Acórdão nº 01466/13.4BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelJo
Data da Resolução17 de Abril de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes da 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO Centro Hospitalar de S. J..., E.P.E. interpôs o presente recurso jurisdicional da decisão proferida em 17/09/2014 no TAF do Porto, no âmbito da acção administrativa comum, sob a forma ordinária, por si proposta contra SCFH - Sociedade Central Farmacêutica Hospitalar, S.A. para pagamento da quantia de € 2.628.546,74 e juros vencidos à data da propositura da acção e vincendos por alegadas dívidas provenientes de incumprimento contratual (Contrato de concessão do serviço público criado no Hospital de S. J... E.P.E. para a dispensa de medicamentos ao público) determinando “… a suspensão dos presentes autos” na sequência do ofício remetido pela 1.ª Secção do Comércio do Tribunal Judicial de Leiria (processo n.º 244/14.8TBFVN, Processo Especial de Revitalização (PER) da sociedade comercial SCFH) e em face do disposto nos artigos 272.º, n.º 1 in fine do CPC conjugado com o disposto no artigo 17.º-E do CIRE.”.

*O Recorrente pede a procedência do presente recurso e, em consequência, a revogação da decisão recorrida, formulando as seguintes conclusões de recurso: 1 - O artigo 17º-E, nº 1 do Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas dispõe que: “1 - A decisão a que se refere a alínea a) do nº 3 do artigo 17º-C obsta à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra o devedor e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende, quanto ao devedor, as acções em curso com idêntica finalidade, extinguindo-se aquelas logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação.” - sublinhado nosso.

2 - Por aplicação desta norma, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, e após a prolação da decisão a que se refere o artigo 17º-C, nº 3 alínea a) do CIRE, suspendem-se as acções para cobrança de dívidas instauradas contra o devedor.

3 - A presente acção administrativa comum configura uma acção declarativa de condenação, pelo que não integra a categoria de “acções para cobrança de dívidas”, pelo que não pode ser abrangida pelo campo de aplicação da referida norma legal.

4 - A acção declarativa de condenação não se acha abrangida pelo campo de aplicação do artigo 17º-E, nº 1 do CIRE, pelo que o efeito da suspensão não lhe é aplicável, sendo que apenas se acham abrangidas pelo campo de aplicação daquele preceito as execuções para pagamento de quantia certa, as quais visam a realização coactiva do direito.

5- O elemento literal diz-nos que o despacho de nomeação do administrador judicial provisório suspende as acções para cobrança de dívidas contra o devedor, sendo certo que nenhuma referência é feita na letra da lei às acções declarativas.

6 - Atendendo ao elemento sistemático, e considerando o teor do artigo 88º e do artigo 17º- E do CIRE, resulta que na previsão do artigo 17º E, nº 1, o legislador quis prever um campo de aplicação mais restritivo do que o elencado no artigo 88º, pelo que somente as acções executivas para pagamento de quantia certa e os procedimentos cautelares antecipatórios destas se enquadram no referido artigo 17º E, nº 1.

7 - Não há fundamento legal para decretar a suspensão da presente acção administrativa comum.

8 - A suspensão decretada viola o direito constitucionalmente consagrado ao acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva (artigo 20º da CRP).

9 - Foram violados os artigos 17º-E, nº 1 e 88º do Código de Insolvência e de Recuperação da Empresa, o artigo 9º do Código Civil e o artigo 20º da Constituição da República Portuguesa.”.

*A Recorrida, não contra-alegou.

*A Digna Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal, notificada nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 146.º e 147.º do CPTA, pronunciou-se sobre o mérito do presente recurso, nos termos que constam do seu parecer de fls. 764 a 765 dos autos, sentido de lhe ser concedido provimento.

*DEFINIÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR O objecto do presente recurso jurisdicional e, em consequência, o âmbito de intervenção deste tribunal, encontra-se delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas pelo Recorrente a partir da respectiva motivação – artigos 5.º, 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 3, 4 e 5 e 639.º do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) – sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, caso existam, e do disposto no artigo 149.º do CPTA.

As questões suscitadas resumem-se a saber e decidir se decisão recorrida padece de erro de julgamento por, com fundamento nas disposições conjugadas dos artigos 269.º, n.º 1, alínea d) do CPC e art.º 17.º-E do Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas [CIRE], ter determinado a suspensão dos presentes autos (acção administrativa comum, sob a forma ordinária, para pagamento à ora Recorrente pela Recorrida da quantia de € 2.628.546,74 e respectivos juros vincendos e vencidos, por alegadas dívidas provenientes de alegado incumprimento contratual.

Ou seja, está em discussão a suspensão dos presentes autos declarada ao abrigo do disposto no art.º 17.º-E, n.º 1, do CIRE.

* FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Com relevância para o julgamento do presente recurso toma-se em consideração os seguintes elementos do processo: A - O Centro Hospitalar de S. J..., E.P.E., ora Recorrente intentou no TAF do Porto, em 03/06/2013, acção administrativa comum, sob a forma ordinária, contra SCFH-Sociedade Central Farmacêutica Hospitalar, S.A., ora Recorrida para pagamento da quantia de € 2.628.546,74 (dois milhões seiscentos e vinte e oito mil quinhentos e quarenta e seis euros e setenta e quatro cêntimos) e juros vencidos à data da propositura da acção e vincendos, por alegadas dívidas provenientes de alegado incumprimento contratual (Contrato de concessão do serviço público criado no Hospital de S. J... E.P.E. para a dispensa de medicamentos ao público).

Juntou prova documental e testemunhal.

B – Em contestação o Réu formulou a seguinte pretensão: «Nestes termos e melhores de direito, deve julgar-se: a) Improcedente, por não provada, a acção, e, em consequência, absolver-se a R. do pedido, com verificação das demais consequências legais e b) Procedente, por provada, a reconvenção, e, em consequência, condenar-se o A./Reconvindo a pagar à R./Reconvinte a quantia mínima de 2.908.277,00€ (…) a título de compensação/indemnização devida, em sede de responsabilidade civil (máxime, por incumprimento contratual), por todos os prejuízos emergentes do contrato de concessão “sub iudice”, constituindo tanto danos directos (prejuízos emergentes) como lucros cessantes, imputáveis ao A., incluindo a obrigação de reposição de equilíbrio financeiro da concessão, quantia a que acrescerão os juros de mora vincendos desde a citação até efectivo e integral pagamento, (…) quantia que poderá ser ampliada em liquidação (nomeadamente, de execução de sentença) em face da evolução da exploração deficitária da concessão e do previsível avolumar dos danos, nos termos supra expostos, reconhecendo-se concomitantemente, e sendo causa disso, o invocado direito de retenção da R. sobre todos meios afectos à concessão, em especial o estabelecimento farmacêutico sito ao Hospital de S. J..., no Porto, tudo com as legais consequências.» Juntou prova documental e requereu prova testemunhal.

C - Os presentes autos constituem a acção principal do procedimento cautelar especificado de arresto (n.º 770/13.6BEPRT), intentado em 21/03/2013 no TAF do Porto pelo Recorrente contra a Recorrida para arrestar “o crédito já vencido, proveniente da comparticipação no fornecimento de medicamentos que a Requerida tem sobre a ARS Norte- Administração Regional de Saúde do Norte, IP, …. até à quantia de € 2.407.991, 15 (dois milhões quatrocentos e sete mil novecentos e noventa e um euros e quinze cêntimos)”.

D - A referida providência foi deferida por decisão proferida em 21/05/2013 que determinou o arresto ”do crédito já vencido, proveniente da comparticipação no fornecimento de medicamentos que a requerida SCFH, SA tem sobre a ARS Norte- Administração Regional do Norte IP, até à quantia de 2.407,991, 15 €”, confirmada por acórdão deste TCAN, de 11/10/2013, já transitado em julgado.

E - Em 05/08/2014 por despacho proferido no processo n.º 244/14.8TBFVN que corre termos na 1.ª Secção do Comércio do Tribunal Judicial de Leiria foi admitido o Processo Especial de Revitalização da sociedade comercial SCFH, ora Recorrida, nos termos do disposto nos artigos 17.º-A n.º 2 e 17.º -C, n.ºs 1,2 e 3. Alínea b) do CIRE.

F - Em 08/09/2014, o administrador judicial provisório, nomeado no Processo Especial de Revitalização referido veio requerer a suspensão do procedimento cautelar em questão ao abrigo do art.º 17.º-E, n.º do CIRE, o que foi deferido por despacho de 17/09/2014 (rectificado por despacho de 09/10/2014) que ao abrigo do disposto nos artigos 269.º, n.º 1 al. d) do CPC/2013 e 17.º-E do CIRE, determinou a “… a suspensão dos … autos de arresto quanto aos montantes arrestados com vencimentos futuros”.

G - Desta decisão foi pela ora Recorrente interposto recurso para este TCA – com fundamentos idênticos ao do presente recurso – ao qual, por Acórdão n.º 770/13.6BEPRT, datado de 19 de Dezembro de 2014 (ainda não publicado) foi negado provimento.

H - Igualmente, na sequência do ofício remetido aos presentes autos pela 1.ª Secção do Comércio do Tribunal Judicial de Leiria (processo n.º 244/14.8TBFVN, PER da sociedade comercial SCFH) e em face do disposto nos artigos 272.º, n.º 1 in fine do CPC conjugado com o disposto no artigo 17.º-E do CIRE, foi determinada “a suspensão dos presentes autos”.

I – Dão-se por reproduzidos os articulados e os demais documentos dos autos, quando referidos neste acórdão.

* DE DIREITO O Recorrente critica a decisão de suspensão dos presentes autos, alegando que o artigo 17.º-E, n.º 1, al. a) do CIRE não abrange acções declarativas mas apenas acções executivas para pagamento de...

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