Acórdão nº 01770/13.1BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 07 de Abril de 2017
Magistrado Responsável | Frederico Macedo Branco |
Data da Resolução | 07 de Abril de 2017 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório O Instituto de Gestão de Fundos de Capitalização da Segurança Social, IP, no âmbito da Ação Administrativa Comum intentada por MCLS, tendente, designadamente, a ser reconhecido que o montante de 1.895€ constitui a sua remuneração, inconformado com a Sentença proferida em 23 de setembro de 2016, que julgou a Ação procedente, veio a apresentar Recurso Jurisdicional, em 7 de novembro de 2016, no qual concluiu (Cfr. fls. 396 a 400v Procº físico): “I. Uma cuidada análise da Sentença «a quo» revela um erro grave interpretativo quanto aos pontos 1 a 3, da matéria dada como provada, conjugados com o Ponto 16, em que o julgador se alicerçou em declarações da testemunha PMGCGA que a mesma não produziu em sede de audiência de discussão e julgamento, pelo que os factos dados como provados conduziriam à improcedência do peticionado pela Recorrida.
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E o Tribunal também andou mal quando desconsiderou a normatividade efetivamente aplicável, violando a Sentença «a quo» não só o disposto no artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 14/2003, de 30 de janeiro, mas também a imposição legal de reduções remuneratórias que resulta das Leis de Orçamento de Estado.
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O Tribunal «a quo» considerou como provados os seguintes factos: 1-A 25 de Julho de 2009 foi publicado na Bolsa de Emprego Público (BEP), concurso externo para contratação de um Técnico Superior de 1ª. Classe.
2-No Detalhe da Oferta de Emprego constava, designadamente: .Nível Orgânico- Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social: .Órgão /Serviço- Instituto de Gestão de Fundos de Capitalização da Segurança Social; .Vínculo- CTFP por tempo indeterminado; .Regime-Pessoal Técnico Superior; .Categoria- Técnico Superior de 1.ª Classe; .Remuneração- 1898; .Suplemento Mensal- 0,00 EUR – cfr. doc. 1 junto com a petição inicial.
3-A Autora apresentou a sua candidatura em conformidade com os requisitos gerais do recrutamento, o qual culminou, após processo de seleção, na obtenção do 1.º lugar na classificação do concurso, com a sua admissão para o exercício das funções ali referenciadas.
16- Em resposta, o Dr. HC somente lhe transmitiu [à Autora] que era prática do Instituto, ora Réu, decompor em duas parcelas a retribuição dos seus trabalhadores, sem conferir qualquer outra explicação, mas garantindo-lhe que a sua remuneração base era, e sempre seria, a constante do anúncio constante do BEP.
(…) Enfatizou que, olhando para a publicitação efetuada pelo Réu no BTE (…) que não lhe suscitaria qualquer dúvida quanto ao valor da remuneração, que era de 1.898,00 euros e que o contrato era por tempo indeterminado, como assim depôs a testemunha PMGCGA (…)”.
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Ora, a Testemunha PMGCGA afirmou precisamente o contrário do que consta deste Ponto 16! V. E do depoimento desta Testemunha, que, adiante-se, foi ouvida oficiosamente pelo Tribunal, por reconhecer a importância dos esclarecimentos que pudesse carrear pelos autos, dado ser o responsável pelos serviços que preencheram o polémico formulário do BEP, nada resulta que permita concluir quanto à indicação de Suplemento Mensal como sendo €0,00, “(…) que inexistia remuneração nesse domínio (…)”: antes pelo contrário, a Testemunha esclareceu não só o motivo informático que estava por detrás dessa menção a €0,00, bem como que lhe foi expressamente transmitido pelo Conselho Diretivo do Recorrente que a remuneração devia ser repartida em duas partes no Anúncio do BEP, uma fixa e uma variável, pelo que não se entende como pode o Tribunal «a quo» ter ignorado ostensivamente tais declarações.
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Com efeito, esta Testemunha afirmou em audiência de discussão e de julgamento, vide, minutos 29:48 a 31:30, que “(…) que o formulário nem estava sequer preparado para a situação do Instituto porque não tinha a possibilidade de escolher o que aqui aparece como carreiras não revistas (…)”, e que foi preenchido “(…) da maneira que foi possível preencher (…)”, dado que “(…) as indicações que [ recebeu] do Conselho Diretivo foi para a decomposição do vencimento base de maneira diferente da que [na Oferta] está (…)” e “(…) o formulário prévio do Boletim não o permitiu (…).
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Ou seja, a plataforma do BEP estava pré-formatada, pelo que não foi possível aos Serviços inserirem o prémio separadamente, porque a plataforma não estava preparada para este tipo de carreiras, conquanto o CD tivesse a decomposição do vencimento muito clara; a própria categoria indicada foi, atendendo às limitações da plataforma, e segundo a Testemunha, “(…) foi algo o mais aproximado possível (…), cfr., minuto 31:27, pelo que da correta apreciação da prova testemunhal, ao explicar devidamente, e com uma posição privilegiada para o fazer, o contexto da inserção do Anúncio em crise na BEP, deveria ter resultado a improcedência do peticionado pela Recorrido, e não a procedência da ação.
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O Tribunal «a quo» ignorou a argumentação de Direito amplamente expendida pelo Recorrente durante o processo, refugiando-se num princípio geral de Direito, o da Segurança Jurídica, como garante, sem mais, de todos os direitos invocados pela Recorrida, obnubilando a legislação concreta existente sobre a matéria em crise e que, nitidamente, faria improceder o que a Recorrida peticionou.
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Com efeito, e por força da entrada em vigor a 31 de janeiro de 2003 do Decreto-Lei n.°14/2003, de 30 de janeiro, a atribuição à Recorrida dos prémios de produtividade e mérito após a referida data seria manifestamente ilegal, pelo que nunca poderia proceder o por esta peticionado.
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As compensações complementares previstas no artigo 6.º/1 do Regulamento de Política de Pessoal do IGFCSS, porque não se encontram previstos na lei nem em instrumento de regulação coletiva de trabalho, estão abrangidos pela previsão normativa do artigo 6.º/1 do Decreto-Lei n.º 14/2003, que determina a revogação dos atos que os instituíram.
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Nos termos do n.º 2 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 14/2003, cessaram, com a entrada em vigor do diploma, de modo imediato e automático, as regalias e benefícios suplementares já atribuídos.
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Ou seja, deixou de ter cabimento a atribuição ao pessoal do IGFCSS de concretas prestações remuneratórias, tendo por fundamento disposições contidas no Regulamento de Política de Pessoal ou de outro instrumento de natureza administrativa consideradas revogadas.
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Contudo, e embora o segmento final do n.º 2 do artigo 6.º do Decreto-Lei ressalve os direitos legitimamente adquiridos, Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, cfr., DOC. 7 da Contestação, com remissão para Relatório do Tribunal de Contas n.º 29/2010, elaborado no processo n.º 05/2009.AUDIT, aprovado a 21 de outubro de 2010, na Subsecção da 2.ª Secção, e disponível na página eletrónica do TC, em http://www.t.contas.pt/atos/rel_auditoria, concluiu que a proteção dos direitos adquiridos prevista no Decreto-Lei n.º 14/2003, de 30 de janeiro, se aplica apenas às regalias e benefícios suplementares que já tenham sido atribuídos, como determina a referida norma, o que tendo em consideração o âmbito de aplicação da norma, verifica-se não estarem reunidos os pressupostos para o enquadramento no conceito de direitos adquiridos de componentes remuneratórias como os prémios de produtividade e de mérito quando não atribuídos antes de 31 de janeiro de 2003, tratando-se antes de situações de simples expectativa jurídica, e não lhes sendo aplicável, por conseguinte, a exceção prevista no n.º 2 do artigo 6.° do Decreto-Lei n.º 14/2003, de 30 de janeiro.
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De referir também que, para o conselho consultivo da Procuradoria-Geral da República, a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 39/2011, de 21 de março, não alterou qualquer das conclusões referidas supra: o referido parecer analisa o artigo 5.° do referido decreto-lei e retira do disposto no n.º 2, quando este dispõe que as carreiras do IGFCSS que ainda não tenham sido objeto de extinção, de revisão ou de decisão de subsistência continuam a reger-se ainda pela integralidade dos respetivos regulamentos internos, que o mesmo só pode ser entendido como mantendo o que existe na ordem jurídica no momento da sua entrada em vigor, ou seja, mantendo a aplicação dos regulamentos internos na parte em que os mesmos não tenham sido já revogados (e por isso tenham deixado de existir na ordem jurídica) por força do Decreto-Lei n.º 14/2003, de 30 de janeiro.
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E as conclusões do Relatório de Auditoria do Tribunal de Contas e do parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República sustentam que o Decreto-Lei n.º 14/2003, de 30 de janeiro, revogou as normas constantes do Regulamento que consagravam remunerações suplementar ou compensações complementares.
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Cumpre, ainda, salientar que a atuação do Recorrente desde a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 14/2003, de 30 de janeiro, sempre se pautou pela aplicação das regras que os titulares do conselho diretivo consideravam estar em vigor à data dos acontecimentos, o que veio a ser contrariado pela auditoria do Tribunal de Constas e posteriormente; não existiu, por isso qualquer atuação contrária à boa-fé ou à confiança jurídica da parte dos titulares do conselho diretivo do Recorrente quando celebraram o contrato de trabalho com a Recorrida no qual ficou fixado a componente remuneratória correspondente ao prémio de produtividade e mérito.
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Perante as conclusões do Relatório de Auditoria do Tribunal de Contas e do parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República, o Recorrente só podia aplicar as mesmas, suspendendo a atribuição das remunerações consideradas indevidas e promovendo a reposição das quantias indevidamente percebidas.
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O ato de suspensão do pagamento não consubstancia qualquer intervenção unilateral do Réu enquanto entidade empregadora, mas é, sim, o resultado do acatamento das conclusões do Relatório de Auditoria do Tribunal de Contas e do parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República, pelo...
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