Acórdão nº 00022/08.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução11 de Setembro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: O Estado Português veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, pela qual foi julgada parcialmente procedente a acção administrativa comum, na forma sumária, intentada por EBR para pagamento de uma indemnização de 12.505,00 euros, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde a citação e até integral pagamento por efectivação de responsabilidade civil extracontratual.

Invocou para tanto a ilegitimidade passiva do Réu Estado Português e quanto ao fundo da causa alegou que não se verificam os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Estado por actos ou omissões dos seus agentes.

A recorrida contra-alegou defendendo a manutenção do decidido.

*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.

*I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: 1ª - Em 27.01.2006, a emissão de certidão de teor de descrição predial, era da competência da Conservatória do Registo Predial de VNG, que consistia num serviço externo inserido na estrutura organizacional da Direcção-Geral dos Registos e do Notariado, que fazia parte da Administração Directa do Estado e que estava integrada na Direcção Geral de Registos e Notariado.

  1. - Pelo Dec.-Lei nº 206/2006, (Lei Orgânica do Ministério da Justiça), tal Direcção Geral foi reestruturada e integrada na administração indirecta do Estado sob a designação de “Instituto dos Registos e do Notariado, IP”, o qual é dotado de autonomia administrativa e de património próprio, nos termos do seu artigo 14º.

  2. - As atribuições e funções daquela Direcção Geral passaram a pertencer ao Instituto de Registos e Notariado, criado pelo Dec.-Lei nº 129/2007, que entrou em vigor no dia 1 de Maio de 2007 (cf. seu artigo 19º) e que lhe sucedeu legalmente; sendo as conservatórias do registo predial em serviços desconcentrados do I.R.N., I.P., tal como previsto nos termos da alínea b) do nº 3 do artigo 8º do citado Decreto-lei nº 129/2007, a responsabilidade por eventuais factos ocorridos nesse período, terá de ser imputada àquele Instituto e não ao réu Estado Português.

  3. - Atenta a natureza subsidiária da responsabilidade civil extracontratual do Estado, o réu Estado Português não tem, pois, interesse em contradizer o alegado pela autora, sendo, por conseguinte, parte ilegítima para a presente acção.

  4. - Ocorre a ilegitimidade passiva do réu Estado Português, por não poder ser condenado no pagamento de qualquer indemnização, tem de ser absolvido da instância, nos termos e com os efeitos previstos pelos artigos 493º nº 2 e 494 alª e) do CPC, ex vi do artigo 1º e 10º nºs 1 e 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

  5. - A presente acção assenta em factos praticados por funcionário da 1ª Conservatória do Registo Predial de VNG, que emitiu uma emissão de certidão de teor da descrição e de todas as inscrições em vigor da fracção autónoma, melhor identificada nos autos, a qual se destinou a instruir escritura pública de dação em cumprimento de ½ indivisa do referido imóvel, tendo-se constatado a omissão, por lapso, de um registo de penhora sobre o mesmo – existência de uma discrepância entre a realidade registral e o teor daquela certidão.

  6. - A funcionária daquele serviço actuou de acordo com critérios de profissionalismo e zelo que lhes eram exigíveis em razão das circunstâncias concretas em que tal acto foi praticado, tendo sido dado como provado, além do mais, que “aquando da emissão da certidão referida em B) verificou-se um grande número de apresentações e que o prédio em causa está descrito no sistema de livro de registo”, após exaustiva descrição das condições de trabalho e ocorrendo pressão bancária.

  7. - Face às circunstâncias concretas, não lhe era exigível outro comportamento, pelo que, ainda que admitindo-se um lapso na emissão da referida certidão, o mesmo é justificado por imperativos de celeridade no exercício da actividade registral, e não consubstancia qualquer actuação ilícita culposamente praticada por qualquer funcionário, ou sequer pelo réu Estado, sendo insusceptível de gerar os danos alegadamente sofridos pela autora, pelo que, se não encontram preenchidos os requisitos da ilicitude e da culpa, como pressupostos necessários da obrigação de indemnizar; 9ª - Igualmente, não se verifica no caso “sub judice” o requisito do nexo de causalidade entre o eventual facto ilícito e o dano alegadamente sofrido pela autora, uma vez que a alegada omissão ou lapso dos serviços da Conservatória não era susceptível de originar os danos que a autora alega ter sofrido, pois que os mesmos resultaram de violação culposa, por parte de FCM, quanto às obrigações por si assumidas na escritura pública de dação em cumprimento, designadamente, na parte em que declarou que, com excepção da hipoteca registada, o imóvel estava livre de ónus e encargos. 10ª - Foi este terceiro, enquanto comproprietário do imóvel em questão nos presentes autos (cf. artigos 1403 e seguintes do Código Civil) quem actuou dolosamente, induzindo deliberadamente em erro sobre os ónus impendentes sobre o imóvel, com o intuito de prejudicar a autora.

  8. - Mesmo assim a autora decidiu realizar o negócio jurídico de dação em cumprimento, como forma de efectivação de alegado crédito que detinha sobre FCM, como inequivocamente resulta do alegado nos artigos 5º, 6º e 13º do requerimento inicial de embargos de terceiro, deduzidos pela autora por apenso aos autos de execução que correram termos pela 1ª Vara Mista de VNG, sob o processo nº 23/2001, conforme o documento nº 1 da petição inicial.

  9. - A autora aceitou a celebração do negócio de dação em cumprimento de ½ indivisa do imóvel do qual já era, àquela data, comproprietária da restante metade indivisa, como forma de restituição do valor mutuado a FCM, independentemente de qualquer informação relativa à situação jurídica do imóvel, ante os compromissos por este assumidos e sua “falta de liquidez”; 13ª - O terceiro FCM teve integral conhecimento da existência desse ónus sobre a metade indivisa da fracção transmitida à autora, uma vez que interveio na constituição da dívida e subsequente obrigação de pagar ao Banco Santander, quer por via da sua intervenção processual, na qualidade de executado citado no âmbito do processo que correu pela 1ª Vara Mista de VNG, sob o nº 23/2001, em data muito anterior à da realização do negócio jurídico celebrado com a autora.

  10. - Sendo evidente que FCM dolosamente usou de má-fé, de modo a beneficiar de uma garantia real de uma dívida sua, incidente sobre bem alheio, “in casu”, a metade indivisa da fracção autónoma “U”, transmitida à autora, com sua violação das obrigações assumidas na escritura pública de dação em cumprimento e constituiu-se em responsabilidade contratual para com esta.

  11. - Foi aquele quem recolheu os benefícios do negócio celebrado com a autora, uma vez que recebeu integral quitação da dívida que tinha para com esta, bem como viu integralmente satisfeito o débito que esteve na origem do registo da penhora sobre o imóvel em causa, tendo face ao pagamento da quantia exequenda pela autora, recebido o correspondente ao valor da sua dívida para com o exequente, sem ter cuidado de pagar a dívida que tinha para com o Banco Santander.

  12. - Como tal, o património de FCM ficou enriquecido, na exacta medida em que o da autora ficou empobrecido, sem que ocorra qualquer causa justificativa desse enriquecimento – cf. artigos 473º e seguintes do Código Civil.

  13. - A autora poderia ter instaurado uma acção para anulação do mencionado negócio da dação em cumprimento ou intentado acção de enriquecimento sem causa, exigindo a restituição e reposição de tudo quanto havia pago, bem como o ressarcimento pelos prejuízos eventualmente sofridos, como meios possíveis de sua actuação, uma vez que se está no domínio da responsabilidade contratual.

  14. - A responsabilidade pelos danos sofridos pela autora só àquele são...

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