Acórdão nº 00223/13.2BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 10 de Fevereiro de 2017
Magistrado Responsável | Rog |
Data da Resolução | 10 de Fevereiro de 2017 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: LCLC, LFCM e ALFM vieram interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL do despacho saneador do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, de 23.09.2015, pelo qual se julgou verificada a excepção dilatória da nulidade de todo o processo, com fundamento em ineptidão da petição inicial, tendo os Réus sido absolvidos da instância (artigos 577º alª b), 186º nºs 1 e 2 alª a) e 278º nº 1 alª b) do Código de Processo Civil) em acção administrativa comum, com processo ordinário, que os recorrentes moveram contra o Estado Português, o Ministério da Administração Interna, AJOR, IMSF, LSC e Incertos militares da GNR ou Funcionários do MAI.
Invocaram, para tanto, no essencial, que a petição inicial não enferma de ineptidão.
Apenas o Estado Português, representado pelo Ministério Público, contra-alegou, pugnando pela manutenção do despacho recorrido.
* Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.
* I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional (incluindo a requerida ampliação): 1- A petição inicial, cuja ineptidão foi invocada pelo Ministério Público na sua contestação – suposto vício no entanto que não o impediu de contestar, revelando bem ter entendido o que pretendiam os Autores com a sua acção -, manifestamente não padece de vício determinante do seu absoluto repúdio por total falta de préstimo e, portanto, da nulidade de todo o processo.
2- É complexa – seja pelo número de demandantes, seja pelo número de demandados, seja ainda pelos nexos de subsidiariedade estabelecidos nas causas de pedir e nos pedidos – mas custa com franqueza alcançar que não se percebe e que dúvidas de interpretação pode suscitar.
3- A decisão recorrida é manifestamente genérica (não concretizada) e adjectivante (não substantiva), não facultando (salvo no que concerne a questões relacionadas com a legitimidade activa, e mesmo aí sem tomar posição de fundo) um único exemplo das irregularidades que refere.
4- A petição julgada inepta está dividida em 5 títulos temáticos – o que lhe confere clareza, organização substantiva e ordem estrutural.
5- Num primeiro, designado “legitimidade activa – e Uso Objecto de Privação (artigos 1º a 27º) esclarece as várias relações imediatas estabelecidas entre os Autores e as coisas de cujo uso foram privados por actuação directa dos dois demandados agentes da GNR.
6- Todos os factos aí alegados (essenciais ou instrumentais) são relevantes, estando a legitimidade activa perfeitamente substanciada, sendo claro e perceptível o teor dos assinalados artigos, que se entendem com facilidade acrescida tendo em vista o título que os unifica – e sem qualquer hipótese de dúvida depois de apreciadas as “Breves Considerações de Direito”, constantes do título V.
7- Os artigos 28º a 47º, reunidos sob o título “Privação do Uso – e Legitimidade passiva”, são expressivos de narrativa clara cujo teor é de todo em todo evidente, neles se esclarecendo (estando dito nos artigos 26º e 27º o local de estacionamento dos veículos, quando subtraídos à sua posse):
a) Que os Autores foram indevidamente privados do uso de dois veículos (4 alíneas do artigo 28); b) Quando (artigo 28) e por acção directa de quem (artigo 29).
c) Para que efeito (artigo 30) e para onde foram deslocados (artigo 29); d) Por instrução de quem (artigo 31) e no exercício de que funções (artigos 32 e 33); e) As omissões de deveres de notificação evidentes (artigos 34 e, reiterando, 46); f) O anormal funcionamento do serviço em causa (artigos 35 e 36); g) As imputações de responsabilidades pelo sucedido aos agentes da GNR, à GNR e, portanto, (alternativamente) ao MAI ou ao Estado Português (artigo 37); h) Que se mantêm os Autores na actualidade privados de tais veículos (artigos 38 e 39), por efeito das condutas activas e omissiva dos Réus agentes da GNR; i) Outros factos positivos e negativos causadores de outros danos sofridos por um dos Autores (artigos 40 a 45); j) Todos os factos substanciadores da legitimidade passiva de todos os Réus (menos um).
8- Quanto aos danos em que estribam os Autores os seus pedidos de indemnização, são igualmente suficientemente esclarecedores quer os factos quer as caracterizações jurídicas constantes dos artigos 48 a 75 da petição inicial, reunidos no título: III – Danos Verificados e Futuros – e Indemnizações: “Patrimoniais e não patrimoniais, liquidáveis e não liquidáveis nesta data, já verificados e futuros” (artigo 48).
9- Danos decorrentes da privação de objectos que se encontravam dentro de uma das viaturas e se traduziram na impossibilidade de realização de negócio por parte do 3º A (artigo 49) e nos sofrimentos que por isso suportou (artigos 50 a 54) – sendo ainda justificadamente quantificados todos os danos sofridos pelos Autores (artigos 50, 54 a 67 e 71) ou suficientemente caracterizados para liquidação futura (artigos 68, 69 e 74).
10- Também, pois, quanto aos danos sofridos pelos apelantes Autores, só foram alegados factos relevantes e todos os factos relevantes foram alegados – sendo ainda, suficientes, sem excessos e úteis às considerações conclusivas que teceram.
11- Sob o título “IV – Persistências”, artigos 76 a 81, foram alegados outros factos com interesse para o sucesso das pretensões dos Autores, pois substanciam condutas com relevo seja para a demonstração de que tudo fizeram para recuperar extrajudicialmente a posse dos veículos em causa (artigos 76 e 77) – e que de modo nenhum contribuíram, portanto, para a formação dos danos que sofreram e continuam a sofrer -, seja de que o 6º R se recusou a devolvê-los (artigo 78) por ter recebido instruções da GNR nesse sentido (artigos 79 a 81).
12- Reforçando a já patente suficiência, adequação recíproca, compatibilidade e inteligibilidade seja das concretas causas de pedir, seja dos concretos pedidos formulados, seja, ainda, dos fundamentos legais invocados pelos AA e da razoabilidade das suas pretensões, vêm os artigos 82 a 100, sob o título “V – Breves Considerações de Direito”, evidenciar que os factos imputados à autoria dos 3º a 6º Réus:
a) Causaram e são adequados a causar os danos alegados (artigo 82), merecendo os extrapatrimoniais a tutela do direito (artigo 83); b) Ofenderam direitos de propriedade da 1ª Autora e do 2º Autor (artigos 84 e 85) – consignados na lei ordinária (designadamente no artigo 1305º do Código Civil) e na lei constitucional –, violando ainda os direitos de comodatário do 3º A (artigo 86) e os direitos de 1º e 3º Autores inerentes à sua qualidade de utilizadores e condutores habituais dos veículos em questão (artigo 87).
13- Concluindo-se após no sentido de que as condutas em causa são ilícitas e anómalas (artigo 88), de que os Réus militares da GNR agiram no exercício das respectivas funções (artigo 89), praticando portanto (artigo 90) factos que responsabilizam o Réu Ministério da Administração Interna ou o Réu Estado Português – seja exclusivamente como se alega a título prioritário (artigo 92) seja (algum deles) solidariamente (como se alega a título subsidiário) com aqueles militares (artigo 93) – acrescentando-se depois (artigo 95) que foi imposto aos Autores um sacrifício especial, ilícito (ou lícito, admite-se subsidiariamente), anómalo (artigo 96) e indevido (artigo 97), e esclarecendo-se ainda, com evidenciação manifesta, em que circunstâncias não devem ou devem os 3º a 5º Réus ser condenados (artigos 98 e 99), como resulta do disposto nos artigos 7º a 10º e 16º da Lei nº 67/2007, de 21 de Dezembro (artigo 100).
14- Harmonizando-se os pedidos formulados com as respectivas causas de pedir – visando:
a) O primeiro, a condenação do MAI ou do Estado Português, 1º e 2º Réus, exclusivamente ou (pedido subsidiário) solidariamente com os 3º a 5º Réus: aa) No pagamento a todos os Autores de uma indemnização pelos danos patrimoniais que todos sofreram (um, enquanto proprietário, e os demais, enquanto utilizadores) por efeito do desapossamento de uma das viaturas, até à sua entrega efectiva; bb) No pagamento de uma indemnização, apenas à 1ª Autora e ao 3º Autor (aquela enquanto proprietária, e ambos, enquanto utilizadores), pelos danos patrimoniais que sofreram e venham a sofrer por efeito do desapossamento da outra viatura; cc) No pagamento de indemnizações apenas à 1ª Autora, por danos patrimoniais e não patrimoniais que apenas ela sofreu; dd) No pagamento de indemnizações apenas ao 3º Autora, por danos patrimoniais e não patrimoniais que apenas ele sofreu; ee) No pagamento das necessárias reparações dos referidos veículos; ff) A entregar um dos veículos à 1ª Autora ou ao 2º Autor (proprietária aquela e utilizadores ambos) e o outro, a qualquer dos Autores (um, proprietário, os demais, utilizadores), em morada expressamente indicada; b) O segundo, em que é visado apenas o 6º Réu (rebocador e garagista), a condenação do mesmo a disponibilizar as viaturas em causa para a realização das reparações constantes da alínea e) e das entregas referidas na alínea f) do pedido anterior.
15- Não pode o Tribunal confundir meras dificuldades com verdadeiras impossibilidades de percepção, determinantes, mas só estas, de ineptidão da petição inicial.
16- Contrariamente ao que se cuida na decisão recorrida, o socorro que os documentos frequentemente prestam na elucidação dos sentidos de um articulado é sinal de que podem contribuir para a sanação de eventuais deficiências de que padeçam – sobretudo (como no caso) tendo sido dados como reproduzidos e sendo portanto sua parte integrante, circunstância que adiciona ao valor de meios de prova que já tinham, o valor de meios de substanciação da relação material controvertida que passam a ter (conforme doutrina e jurisprudência pacífica dos tribunais superiores).
17- Do mesmo modo (e também contrariamente ao que parece defender a douta decisão recorrida), constituindo a réplica (no domínio da legislação ao tempo...
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