Acórdão nº 01995/07.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Abril de 2015
Magistrado Responsável | Helena Ribeiro |
Data da Resolução | 17 de Abril de 2015 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.RELATÓRIO MLGS E AJGS, com os sinais dos autos, inconformados, vieram interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (doravante TAF do Porto), em 11/06/2012, que julgou improcedente a ação administrativa comum, que instauraram contra o «HOSPITAL DE S. J...» e os intervenientes CMSM e «A... PORTUGAL, Companhia de Seguros, S.A.», em que peticionavam a condenação destes a pagar-lhes a quantia de 75.000,00 € de indemnização, correspondendo a quantia de 25.000,00 € à indemnização do direito à vida do JJ e 50.000,00 € à indemnização por danos morais sofridos pelos Autores, com fundamento em responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito decorrente de ato médico.
*Os Recorrentes apresentaram as seguintes CONCLUSÕES de recurso: «A - DA MATÉRIA DE FACTO I - Andou mal o Tribunal “a quo” ao decidir nos termos em que o fez! II – Embora mal, foram dados como provados os seguintes factos: 1) A A. ML, é viúva de JJGS.
2) O A., AJ, é filho do referido JJ.
3) O JJ faleceu no Hospital de S. J…. em 7 de Junho de 1994, pelas 9,55 horas, com 69 anos de idade.
4) No ano de 1988, o JJ foi submetido a uma operação cirúrgica, no Hospital de S. J..., para lombotomia esquerda por nefrectomia (extracção do rim esquerdo).
5) A equipa médica que procedeu a tal intervenção cirúrgica, liderada pelo médico Dr. CMSM, deixou uma pinça dentro do espaço retroperitoneal do JJ, pinça essa que veio a ser detectada no Hospital Geral de Sto. A..., no dia 6 de Junho de 1994.
6) Nesse dia, foi feito ao doente JJ "um RX abdominal simples com o doente de pé e nele se constatou a existência de um corpo estranho - pinça de Kelly - no espaço retroperitoneal, cuja presença foi relacionada com lombotomia esquerda por nefrectomia ocorrida há cinco anos no Hospital de S. J....
7) Com o andar dos anos, a pinça aderiu, sem infecção, à massa muscular, não causando qualquer incómodo ou lesão ao JJ.
8) No dia 6 de junho de 1994, o JJ, porque voltou a sentir-se mal, voltou ao Serviço de Urgência do Hospital Geral de Sto. A....
9) Foi na sequência de RX à parte abdominal do JJ, primeiro na posição de deitado e depois na posição de pé que veio a revelar a existência da pinça no espaço retroperitoneal e se concluiu que a mesma tinha sido aí deixada pela equipa médica que tinha operado o JJ cm 1988, no Hospital de S. J…, equipa essa liderada pelo Dr. CMSM.
10) O Hospital Geral de Sto. A... contactou o Serviço de Urologia do Hospital S. J..., sendo acordada a transferência do JJ para este Hospital, onde deu entrada no Serviço de Urgência já no dia 7 de junho de 1994, pelas 01,16 horas.
11) A equipa médica do Dr. CMSM executou uma lombotomia exploradora e retirou o corpo estranho - pinça de Kelly.
12) Nessa operação cirúrgica - lombotomia exploradora - foram anestesistas o Dr. JPAP e ajudante o Dr. JAF.
13) Quer o Dr.
, CMSM, quer o Dr. JPAP, quer o Dr. JAF sabiam que o JJ tinha dentro de si uma pinça antes de o operarem.
14) Correu termos com o n.º 141/97, pelo 2° Juiz do Tribunal Administrativo de Círculo do Porto, acção de indemnização por responsabilidade civil extracontratual sob a forma ordinária contra o Hospital Geral de Sto. A... e contra o Hospital de S. J..., intentada em 03 de Março de 1997, em que foram AA os aqui AA e RR o Hospital Geral de Sto. A... e Hospital de S. J..., com sentença de condenação do Hospital de S. J... a pagar a cada um dos AA a quantia de 15.000,00 € e absolvição do pedido do Hospital Geral de Sto. A... e que foi motivo de recursos por parte do Hospital de S. J... e do interveniente acessório, Dr. CMSM, que acabaram por merecer provimento através de Acórdão do STA, proferido em 21 de Setembro de 2004, já transitado em julgado em 6 de Outubro de 2004, Acórdão esse que integra as fls. 828 a 865 dos autos apensos n.º 141/97 (IV Volume) que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
15) Em 4/7/94 o Hospital Geral de Sto. A... elaborou o seguinte relatório médico: (Doc. n.º 4 junto com a P.I.) 16) Entre a operação de 1988 e o internamento de 9 de Maio de 1994, o JJ queixava-se aos familiares e amigos de dores no local onde tinha sido extraído o rim em 1988, nomeadamente, quando se sentava, mas dada a sua forte compleição física, acabavam por não ser incapacitantes.
17) No dia 9 de Maio de 1994, o JJ sentiu-se mal, vindo a dar entrada no Serviço de Urgência do Hospital Geral de Sto. A..., nesse mesmo dia, tendo aí ficado internado até ao dia 3 de Junho de 1994, data em que teve alta.
18) Durante esse período de tempo o JJ esteve internado por apresentar sinais evidentes de insuficiência hepática, vindo a ser tratado a uma descompensação de cirrose hepática, tendo sido médico assistente o Dr. JT.
19) Neste período de tempo em que o JJ esteve internado, não foi detectada a existência da referida pinça, e o JJ também não revelou qualquer sintoma clínico que directa ou indirectamente pudesse levar os médicos a suspeitar da existência da pinça no respectivo ventre.
20) No dia 6 de junho de 1994, quando o JJ voltou ao Serviço de Urgência do Hospital Geral de Sto. A..., queixava-se de obstipação.
21) No dia 7 de Junho de 1994, já dentro do Hospital de S. J..., o JJ deu entrada no Serviço de Urologia pelas 03,00 horas, onde foi recebido pelo Dr. JAF.
22) Quando chegou ao Hospital de S. J... fez exames preparatórios, designadamente hemograma e EC.
23) O JJ foi visto por urna equipa médica que entendeu, não obstante os riscos ponderados, ser urgente intervencioná-lo por suspeita de oclusão intestinal e de abcesso na loca renal esquerda com possível origem no objecto estranho detectado no RX.
24) O anestesista afecto à equipa médica estudou o doente.
25) O JJ foi operado às 04.00 horas novamente pela equipa médica do Dr. CMSM, vindo a falecer pelas 09,55 horas.
26) Nessa operação cirúrgica de 7 de Junho de 1994 – lombotomia exploradora - executada pela equipa médica do Dr. CMSM, foram anestesistas o Dr. JPAP e ajudante o Dr. JAF.
27) Nessa operação cirúrgica - lombotomia exploradora - ocorreu o rompimento do cólon.
28) Durante a lombotomia exploradora - durante a qual foi retirada a detectada pinça de Kelly - verificou-se que não havia sinais de abcesso ou infecção nessa área.
29) Mas que havia uma massa muito dura (pétrea) na parede anterior da loca renal o que levou o cirurgião a pensar estar-se na presença de um tumor que poderia ser a causa da grave situação clínica do doente.
30) Tendo o Dr. CM pedido a colaboração do Dr. RAFG.
31) O qual procurou estabelecer a hemóstase e explorar a massa tida como tumoral oriunda da cavidade abdominal que se exteriorizava através de uma comunicação.
32) Dessa exploração resultou a observação de um cólon contendo volumosos fecalitos (fezes muito endurecidas) pétreos que o obstruíam.
33) Mais se observou uma hemorragia que provinha, em parte, da cavidade abdominal.
34) Tendo-se iniciado uma laparotomia abdominopélvica e uma colostomia esquerda.
35) Justificada pela existência de massa dura e pétrea no cólon descendente e no cólon sigmoide.
36) Se não existisse a referida massa dura e pétrea no cólon descendente e no cólon sigmoide não se teria procedido à laparotomia exploradora e colostomia.
37) Durante a laparotomia surgiu uma hemorragia em toalha.
38) Tendo sido realizados pela equipa médica todos os esforços no sentido de fazer a hemóstase da referida hemorragia.
39) Após a hemorragia ter sido controlada pela equipa médica chefiada pelo Dr. RG, o paciente JJ foi encaminhado para a Unidade de Cuidados Intensivos, vindo, porém, a falecer nessa Unidade.
40) Nesta última cirurgia - laparotomia - o Dr. RAFG passou a chefiar a equipa cirúrgica, passando o Dr. CM juntamente com o Dr. JAF a ajudantes daquele.
41) Após a lombotomia exploradora ocorreu um choque hipovolémico que levou à morte do JJ, já na Unidade de Cuidados Intensivos.
42) Os doentes com cirrose hepática em estado avançado apresentam alterações graves de coagulação sanguínea.
43) A intervenção cirúrgica de lombotomia exploradora justificava-se por suspeita de oclusão intestinal e de abcesso na loca renal esquerda, com possível origem no objecto estranho detectado no RX.
44) O diagnóstico pós-operatório foi de hemorragia intra-abdominal e lombar relacionada com patologia hepática e de oclusão por fecaloma de grande dureza.
45) O JJ sofria de doença hepática crónica Classe C de Child - última fase da doença - afectado de alcoolismo crónico, com gastrite e bolbite erosivas.
46) O Dr. RG, depois de se aperceber da presença, de durezas localizadas no intestino e tendo conhecimento do diagnóstico de oclusão intestinal, concordou com a possibilidade de existência de um tumor do cólon e decidiu explorar o intestino com o objectivo de esclarecer a patologia ali existente.
47) Suturou-se então a incisão feita no JJ concluindo-se a lombotomia exploradora da responsabilidade do Dr. CM.
48) Após a conclusão da lombotomia exploradora procedeu-se, por indicação do Dr. CG a uma segunda cirurgia, mudando o JJ da posição de decúbito lateral direito para decúbito dorsal.
49) O JJ foi submetido, no dia 07/06/1994 a duas incisões cirúrgicas distintas, chefiadas por distintos cirurgiões.
III - A matéria de facto, pelo menos parte dela, está erradamente julgada. De facto, foram erradamente dados como provados os factos 23, 29, 35, 36, 37, 39, 43 e 46.
IV - Por outro lado, há factos que não foram dados como provados e que analisado o depoimento das testemunhas, não resultam dúvidas da sua verificação, nomeadamente os factos 13.º (na parte em que se refere a hemorragia generalizada), 14.º, 19.º (na parte em que se diz que foi o rompimento do colon na sequência da lombotomia exploradora que provocou o choque hipovolémico), e 20.º da Base inquisitória.
V - O Tribunal “a quo”, refere que foram decisivos para a decisão tomada, os depoimentos das testemunhas RAFG...
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