Acórdão nº 00302/10.8BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 05 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução05 de Junho de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.RELATÓRIO.

O MINISTÉRIO PÚBLICO, em representação do ESTADO PORTUGUÊS, inconformado, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, proferida em 30/01/2014, que julgou parcialmente procedente a ação administrativa comum, para efetivação de responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito [queda de uma árvore], intentada por VMAR, residente …, condenando o Estado português a pagar ao autor a, título de indemnização pelos danos patrimoniais sofridos em consequência da queda de uma árvore sobre o seu veículo automóvel, a quantia de €8.724,26, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até efetivo e integral pagamento.

**O Recorrente MINISTÉRIO PÚBLICO alegou, e formulou as seguintes CONCLUSÕES que aqui se reproduzem: «1ª) Constituem requisitos/pressupostos cumulativos da responsabilidade civil extracontratual do Estado que se pretende efectivar na presente acção o (f)acto ilícito, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano; 2ª) Sucede, desde logo, que a matéria de facto considerada assente na douta sentença recorrida não permite dar como verificada a actuação ilícita do Estado; 3ª) Na verdade, não tendo o Autor logrado demonstrar - como lhe competia, de acordo com as regras do ónus da prova - que a árvore aqui em causa se apresentava - como havia alegado - sem preservação e com problemas ao nível do acondicionamento e enraizamento (art° 2° da base instrutória) -, afastada fica a verificação do aludido requisito, indispensável, também ele, à emergência da invocada responsabilidade civil do Estado; 4ª) Sendo que, ao assim não considerar, violou a Mª Juíza, por erro de interpretação, as normas contidas nos arts 7°, n°1 e 9°, n°1 da Lei n° 67/2007, de 31/12; 5ª) Sem prejuízo, ao conferir, nos termos em que o fez, resposta restritiva ao quesito 3º da base instrutória e respostas negativas aos subsequentes quesitos 26º, 28º e 30°, incorreu a Mª Juíza recorrida, salvo o devido respeito, em erro de julgamento, porquanto a correcta apreciação/valoração da prova produzida e atendível no âmbito da presente acção impunha se assentasse toda a correspondente factualidade; 6ª) Afigurando-se que: i) O assentamento da matéria do falado quesito 3° da base instrutória se impunha em face dos acima transcritos depoimentos das testemunhas JR (1.28.43s - 1.29.10s), JRd (4.23.32s - 4.24.32s) e CA (5.16.24s 5.17.24s); ii) O assentamento da matéria dos quesitos 26° e 30° da base instrutória se impunha em face dos acima transcritos depoimentos das testemunhas MOP (3.56.56s 4.04.09s), JN (4.40.00s - 4.41.16s e 5.03.15s - 5.08s) e CA (5.18.34s - 5.19.26s e 5.26.32s - 5.29.27s), relevando, do mesmo passo, a por eles afirmada coadjuvação dos competentes serviços camarários; iii) O assentamento da matéria do quesito 28° da base instrutória se impunha em face do teor dos acima transcritos depoimentos das testemunhas JM (3.27.10s - 3.37.52s), MOP (3.56.10s - 3.56.49s), JRd (4.24.38s - 4.24.55s, 4.25.38s - 4.25.43s e 4.29.29s - 4.29.31), JN 4.40.00s - 4.41.21s) e CA (5.14.57s - 5.15.29s); 7ª) Acresce que, por se tratar de matéria (i) alegada na contestação do Réu, (ii) com interesse para a boa decisão da causa e (iii) e relativamente à qual foi produzida, em audiência de julgamento, prova testemunhal que atesta e confirma, deveria a Mª Juíza recorrida ter considerado - em observância do disposto no art° 5°, n° 1 do NCPCivi1 - e relevado na sentença, como factualidade assente, a vertida nos arts 5°, 9°, 16° e 18º daquele articulado; 8ª) Impondo, a nosso ver, o assentamento de tal matéria os depoimentos prestados pelas testemunhas JR (1.26.30s -1.39.59s), JM (3.27.10s - 3.27.57s e 3.28.36s -3.30.30), MOP (4.01.59s - 4.04.09s), JRd 4.23.32s - 4.29.31s), JN (4.40.00s - 4.41.27s e 4.41.34s - 4.41.50s) e CA (5.14.50s - 5.15.29s, 5.16.15s, 5.17.13s - 5.17.37s, 5,21.02 - 5.24-01, 5.30.09s - 5.30.35s e 30.38s - 5.31.14s), conjugados, na parte referente à afirmada situação atmosférica, com a matéria elencada na douta sentença recorrida nos pontos G e H dos factos provados; 9ª) Sendo certo que a não inclusão da sobredita matéria na base instrutória foi, oportunamente, objecto de reclamação e que se requereu na audiência de julgamento a relevação da mesma cfr. gravação: 5.55.06s — 5.56.20s); 10ª) De tal conjunto de elementos probatórios, devidamente ponderado e valorado à luz das regras da experiência comum, resultando, além do mais, que a árvore aqui em causa apresentava bom estado fitossanitário, se encontrava firmemente implantada, bem conservada, tratada e enraizada, que a vigilância que o Réu Estado exercia sobre ela era adequada e satisfatória, que nada fazia prever a sua queda, mesmo em condições atmosféricas adversas, e que tal evento se ficou exclusivamente a dever à concorrência de elementos atmosféricos anormais/insólitos e não domináveis pelo homem, que incidiram sobre ela, arrancando-a pela raiz; 11ª) E, consequentemente, que se não verificou, no caso, nem actuação ilícita, nem actuação culposa do Réu Estado; 12ª) Neste entendimento, deverá a douta sentença recorrida ser revogada e modificada em conformidade com o que aqui se deixou dito e absolver-se, subsequentemente, o Réu Estado do contra ele formulado pedido, por não verificados, "in casu", os requisitos/pressupostos da responsabilidade civil extracontratual onde o mesmo se pretendia estribar/fundamentar»**O Recorrido apresentou contra alegações, e enunciou as seguintes CONCLUSÕES que aqui se transcrevem: «

  1. BEM ANDOU O TRIBUNAL A QUO A DECIDIR COMO DECIDIU, PORQUANTO FACE AO QUE FICOU PROVADO OUTRA NÃO PODIA SER A DECISÃO, TENDO-SE PRONUNCIADO SOBRE TODAS AS QUESTÕES QUE FORAM LEVADAS AO SEU CONHECIMENTO, FUNDAMENTANDO A SUA DECISÃO PERANTE O QUE FOI ALEGADO PELAS PARTES E PERANTE OS FACTOS DADOS COMO PROVADOS E FACE À PROVA PRODUZIDA E CRITICAMENTE APRECIADA PELO TRIBUNAL A QUO; B) NÃO SE VIOLOU, DESTARTE, QUALQUER NORMATIVO.

  2. NÃO INCORREU A SENTENÇA EM ERRO DE JULGAMENTO COMO ALEGADO NO RECURSO.

  3. O AUTOR CUMPRIU COM O ÓNUS DA PROVA QUE LHE INCUMBIA, NÃO TENDO, AO INVÉS, O RÉU PRODUZIDO PROVA QUE PERMITISSE ILIDIR A PRESUNÇÃO QUE SOBRE SI IMPENDE, COMO JÁ HAVIA OCORRIDO NOS DOIS OUTROS PROCESSOS JUDICIAIS EM QUE FOI CONDENADO PELO MESMO FACTO MAS A OUTROS LESADOS.

  4. FICOU BEM PATENTE QUE O TRIBUNAL AD QUO TOMOU EM CONSIDERAÇÃO TODOS OS FACTOS DADOS COMO PROVADOS BEM COMO O TESTEMUNHO PRESTADO PELAS TESTEMUNHAS, E A PROVA DOCUMENTAL JUNTA AOS AUTOS.

  5. O ESTADO RÉU JÁ FOI CONDENADO EM DOIS PROCESSOS AUTÓNOMOS (QUE CORRERAM TERMOS NO TAF DE PENAFIEL) POR DANOS PROVOCADOS PELA MESMA ÁRVORE NO MESMO DIA E MESMA HORA, PELO QUE TENDO EM CONTA QUE A PROVA PRODUZIDA E A QUESTÃO DE DIREITO É A MESMA, NÃO SE MOSTRA COMO SERIA POSSÍVEL NESTES PRESENTES AUTOS A SENTENÇA SER DIFERENTE DAQUELA QUE FOI PROFERIDA.

  6. O ESTADO DEVE SER CONDENADO, NÃO SÓ PORUQE NÃO AFASTOU A PRESUNÇÃO LEGAL QUE SOBRE SI IMPENDIA MAS CLARAMENTE PORQUE NÃO AGIU COMO DEVIA NA FISCALIZAÇÃO DO ESTADO FITOSSANITÁRIO DA ÁRVORE MAS TAMBÉM PORQUE MEDIANTE OS AVISOS DE MAU TEMPO NÃO ACAUTELOU O ESTADO DA MESMA.

  7. DEVERÁ IMPROCEDER, POR FALTA DE FUNDAMENTO, QUER DE DIREITO QUER DE FACTO, TENDO EM CONTA A PROVA PRODUZIDA NOS AUTOS E OS CONCRETOS MEIOS DE PROVA INDICADOS NESTAS CONTRA-ALEGAÇÕES, O RECURSO APRESENTADO, PELO QUE OS FUNDAMENTOS (DE DIREITO E DE FACTO) DA DOUTA DECISÃO RECORRIDA SEMPRE DEVERÃO MERECER INTEGRAL ACOLHIMENTO, CONFIRMANDO-SE A DOUTA SENTENÇA.

    COM O QUE FARÃO V. EXAS.

    INTEIRA E SÃ, JUSTIÇA!».

    **2.

    QUESTÕES DECIDENDAS-DO OBJETO DO RECURSO.

    As questões suscitadas pelo ora Recorrente no âmbito do presente recurso jurisdicional serão apreciadas no respeito pelos parâmetros estabelecidos, para tal efeito, pelos artigos 5.º, 608.º, n.º2, 635.º, n.ºs 4 e 5, e 639.º do C.P.C., na redação conferida pela Lei n.º 41/2013, ex vi no art.º 1.º do C.P.T.A, e ainda conforme o disposto no artigo 149º do CPTA.

    De acordo com a motivação e conclusões apresentadas pelo Recorrente, as questões suscitadas que cumpre decidir, cifram-se em saber se a decisão judicial recorrida enferma de: I- Erro de julgamento sobre a matéria de facto.

    II- Erro de julgamento sobre a matéria de direito, decorrente da errada interpretação das normas contidas nos arts 7°, n°1 e 9°, n°1 da Lei n° 67/2007, de 31/12.

    **3.FUNDAMENTAÇÃO.

    3.1.MATÉRIA DE FACTO Independentemente do objeto do recurso, na parte em que versa sobre a reapreciação da matéria de facto, que adiante conheceremos, deixamos transcritos, desde já, os factos que a 1.ª instância deu como provados:

  8. O Autor é o dono do veículo ligeiro de passageiros de marca Volkswagen, modelo Golf, com a matrícula 00-00-MV - Cfr. fls. 61 do processo físico cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

  9. No dia 22/03/2008, cerca das 14h 45m, o MV encontrava-se estacionado no parque de estacionamento contíguo à escola EB 2/3 de P..., sita na Rua AA, cidade de P... – facto admitido por acordo.

  10. O MV, bem como outros veículos aí estacionados, naquela data e hora, foram atingidos por um pinheiro de grande porte situado no interior do recinto escolar - facto admitido por acordo.

  11. No dia 22/03/2008, estiveram presentes na Rua AA, cidade de P..., elementos da protecção civil da Câmara Municipal de P..., os Bombeiro Voluntários de P..., bem como elementos da Polícia Municipal de P... - Cfr. fls. 22 e 23 do processo físico cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

    E) A edição do Jornal de Notícias de 20 de Março de 2008 anunciava para o fim-de-semana – compreendendo o dia 22/03 – a previsão de ventos fortes - Cfr. fls. 25 do processo físico cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

  12. O Instituto Nacional de Meteorologia, em 19/03/2008, avisava que para o período da Páscoa de 2008 (compreendido entre 21 de Março a 23 de Março), se esperava para todo o continente, a partir...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT