Acórdão nº 00046/05.2BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 16 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelM
Data da Resolução16 de Fevereiro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: J…, inconformado com a sentença proferida pela MMª juiz do TAF do Porto que julgou totalmente improcedente a impugnação deduzida contra as liquidações de IRS relativas aos exercícios de 1999 e 2000, apuradas com recurso a métodos indiretos, dela interpôs recurso terminando as alegações com as seguintes conclusões: 1. O presente recurso jurisdicional vem interposto da sentença de fls..., datada de 07.12.2009, proferida nos autos referidos em epígrafe, a qual considerou improcedente a impugnação judicial deduzida pelo ora recorrente contra as liquidações adicionais de IRS, promovidas pela Administração fiscal, relativamente aos anos de 1999 e 2000, nos montantes de € 2.631,99 e € 1.348,11 respectivamente.

  1. Em causa está a desconsideração de determinadas operações – prestações de serviços contratadas pelo recorrente – porquanto as facturas que materializaram tais operações foram emitidas por sujeitos passivos (alegadamente) inexistentes e outros já cessados à data da emissão das facturas, desconsideração essa que, na óptica da Administração fiscal – a par de outros alegados indícios – justificou a aplicação de métodos indirectos para os exercícios em referência.

  2. O Tribunal a quo, por um lado, revelou alguns equívocos a cujas clarificações a ora recorrente não se pode nesta sede eximir, e, por outro lado, incorreu em manifestos erros de julgamento da matéria de facto – não deu como provados diversos factos que, por si só, impõem solução diversa da chegada na sentença.

  3. Acresce que, aplicando-se as disposições aos factos que deveriam, sem mais, ter sido dados como provados, também andou mal o Tribunal a quo, havendo, nessa medida, erro de julgamento quanto à matéria de direito.

  4. Na verdade, de acordo com a Fundamentação respectiva, a liquidação em referência funda-se na aplicação de métodos indirectos conforme disposto nos artigos 87.º e 88.º da Lei Geral Tributária e, bem assim, ao abrigo do artigo 39.º do CIRS, cujo recurso se justificou em virtude dos seguintes indícios: (i) nas remunerações pagas adicionalmente aos empregados e aos outros trabalhadores não foram efectuadas retenções na fonte de IRS, nem foram efectuados descontos para a segurança social; (ii) Rentabilidade da actividade muito baixa face à média do sector em que está enquadrado, não obstante os encargos com o pessoal declarados; (iii) Rentabilidade média do pessoal elevada face à média do sector em que está enquadrado; e, por fim que (iv) Foram relevados na contabilidade serviços prestados por sujeitos passivos inexistentes e outros já cessados à data da emissão das facturas, pagamentos efectuados através da conta caixa.

  5. Da prova produzida, entende o recorrente que resultou demonstrada e esclarecida toda a factualidade por si descrita na petição inicial, designadamente, pela sua particular relevância para a decisão da presente causa, os factos que demonstram: 7. No período em referência, o recorrente contratou serviços na área da construção civil a diversas entidades, entre as quais a Sociedade de Construções…, Lda., a sociedade P…, Lda., A…, M… e N….

  6. Estes serviços tiveram efectivamente lugar nos exactos termos constantes das facturas, no período nelas aposto e pelo preço delas constantes., e as obras efectuadas foram devidamente facturadas, e, bem assim, liquidado o correspondente IVA.

  7. O recorrente recebeu as respectivas facturas numa forma que, tanto quanto pode avaliar um contribuinte normal, é a forma legal e cumpre todos os requisitos legais exigidos e nada faria supor – nem o recorrente tinha como saber – que as entidades emitentes dessas facturas não se identificavam correctamente ou utilizavam números de identificação fiscal falsos ou inexistentes.

  8. O recorrente tem a sua contabilidade correctamente organizada, não dispõe de contabilidade paralela, não ocultou nenhum dado ou documento, não declarou custos cujo preço de mercado seja sensivelmente inferior e não falsificou nenhuma factura.

  9. A Administração fiscal não questiona a materialidade ou existência das operações consubstanciadas nas facturas em referência e não reconhece nem aponta qualquer outra irregularidade relevante na contabilidade do recorrente.

  10. O recorrente mantém, atenta a factualidade provada, toda a argumentação jurídica aduzida na petição inicial de impugnação judicial relativamente a todas as questões que estão na base dos actos tributários impugnados.

  11. Desde logo, o vicio de falta de fundamentação, previsto no artigo 77.º da LGT e artigo 268.º da CRP.

  12. Ora, a fundamentação deve dar a conhecer ao interessado o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor da decisão para decidir no sentido em que decidiu e não em qualquer outro sentido.

  13. Se a fundamentação não esclarecer concretamente a motivação do acto por obscuridade, contradição ou insuficiência ou utilizar expressões vagas, não concretas e juízos conclusivos – o que claramente sucede no caso em apreço, conforme acima se demonstrou – o acto considera-se não fundamentado.

  14. Os actos tributários são, igualmente ilegais, porquanto a situação fáctica acima referenciada não configura, de modo algum, fundamento para a aplicação dos métodos indirectos, prevista nos artigos 87.º e 88.º da LGT.

  15. A Lei, designadamente o artigo 87.º da LGT descrimina, de forma taxativa as situações em que se pode recorrer à avaliação indirecta da matéria colectável, situações essas que, forçosamente e atentos os factos acima assinalados, não se verificaram, de forma alguma, no presente caso.

  16. Com efeito, a inexistência de retenções alegadamente devidas, por retribuições pagas a trabalhadores, a rentabilidade da actividade do recorrente ser muito reduzida face às médias do sector, tendo especialmente em conta os baixos encargos declarados com o pessoal e as prestações de serviços contratadas pelo recorrente assentarem em facturas cujo emitente ou já havia cessado a sua actividade ou cujo número de identificação fiscal não consta do cadastro não se enquadram nas situações taxativamente previstas no artigo 87.º da LGT, pelo que não podem servir de justificação legal para o recurso à aplicação de métodos indirectos.

  17. Acresce que a Administração fiscal não logrou demonstrar a alegada reduzida rentabilidade da empresa do recorrente face às médias do sector, pelo que, também, também este argumento é ilegal por não provado.

  18. Aliás, os actos tributários aqui em crise têm como fundamento expresso o facto de a contabilidade não reflectir a realidade do sujeito passivo, o que se enquadra na alínea b) do artigo 87.º da LGT, pelo que, a invocação deste fundamento torna, assim, irrelevantes todos os argumentos analisados.

  19. Mencione-se ainda que, mesmo que as prestações de serviços em causa não tivessem, de facto, tido lugar – no que não se consente e a Administração fiscal não questiona –, o procedimento correcto seria apenas o de eventualmente desconsiderar fiscalmente aqueles custos, e nunca o de proceder à aplicação de métodos indirectos.

  20. Para além do mais, e tendo em conta o princípio da tributação do lucro real, a argumentação da Administração fiscal é absolutamente inconstitucional, uma vez que o recorrente tem a sua contabilidade correctamente organizada, dos elementos inspeccionados pela Administração fiscal é possível determinar, rigorosamente, que custos e que proveitos suportou e auferiu, ou seja, quantificar ao cêntimo a sua matéria tributável 23. Ao que acresce que tais liquidações, se acumuladas com a presente correcção, dão, aliás, lugar a uma inaceitável duplicação de colecta, o que viola manifestamente a nossa constituição fiscal.

  21. Por fim, cumpre ainda dizer que a Administração fiscal optou por corrigir a matéria colectável de acordo com o critério da rentabilidade média fiscal da actividade do recorrente – critério esse ad hoc e sem qualquer justificação legal – pelo que o mesmo é ilegal, por violação do disposto no artigo 90.º da LGT e viola os mais elementares corolários do princípio da legalidade.

  22. O Tribunal a quo não logrou demonstrar – quer factualmente quer juridicamente – a solução chegada, razão pela qual deve a sentença ser imediatamente anulada, com a consequente anulação das liquidações em crise.

Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, com todas as consequências legais.

CONTRA ALEGAÇÕES.

Não houve.

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

A Exma. Procuradora-Geral Adjunta neste TCA emitiu esclarecido parecer concluindo pela improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida.

II QUESTÕES A APRECIAR.

O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se a sentença errou no julgamento da matéria de facto ao não dar como provados determinados factos; se errou no julgamento de direito ao considerar preenchidos os requisitos para avaliação indireta; se se encontram fundamentados os pressupostos bem como os indicadores dos rácios usados para a determinação da matéria coletável e por último, se corre duplicação e colecta.

Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.

III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

A sentença fixou os seguintes factos provados e respetiva motivação, aqui se incluindo a decisão sobre a exceção de inimpugnabilidade alegada pelo Exmo. Representante da Fazenda Pública: EXCEPÇÕES PEREMPTÓRIAS: DA INIMPUGNABILIDADE Incumbe ao Tribunal o conhecimento de todas as questões suscitadas pelas partes, e apenas destas, sem prejuízo de a lei impor ou permitir o conhecimento ofícios de outras: art. 660º n.º 2 do Código de Processo Civil (CPC), ex vi do art. 2º al. e) do Código de Processo Tributário (CPPT). --- A questão da inimpugnabilidade, a proceder, prejudica o conhecimento das restantes...

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