Acórdão nº 01932/07.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 10 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução10 de Outubro de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: AACD veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL do acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 06.05.2011, pelo qual foi julgada improcedente a acção administrativa especial intentada contra o Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e Pescas para anulação do despacho proferido pelo Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, em 15 de Maio de 2007, que indeferiu recurso hierárquico interposto pelo autor de despacho proferido pelo Director Regional da Agricultura de Entre D.M, em 21 de Junho de 2006, nos termos da qual lhe foi aplicada a pena disciplinar de multa correspondente a 15 dias de vencimento.

Invocou para tanto em síntese que a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento ao considerar verificada a infracção pela qual foi punido.

Foram apresentadas contra-alegações a defender a manutenção integral do acórdão recorrido.

O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.

*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.

* I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: 1. No mesmo processo disciplinar sobre os mesmos factos surgem duas penas com medidas diversas.

  1. A decisão do Ministro da Agricultura que recaiu o sobre o Recurso Hierárquico interposto carece de fundamentação que permita que ao Recorrente entender essa razão, violando essa decisão os princípios ínsitos no art.º 125º do CPA.

  2. Como não aplicou correctamente os princípios previstos que no n.º 7 do art.º 75º do Estatuto Disciplinar a decisão agora em crise quando não, considerou a violação do primado “reformatio in pejus”.

  3. Porquanto foi a decisão de anulação do Processo Disciplinar proferida sobre um Recurso Hierárquico interposto pelo aqui Recorrente que provocou o agravamento da primeira pena sobre os mesmos factos.

  4. O Chefe de Divisão onde trabalha o Recorrente teve conhecimento dos factos que este vem acusado antes de 21 de Fev. de 2005.

  5. O Director Regional a que pertence a Divisão onde trabalha o Recorrente teve conhecimento dos factos antes de 11 de Março de 2005.

  6. Encontram-se, assim, prescritos todos os factos de que vem acusado o Recorrente anteriores a 18 de Maio de 2005, por terem passados mais de 3 meses até à instauração do Processo disciplinar, nos termos do n.º 2 do art. 4º do Estatuto Disciplinar, errando o Douto Acórdão ao assim não entender.

  7. O Recorrente, enquanto funcionário, está obrigado a denunciar factos criminosos quando deles tome conhecimento no exercício da sua actividade em obediência aos comandos dos art.º 386º do Código Penal e, art.º 242º do Código de Processo Penal e art.º 3º n.º 3 do Estatuto Disciplinar.

  8. Não havendo distinção se os factos são praticados por outros funcionários ou pelos superiores hierárquicos.

  9. Superiorizando-se aqueles deveres a qualquer outro, não fazendo sentido participar os factos aos autores dos alegados factos criminosos para que estes se auto denunciem.

  10. Não havendo no presente caso, a prática de qualquer infracção praticada pelo Recorrente, errando o Douto Acórdão ao entender que a lei faz submeter o dever de denúncia a um dever de lealdade e correcção para com os superiores hierárquicos quando são eles os suspeitos, decidindo contra os comando legais supra identificados.

  11. Dadas estas divergências entre o entendimento da lei e a leitura que o Douto Acórdão dela faz, deve determinar-se a sua revogação.

    *II – Matéria de facto.

    1. O Director Regional de Agricultura de Entre D.M, por despacho proferido no dia 15 de Junho de 2005, determinou a instauração ao A. de processo disciplinar – cf. fls. 97 dos autos.

    2. Foi elaborada a respectiva nota de culpa, à qual o A. respondeu. – cf. docs. 11 e 12 juntos com a p.i..

    3. Por despacho proferido pelo Director Regional de Agricultura de Entre D.M, em 21 de Novembro de 2005, foi aplicada ao A. a pena disciplinar de dois dias de vencimento. – cfr. fls. 103 dos autos.

    4. O A., no dia 15 de Dezembro de 2005, interpôs recurso hierárquico, visando o despacho referido em C). – cfr. doc. 14 junto com a p.i. que se dá por reproduzido.

      E)No dia 3 de Fevereiro de 2006 foi proposto, por consultor jurídico do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Regional e das Pescas “…a anulação do processo disciplinar a partir da nota de culpa…”, proposta que obteve a concordância do Secretário de Estado Adjunto da Agricultura e das Pescas, nos termos de despacho proferido em 10 de Fevereiro de 2006 – cfr. fls. 122/125 dos autos que se dão por reproduzidas.

    5. Foi elaborada nova nota de culpa, à qual o A. respondeu. – cfr. docs. 16 e 17 juntos com a p.i..

    6. Foi elaborado relatório final no qual foi proposto a aplicação ao A. da pena disciplinar de multa correspondente a 15 dias de vencimento, pena que foi aplicada ao A. por despacho proferido em 21 de Junho de 2006, pelo Director Regional de Agricultura de Entre-D.M. – cfr. fls. 133/141 dos autos que se dão por reproduzidas.

    7. O A. interpôs recurso hierárquico, dirigido ao Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, visando o despacho referido em G). – cfr. doc. 19 junto com a p.i que se dá por reproduzido.

    8. No dia 25 de Outubro de 2006 foi elaborado, por Consultor Jurídico do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e Pescas, a Infª nº 348/06 da qual se extrai o seguinte: (…) “11 – Para uma melhor apreciação e qualificação da conduta do recorrente, importa ter presente que este exercia as funções de instrutor de processos de contra-ordenação instaurados no âmbito da Reserva Agrícola, nos termos do artº 38º do DL nº 196/89, de 14 de Junho, que comete às direcções regionais de agricultura a sua instrução e às comissões regionais da RAN (CRRA) a competência para determinar e aplicar as respectivas coimas.

      12 – E foi na qualidade de instrutor, como acima se referiu, que o recorrente se dirigiu aos tribunais e ao Ministério Público.

      13 – As CRRA são compostas, entre outros, por dois representantes da direcção regional de agricultura respectiva, um dos quais é designado para presidente (art.º 16º do DL nº 196/89, na redacção do DL 274/92, de 12 de Dezembro, sendo certo que no presente caso o presidente da CRAA era o próprio Director Regional da DRAEDM.

      14 – Ao recorrente, enquanto instrutor, competia averiguar os factos denunciados ou participados e propor o arquivamento do processo ou a aplicação das coimas e outras medidas que ao caso coubessem, nos termos das disposições conjugadas do art 54º do DL nº 433/82 de 27 de Outubro e arts. 38º e 39º do DL nº 196/89.

      15 – As suas funções como instrutor terminavam com o envio do processo à CRRA, não estando esta vinculada a actuar ou decidir em conformidade com o seu entendimento ou com as suas propostas.

      16 – Não assistia, assim, ao recorrente, enquanto instrutor, o direito de se dirigir ao Ministério Público e aos Tribunais, insurgindo-se contra as decisões da CRRA e solicitando que fossem responsabilizados civil e criminalmente os seus membros, quando estes não decidiam de acordo com o seu entendimento sobre a matéria constante dos processos.

      17 – Tal comportamento configura uma violação grave e reiterada dos seus deveres funcionais, sendo certo que o recorrente, além de cidadão, é também funcionário público, estando, no exercício das suas funções, exclusivamente ao interesse público, tal como é definido, nos termos da lei, pelos órgãos competentes da Administração e cabendo-lhe exercer as funções com zelo, lealdade e em obediência aos seus superiores hierárquicos.

      18 – Os factos praticados pelo recorrente assentam num desconhecimento grosseiro das normas legais sobre a sua competência como instrutor, traduzindo-se, na prática, numa completa subversão das normas que regulam o funcionamento do serviço.

      19 – E daí a pertinência das observações da Senhora Procuradora Adjunta do Tribunal de VC no seu despacho a fls. 62 do processo disciplinar, que a propósito da “directiva” do recorrente para que o Ministério Público averiguasse o motivo por que o Núcleo Jurídico não lhe devolveu um processo, referiu: “Diga-se, em abono da verdade, que não se compreende a atitude do Engº AD, nem tão pouco se percebe por que razão enviou ao Ministério Público o expediente que deu origem a este processo, já que naquela Direcção Regional, ao que sabemos, existe uma chefia e um gabinete jurídico, aos quais o denunciante se devia dirigir para esclarecer qualquer questão relacionada com a matéria dos autos.” 20 – As considerações do recorrente sobre a natureza do seu vínculo não excluem, antes acentuam a sua vinculação aos deveres que impendem sobre os funcionários públicos, maxime os deveres de zelo, de lealdade e de obediência.

      21 – Improcedem também as suas considerações sobre o exercício da cidadania, sendo óbvio que o recorrente não actuou no presente caso na “veste” de cidadão, mas na qualidade, que se arrogava, de instrutor nos processos de contra-ordenação.

      22 – O recorrente devia obediência à Norma Interna nº 1, de 21.02.2005, do Chefe de Divisão de Infraestruturas Rurais, Hidráulica, Engenharia Agrícola e Ambiente, nos termos do disposto no art 3º nº 7 do Estatuto Disciplinar. Na verdade, como muito bem refere a DRAEDM, citando o Prof. Freitas do Amaral, “o superior hierárquico, desde que tenha justamente essa qualidade, não tem de indicar a norma legal que lhe confere a possibilidade de emitir ordens, já que nela radica a própria razão de ser da existência de uma hierarquia.

      (….) Cumpre referir, para finalizar, que a pena de multa aplicada é legal e se mostra adequada às infracções praticadas, nos termos das disposições conjugadas dos arts. 11º/1,b), 12º/2, 23º e 28º do Estatuto Disciplinar. (…) – cf. fls. 151/156 dos autos que se dão por reproduzidas.

    9. Sobre a referida informação foi exarado, em 15 de Maio de 2007, pelo Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, despacho...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT