Acórdão nº 02926/09.7BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução19 de Novembro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório TAGBC, devidamente identificado nos autos, no âmbito da ação administrativa comum, intentada contra o Município de G...

, na qual peticionou uma indemnização global de 585.490,78€, em resultado de acidente que sofreu em 19 de Novembro de 1998, “enquanto saltava à corda no ringue do Pavilhão Municipal de G...”, inconformado com a Sentença proferida em 6 de Outubro de 2014, no TAF do Porto, na qual a ação foi julgada “improcedente”, veio interpor recurso jurisdicional da mesma, em 25 de Novembro de 2014 (Cfr. fls. 782 a 790 Procº físico).

Formula o aqui Recorrente/TAGBC nas suas alegações de recurso as seguintes conclusões (Cfr. fls. 787 a 790 Procº físico).

“1 - O Recorrente não se pode conformar com a sentença de fls. que julgou totalmente improcedente o pedido por si intentado.

2 - Desde logo, o Recorrente não concorda com o julgamento da matéria de facto, nomeadamente com a resposta dada aos factos vertidos nos artigos 75º e 87 dos factos provados.

3 - Entende igualmente que face á matéria de facto dada como provada, deveria ter sido julgado procedente o pedido do Recorrente.

4 - Desde logo entende o Recorrente que houve um incorreto julgamento da matéria de facto, nomeadamente no que diz respeito aos factos vertidos nos artigos 75º e 87º dos factos provados, entendendo o Recorrente que deveriam ter merecido resposta negativa.

5 - Ainda que assim não se entenda, o que se admite por mera hipótese académica, sempre o pedido teria de ser julgado procedente.

6 - Com efeito, resultou provado que as balizas do pavilhão propriedade da Ré Município de G... não estavam fixas ao solo e que as mesmas eram constituídas por pesadas estruturas de ferro.

7 - Certo é que, ao não ordenar a fixação das balizas ao solo, a Ré Município de G... omitiu o seu dever de vigilância e de cuidado sobre o pavilhão municipal, tal como é da sua competência no âmbito da gestão pública.

8 - Dito de outro modo, o referido pavilhão desportivo é propriedade do Município do G... e, como tal, cabia-lhe a responsabilidade de vigiar e tomar as medidas de segurança necessárias para evitar que acidentes deste tipo ocorressem num espaço frequentado por crianças.

9 - Culpa que aliás se presume, ao abrigo do artigo 493º do Código Civil e que ora se invoca.

10 - A medida de segurança que se impunham era a fixação das balizas ao solo.

11 - Com efeito, era dever do Município de G... determinar que em todos os espaços desportivos sobre os quais recaísse o encargo de vigiar, que as balizas fossem devidamente fixadas ao solo de forma a oferecer garantias de segurança às atividades desportivas e aos seus utilizadores.

12 - Os equipamentos desportivos devem ser mantidos em condições que excluam a possibilidade de queda e a ocorrência de acidentes e para isso não são necessários regulamentos.

13 - É um facto mais do que previsível que as balizas ao não estarem fixas ao solo podem cair sobre a cabeça de qualquer pessoa que frequente o espaço desportivo.

14 - Por tal cenário ser previsível é que o Município de G... deveria ter agido em conformidade, fixando devidamente as balizas.

Um pavilhão municipal que mantém as instalações acessíveis a crianças, necessariamente tem de vigiar as balizas que lhes põe ao dispor para que elas não possam cair, seja pelas incidências do próprio jogo, seja pela natural irreverência dos utilizadores do campo desportivo, como é o caso das crianças.

15 - Nesse mesmo sentido decidiu o Acórdão do STJ de 26-02-2006, Processo 05B3834 in www.dgsi.pt.

16 - Infelizmente foi necessário ocorrer este acidente com o TAGBC para que o Município de G... emitisse um comunicado interno determinando “a correta fixação das balizas, de forma a evitar possíveis acidentes”, conforme documento que ora se junta sob a designação de doc. n.º (Doc. ) 17 - Como é do conhecimento público entre 1994 e 2002 sucederam-se as notícias na comunicação social sobre quedas de balizas que, de modo reiterado, vitimaram várias crianças e jovens do nosso país. Várias crianças morreram e outras sofreram traumatismos graves com sequelas definitivas, como é o caso do TAGBC.

18 - Dito de outro modo, o pavilhão do Recorrido Município de G... não estava adequado a evitar acidentes, nomeadamente com as balizas ali existentes.

19 - E tal deve-se apenas à omissão do dever de vigilância por pare do Município.

20 - Com efeito, o referido pavilhão era utilizado por várias instituições públicas e privadas e que compreendiam crianças e adultos.

21 - Significa isto que o acidente ocorrido pelo TAGBC poderia ter ocorrido com qualquer pessoa que frequentasse o referido pavilhão.

22 - Neste ponto, refere o Acórdão do STJ acima referido, “Face às omissões verificadas (a não fixação das balizas ao solo), tendo em conta o desconhecimento do perigo por parte do lesado, não sendo de esperar que o mesmo lesado adotasse o comportamento típico de um adulto, havendo grande probabilidade de vir a ocorrer um dano do tipo verificado e sabendo-se que as medidas de segurança exigíveis ao clube desportivo em causa não eram onerosas, nem de execução complexa, temos por certo o facto responsabilizante nos seus elementos objetivos e subjetivos”.

23 - Isto quer dizer que, mesmo relativamente à mãe do menor, funcionária do Município e que não tinha recebido qualquer instrução para proceder á fixação das balizas, o desconhecimento do perigo quer para o Recorrente quer para a sua mãe afasta desde logo qualquer responsabilidade dos mesmos.

24 - Significa isto que não há qualquer responsabilidade do Autor ou da sua mãe na produção do sinistro e suas consequências.

25 - Pelo contrário, os mais elementares deveres de vigilância foram omitidos pelo Réu Município de G..., motivo pelo qual deve este ser responsabilizado pelas consequências do sinistro, as quais foram muito graves para o recorrente e para os seus pais.

26 - Assim, deve o presente recurso ser julgado procedente, condenando-se o Réu Município ao peticionado.

A douta sentença de fls. violou, entre outros, o disposto no Artº 491º do Código Civil.

Nestes termos e nos melhores de direito revogando V. Exª a douta Sentença de Fls. farão um ato de inteira e sã Justiça”.

O Recurso Jurisdicional foi admitido por Despacho de 27 de Novembro de 2014 (Cfr. fls. 797 Procº físico).

O Recorrido/Município, não veio apresentar contra-alegações de Recurso.

O Ministério Público junto deste Tribunal, tendo sido notificado em 17 de Março de 2015 (Cfr. fls. 839 Procº físico), veio a emitir Parecer em 25 de março de 2015, concluindo que “deverá ser negado provimento ao Recurso”.

Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II - Questões a apreciar As principais questões a apreciar resultam do invocado “incorreto julgamento da matéria de facto” e “erro de direito”, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.

III – Fundamentação de Facto O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade, como provada, a qual aqui se reproduz e ratifica: “1) No dia 19 de Novembro de 1999, pelas 17 horas, ocorreu um acidente no Pavilhão Municipal de F..., concelho de G..., no qual foi vítima o Autor, o então menor TAGBC (alínea A da Matéria Assente).

2) Os pais do Autor são funcionários da Câmara Municipal de G... e desempenham funções no referido Pavilhão, como auxiliares administrativos (alínea B da Matéria Assente).

3) A interveniente A... Portugal e a Câmara Municipal de G... celebraram um contrato de seguro de responsabilidade civil titulado pela apólice n.º 07.84.102087, com o capital máximo garantido de € 249.396,35, em vigor à data do evento [Novembro de 1998] (alínea C da Matéria Assente).

4) Era habitual os seus pais levarem o TAGBC para o local de trabalho, onde a criança passava parte da tarde, a fazer os “deveres” e a brincar enquanto esperava pelo fim do expediente da mãe (quesitos 1º e 2º da base instrutória).

5) Naquele dia, o TAGBC encontrava-se a brincar no ringue do pavilhão, a saltar à corda, enquanto aguardava pela hora de saída da mãe, que procedia a limpezas nos balneários (quesito 3º da base instrutória).

6) No ringue existiam balizas de andebol que não estavam fixas ao solo (quesito 4º da base instrutória).

7) Tais balizas eram constituídas por pesadas estruturas de ferro (quesito 7º da base instrutória).

8) De modo e por causa não concretamente apurados, uma das balizas caiu em cima do TAGBC enquanto este se encontrava sozinho no ringue do pavilhão (quesito 8º da base instrutória).

9) Atingindo-o no lado direito da cabeça (quesito 8º da base instrutória).

10) Derrubando-o, assim, ao chão, onde ficou inconsciente (quesito 9º da base instrutória).

11) Do local do acidente, o TAGBC foi imediatamente transportado de ambulância, em ventilação espontânea, para o Hospital de São João, no Porto (quesito 10º da base instrutória).

12) Tendo dado entrada nos serviços de urgência em estado de coma (Glasgow 8) (quesito 11º da base instrutória).

13) Apresentava otorragia bilateral e nasal, EG =4+2+2=8, fez transfusão de G.R e tamponamento nasal (quesito 12º da base instrutória).

14) Foi-lhe feito ainda um TAC CE que revelou a existência de "ar e sangue no espaço subaracnóideu...

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