Acórdão nº 595/14.1TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelTOMÉ GOMES
Data da Resolução19 de Abril de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1. AA (A.) intentou, em 09/04/2014, contra a sociedade BB seguros, S.A.

(R.), ação declarativa, sob a forma de processo comum, alegando, em síntese, que: .

Em 13/03/2013, pelas 17h40, na Rua …, em Lisboa, o veículo de matrícula ...-...-EB, objeto de seguro celebrado com a R., conduzido por CC, invadiu a berma do seu lado direito destinada ao estacionamento automóvel, para além da linha delimitadora da faixa de rodagem, e foi atropelar a A., que por ali caminhava no mesmo sentido; .

A condutora do EB encostou o veículo e invadiu a referida berma, agindo de forma desatenta e devido a uma viatura mal estacionada, passando com a roda dianteira por cima do pé esquerdo da A. e projetando-a para o chão; .

Em consequência do acidente, a A. sofreu traumatismo do pé esquerdo, o que lhe determinou internamento e tratamento hospitalar, consultas médicas, medicação, subsequentes tratamentos de fisioterapia, 253 dias de incapacidade temporária na atividade profissional e incapacidade parcial permanente não inferior a 10%; .

A A. suportou, por isso, despesas com consultas e tratamentos de ortopedia no valor de € 486,08, despesas com deslocações, parqueamento, medicamentos e tratamento de documentação, no valor de € 382,21, bem como despesas com os estragos de umas calças no valor de € 19,95 e de umas botas no valor de € 167,60 e ainda com parqueamento necessário de deslocação no valor de € 1,50; .

Pelos danos resultantes da incapacidade parcial temporária de atividade e da incapacidade permanente parcial deve ser-lhe atribuída indemnização nos valores, respetivamente, de € 4.609,45 e de € 26.736,00; .

A título de danos não patrimoniais, deve-lhe ser fixada uma compensação de € 20.000,00.

Concluiu a A. a pedir que a R. fosse condenada a pagar-lhe a indemnização global de € 52.402,79, acrescida de juros legais, vencidos e vincendos.

  1. A R. apresentou contestação, em que impugna a versão da dinâmica do acidente dada pela A. e os montantes peticionados, concluindo pela improcedência da ação. 3.

    No decurso da audiência prévia, procedeu-se à fixação o valor da causa em € 52.402,79, à prolação de saneador tabelar, à identificação o objeto do litígio e à enunciação dos temas da prova, conforme consta da ata de fls. 134-141.

  2. Realizada a audiência, foi proferida a sentença de fls. 196-206, datada de 29/07/2016, a julgar a ação parcialmente procedente, condenando-se a R. a pagar à A. as seguintes parcelas indemnizatórias: a) – a quantia de € 2.833,40, por danos patrimoniais, acrescida de juros de mora vencidos desde a citação e vincendos, à taxa anual de 4%; b) – as quantias de € 11.000,00 por danos patrimoniais futuros e de € 6.000,00 a título de danos não patrimoniais, acrescidas de juros de mora, à mesma taxa anual, desde a data da sentença. 5.

    Inconformada com aquela decisão, a A. recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa, em sede de impugnação facto e de direito, tendo a apelação sido julgada parcialmente procedente com a alteração da decisão da 1.ª instância, conforme o acórdão de fls. 240-249, datado de 13/07/2017, no sentido de condenar a R. a pagar à A. o seguinte: a) – a quantia de € 4.533,43, por danos patrimoniais; b) - a quantia de € 17.600,00, por danos patrimoniais futuros; c) – a quantia de € 16.000,00, a título de danos não patrimoniais; d) – juros de mora, à taxa legal, desde a citação sobre o montante indemnizatório referido em a) e desde a data da sentença relativamente aos demais. 6.

    Desta feita, vem agora a R. pedir, em sede de revista, a revogação parcial do acórdão recorrido, para o que formula as seguintes conclusões: 1.

    a - Da leitura e análise dos factos provados, resulta dos mesmos que o acidente dos autos ocorreu por igual percentagem de culpa de ambos os intervenientes.

    1. - Atenta toda a matéria provada nos autos e as circunstâncias definitivamente fixadas, relativas à dinâmica do acidente, a atribuição de 80% de responsabilidade à condutora do veículo seguro é manifestamente gravoso, atentas as aludidas circunstâncias em que o acidente ocorreu; 3.ª - Tendo o acidente ocorrido na faixa de rodagem, local por onde circulava a Recorrida, de costas para o trânsito, quanto tinha, a escassos metros, passeios de ambos os lados da via, por onde podia circular sem qualquer embaraço, mormente para o trânsito, a percentagem de 20% de responsabilidade mostra-se muito diminuta para tal conduta estradal; 4.ª - Analisadas ambas as condutas estradais e respetivos dispositivos legais, respetivamente, a existência de alguma distração da condutora segura e o disposto nos artigos 99.º, n.º 1, e 100.º, n.º 1, do CE, em relação ao peão, verifica-se um equilíbrio entre as condutas estradais dos intervenientes e, como tal, a repartição de 50%, que havia sido fixada em 1.

      a instância mostra-se ajustada.

    2. - O montante de € 20 000,00 fixados a título de danos morais é elevado, atenta a produção de prova nos autos, e ainda os critérios de juízo de equidade que seja aplicado a este mesmo caso.

    3. - Verifica-se a violação no disposto no artigo 570.º, n.º 1, do CC. 7.

      Por sua vez, a A. interpôs revista subordinada, rematando com as seguintes conclusões: 1.ª - O âmago da divergência quanto ao acórdão proferido reside na divisão de responsabilidades, uma vez que, a A. pugna pela sua total ausência de participação na eclosão deste acidente, seja por inexistência de nexo causal entre a sua conduta e o resultado, pela teoria do risco, seja pela própria responsabilidade objetiva, uma vez que se tratou de um acidente entre uma viatura automóvel e um peão.

    4. - Desta forma, o tribunal “a quo” incorreu em erro de aplicação das normas jurídicas aos factos assentes, designadamente fazendo tábua rasa ao art.º 503.º, n.º 1, do CC e falta de fundamentação na aplicação do art.º 570.º do mesmo diploma legal, por também relativamente ao lesado ter-se que demonstrar os respetivos pressupostos de responsabilidade civil para efeitos de conculpabilidade, tal qual ensina o Prof. Antunes Varela; 3.ª - Caso tivesse sido feita a devida interpretação e aplicação dos artigos 483.º, 503.º, n.º 1, 562.º e 570.º todos do CC, aos factos assentes, teria conduzido a uma solução conforme preconizada pela A., a imputação total da responsabilidade do acidente à R.

    5. - Embora tenha ficado provado que a A. caminhava na faixa de rodagem, é um facto instrumental e resulta da prova documental e testemunhal que o fazia junto ao estacionamento. Por outro lado, o comportamento da A. não é causal do acidente; 5.ª - Na verdade, constituem dados objetivos e consequentemente factos assentes, que estamos perante um embate de uma viatura automóvel com um peão. Que a A. caminhava na faixa de rodagem (ainda que junto ao estacionamento) e o veículo seguia na mesma direção, mas atrás daquela. Ou seja, o condutor do veículo tinha possibilidade de ver a A. mas esta não tinha possibilidade de ver o automóvel; 6.ª - Por conseguinte, as condutas dos agentes a apreciar são, por um lado, a A. caminhar na faixa de rodagem, por outro, o condutor do veículo automóvel circular distraído sem atentar nos obstáculos da via ao efetuar uma manobra de inversão de marcha, numa rua sem saída, às 17h40, de dia, com tráfego intenso, junto de uma igreja. Não merecendo dúvidas que o comportamento do condutor do veículo automóvel é censurável e causal do acidente, já nos levantam sérias reservas quanto ao comportamento da A.. É que, para funcionar o art.º 570.º do CC, também têm que se verificar igualmente os pressupostos da responsabilidade civil, isto é, o facto, a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade.

    6. ...

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