Acórdão nº 00509/12.3BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Novembro de 2014

Magistrado ResponsávelAna Patroc
Data da Resolução13 de Novembro de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I – Relatório Eólica ..., s.a.

, NIPC 5…, intentou a presente acção administrativa especial, impugnando o despacho do Senhor Chefe do Serviço de Finanças de Cinfães, praticado em 04.09.2012, que determinou o indeferimento da reclamação da matriz predial apresentada pela A., na qual peticionava a anulação da inscrição matricial oficiosa do artigo urbano 265 da freguesia de Bustelo.

No Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu foi proferido despacho saneador, em 18/06/2013, que julgou procedente a excepção de inimpugnabilidade do acto e, em consequência, absolveu a Entidade Demandada da instância, mais julgando improcedente o pedido de condenação da Entidade Demandada como litigante de má-fé, decisão com que a A. não se conformou, tendo interposto o presente recurso jurisdicional.

Alegou, tendo concluído da seguinte forma: 1. A Recorrente entende que deveria ter sido julgado provado que a Demandada invocou no processo 237/12.0BEVIS que corre termos no TAF de Viseu, que relativamente ao ato de inscrição oficiosa do prédio “o meio próprio para contestar o ato praticado é, a ação administrativa especial que se rege pelas regras do processo nos tribunais administrativos, nos termos previstos no art. 97º nº 2 do CPPT.”.

  1. A Recorrente entende que deveria ter sido julgado provado que a Demandada notificou a A. do resultado da segunda avaliação.

  2. A Recorrente entende que deveria ter sido julgado provado que em 26.11.2012, a Demandada, na sua contestação, alegou estar ainda pendente o procedimento de segunda avaliação no presente caso.

  3. A Recorrente entende que deveria ter sido julgado provado que em 26.11.2012, a Demandada, na sua contestação, alegou estar ainda por concluir o ato de inscrição na matriz.

  4. A Recorrente entende que deveria ter sido julgado provado que em 26.11.2012, a Demandada, na sua contestação, alegou que a A. não tinha solicitado a correção da inscrição junto do chefe do serviço de Finanças.

  5. O princípio da impugnação unitária no direito processual fiscal não determina a absolvição da instância que o tribunal a quo determinou na sentença recorrida.

  6. O ato objeto da presente ação administrativa especial é um ato imediatamente lesivo pelo que é possível a sua impugnação imediata sem prejuízo de a sua ilegalidade vir também a ser suscitada no posterior ato de liquidação que com base nele se venha a produzir.

  7. A decisão recorrida funda-se no pressuposto errado que o ato de inscrição na matriz se insere no procedimento de liquidação de IMI e não tem quaisquer efeitos lesivos fora desse procedimento.

  8. No entanto, o procedimento de inscrição na matriz e o procedimento de liquidação são procedimentos autónomos e se é verdade que o ato de inscrição na matriz se mostra determinante para uma eventual liquidação de IMI, os correspondentes efeitos não se esgotam, simplesmente, na sua relação de prejudicialidade a uma tal liquidação. O mencionado ato de inscrição provoca uma alteração significativa e irreversível na esfera jurídica do particular conferindo-lhe a qualidade de sujeito passivo de IMI quanto àquele prédio em concreto, e determina também a sua qualificação como proprietário do mesmo, o que conduz a que este passe a encontrar-se investido no dever de cumprimento de uma série de obrigações declarativas e acessórias decorrentes dessa nova qualidade.

  9. O ato impugnado constitui uma determinação atualmente lesiva, na medida em que afeta, de forma atual e imediata, os direitos ou interesses legalmente protegidos da recorrente, e que, por isso, reclama a possibilidade de impugnação autónoma e imediata, subtraída ao regime regra de impugnação unitária.

  10. Isso mesmo vem a doutrina e a jurisprudência afirmando ao considerar que é bem distinto e autonomizável o ato de inscrição na matriz e o de liquidação de IMI (ou de outros impostos), considerando que o primeiro é mais do que um mero ato preparatório ou interlocutório, devendo ser autonomizável do procedimento de liquidação, posto que afeta, imediatamente e de forma desfavorável, a esfera do contribuinte.

  11. O ato de inscrição na matriz é autonomamente impugnável uma vez que tal ato implica uma lesão imediata e actual que produz efeitos jurídicos negativos imediatos na esfera jurídica do contribuinte já que implica para o alegado titular um conjunto de consequências desfavoráveis que extravasam o âmbito da liquidação do IMI e podem implicar liquidação de outros impostos e um conjunto de deveres acessórios e declarativos.

  12. O ato é lesivo quando atinge a esfera jurídica do contribuinte não sendo necessário que atinja também, imediatamente, a sua esfera patrimonial sendo certo que no caso concreto a inscrição na matriz atinge a esfera jurídica do contribuinte porque molda a configuração concreta do património do contribuinte perante a Administração Tributária sendo certo que esse acervo patrimonial será tido em conta, também, fora do procedimento de liquidação do respetivo IMI, projetando os seus efeitos sobre toda a relação contribuinte – AT e não apenas em sede de IMI.

  13. Em qualquer caso e, mesmo que assim não se entendesse, sempre teria de se considerar que o art. 134º nº 3 CPPT constitui uma exceção ao principio da impugnação unitária que teria aplicação no presente caso, ainda que por convolação da ação administrativa especial em impugnação judicial, uma vez que a ação administrativa especial foi intentada no prazo de 30 dias previsto no art. 134º nº3 CPPT.

  14. Como a lei não distingue entre os fundamentos da reclamação da matriz quando no art. 134º nº 3 CPPT determina que da incorreção da inscrição matricial cabe impugnação judicial, e estabelecendo o art. 130º nº 3 CIMI que os sujeitos passivos podem, a todo o tempo, reclamar de qualquer incorreção nas inscrições matriciais, nomeadamente da indevida inclusão do prédio na matriz, torna-se manifesto que a interpretação correta do art. 134º nº 3 CPPT não pode ser aquela que foi feita pelo tribunal a quo mas sim a de que a indevida inclusão do prédio na matriz é considerada uma incorreção na inscrição matricial para efeitos da sua impugnação nos termos do art. 134º nº 3 CPPT.

  15. No presente caso como foi apresentada reclamação da matriz predial que veio a ser expressamente indeferida, tendo a ora recorrente apresentado ação administrativa especial desse indeferimento dentro do prazo de 30 dias que o art. 134º nº 3 CPPT prevê, deveria ter sido determinada a convolação da ação administrativa especial em impugnação da incorreção na inscrição matricial, assim se dando cumprimento à exceção expressa ao princípio da impugnação unitária contido no art. 134º nº 3 CPPT.

  16. Pelo que o ato de inscrição na matriz deve ser considerado como imediatamente lesivo e como tal autonomamente impugnável nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 54º CPPT e 97º nº 2 CPPT, ou caso assim não se entenda, sempre teria de considerar-se ser aplicável a exceção ao principio da impugnação unitária prevista no art. 134º nº 3 CPPT pelo que a sentença recorrida deveria ter convolado a ação administrativa especial em impugnação, assim conhecendo do mérito do pedido.

  17. A recorrente não se conforma com o entendimento do tribunal a quo de que “em face da diversidade do regime de representação em juízo da administração fiscal na impugnação judicial (art. 15º CPPT) e na ação administrativa especial (art. 10º, nº 1 e 2 e 11º, nº 2 CPTA), não se vislumbra existir um uso manifestamente reprovável dos meios processuais”.

  18. A ora recorrente intentou tanto a ação administrativa especial como a impugnação judicial contra o Ministério das Finanças por ser o ministério a cujo órgão (Autoridade Tributária e Aduaneira) são imputáveis os atos jurídicos impugnados.

  19. Em qualquer uma das ações a Parte Passiva – o Ministério das Finanças - não é, logicamente confundível com os seus representantes legais (num caso a Representação da Fazenda Pública, noutro caso, licenciado em direito com funções de apoio jurídico expressamente designado para o efeito).

  20. A condenação como litigante de má-fé censura os atos das Partes e nunca os actos dos seus representantes.

  21. Assim, não se pode compreender que o tribunal a quo tenha considerado que o simples facto de o Ministério das Finanças ser representado por pessoas distintas nas duas ações era suficiente para afastar em absoluto e sem qualquer ponderação concreta dos factos qualquer condenação como litigante de má-fé.

  22. Acresce que o facto de o Tribunal ter considerado procedente a exceção invocada pela Entidade Demandada é irrelevante para a apreciação do pedido de condenação em litigância de má-fé pois uma Parte pode fazer um uso reprovável dos meios processuais mesmo quando a sua pretensão jurídica é válida já que a condenação como litigante de má-fé é autónoma e distinta da discussão jurídica do mérito da causa, versando unicamente sobre a atuação processual que a parte tomou.

  23. Uma vez que (i) a Entidade Demandada apresentou factos falsos ao Tribunal para justificar a sua posição jurídica, sendo certo que tais factos eram factos de conhecimento pessoal porque tinham sido praticados pela própria Administração Tributária e que (ii) a Entidade Demandada está sujeita aos princípios da legalidade, da proporcionalidade e da boa-fé (art. 55º e 59º LGT) não se pode aceitar que tenha defendido, relativamente a uma mesma questão concreta, que o particular afetado deveria ter adotado, processualmente, uma forma de reação que é distinta (sendo todas elas excludentes umas das outras) em função da ação concreta intentada pelo particular.

  24. A Entidade Demandada, em manifesto abuso de direito (na modalidade de venire contra factum proprium), e com criticável má-fé, procurou obstar à discussão judicial da ilegalidade cometida com a inscrição na matriz predial dos aerogeradores e consequente liquidação de IMI sobre os mesmos pois no processo 237/12.0BEVIS (que tinha por objeto o resultado da...

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