Acórdão nº 7095/14.8T8SNT.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Maio de 2018
Magistrado Responsável | RIBEIRO CARDOSO |
Data da Resolução | 23 de Maio de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça ([1]) 1 - RELATÓRIO AA - UNIPESSOAL, LDA intentou a presente ação contra BB, pedindo a condenação deste a pagar-lhe: - Uma indemnização pelos danos patrimoniais sofridos, no valor de € 25.787.00; - Uma indemnização pelas despesas que vai suportar com o acompanhamento deste processo, de valor não inferior a € 4.500,00.
- Caso venha a ser responsabilizada pelo pagamento da coima referente ao processo de contraordenação n.º ..., deverá o Réu ser condenado a indemnizá-la por todas as quantias que vier a suportar, relegando a sua quantificação para a posterior liquidação em execução de sentença.
- Peticiona ainda a condenação do Réu no pagamento dos juros de mora desde a data da citação até efetivo e integral pagamento de todas as quantias peticionadas.
Como fundamento alegou que se dedica à gestão de leilões de veículos automóveis pela internet e todas as atividades relacionadas, e que celebrou com o A. um contrato de trabalho. Entre o momento da aquisição dos veículos e o da sua venda, os trabalhadores da Autora circulam com os referidos veículos, sendo eles que suportam todos os correspondentes custos, incluindo as despesas com portagens, exceto nas deslocações em serviço. O R. efetuou diversas passagens nas portagens, sem ser em serviço e sem ter efetuado o pagamento, e quando a A. foi notificada para identificar o condutor entregou, como é seu uso, ao R. as respetivas notificações para que regularizasse a situação, tendo o mesmo se comprometido a fazê-lo. Todavia não efetuou o pagamento em consequência do que foram instaurados à A. diversos processos de contraordenação, uma vez que era a proprietária dos veículos. Pagou as coimas em causa, devendo, por isso, o R. ressarci-la das respetivas quantias.
O R. contestou excecionando a incompetência material da jurisdição laboral e impugnando parte da matéria alegada pela Autora.
A Autora respondeu relativamente à exceção deduzida.
No saneador foi julgada improcedente a exceção de incompetência material.
Realizado o julgamento foi proferida sentença que julgou a ação improcedente, absolvendo-se o Réu do pedido.
Inconformada A. apelou, tendo a Relação deliberado confirmar a sentença, embora com fundamentação diversa.
Desta deliberação recorre a A. de revista para este Supremo Tribunal impetrando a revogação do acórdão e a condenação do R. nos termos peticionados.
Por despacho do aqui relator foi determinado o desentranhamento das contra-alegações, por extemporâneas.
Recebido o recurso e cumprido o disposto no art. 87º, nº 3 do CPT, a Exmª Procuradora-Geral-Adjunta emitiu douto parecer no sentido da negação da revista.
Notificadas as partes, apenas a recorrente respondeu mantendo o que alegara no recurso.
Formulou a recorrente as seguintes conclusões, as quais, como se sabe, delimitam o objeto do recurso ([2]) e, consequentemente, o âmbito do conhecimento deste tribunal: ”1) O Tribunal a quo decidiu mal ao julgar improcedente a Apelação e confirmar a decisão proferida pelo Tribunal de primeira instância; 2) A decisão do Tribunal a quo assenta em fundamento essencialmente diferente do fundamento da sentença proferida pelo Tribunal de primeira instância, justificando-‑se, assim, a admissibilidade do recurso de revista - artigo 671º, nº 3 a contrario do C.P.C.; 3) O Recorrido praticou uma contraordenação, punível com coima, ao transpor, entre janeiro e março de 2013, aproximadamente 50 vezes, barreiras de portagem reservadas à Via Verde, sem ter associado ao veículo um sistema automático de cobrança de portagem e sem proceder ao pagamento das respectivas portagens - artigo 5º., nº. 1, alínea da Lei nº. 25/2006, de 30 de junho; 4) À Recorrente não pode ser imputada qualquer responsabilidade no que concerne à prática da contraordenação, porque não teve qualquer intervenção ou participação nos factos; 5) O Recorrido tinha a obrigação de pagar as portagens quando circulasse com os veículos da Recorrente, a título pessoal, obrigação que incumpriu - artigos 10º., 11º., 16º. e 35º. dos Factos Provados; 6) O Recorrido recebeu, em mão, a Notificação da Via Verde nº. … para pagar as suas portagens, admitiu que essas portagens eram da sua responsabilidade e disse à Recorrente que ia tratar do assunto - artigos 33º., 34º., 36º., 37º. 38º, 39º. 75º. e 77º. dos Factos Provados; 7) O Recorrido não pagou as portagens constantes na Notificação da Via Verde nº. … e não informou a Recorrente que tinha deixado passar o prazo sem realizar o pagamento -artigos 41º. e 40º. dos Factos Provados; 8) O Recorrido incumpriu, uma vez mais, a obrigação a que estava adstrito para com a Recorrente, isto é, de pagar as taxas de portagem identificadas na Notificação da Via Verde nº. … no prazo estabelecido no artigo 10º., nº. 1 da Lei nº. 25/2006, de 30 de junho; 9) A instauração dos processos de execução e de contraordenação junto da Autoridade Tributária são consequência directa da falta de pagamento das portagens no prazo previsto no artigo 10º., nº. 1 da Lei nº. 25/2006, obrigação que, no âmbito das relações entre a Recorrente e o Recorrido, cabia exclusivamente a este último; 10) Tal conclusão resulta directamente dos artigos 50º. e 62º. dos Factos Provados; 11) Não é imputável à Recorrente responsabilidade quanto à instauração dos processos de contraordenação, porque quando esta descobriu que o Recorrido não tinha procedido ao pagamento das portagens no prazo previsto no artigo 10º., nº. 1 da lei nº. 25/2006, como se comprometera e era sua obrigação, já os processos de contraordenação se encontravam instaurados junto da Autoridade Tributária; 12) Os processos de contraordenação foram tramitados pela Recorrente de forma diligente, não tendo, sequer, atingido a fase de execução, contrariamente ao que resulta do Acórdão recorrido; 13) Resulta provado nos autos que quando a Recorrente recebe notificações da Via verde e o condutor é um dos seus trabalhadores, entrega as notificações em mão aos trabalhadores para que estes procedam ao respectivo pagamento - artigos 18º. a 21º. dos Factos Provados; 14) O procedimento aplicado pela Recorrente nas situações em que os veículos utilizados pelos trabalhadores constam de notificações da Via Verde ou de outras concessionárias não é merecedor de qualquer censura, tendo em conta o critério bónus pater família[s]; 15) Merecedor de censura é o comportamento do Recorrido que passou pelas barreiras de portagem cerca de 50 vezes, durante o período de janeiro a março de 2013, sem proceder ao pagamento das respectivas taxas de portagem, e depois da Recorrente lhe ter entregue a Notificação das Via Verde nº. … para proceder ao pagamento dessas portagens, não fez tal pagamento - artigos 33º. a 39º., 41º., 74º. a 78º. dos Factos Provados; 16) O Tribunal a quo não distinguiu as relações (imediatas) entre a Recorrente e a Concessionária, no âmbito dos processos de contraordenação, e as relações (mediatas) entre a Recorrente e o Recorrido, no que concerne aos prejuízos resultantes da actuação deste último; 17) A preclusão do direito de fazer ilidir a presunção de responsabilidade do titular do documento de identificação do veículo apenas se aplica no âmbito do processo de contraordenação - artigo 10º., nº. 6 da lei nº. 25/2006, de 30 de junho; 18) A Recorrente logrou demonstrar e provar nos autos que o prejuízo que sofreu é resultado da actuação do Recorrido; 19) O Recorrido praticou um acto ilícito ao transpor as barreiras de portagem sem proceder ao respectivo pagamento e ao não pagar as portagens no prazo previsto no artigo 10º., nº. 1 da Lei nº. 24/32006, de 30 de junho; 20) O comportamento do Recorrido é culposo - artigo 798º., nº. 1 do Código Civil; 21) O grau de censura do comportamento do Recorrido é elevado, porquanto faltou à verdade à Recorrente quando recebeu a notificação e disse que ia tratar, e quando posteriormente foi questionado sobre o processo e disse que estava a tratar; 22) O Recorrido omitiu à Recorrente a falta de pagamento até maio de 2014, altura em que os processos de execução fiscal e de contraordenação já estavam instaurados, deixando a Recorrente sem qualquer hipótese de afastar a sua responsabilidade nesses processos; 23) O comportamento do Recorrido é causa adequada do prejuízo reclamado nos autos, correspondente ao valor das coimas (€ 26.338,10), já pagas pela Recorrente por infracções que esta não cometeu; 24) O Tribunal a quo decidiu mal ao considerar a Recorrente como responsável pela instauração e prossecução dos processos de contraordenação e, consequentemente, pelo pagamento das coimas; 25) O Tribunal a quo ao decidir julgar improcedente o recurso de apelação violou o disposto nos artigos 562º., 563º., 483º., 487º, 798º. e 799º. do Código Civil e os artigos 5º., nº. 1 e 10º., nº. 6 da Lei nº. 25/2006, de 30 de junho.” 2 – ENQUADRAMENTO JURÍDICO ADJETIVO Os presentes autos respeitam a ação emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum intentada em 11/12/2014.
O acórdão recorrido foi proferido em 14/06/2017.
Assim sendo, são aplicáveis: - O Código de Processo Civil (CPC) na versão conferida pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho; - O Código de Processo do Trabalho (CPT), na versão operada pelo DL n.º 295/2009, de 13 de outubro, entrada em vigor em 1 de janeiro de 2010.
3 - ÂMBITO DO RECURSO – DELIMITAÇÃO Face às conclusões formuladas as questões submetidas à nossa apreciação consistem em saber se o R. é responsável pela restituição à A. das quantias pagas por esta e demais montantes peticionados.
4 - FUNDAMENTAÇÃO 4.1 - OS FACTOS A matéria de facto julgada provada pelas instâncias é a seguinte: “1. Em 12 de Outubro de 2009, A. e R. celebraram um contrato de trabalho a termo certo.
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O referido contrato de trabalho foi convertido em contrato por tempo indeterminado, pelo decurso do tempo.
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O Réu foi admitido ao serviço da Autora para exercer funções de Comercial.
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Até à data da cessação do contrato, o Réu desempenhou as funções de Comercial...
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