Acórdão nº 7859/15.5T8STB.E1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelFÁTIMA GOMES
Data da Resolução04 de Maio de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1.

O Ministério Público intentou acção declarativa comum contra os Réus AA e BB (este falecido a 6 de Julho de 2014, tendo sido julgadas habilitadas a sua mulher, CC, e as suas filhas DD e EE) pedindo que fosse declarada a nulidade da escritura de justificação celebrada a 1 de Outubro de 2012. Alegou, em síntese, que as declarações constantes da escritura não eram verdadeiras e que tinha havido fraccionamento de prédio rústico com violação do art.º 1376.º, n.º1 do CC e da Portaria 202/70 (área de cultura mínima). Os RR contestaram.

  1. O processo seguiu os seus trâmites e foi proferida sentença a 2 de Março de 2017, que julgou improcedente o pedido de declaração de nulidade da escritura de justificação celebrada a 1 de Outubro de 2012.

  2. Inconformado recorreu o Ministério Público para o Tribunal da Relação de Évora, que julgou procedente o recurso, revogando a sentença.

  3. Inconformados os RRs apresentaram revista, na qual formularam as seguintes conclusões (transcrição): “

    1. A usucapião é um modo de aquisição originária do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo que depende apenas da verificação de dois elementos: a posse e o decurso de certo lapso de tempo e de acordo com os caracteres da posse (artigo 1287.° e 1316.° do C. Civil).

    2. Quando invocada, os seus efeitos retrotraem-se à data do início da posse adquirindo-se o direito de propriedade no momento do início da mesma posse (artigo 1288.° e 1317.°, alínea c) do Código Civil) c) A usucapião serve, em regra e além do mais, para consolidar legalmente situações de factos de génese ilegal, mantidas durante longos períodos de tempo.

    3. Pode inclusivamente permitir a aquisição de direitos sobre bens ilegítimos ao ilicitamente apropriados.

    4. A sentença proferida no Tribunal de 1ª Instância não merece qualquer censura pelo que deverá manter-se.

    5. O instituto jurídico da usucapião prevalece às limitações impostas pelo artigo 1376.° do Código Civil. Situação que resulta da sua natureza de aquisição originária de direitos e portanto auto-suficiente.

    6. A usucapião não é um negócio jurídico passível de invalidade jurídica uma vez que constitui uma forma de adquirir um direito real mercê de determinada actuação fáctica sobre a coisa.

    7. As únicas limitações à aquisição originária por usucapião são as constantes do artigo 1293.° do Código Civil e nenhuma norma legal exclui da aquisição por usucapião os terrenos inferiores à unidade de cultura legalmente prevista.

    Termos em que deverá decidir-se pela procedência do recurso, revogando o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora e mantendo a decisão proferida no Tribunal de Primeira Instância.” O Ministério Público apresentou contra-alegações.

    1. Fundamentação 5.

    Vêm provados os seguintes factos: 1) Os Réus outorgaram escritura de justificação no Cartório Notarial de Palmela perante FF, notária em substituição, no dia 01 de Outubro de 2012, exarada de fls. 80 a fls. 84 do Livro de escrituras diversas n.º 4-C, sendo na qualidade de justificantes.

    2) Na escritura identificada em 1) BB declarou, entre o mais: 2.1 Que, com exclusão de outrem, é dono e legítimo possuidor de prédio rústico, composto por cultura arvense, com a área de três mil e trinta e dois virgula doze metros quadrados, a confrontar a Norte com GG, a Nascente com GG e caminho de serventia, a Sul com HH e a Poente com II, sito em Olhos de Água, freguesia do Pinhal Novo, concelho de Palmela, à qual atribuem o valor de € 70,00.

    3) Na escritura identificada supra em 1) a 1.ª Ré declarou, entre o mais: 3.1 Que, com exclusão de outrem, é dona e legítima possuidora de prédio rústico, composto por cultura arvense, com a área de dois mil quatrocentos e oitenta virgula cinquenta metros quadrados a confrontar a Norte com BB, a Sul com JJ, a Nascente com caminho de serventia e a Poente com LL e II, sito em Olhos de Água freguesia do Pinhal Novo, concelho de Palmela, à qual atribuem o valor de € 100,00.

    4) Na escritura identificada em 1) mais declararam BB e a 1.ª Ré: 4.1 Que ambos os prédios rústicos supra identificados são a destacar da parte rústica do prédio misto, com a área total de seis mil quinhentos e setenta e nove metros quadrados, sito em Olhos de Água, freguesia do Pinhal Novo, concelho de Palmela, compondo-se a parte rústica de terreno hortícola de regadio, pomar e poço, inscrita (…) e a parte urbana composta de rés-do-chão para habitação com a área coberta de sessenta seis metros quadrados, inscrito (…).

    4.2 Que o pai MM adquiriu a totalidade do terreno por volta do ano de mil novecentos e sessenta e cinco, tendo nessa mesma data dividido o mesmo em três parcelas por ser este o seu número de filhos. Em mil novecentos e setenta e um, doou verbalmente aos respectivos filhos, BB e AA as parcelas supra identificadas, tendo ele, MM ficado possuidor da...

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