Acórdão nº 00589/04.5BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 27 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução27 de Janeiro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: SMMM e mulher MRFJCM vieram interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL do acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, de 29.02.2016, pelo qual foi julgada improcedente a acção administrativa especial intentada pelos Recorrentes contra o Município de Valongo e a Contra-Interessada C... - Investimentos Imobiliários, Ld.ª, para declaração de nulidade do acto de licenciamento de construção de um armazém industrial sito na Rua … (como consta do processo de obras nº 266-OC/2002), proferido em 01.06.2004, por violação do artigo 30º nº 3 do Plano Director Municipal de Valongo e dos artigos 59º e ss do RGEU, e, ainda, em caso de deferimento do pedido impugnatório, a condenação do Município de Valongo a emitir acto de tomada de posse administrativa para demolição da obra na parte em que está inquinada de ilegalidade, isto é, nos posteriores da mesma, confinantes com o prédio dos aqui Autores.

Invocaram para tanto, em síntese, que estribando-se o acórdão recorrido na figura urbanística da geminação, sendo esta aplicável apenas a moradias, enquanto casa destinada a residência em geral de uma só família (Dicionário da Língua Portuguesa – Verbo), tem de considerar-se ilegal o acto de licenciamento de um edifício com fim industrial, por violar o artigo 30º, nº 3, do Plano Director Municipal em vigor no momento do licenciamento em questão; argúem ainda a nulidade do acórdão por a resposta aos factos da base instrutória conter uma contradição quanto a dois pontos da matéria de facto.

Os Recorridos contra-alegaram defendendo a manutenção do decidido.

O Ministério Público neste Tribunal emitiu parecer também no sentido de ser negado provimento ao recurso.

* Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.

* I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: I- O Decreto Regulamentar nº 2/2009, invocado pela decisão judicial impugnada, este diploma legal e a noção de geminação que aqui veio no ponto 32 do seu anexo a ser explicitada não constitui justificação para a permissão de afastamentos superiores pelo simples motivo de o licenciamento datar de data anterior à entrada em vigor do referido decreto regulamentar, mais propriamente de 2004 quando o DR só entrou em vigor em 30 maio de 2009.

II- Não há indústrias geminadas, mas moradias geminadas, sendo certo que - como o próprio tribunal afastou também - não é aplicável o conceito de banda porque para isso os afastamentos posteriores dos edifícios supostamente integrados na banda seriam os mesmos o que não é manifestamente o caso conforme se pode analisar pelos plantas constantes do processo administrativo.

III - Já que se deu crédito ao DR 2/2009 para justificar o sentido do presente acórdão sempre se dirá também que lá mesmo, no nº 32 citado pelo tribunal, o conceito de geminação usado diz apenas respeito a moradia, que é no caso concreto uma casa destinada à residência em geral de uma só família (Dicionário da Língua Portuguesa - Verbo).

IV - No caso sub judice o licenciamento impugnado não tinha por objecto a construção de uma moradia, mas de um edifício com fim industrial.

V - A noção da técnica da geminação não tem aqui qualquer enquadramento legal ou regulamentar possível, uma vez que a geminação é uma técnica urbanística que permite o aproveitamento de espaço físico dos terrenos das construções que vão ser implantadas, aproveitamento de espaço a que se dá relevância económica quando do que se trata é de construir moradias, mas já não quando se trata de construir edifícios destinados a outros fins designadamente industriais.

VI - A razão de tal diferença reside na circunstância de o interesse do aproveitamento de espaço ter de ceder perante a necessidade mais alta de protecção de riscos e perigos reconhecidamente mais inerentes (em maior escala e proporções) à actividade industrial, pois que o agrupamento de edifícios industriais 2 a 2 com a justaposição de empenas potencia o risco de actividade industrial.

VII - Não configurando a figura urbanística da geminação possibilidade no caso sub judice terá forçosamente de dizer-se que tal justificação não tendo aqui aplicação no caso concreto mantém a ilegalidade apontada pelos aqui recorrentes e que no que aqui interessa se reporta à violação por este licenciamento dos limites de afastamentos posteriores a ter em conta em função do Plano Director Municipal.

VIII - Os arestos que o Tribunal a quo chama a colação para dar sustento a esta tese, sempre se dirá que os mesmos dizem respeito precisamente em qualquer um dos casos ali julgados a moradias e bem pode compulsar-se a base de dados de jurisprudência em procura de um acórdão que alguma vez aplique o conceito de geminação a indústrias, que tal tarefa será em vão porque pura e simplesmente tais decisões ali não existem.

IX - Pelo que em face da matéria dada como provada e excluindo a possibilidade de geminação de edifícios industriais se deve sem mais revogar o acórdão recorrido e substituir por outro que julgue o ato recorrido nulo por violação do Plano Director Municipal designadamente dos afastamentos posteriores vertidos no artigo 30º do Plano Director Municipal em vigor no momento do licenciamento da obra aqui em causa.

X - O relator toma como válido EEE) um testemunho do projectista reproduzindo a fls. 41 segundo o qual sempre considerou tratar-se de uma construção geminada e ao mesmo tempo mantém também como assente em DDD) que a justaposição ocorreu por vontade da contra-interessada.

XI- Estes dois factos que dizem respeito a mesma circunstância - de onde vem a ideia da geminação da Ré ou da Contra-Interessada tem respostas contraditórias na matéria de facto apurada, o que é uma contradição relevante até porque o cerne da questão está precisamente como se viu supra na geminação dos edifícios.

XII- A contradição na resposta a estes dois pontos da matéria de facto considerados relevantes para o Tribunal a quo decidir a questão inquina a decisão de nulidade, nos termos do artigo 668º do Código de Processo Civil porque está provado um facto e uma versão do mesmo que é um seu oposto.

* II – Matéria de facto.

Os Recorrentes invocam a nulidade do acórdão por contradição entre as respostas dadas a dois factos da base instrutória – artigo 668º do Código de Processo Civil de 1995.

Alegam a este propósito que: o Relator toma como válido - EEE) - um testemunho do projectista, reproduzido a fls 41, segundo o qual, sempre considerou tratar-se de uma construção geminada e ao mesmo tempo mantém também como assente em – DDD) - que a justaposição ocorreu por vontade da Contra-Interessada; estes dois factos que dizem respeito à mesma circunstância - de onde vem a ideia da geminação da ré ou da Contra-Interessada? - tem respostas contraditórias na matéria de facto apurada, o que é uma contradição relevante até porque o cerne da questão está precisamente, como se viu supra, na geminação dos edifícios; a contradição na resposta a estes dois pontos da matéria de facto, considerados relevantes para o Tribunal a quo decidir a questão, inquina a decisão de nulidade, nos termos do artigo 668º do Código de Processo Civil, porque está provado um facto e uma versão do mesmo que é um seu oposto.

Mas sem razão.

Os dois factos indicados respondem, como sustenta o Município, no mesmo sentido: que foi sempre vontade da Contra-Interessada construir um prédio geminado ou em banda: o projectista da obra foi contratado pela Contra-Interessada para elaborar o projecto e, por isso, ambos, projectista e Contra-Interessada promoveram a justaposição da construção.

Mas também como refere o Acórdão recorrido: “… Resulta do probatório, ainda, que tal justaposição não ocorreu por um mero acaso mas sim por vontade e indicação da ED, cfr. resulta da Informação nº 421/00/2002 – referida nas alíneas KKK, LLL e MMM do probatório - onde foi proposta essa justaposição das empenas na construção da CI com a do edifício contíguo, e que era propósito da ED, que houvesse articulação entre os edifícios – alíneas CCC e DDD do probatório” (cfr. pág. 40 «in fine» da sentença).

Basta atentar, como defende a Contra-Interessada, nos pontos DDD) e EEE) da matéria de facto julgada provada para se confirmar que a construção da Contra-Interessada tem as características integradoras do conceito de “geminação”, acrescendo que, como decorre do ponto CCC), tal implantação foi determinada pela Ré.

Não se verifica, em conclusão, qualquer contradição na matéria de facto dada como provada, apontada pelos Recorrentes ou qualquer outra, do que se conclui não existir a nulidade do acórdão prevista no artigo 668º do Código de Processo Civil de 1995, actual artigo 615º do Código de Processo Civil de 2013.

Deveremos assim da por provada a seguinte matéria de facto alinhada na decisão recorrida.

  1. Por requerimento datado de 16 de Agosto de 2002, e apresentado na Câmara Municipal de Valongo em 21 do mesmo mês e ano a contra-interessada C... expôs o seguinte "( ... ) vem apresentar a V. Exª o projecto de construção de um armazém industrial, no terreno sito na Rua Central, freguesia de Campo, concelho de Valongo, vem muito respeitosamente requerer a V. Exª se digne aprovar e conceder o necessário alvará pelo período de um ano" (cf. documento de pág. 1 do processo administrativo, doravante – artigo I da matéria de facto considerada assente no despacho saneador).

  2. Acerca desse requerimento foi pedido parecer do DSU (cf. documento de pág. 1 verso do processo administrativo - artigo II da matéria de facto considerada assente no despacho saneador).

  3. Acompanhavam o pedido supra mencionado, vários documentos, nomeadamente, certidão da Conservatória do Registo Predial (fls. 2 a 6 do processo administrativo), memória descritiva e justificativa do projecto (fls. 7 a 12 do processo administrativo) declaração de responsabilidade do engenheiro que elaborou o...

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