena, nos termos do n.º 1 do artigo 371.º do Código Civil (CC).

    6. Sendo que, esse documento não foi impugnado pela A. nem arguiu a sua falsidade.

      I. Pelo que, a declaração aí contante, o preço, configura uma declaração confessória extrajudicial, nos termos do artigo 352.º do CC, sendo que apenas pode ser ilidida com base na falsidade do documento (cfr. artigo 347.º e nº 1 do artigo 372.º, ambos do CC), ou mediante a invocação da falta ou vício de vontade que determinem a nulidade ou anulabilidade da confissão. O que não aconteceu.

    7. Por força do nº 3 do artigo 358.º e nº 2 do artigo 393.º, ambos do CC, tal declaração confessória não admite prova testemunhal.

    8. A Recorrente fez referência a um dos acórdãos que ia nesse sentido, o acórdão do STJ de 13-9-2012, processo n.º 2816/08.0TVLSB.L1.S1.

      Concluindo a Recorrente: “Pelas razões expostas, o Tribunal ao dar como provado que o preço pago no negócio foi de 175.000,00 €, sustentado na prova testemunhal e noutros documentos de valor probatório inferior, violou os artigos nº 2 do artigo363.º, nº 1 do artigo 371.º, o artigo 352.º, 347.º e nº 1 do artigo 372.º, o n.º 3 do artigo 358º e o nº 3 do artigo 393,º, todos do Código Civil.” L. Não obstante o invocado e, em consequência peticionar a alteração da matéria de facto da alínea g) dos factos provados serem dados como não provados os factos das alíneas o), p), q), s) e t), o Tribunal a quo não deu provimento, considerando ser admissível o recurso à prova testemunhal, mesmo sem a Recorrida ter impugnado o documento autêntico ou alegado a sua falsidade.

    9. Muito embora a Recorrente tenha já referido um acórdão que vai de encontro ao seu entendimento, existe um outro acórdão (fundamento) que mais se enquadra às questões discutidas nos autos, nomeadamente relacionado com o valor da prova, forma da impugnação da prova plena, a admissibilidade da prova testemunhal relativamente à prova de força plena não impugnada, às limitações da prova quando a simulação é arguida pelos simuladores dos negócios (Doc. 1 junto em anexo e que aqui se dá por integralmente reproduzido).

    10. Acórdão esse, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, em 30/01/2013, processo nº 2072/09.3TBTVD.L1.S1 - 2ª Secção, cujo sumário reza o seguinte: “I - A força probatória plena das declarações negociais constantes de documentos autênticos confina-se à percepção que das mesmas teve o oficial público e não também à realidade dos factos que são objecto dessa declaração.

      II - A impugnação dessa força probatória só pode ser efectuada através da arguição da sua falsidade.

      III - Não sendo arguida a falsidade, a força probatória exclui a admissibilidade de prova testemunhal de convenções anteriores, contemporâneas ou posteriores à sua outorga, contrárias ou adicionais ao respectivo conteúdo.

      IV - Tal limitação, porém, não se aplica ao acordo simulatório e ao negócio dissimulado, quando invocado por terceiros.

      V - A reapreciação da decisão da matéria de facto pela Relação quando estiver em causa a arguição de simulação não pode deixar de abranger os meios de prova produzidos na 1.ª instância e que aí determinaram a decisão impugnada.” O. Toda arguição da A/Recorrida teve por base uma alegada divergência entre a vontade real e a vontade...

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