Acórdão nº 00095/11.5BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução11 de Setembro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

O Ministério Público, em representação do ESTADO PORTUGUÊS, inconformado, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, proferida em 19/01/2015, que julgou improcedente a ação administrativa comum, para efetivação de responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito [acidente de viação], intentada contra o MUNICÍPIO DE L...

, na qual figura como interveniente acessória a “COMPANHIA DE SEGUROS A..., S.A.”, e na qual o autor peticionava a condenação do réu no pagamento de uma indemnização por danos patrimoniais decorrentes do acidente de viação em causa nos autos, no montante de €6.612,10 (seis mil seiscentos e doze euros e dez cêntimos).

**O Recorrente Ministério Público alegou, e formulou as seguintes CONCLUSÕES que aqui se reproduzem: « 1. Na douta sentença a Mma. Juíza concluiu que a sinalização colocada no dia 12/02/2010 pela Divisão de Manutenção de Serviços Urbanos do Município de L..., não foi adequada e, pelo exposto, o Réu não cumpriu adequadamente o seu dever de sinalização, tendo a sua conduta de ser qualificada como ilícita.

  1. Da factualidade apurada resultou e ficaram efetivamente demonstrados os factos de que a lei faz depender a presunção de culpa do Réu e que competia ao Réu provar então que não houve culpa da sua parte ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa sua (cfr. parte final do n.°1 do artigo 493.° do C.C.).

  2. Ora, apesar de dar como provada a prática pelo Réu Município de L... de um ato ilícito e culposo, na decisão a Mma. Juíza não tira a correspondente consequência desse facto atribuindo toda a culpa do acidente ao Sr. Inspetor da PJ JATM em termos que infere-se, tornam inoperante a presunção legal de culpa pendente sobre o Réu.

  3. A Mma. Juíza, quanto a nós, com base nesse facto ilícito e culposo do Réu deveria quanto muito ter atribuído a sua parte de responsabilidade no acidente e calcular essa responsabilidade na atribuição dos danos e não, como fez, fazer tábua rasa dessa ilicitude e culpa atribuindo a responsabilidade do acidente e os danos sofridos no veículo conduzido pelo agente da PJ exclusivamente ao lesado.

  4. Surge assim uma contradição insanável entre os fundamentos e a decisão proferida devendo a sentença ser declarada nula e substituída por outra que com base nos factos dados como assentes quanto ao Réu Município de L... se pronuncie sobre o seu grau de culpa e atribua ao lesado um indemnização correspondente a esse grau de culpa.

  5. Em relação ao Réu Município de L..., face aos factos dados como assentes verificam-se cumulativamente os requisitos da responsabilidade civil, ou seja, o facto, a ilicitude, a culpa o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano.

  6. E existe obrigação de indemnizar dado que os danos reclamados pelo Autor Estado Português não podem deixar de ser considerados, consequência normal do facto ilícito e culposo praticado pelo Município de L..., sustentados em critérios objetivos considerados como provados na douta sentença.

  7. Por outro lado, como também refere a douta sentença o Réu não conseguiu provar que não houve culpa da sua parte ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa sua (cfr. parte final do n.° 1, do artigo 493.°, do C.C.).

  8. Ora, existindo como foi provado na sentença um ato ilícito e culposo do Réu concluímos que este não conseguiu ilidir a presunção de culpa que incide sobre o mesmo e que a sua eventual condenação se baseia em culpa objetiva da sua parte e não em culpa presumida como refere a douta sentença.

  9. Pelo que, a materialidade fática dada como provada permite um exercício substantivo que desague no preenchimento cumulativo dos referidos requisitos constitutivos (ilicitude, culpa, nexo causal e danos) do direito à indemnização e da obrigação de indemnizar, pelo que deve o Réu ser condenado no pedido.

  10. Não o fazendo, concluímos que os fundamentos invocados na sentença estão em insanável contradição com o decidido, pelo que a mesma, nos termos do artigo 615.°, n.º1, alínea c), do C.P.C., aplicável por força do artigo 1.°, do C.P.T.A., é nula e, como tal, deverá ser declarada.

  11. Termos em que, deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, com a consequente condenação do Réu Município de L... no pedido».

    **O Recorrido Município de L...

    contra-alegou e apresentou as seguintes CONCLUSÕES que aqui se transcrevem: «1- Não existe oposição entre os fundamentos e a decisão proferida e, por isso, a sentença não é nula nos termos do artº 615º, nº a al. c) do CPC.

    2- A presunção de culpa é ilidível, nos termos do artº 493º, nº 1 do CC, podendo ser afastada ou pela ausência de culpa ou demonstrando que o evento e os consequentes danos teriam ocorrido, mesmo sem culpa.

    3- O disposto no artº 493º, nº 1 do CC ao estabelecer uma presunção de culpa não exige que o autor e, portanto, lesado, faça prova da culpa funcional do réu.

    4- Mas a responsabilidade do réu Município de L... é excluída se se provar, como provou que os danos ocorreram por conduta do lesado, ou seja se se demonstrar que os danos teriam ocorrido independentemente da verificação daquela presunção.

    5- “Se a responsabilidade se basear numa simples presunção de culpa, a culpa do lesado, na falta de disposição em contrário, exclui o dever de indemnizar. (artº 570º nº 2 do CC).

    6- “ Não resulta da matéria de facto assente a culpa efetiva do réu, por isso se alguma responsabilidade existisse fundar-se-ia simplesmente numa culpa presumida de modo que sempre estaria excluído o dever de indemnizar”, como acertadamente se escreveu na sentença em recurso e que aqui, com a devida vénia, transcrevemos.

    7- A presunção só funciona se outros factos não existirem e existem que demonstram de forma inequívoca a culpa do lesado na produção do acidente.

    8- As presunções não funcionam, de forma automática e nunca funcionam quando a culpa é do lesado. » Termina requerendo o não provimento do recurso, e a confirmação da sentença recorrida.

    **A Recorrida Companhia de Seguros contra-alegou, e enunciou as seguintes CONCLUSÕES que aqui se transcrevem: « 1. A Douta Sentença proferida pela Mmª Juíza do tribunal a quo não merece qualquer censura.

  12. O Recorrente, Estado Português, defende que a sentença recorrida é nula, porquanto considera que os fundamentos que a sustentam estão em oposição com a Em ordem a ilidir a presunção que impendia sobre o Recorrido, era necessário que este provasse que os danos se teriam produzido independentemente de ter infringido as disposições legais relativas à sinalização.

  13. decisão tomada.

  14. O Recorrente alega que ao considerar provada a prática de um ato ilícito e culposo por parte do Recorrido, Município de L..., a Mmª Juiz do Tribunal a quo deveria ter necessariamente atribuído a responsabilidade pelos danos decorrentes do sinistro em causa nos autos.

  15. O Recorrente logrou reunir os pressupostos de que depende a presunção de culpa que impende sobre o Recorrido, Município de L..., mas tal presunção é ilidível.

  16. Segundo o artigo 570º, n.º 2 do Código Civil, quando a culpa se baseia meramente numa presunção legal, a culpa efectiva do lesado exclui o dever de indemnizar.

  17. Resultou provado que o condutor do veículo de matrícula **-IO-**, Inspector JATM, desrespeitou o sinal de proibição C2, com a indicação “excepto moradores” e que aquele não reside na via regulada por aquele sinal.

  18. Ficou assente que o condutor do veículo de matrícula **-IO-**, circulava a uma velocidade aproximada entre os 61 e os 71 km/h, quando a velocidade máxima permitida no local é de 50 km/h.

  19. A conduta do condutor do veículo de matrícula **-IO-** deve considerar-se ilícita e culposa.

  20. Da prova produzida apenas resultou provada a ilicitude da conduta do Recorrido, Município de L..., sendo certo que a culpa deste fundar-se-ia somente numa presunção legal e esta foi ilidida.

  21. Nada há a indemnizar.

  22. Bem andou a Mmª Juiz a quo ao absolver o Recorrido, Município de L..., do pedido.

  23. A douta sentença recorrida deverá ser mantida, uma vez que a Mmª Juiz do Tribunal a quo, fez a correcta apreciação das questões que lhe foram submetidas.» Termina requerendo o não provimento do recurso, devendo manter-se a decisão recorrida.

    **2.

    DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO- QUESTÕES DECIDENDAS.

    Considerando que são as conclusões de recurso que delimitam o seu objeto, as questões suscitadas que cumpre decidir, cifram-se em saber se a decisão judicial recorrida enferma da nulidade prevista na alínea c) do n.º1 do art.º 615.º do CPC, por contradição insanável entre os fundamentos e a decisão proferida.

    **3.FUNDAMENTAÇÃO.

    3.1.MATÉRIA DE FACTO Com relevo para a decisão a proferir, a 1.ª instância deu como provados os seguintes factos: «

    1. Em 12/02/2010, foi elaborada a “Participação de Acidente de Viação” com o nº de registo 31/2010, pela Guarda Nacional Republicana, a qual integra um relatório fotográfico digital respeitante ao acidente, documentos que dou aqui por integralmente reproduzidos (cf. documento nº 1 junto com a petição inicial).

    2. A responsabilidade civil inerente à circulação do veículo ligeiro de mercadorias de serviço particular de marca Mitsubishi L200, matrícula **-IO-** encontrava-se, em 12/02/2010, transferida para a seguradora Az..., através do contrato de seguro titulado pela apólice nº 50....

    3. O Município de L... celebrou contrato de seguro de responsabilidade civil com a G... Companhia de Seguros, S.A., titulado pela apólice nº 20…, cujo teor dou aqui por integralmente reproduzido (cf. documento nº 1 junto pela Companhia de Seguros na sua contestação).

    4. Em 24/01/2011, a G... Companhia de Seguros, S.A., foi incorporada, por fusão, na Companhia de Seguros A..., S.A. (facto não impugnado).

    5. A variante de C..., no concelho de L..., é uma estrada municipal (facto admitido por acordo).

    6. Em 12/02/2010, cerca das 18 horas, circulava na variante de C..., concelho de L..., na qual entrou pelo entroncamento em frente ao...

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