Acórdão nº 00878/14.0BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 05 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelJoaquim Cruzeiro
Data da Resolução05 de Junho de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1 – RELATÓRIO I... - Produtos Alimentares Lda.

vem interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, datada de 11 de Novembro de 2014, e que indeferiu a providência cautelar que intentou contra o Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas IP (IFAP IP), e onde era solicitado que fosse decretada:

  1. A providência cautelar conservatória que suspenda a eficácia do acto administrativo em questão nos termos do artigo 120º, n.º 1, al. b) e bem assim, abster-se a Ré de o executar; b) Decisão da causa principal, nos termos do artigo 121º do CPTA, que anule o acto administrativo em questão, por vício de forma, preterição de formalidades legalmente exigidas e violação do princípio da legalidade e de direito constitucionalmente garantido; c) Decisão da causa principal, nos termos do artigo 121º do CTA que suspenda a eficácia o acto administrativo em questão sob condição, atá à verificação da fase de liquidação dos autos de insolvência citados, e em consequência, abster-se a Ré de o executar.

    Em alegações o recorrente concluiu assim:

    1. Não se verifica nos presentes autos a excepção de caducidade referida na douta sentença.

    2. Isto porque, o acto administrativo em crise enferma da nulidade prevista no artigo 133.º, n.º 2, alínea d) do C.P.A., a qual é invocável a todo o tempo.

    3. O direito de audição prévia é um “direito fundamental”, ou, se preferirmos, “garantia” fundamental análoga aos DLG’s, referida, expressamente, na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, artigo 41º, n.º 2, alínea b), sob epígrafe “Direito a uma Boa Administração”, que tem força no nosso ordenamento por via do princípio da aplicabilidade directa e imediata do Direito Comunitário e entendido como tal pela jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias.

    4. O qual integra a Constituição Material, ex vi artigo 16.º da C.R.P., plasmado no artigo 267.º n.º 5, e que decorre “directamente do princípio da dignidade da pessoa humana (art.º. 1.º da CRP) e do princípio do Estado de Direito Democrático (art.º. 2.º da CRP), tomado numa perspectiva de garantia da segurança jurídica, in casu, da previsibilidade da decisão por parte da Administração Pública”.

    5. Assim, “quer se qualifique o direito à audiência prévia como mero “direito fundamental”, quer se denomine esse direito, numa perspectiva reforçada, como “direito análogo” a uma “garantia” de natureza jus-fundamental, a preterição desse momento procedimental (art. 100.º do CPA) resultará sempre na nulidade do acto que corporiza a decisão administrativa (…)”.

    6. Direito fundamental esse que foi derrogado sem causa justificativa e de forma inaceitável, porquanto a justificação da Recorrida para fundamentar a decisão de dispensa de audiência prévia nos termos da alínea b), do n.º 1, do artigo 103.º do C.P.A., consistiu, tão só, em alegar que os prazos relativos aos processos de insolvência são demasiado estreitos, o que comprometeria a utilidade da decisão administrativa, G) O que não poderá colher, porquanto entre a data da sentença que declarou a insolvência da Recorrente e a data da decisão final da Recorrida mediou um período superior a seis meses, onde aquela poderia, perfeitamente, ter cumprido com todas as formalidades a que estava adstrita e garantido o direito jusfundamental da Recorrente à audiência prévia.

    7. Por outro lado, na data da decisão final já a Recorrida não poderia reclamar os seus créditos, nos termos dos artigos 36º e 128º do C.I.R.E., restando-lhe socorrer-se da acção de verificação ulterior de créditos.

    8. Acontece que, este último expediente pode ser utilizado, tempestivamente e no que importa ao concreto caso, até 3 meses após a constituição do crédito sobre a insolvente.

    9. Ora, se o crédito apenas se constitui com a decisão final, independentemente da maior ou menor delonga que se verificasse no procedimento tendente à prática de acto administrativo, sempre a Recorrente dispunha de 3 meses, a contar apenas a partir da data da decisão final, para despoletar aquele mecanismo junto dos autos de insolvência.

    10. Sendo mister, assim questionar, onde está, efectivamente, o perigo dos prazos curtíssimos e a possibilidade de grave prejuízo público no cumprimento e garantia de um princípio, repare-se, até comunitariamente consagrado e sancionado como fundamental.

    11. Pelo que, não pode a Recorrente conformar-se com a douta sentença, quando alega que caducou o seu direito e intentar a acção principal.

    12. Por outro lado, ainda que assim não fosse, não olvidando que a convolação da providência cautelar em processo urgente autónomo, nos termos do artigo 121.º do C.P.T.A, depende e integra os poderes de decisão da Mm.ª Juiz, pode o mesmo ser suscitado a pedido das partes - o que a A. requereu, expressamente na alínea b) do seu pedido, constante do seu requerimento inicial.

    13. Assim, “nestas situações, o processo urgente cautelar transforma-se em processo de urgência autónomo. Com efeito, quer na modalidade do processo urgente consagrada no artigo 121.º quer na modalidade consagrada no artigo 132.º, n.º 7 do CPTA, acontece tanto a anulação do nexo de acessoriedade-instrumentalidade como a anulação do sentido qualitativo de provisoriedade. Consequentemente, estando ambas as modalidades consagradas como processos urgentes cautelares, tanto uma como outra se transformam em processos urgentes autónomos, por um lado. E, por outro, pese embora deverem ambas as modalidades desembocar, à partida, em decisões provisórias sobre a quaestio iuris, ambas as modalidades permitem, na verdade, a obtenção da resolução definitiva da quaestio iuris da causa principal. Nestes casos, ambos os processos urgentes cautelares se transformam em processos urgentes autónomos, integrando ambos a mesma estirpe de tutela”.

    14. Por seu turno, a caducidade, enquanto consequência do não exercício de determinado direito em determinado prazo, não se interrompe, nem suspende, em princípio, senão pela prática do acto que apresenta a virtualidade de exercer o respectivo direito.

    15. Acontece que, o pedido expresso da A., ab initio e sem pretensões de “desvirtuar o pensamento do legislador”, foi no sentido de obter decisão final da quaestio iuris, por considerar que se encontravam nos autos todos os elementos necessários a tal.

    16. Assim sendo sempre se verificaria, salvo melhor entendimento, a prática do acto, ou exercício do direito apto a afastar aquele regime de caducidade, in extremis, por via material. Aliás, caso houvesse entendido a Mm.ª Juiz antecipar o juízo sobre a causa principal, nos termos do artigo 121.º do C.P.T.A., a acção principal a interpor (ou interposta) revelar-se-ia supervenientemente inútil, derrogando o princípio de direito adjectivo da economia processual.

    17. Pelo que, sempre se verificaria, salvo melhor entendimento, a prática do acto, ou exercício do direito apto a afastar aquele regime de caducidade, in extremis, por via material.

    18. Considerou, ainda, a douta sentença que não se verificavam os pressupostos essenciais ao decretamento da providência cautelar, em especial o fumus bonnus iuris e o periculum in mora.

    19. Quanto ao primeiro, acredita a Recorrente que a clara e injustificada violação de um direito fundamental seu é, de per si, atestador da muito provável procedência da acção principal.

    20. E, se não fosse bastante, sempre teríamos de atentar aos demais vícios de que enferma aquela decisão, a saber incumprimento do dever de fundamentação, inexistência dos/erro nos pressupostos em que se baseia, não interpelação da Recorrente antes da resolução contratual, os quais conjugados e devidamente explicados no corpo das alegações, apenas corroboram e reforçam a existência de (aparência do) bom direito da Recorrente.

    21. Em primeiro, a data que a Recorrida refere na sua decisão final (“data do único pagamento” – do IFAP à Recorrente) não é a prevista na alínea g) do artigo 11.º do Decreto-Lei 81/2008. Nos termos da referida norma, a contagem do prazo de 5 anos inicia-se a partir da conclusão dos trabalhos, os quais se consideram findos na data em que for paga a factura respeitante à última despesa do projecto – i. é., do pagamento pela Recorrente da última despesa que realizar no âmbito do PROMAR. Pelo que enferma a decisão administrativa de erro nos pressupostos de facto, incorrendo, igualmente, no vício de violação de lei W) Em segundo, a Recorrente não alienou nem onerou – fosse de que forma fosse - os bens/serviços adquiridos no âmbito do projecto, permanecendo aqueles na esfera desta, tal como consta do Plano de Recuperação junto à P.I. (Doc. 4). Inexistindo, assim, o “suposto” incumprimento que a Recorrida alega na sua decisão final. Aliás, a Recorrida, embora alegue tal situação em abstracto, não indica discriminadamente quais os bens onerados, em que termos e de que forma.

    22. Na verdade, face à norma contida no artigo 87º, nº 1 do C.P.A., e dos princípios que lhe subjazem, nomeadamente os do inquisitório e da legalidade, o dever de procurar averiguar os factos que suportam a decisão administrativa incumbe prioritariamente à administração sob pena de anulabilidade do acto praticado - posição...

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