Acórdão nº 2183/15.6T8OAZ-A.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelALEXANDRE REIS
Data da Resolução16 de Maio de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Banco AA moveu execução a BB para obter deste o pagamento das quantias de € 42.428,89 e de € 14.426,09, acrescidas de juros e de sobretaxa moratória, que disse serem-lhe por ele devidas, em virtude dos contratos de mútuo com hipoteca celebrados em 17-07-2007 com o mesmo e a sua então mulher e de esta ter sido declarada insolvente em 8-01-2014.

O executado veio opor-se, alegando, em suma, que, na sequência da dissolução por divórcio de 22-09-2009 do casamento que manteve com a também mutuária CC, o imóvel que tinha sido a casa de morada de família foi adjudicado ao embargante, que assumiu o inerente passivo e sempre cumpriu pontualmente as suas obrigações para com a embargada atinentes ao invocado crédito hipotecário. Assim, sustentou que a insolvência da sua ex-mulher não lhe pode ser oposta e que, tendo procurado solucionar todas as questões suscitadas junto da agência bancária da embargada, esta actuou com violação dos ditames da boa-fé e com abuso de direito.

Foi proferida sentença, julgando procedente a oposição e determinando a extinção da execução.

A Relação julgou improcedente a apelação interposta pela exequente e confirmou a sentença.

Inconformada, a exequente interpôs revista excepcional desse acórdão, admitida pela competente Formação, cujo objecto delimitou com conclusões em que suscita a questão de saber se, mediante a cláusula 16ª (ponto 3) dos contratos dados à execução, interpretada de acordo com o critério da impressão do destinatário, os contraentes convencionaram estender ao co-obrigado ora executado a perda do benefício do prazo advinda da declaração de insolvência da mutuária sua ex-mulher (art. 91º do CIRE), assim afastando o regime supletivo consagrado no art. 782º do CC.

*Importa apreciar e decidir a questão enunciada, para o que releva, em suma e com maior saliência, a seguinte factualidade: a) - Em 17-07-2007, a exequente celebrou com o executado e a então mulher deste dois contratos de mútuo mediante os quais lhes emprestou e entregou as quantias de, respectivamente, € 50.000 de 17.000€, que os mutuários se obrigaram a restituir em 360 prestações mensais e sucessivas, com juros e sobretaxa que convencionaram, tendo sido constituída hipoteca sobre o imóvel identificado no título para garantia dos empréstimos.

  1. - Da cláusula XVI de tais contratos consta (nomeadamente): «…Assiste ainda à “IC” o direito de pôr termo ao contrato e exigir o integral reembolso daquilo que lhe for devido por força do mesmo, se o “Mutuário” deixar de cumprir qualquer obrigação contratual, ou se se verificar qualquer das situações previstas no art. 780º do Código Civil, designadamente se o “Mutuário” se tornar insolvente ou se, por causa que lhe seja imputável, diminuírem as garantias do crédito ora concedido».

  2. - Em 22-09-2009, foi dissolvido por divórcio o aludido casamento, data em que também foi efectuada partilha dos bens comuns do ex-casal, tendo a fracção autónoma destinada a habitação sobre que fora constituída a mencionada hipoteca sido adjudicada ao executado e este assumido a responsabilidade pela satisfação do crédito da ora exequente.

  3. - Em 8-01-2014, foi declarada a insolvência da ex-mulher do executado, no âmbito de cujo processo a exequente reclamou os créditos emergentes dos aludidos contratos.

  4. - Em 21-01-2014, a exequente informou o executado de que todas as quantias depositadas na instituição e de que fosse co-titular ficariam indisponíveis e, em 10-02-2014, o executado solicitou àquela esclarecimentos sobre essa impossibilidade de movimentação.

  5. - Em 5.05.2014, a exequente informou o executado que «a declaração de insolvência determina o vencimento de todas as obrigações do insolvente», pelo que considerava vencidas as responsabilidades emergentes de tais contratos.

g) - Em 16-04-2015, a exequente comunicou ao executado para proceder ao pagamento das quantias totais de € 45.174,36 e de € 15.358,33.

*Neste recurso, a essência da controvérsia reside no alcance que a referida declaração de insolvência da mutuária CC acarretou em relação ao co-mutuário e ora executado, perante o teor do clausulado supra mencionado na al. b).

Como se viu, o executado defendeu-se da pretensão executiva, dizendo que a insolvência da sua ex-mulher, CC, não lhe pode ser oposta porque o imóvel hipotecado lhe foi adjudicado, tendo assumido o passivo inerente ao crédito invocado, e sempre cumpriu pontualmente as suas obrigações para com a embargada.

Por sua vez, a exequente sustentou que: por um lado, sendo qualquer um dos seus co-devedores solidariamente responsável pela integralidade da dívida (indivisível), «a declaração de insolvência de qualquer um dos mutuários» determinou o vencimento imediato da mesma em relação a ambos, já que essa declaração manifesta a existência de uma quebra de confiança que justifica o direito de exigir o imediato pagamento da dívida; e, por outro, o referido clausulado, de acordo com o critério da impressão do destinatário, deve ser interpretado de modo a considerar-se que as partes afastaram o regime legal supletivo plasmado no art. 782º do CC, convencionando que a perda do benefício do prazo se estenderia ao co-obrigado ora executado, não declarado insolvente.

Vejamos.

A recorrente sustenta, em primeira linha, que a declaração da insolvência de um dos mutuários determinou o vencimento imediato da respectiva obrigação em relação a ambos porque qualquer deles é solidariamente responsável pela integralidade da dívida.

O art. 91º do CIRE, citado pela recorrente, sob a epígrafe “Vencimento imediato de dívidas”, prevê no seu enunciado que a declaração de insolvência determina o vencimento de todas as obrigações do insolvente (não subordinadas a uma condição suspensiva) ([1])...

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