Acórdão nº 0299/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelTERESA DE SOUSA
Data da Resolução28 de Junho de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. Relatório A………… intentou, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, providência cautelar contra o Ministério da Administração Interna (MAl), pedindo a suspensão da execução da pena disciplinar de demissão que lhe foi aplicada, em 11 de Janeiro de 2017, no âmbito do processo disciplinar que lhe foi instaurado.

O TAF de Loulé dicidiu antecipar o juízo sobre a causa principal, nos termos e ao abrigo do art. 121º do CPTA, sendo imputados àquele acto punitivo diversas ilegalidades, pedindo-se a declaração de nulidade ou a anulação do acto, pedindo ainda o A. a condenação da entidade demandada a reconstituir-lhe a carreira que teria se aquela pena não tivesse sido aplicada, o TAF de Loulé por sentença proferida a 5 de Setembro de 2017, e julgou o pedido parcialmente procedente, anulando o acto consubstanciado no despacho de 11 de Janeiro de 2017, da Ministra da Administração Interna, que aplicou ao Autor a pena disciplinar de demissão.

Inconformado com a referenciada sentença, o Ministério da Administração Interna, recorreu da mesma para o Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS) que, concedendo provimento ao recurso, revogou a decisão recorrida.

O Autor, inconformado com o acórdão do TCAS, recorre do mesmo para esta Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo com alegações nas quais formula as seguintes conclusões: A – O procedimento disciplinar sub judice, ao contrário do entendido no Acórdão recorrido está prescrito nos termos do disposto no Artigo 6.° n.° 6.° do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas, aprovado pelo aprovado pela Lei n.° 58/2008, de 9 de Setembro, aplicável por remissão expressa do Artigo 66.° do Regulamento Disciplinar da Policia de Segurança Pública, aprovado pela Lei n.° 7/90, de 20 de Fevereiro, por estarmos perante uma lacuna, perante uma falta ou omissão deste Regulamento Disciplinar.

B - O Tribunal a quo errou na interpretação e aplicação do Direito quando entendeu não ser aplicável ao processo disciplinar em apreço o Artigo 6.° n.° 6.° do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas, aprovado pelo aprovado pela Lei n.° 58/2008, de 9 de Setembro.

C - O Tribunal Central Administrativo do Sul no douto Acórdão de 16 de Março de 2017 (recurso n.° 999/17.5BESNT), disponível para consulta em www.dgsi.pt, entendeu que “se o Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas (Lei n° 58/2008) introduziu uma nova causa de prescrição — a prescrição do procedimento disciplinar — estabelecendo inovatoriamente um prazo máximo para a sua duração (que não existia no anterior regime disciplinar do DL. n° 24/84), prazo com finalidades garantisticas, e se o regime disciplinar próprio do pessoal com funções policiais da Policia de Segurança Pública (PSP) constante da Lei n° 7/90, não afasta (nem afastou, após a aprovação e entrada em vigor da Lei n° 58/2008) tal causa de prescrição, nem prevê prazo especifico distinto daquele, tem que proceder-se à aplicação supletiva daquele normativo, em consonância com o disposto no artigo 66° do RDPSP (Lei n°7/90)”.

D - Entendimento confirmado pelo douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 7 de Maio de 2015 disponível para consulta em www.dgsi.pt.

E - Sendo manifesta a total divergência de entendimentos entre os dois supra referidos Acórdãos e o Acórdão recorrido.

F - No Acórdão recorrido confundem-se os conceitos de prescrição da infracção disciplinar com o conceito de prescrição do procedimento disciplinar, aplicando-se inclusive o prazo de prescrição da infracção não às datas dos factos (2006), mas ao início do procedimento disciplinar 31 de Agosto de 2011.

H - O Acórdão recorrido enferma de erro de direito na integração da omissão (lacuna) verificada no Artigo 55.° do RDPSP, aprovado pela Lei n.° 7/90, de 20 de Fevereiro.

I - A prescrição prevista no Artigo 121.° n.° 3 do Código Penal corresponde à prescrição prevista no Artigo 6.° n.° 1 do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas, aprovado pelo aprovado pela Lei n.° 58/2008, de 9 de Setembro (prescrição da infracção) J - Prescrição que não se confunde com a prescrição do procedimento, mais próxima até do conceito de caducidade e por isso inovadora, do Artigo 6.° n.° 6 do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas, aprovado pelo aprovado pela Lei n.° 58/2008, de 9 de Setembro.

K - A interpretação do n.° 3 do Artigo 1.º do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem com Funções Públicas, aprovado pela Lei n.° 58/2008, de 9 de Setembro, expressa no Acórdão recorrido segundo a qual, e sem prejuízo da remissão expressa do Artigo 66.° do EDTEFP, não se aplica a inovação do prazo de prescrição do procedimento prevista no n.° 6 do Artigo 6.° do EDTEFP, sem mais, ao pessoal da PSP com funções policiais, é inconstitucional por violação do Princípio da Igualdade consagrado no Artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa.

L - A interpretação e aplicação da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP), aprovada pela Lei n.° 35/2014, de 20 de Junho pelo Tribunal recorrido ao processo disciplinar em apreço é inconstitucional por violação do Princípio da irrectroactividade da Lei em matéria penal consagrado no Artigo 29.°, aplicável ex vi n.° 10.º do Artigo 32.°, ambos da Constituição da República portuguesa.

M - A interpretação e aplicação do Regulamento de Disciplina da GNR, na redacção da Lei n.° 66/2014, de 28 de Agosto no Acórdão recorrido configura uma violação quer ao Princípio da Proibição da Analogia em matérias penais, quer ao Princípio da irrectroactividade da Lei em matéria penal, princípios consagrados no Artigo 29.°, aplicável ex vi n.° 10.° do Artigo 32.°, ambos da Constituição da República portuguesa.

N - Mal andou o Tribunal a quo quando revogou a douta Sentença proferida na 1.ª Instância e ordenou a remessa dos Autos ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé para apreciação dos demais vícios invocados pelo ora Recorrente.

O - Mal andou o Tribunal a quo quando condenou o ora Recorrente em custas na instância de recurso, pois este não teve qualquer impulso processual naquela instância.

P - Mal andou o Tribunal a quo quando condenou o ora Recorrente em custas na 1.ª Instância quando reconhece que o julgamento da causa ainda não terminou, tanto que remete os Autos para o Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé para apreciação dos demais vícios invocados pelo ora Recorrente, sendo que o processo cautelar foi convolado em processo principal por Despacho de 27 de Julho de 2017, Despacho que já transitou em julgado.

Nestes termos e nos mais Direito que V Exas. doutamente suprirão deve o presente recurso merecer provimento, devendo o Acórdão recorrido, que padece de erro de interpretação e aplicação de Direito, ser revogado, confirmando-se, em conformidade, a douta Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé de 5 de Setembro de 2017, com as inerentes consequências legais, assim sendo feita JUSTIÇA!” O Ministério da Administração Interna apresentou contra-alegações que terminam com conclusões do seguinte teor: I. O presente recurso não tem efeito suspensivo, tal como decorre expressamente do disposto no n.° 2 do artigo 143.° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, onde se estabelece “Os recursos interpostos de intimações para proteção de direitos, liberdades e garantias e de decisões respeitantes à adopção de providências cautelares têm efeito meramente devolutivo (nosso sublinhado); II. O Recorrente não fundamentou o pedido por referência a estes requisitos; III. Constitui jurisprudência uniforme do STA que estamos perante uma questão de relevância jurídica de importância fundamental, quando a sua solução envolve a aplicação e ligação de diversos regimes legais e institutos jurídicos ou o seu tratamento tenha suscitado dúvidas sérias, ao nível da jurisprudência ou da doutrina; IV. O Recorrente não logrou identificar os contornos da questão em apreço nestes termos, porque, efetivamente, não configura especial complexidade, que suscite dúvidas sérias que justifiquem a intervenção excecional de tribunal superior; V. Como também não esclarece por que razão entendeu tratar-se de questão de relevância social de importância fundamental que, de acordo com a jurisprudência comum do STA, se verifica quando a situação apresente contornos indiciadores de que a solução pode ser um paradigma ou constituir orientação para se apreciarem outros casos, ou quando tenha grande impacto na comunidade; VI. De facto, reveste contornos muito particulares no contexto factual e jurídico do caso concreto, não sendo previsível que a sua solução tenha ou possa vir a ter repercussão noutras situações, atenta a natureza singular do caso; VII. Quanto ao requisito de clara necessidade do recurso de revista para uma melhor aplicação do direito, o recorrido entende que a douta decisão do Tribunal Administrativo Central Sul, de 31 de janeiro de 2018, interpretou muito corretamente o Direito aplicável e deu razão a quem a tinha; VIII. O recurso de revista não deve, portanto, ser admitido; IX. Sem prescindir, não deixa, porém, o Ministério de impugnar o mérito do recurso, defendendo que não assiste razão ao Recorrente, sendo, ao invés, o Douto Acórdão de 31 de janeiro de 2017, do Tribunal Central Administrativo Sul, inteiramente válido, porquanto conforme à Lei e ao Direito, merecendo a nossa integral adesão; X. Pelo que, a Entidade Recorrida acolhe inteiramente a fundamentação inserta no Acórdão que o Recorrente coloca em crise, na mesma se louvando; XI. Ficou inequivocamente demonstrado que o procedimento disciplinar não se encontra prescrito; XII. Há um princípio vigente no ordenamento jurídico português — fixado no Código Penal (cfr. artigo 121.°, n.° 3, no próprio Estatuto Disciplinar de 2008 (cfr. artigo 6.°, n.ºs 1 e 6) e, depois, na...

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