Acórdão nº 00520/12.4BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 02 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelM
Data da Resolução02 de Março de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: O EXMO. REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA inconformado com a sentença proferida pela MMª juiz do TAF de Viseu que julgou procedente a oposição deduzida por T...

e D...

contra a reversão da execução por dívidas da sociedade “Entreposto…, Sociedade Unipessoal por Quotas, Lda” dela interpôs recurso terminando as alegações com a seguintes conclusões:

  1. Incide o presente recurso sobre a douta sentença que julgou procedente e provada a oposição em epígrafe, porquanto se considerou não provado o exercício das funções de gerência por parte das oponentes; b) Na presente oposição, alegam as oponentes nunca terem exercido as funções de gerência de facto, sendo estas desempenhadas apenas pelo seu pai, J...; c) Todavia, resulta inequivocamente demonstrado, por próprio reconhecimento das oponentes, a sua nomeação para gerente da sociedade devedora originária – tendo a sua nomeação como gerentes o objetivo de permitir que a sociedade pudesse emitir cheques – o que aliás, foi confirmado pelas testemunhas que as oponentes apresentaram nos autos, e cuja versão foi levada ao probatório da douta decisão recorrida - cfr. pontos T) e U) do probatório; d) De igual modo, o probatório comporta ainda que as oponentes intervieram como outorgantes na escritura pública de constituição da sociedade, ponto A), declaração de início de atividade da sociedade devedora originária por referência a 2006.10.24 como sócias gerentes, ponto B) e ainda na cessão de quotas com alteração de contrato social e inscrição na Conservatória do Registo Comercial de Lamego, onde figuram as oponentes como sócias gerentes da sociedade devedora, pontos C) e D); e) Figurando também as oponentes como membros de órgão estatutário (MOE) na Segurança Social (fls. 15/16 dos processos executivos, certificados e anexos aos autos, fazendo deles parte integrante), facto que, com o devido respeito, foi desvalorizado pela Mmª Juiz na douta sentença em crítica; f) Assim como não foi tido em consideração na douta sentença o facto de uma das oponentes ter aposto a sua assinatura numa venda a dinheiro (n.º 7376, de 2008.03.30), cfr. consta a fls. 27 do processo executivo anexo aos autos; g) Tendo também sido menosprezado o depoimento da testemunha L…, contabilista, na parte onde o mesmo é questionado sobre a aposição do NIF de uma das oponentes nas declarações modelo 22 de IRC como representante legal da empresa, relativos ao hiato temporal a que se reportam as dívidas exequendas; h) Perante tal quadro factual não pode a Fazenda Pública concordar com a desconsideração de tais funções percorrida na sentença em mérito, pois provando-se que as oponentes foram nomeadas gerentes e que no período temporal a que se reportam as dívidas exequendas assinaram documentos necessários ao giro comercial da sociedade, vinculando-a perante terceiros, tem-se por verificada a gerência de facto, não obstante se cogite que outros atos típicos de gerência fossem praticados por terceiras pessoas; i) No caso em apreço, resultou provado que as oponentes eram gerentes da sociedade e que, nessa qualidade, assinavam documentos respeitantes àquela, o que representa exercício típico de gerência; j) Para as oponentes assinarem os cheques e vendas a dinheiro da devedora originária é porque tem os respetivos poderes de representação e de vinculação jurídica e cambiária de tal sociedade – o que resulta quer da factualidade dos autos, quer do próprio regime legal bancário e financeiro; k) Exercício de poderes representativos da sociedade que não poderá ser desacreditado ou diminuído, tal como o foi na sentença em mérito, sob pena de se cair no paradoxo de se conceder na prática de atos de gestão, vinculativos da sociedade, por quem não era gerente de facto, com a derrogação do regime bancário subjacente e com o ludibriar de terceiros em geral, convictos da qualidade de gerente das oponentes; l) Em suma, não há gerentes parciais, ou gerentes apenas para a prática de determinados atos; ou se é efetivamente gerente e se praticam os atos próprios de quem reveste tal qualidade, tal como o fizeram as oponentes, ou não se é gerente, nada fazendo susceptível de reconhecer a terceiros, que com a sociedade se relacionam, essa qualidade; m) Por outro lado, e é do senso comum, que qualquer pessoa normal, minimamente informada, não desconhecerá a consequência dos atos por si praticados, no que toca ao preenchimento e assinatura de cheques, letras ou livranças, bem como vendas a dinheiro e os efeitos de tais atos no que concerne ao impacto de tal atuação na esfera societária (estamos a falar de meios financeiros que se têm por triviais em qualquer atividade comercial e imprescindíveis à realização do respetivo objeto social) e ao reconhecimento da gerência de facto; n) Admitir-se raciocínio contrário é conceder na criação de sociedades em que se nomeia um gerente para a prática de atos de representação da sociedade, vinculando-a perante terceiros, tais como a prática de assinar cheques, movimentar contas bancárias e assumir compromissos financeiros da sociedade, deixando incólume o responsável subscritor, com fundamento no não exercício das funções de gerência; o) Assim, não se poderá concordar com o afastar da prática de assinar cheques (com as consequências de tal prática na gestão comercial e financeira da sociedade) bem como assinar vendas a dinheiro, com as funções de gerência de determinada sociedade; p) Depois, no que se reporta à qualidade de representante legal da originária devedora nas declarações Modelo 22 de IRC, no intervalo de tempo a que se reportam as dívidas exequendas, conforme se poderá inferir de parte do depoimento da testemunha L…, contabilista, a indicação de representante legal da empresa e do respetivo TOC não é um mero formalismo contabilístico, antes consiste no assumir de que os valores declarados correspondem à verdade, refletem a atividade da empresa, equivalendo à assinatura do TOC e do representante legal da mesma; q) Ora, naturalmente que a assinatura das declarações contabilísticas da empresa corresponde a um ato corrente de gestão daquela, considerando que as pessoas coletivas estão impossibilitadas de agir por si próprias, incumbindo aos gerentes suprir tal incapacidade; r) Com o devido respeito, não se descortina portanto o motivo porque este facto foi desatendido pela Mmª Juiz na douta sentença em crítica, porquanto, ao ter a Fazenda Pública demonstrado que uma das oponentes figurava como representante legal da sociedade na entrega das declarações de IRC, a assinatura daquelas e a vinculação da oponente na entrega das mesmas decorre do regime de cumprimento de obrigações declarativas; s) Assim, ficou demonstrado que as oponentes participaram ativamente na administração da sociedade originária devedora, vinculando-a perante terceiros, em nome, no interesse e em representação dessa sociedade (se nas declarações Modelo 22 de IRC, no período temporal a que se reportam as dívidas exequendas, uma das oponentes constava como representante legal, temos um ato de gestão daquela na esfera representativa da sociedade originária devedora); t) Não se concebendo hipótese contrária – a oponente vincula a originária devedora nas declarações periódicas de rendimentos e tal factualidade é inócua no tocante à gerência de facto daquele na empresa vinculada; u) Em suma, entende-se que a factualidade provada impõe a conclusão de que as oponentes exerceram a gerência de facto da devedora originária no período em questão, sendo, por conseguinte, responsáveis subsidiárias pelas dívidas exequendas; v) Não tendo as gerentes logrado fazer prova de que a insuficiência económica da sociedade originária devedora não é da sua responsabilidade e havendo elementos indiciários de que na sua gerência se limitaram a assinar documentos e se desinteressaram dos destinos da sociedade, deve concluir-se, num juízo de normalidade, que não usaram da diligência de um bonus pater familiae, e, assim, que não conseguiram ilidir a presunção de culpa que sobre elas impendia; w) Em conclusão, é nosso entendimento que a presente oposição deve ser julgada improcedente, pelo facto de estar demonstrada a gerência de facto das ora oponentes, aposto ao facto das mesmas nada ter diligenciado no sentido de convencer o Tribunal de não ter culpa nem qualquer responsabilidade no facto do património da sociedade ser insuficiente para a satisfação daquelas dívidas (ónus que sobre si impendia por força do disposto na alínea b) do n.º 1 do art.º 24º da LGT).

Nestes termos e nos mais de direito deve ser dado provimento ao presente recurso com a consequente revogação da douta sentença recorrida, como será de inteira JUSTIÇA! CONTRA ALEGAÇÕES.

As Recorridas contra alegaram pugnando pela defesa do julgado, sem formular conclusões.

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

A Exma. Procuradora-Geral Adjunta neste TCA emitiu esclarecido parecer concluindo pela improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida.

II QUESTÕES A APRECIAR.

O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se a sentença errou no julgamento da matéria de facto e na questão de direito ao julgar procedente a oposição, por falta de gerência efectiva das oponentes.

Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.

III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

A sentença fixou os seguintes factos provados:

  1. Em 11/08/2006, no Cartório Notarial de Lamego, a fls. 30/31 do livro de escrituras diversas n.º 42-G, foi lavrada escritura pública intitulada “constituição de sociedade”, na qual intervieram como outorgantes D... e T..., aqui oponentes, da qual consta, para além do mais, o seguinte: […] Primeiro A sociedade adopta a...

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