Acórdão nº 0398/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 05 de Julho de 2018

Magistrado ResponsávelTERESA DE SOUSA
Data da Resolução05 de Julho de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. Relatório A……… S.A, propôs contra a Santa Casa da Misericórdia de …………, acção de contencioso pré-contratual, impugnando a Deliberação, datada de 14 de Março de 2017, proferida pela Mesa Administrativa da Santa Casa da Misericórdia de …………, que adjudicou à sociedade B…………, S.A. a empreitada de requalificação do Lar ………… da Santa Casa da Misericórdia de …………, no âmbito de concurso limitado por prévia qualificação.

Por sentença proferida pelo TAF de Braga foi julgada improcedente a acção.

Notificada da sentença, A……….. S.A, recorreu para o TCA Norte que manteve a decisão do TAF de Braga.

É deste acórdão, proferido pelo TAC Norte, em 02.02.2018, que, o agora recorrente, vem interpor recurso apresentando alegações com o seguinte quadro conclusivo: “

  1. A decisão aqui em recurso incorre em manifesto erro de apreciação e de julgamento da qualificação jurídica da factualidade submetida à apreciação jurisdicional.

  2. Na verdade, tanto a douta Sentença prolatada como o Acórdão ora sob apreciação divergem frontalmente, no que toca às exigências de fundamentação da avaliação das propostas, com a Jurisprudência uniforme deste Venerando Tribunal quanto a essa matéria.

  3. Afigura-se-nos, neste quadro, ser de relevante importância para o restabelecimento da certeza e paz jurídica e estabilização jurisprudencial nesta matéria, a Douta Pronúncia deste Supremo Tribunal Administrativo quanto à correcta interpretação e aplicação do disposto nos artigos 146, n°1 e 148º (aplicáveis ex vi artigo 162°) e 70.º, n°1, todos do Código dos Contratos Públicos, bem como dos artigos 151°, n°1, alínea d), 152° e 153° do Código do Procedimento Administrativo no que toca às exigências de fundamentação da avaliação das propostas no quadro de um procedimento de formação de contrato público.

  4. Verificam-se, nestes autos, os pressupostos de que depende a admissibilidade do presente Recurso de Revista, o qual deve funcionar como uma válvula de segurança do sistema, estando reservado a este Colendo Tribunal, enquanto órgão de cúpula da jurisdição administrativa, o exercício de uma importante função orientadora em relação aos demais Tribunais Administrativos.

  5. O Douto Acórdão recorrido decidiu no sentido da suficiência da fundamentação da avaliação das propostas apesar de reconhecer que a grelha classificativa que integra o modelo de avaliação é “universal” ou, dito de outro modo, que a grelha classificativa que descreve os parâmetros de avaliação em cada um dos subfactores em que se densifica o factor “Valia Técnica da Proposta” é exactamente a mesma para cada um daqueles subfactores.

  6. Perante esta decisão, que não acompanha a Jurisprudência Uniforme estabelecida no Acórdão 2/2014, de 21-02-2014, afigura-se-nos ser de manifesta necessidade, e da mais relevante importância, que este Colendo Tribunal se pronuncie sobre esta matéria.

  7. Esta questão versa sobre uma problemática jurídica de alcance geral, que é a de saber quais as consequências da falta, ou insuficiência, da fundamentação da avaliação das propostas sempre que esta se sustenta exclusivamente na atribuição de uma classificação quantitativa; ou, dito de outro modo, até que ponto e em que medida se pode considerar suficientemente fundamentada uma avaliação quantitativa que se sustenta numa grelha classificativa “universal” para todos os subfactores em avaliação, dentro do critério, uniformizado por aquele Douto Acórdão deste Venerando Tribunal, que determina que essa avaliação será suficiente se a grelha classificativa se mostrar “suficientemente densa”.

  8. Trata-se uma questão susceptível de repetir-se, nos mesmos termos, e em situações semelhantes, e que assumem consequências práticas importantes no regime de formação dos Contratos Públicos, com significativos reflexos na racionalidade final deste regime.

  9. Impõe-se, assim, para o restabelecimento da certeza e paz jurídica e estabilização jurisprudencial nesta matéria, a alta Pronúncia deste Supremo Tribunal Administrativo.

  10. As circunstâncias do caso concreto contêm uma questão, típica, bem caracterizada, nos seus contornos, passível de se repetir no futuro.

  11. A Decisão ora sob recurso padece de manifesto erro de julgamento, tendo o Tribunal a quo incorrido em violação dos preceitos legais invocados, concretamente, do disposto nos artigos 146, n°1 e 148° (aplicáveis ex vi artigo 162°) e 70°, n°1, todos do Código dos Contratos Públicos, bem como dos artigos 151°, n° 1, alínea d), 152° e 153° do Código do Procedimento Administrativo.

  12. A Decisão recorrida padece igualmente de erro de julgamento quanto entende não ocorrer violação de lei no que toca à apresentação, na proposta da Contra Interessada, de documentos redigidos em língua estrangeira sem que esteja acompanhados de tradução legalizada, por ofensa do disposto no artigo 58° do CCP e do artigo 14° do programa do procedimento, na medida em que, como adiante melhor se explicitará, olvidou que as determinações do programa do procedimento a esse respeito são imperativas sempre que essa peça expressamente estabeleça a obrigação da apresentação de tradução para a língua portuguesa.

  13. Que se justifica plenamente a intervenção deste Tribunal Supremo, dado que a orientação que será transmitida por este Colendo Tribunal, para além de fixar um sentido decisório na presente lide, constituirá um critério reitor para futuros casos análogos, ademais frequentes, ou do mesmo tipo, contribuindo, assim, para a clarificação e previsibilidade na aplicação do Direito.

  14. Mostram-se preenchidos os pressupostos previstos no n° 1 do art° 150.º do CPTA, pelo que deve o presente Recurso de Revista ser admitido e, em consequência, conhecido o seu mérito o) Entendeu o Tribunal a quo que a inexistência de parâmetros diferenciadores para cada um dos subfactores visível na grelha classificativa não assume relevância jurídica pelo facto de a Recorrida ter “definido os (...) subfactores densificadores do exercício avaliativo, por referência com os documentos exigidos no programa do procedimento”, olvidando-se, porém, na Decisão em recurso que o critério de adjudicação e, subsequentemente, o modelo de avaliação deve ser claro, explícito e auto-suficiente.

  15. O modelo de avaliação deve conter de forma exaustiva todos os elementos, qualquer que seja a sua natureza, que permitam aos concorrentes compreender quais os atributos das suas propostas que serão sujeitos a avaliação e quais são os parâmetros de cada um desses atributos que permitirão diferenciar, na pontuação, o conteúdo das propostas.

  16. Na Douta Decisão em recurso implicitamente reconhece-se a insuficiência do modelo de avaliação no que toca à parametrização da pontuação dos vários subfactores em avaliação; e tanto é assim que nela se invoca, como putativo “elemento interpretativo” do modelo de avaliação, os documentos exigidos no programa do procedimento como referência “fundamentadora” do alegado conhecimento, pelos concorrentes, dos atributos em avaliação.

  17. Tal asserção revela-se equivocada, não apenas porque não se trata, in casu, de conhecer os atributos em avaliação mas antes o conteúdo da parametrização da pontuação a atribuir a cada subfactor — que forçosamente teria de ser específica para cada um dos subfactores em avaliação, como igualmente por “necessitar”, para legitimar o modelo de avaliação, de se socorrer a elementos externos a esse modelo, como são os documentos da proposta que contêm os aspectos submetidos à concorrência no procedimento.

  18. Enferma igualmente de erro de julgamento a apreciação do Tribunal a quo quanto à alegada suficiência da grelha classificativa constante do modelo de avaliação em causa nestes autos.

  19. O Tribunal a quo sustenta a conformidade da grelha classificativa com a Jurisprudência Uniformizada pelo Acórdão 2/2014 exclusivamente no que respeita à sua decomposição — mas não quanto ao seu conteúdo, enquanto grelha “universal” para todos os subfactores em avaliação.

  20. Muito inversamente ao que se sustenta na Decisão em recurso, a racionalidade da avaliação residirá, não na padronização (ou uniformização) dos parâmetros de pontuação, mas antes na sua perfeita e rigorosa especificação em conformidade com o subfactor a que a grelha classificativa diz respeito.

  21. Tal racionalidade deverá forçosamente, pois, pressupor a diferenciação da parametrização da avaliação — e não o inverso, como muito inadmissivelmente se sustenta na Decisão em recurso, e só essa racionalidade — geradora de diferenciação — poderá assegurar a percetibilidade do iter cognitivo percorrido pelo avaliador, dessa forma cumprindo-se as exigências de fundamentação legais e densificadas por este Colendo Tribunal.

  22. Muito inversamente ao que se conclui na Decisão recorrida, as operações aritméticas em que se alicerça a classificação atribuída às propostas são manifestamente insuficientes para que se afirme estarem cumpridas as exigências de fundamentação, tendo em conta o conteúdo vago e genérico da grelha de avaliação “universal” fixada para todos e qualquer dos subfactores no critério de avaliação.

  23. A utilização da mesma grelha para todos os subfactores de avaliação manifestamente impede que da mesma se extraiam os parâmetros diferenciadores, para cada um dos subfactores, da avaliação das propostas.

  24. Forçoso seria, para que a avaliação das propostas se considerasse suficiente mediante a atribuição de uma pontuação meramente quantitativa, que, por exemplo, no subfactor “Memória Descritiva” do factor “Valia Técnica da Proposta”, que ao mesmo tivesse sido fixada uma grelha classificativa própria, adequada ao atributo a avaliar, sustentada, designadamente, no nível de pormenor que apresente, na coerência da descrição dos trabalhos, na explicitação do modo de execução dos trabalhos e na descrição dos processos construtivos — reflectida numa escala de pontuação descendente por cada patamar, atribuível em conformidade com o grau de qualidade da proposta avaliada nesse...

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