Acórdão nº 00427/15.3BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 26 de Maio de 2017
Magistrado Responsável | Frederico Macedo Branco |
Data da Resolução | 26 de Maio de 2017 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório A Universidade de Coimbra, no âmbito da Ação Administrativa Comum intentada por JCCN tendente, em síntese, “ao pagamento da compensação devida pela caducidade do contrato a termo certo que se verificou em 31/08/2014”, inconformada com a Sentença proferida em 15 de abril de 2016 (Cfr. fls. 75 a 81v Procº físico), a qual julgou a ação parcialmente procedente, determinando-se, designadamente, o pagamento ao Autor de 6.108,44€ a título “de compensação por caducidade do contrato de trabalho a termo em funções públicas”, veio interpor recurso jurisdicional da referida decisão, em 23/05/2016 (Cfr fls. 86 a 97v Procº físico), proferida em primeira instância, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra.
Formula o aqui Recorrente/Universidade nas suas alegações de recurso apresentadas, as seguintes conclusões (Cfr. Fls. 93 a 97v Procº físico): “1.ª Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, em 15 de abril de 2016, que concedeu provimento parcial aos pedidos formulados pelo Autor, condenando-se a Ré a pagar ao Autor a título de compensação por caducidade do contrato de trabalho a termo em funções públicas a quantia de € 6.108,44, acrescida de juros vencidos no montante de € 396,30, a que acrescerão juros vincendos; o Tribunal a quo, ao julgar procedente o pedido de condenação, a título de compensação por caducidade do contrato de trabalho a termo em funções públicas, na quantia de € 6.108,44, incorreu em erro de julgamento face ao contexto legal e às circunstâncias do presente pleito.
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O Estatuto da Carreira Docente Universitária (ECDU) não prevê o pagamento de uma compensação no caso de caducidade do contrato de trabalho, o que representa um desvio ao regime regra instituído no RCTFP e na LTFP, desvio esse legitimado pela natureza específica da Ré, assente na génese da criação do ECDU; o ECDU integra um regime especial de contratação a termo, que encontra a sua razão de ser na circunstância do regime geral respeitante àquele tipo de contratação ser incompatível com a obrigatoriedade de obtenção dos graus académicos necessários à progressão na carreira de docente do ensino superior; dai que, a subsistência do vínculo contratual dependa de sucessivas prestações de provas por parte do trabalhador, situação que é imposta pela idoneidade científica e pedagógica que é exigida às universidades.
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A circunstância do ECDU não prever, nomeadamente no artigo 33.º, que se pague qualquer compensação aos trabalhadores pela caducidade, «ratione temporis», dos seus contratos a termo corresponde a uma intenção do legislador e não consubstancia uma «lacuna legis», pelo que, as diferenças entre aquele regime laboral próprio das universidades e o de direito público em geral vedam que tal compensação, prevista no último, deva ser estendida ao primeiro por razões de igualdade, não havendo lugar à aplicação do artigo 10.º do Código Civil; os especiais contornos em que se desenvolve a atividade contratada, em ordem à realização das finalidades inseridas no próprio ECDU e no seu preâmbulo, impõem uma perspetiva que não pode alhear-se da efetivação da autonomia universitária, no que às vertentes estatutária, científica e pedagógica diz respeito, e que justifica também mais esta especialidade em relação ao regime geral da contratação a termo.
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O Tribunal a quo, ao decidir no sentido em que decidiu, ignorou a ideia que está na génese da criação do Estatuto da Carreira Docente Universitária expressa no próprio preâmbulo do Decreto-Lei 448/79, de 13 de novembro, "constata-se, de facto, em Portugal, uma enorme carência de docentes universitários qualificados. O crescimento dos quadros docentes universitários que se verificou nos últimos dez anos foi efetivamente conseguido, sobretudo, à custa do recrutamento de numerosos assistentes, o que teve como consequência o aumento exagerado da proporção destes relativamente aos professores." 5.ª O Tribunal a quo não levou também em consideração os princípios fundamentais vertidos no Dec.-Lei n.º 205/2009 de 31.08, que constam do seu preâmbulo: "O doutoramento como grau de entrada na carreira e a abolição das categorias de assistente e assistente estagiário; o alargamento dos lugares do topo da carreira, devendo o conjunto de professores catedráticos e associados representar entre 50% e 70% dos professores, não podendo o número de professores convidados exceder um terço em cada categoria; a título excecional, e apenas quando os concursos fiquem desertos ou se apresente um número insuficiente de candidatos, prevê-se a possibilidade de contratar assistentes convidados, em tempo integral, e apenas por um período máximo de quatro anos, acentuando, assim, a necessidade de doutoramento, e de concurso, como regra para a prestação de serviço a tempo integral em instituições universitárias." 6.ª A característica principal do ECDU centra-se em regras com carácter imperativo: (1) Os professores catedráticos, associados e auxiliares são contratados por tempo indeterminado (artigo 19.º e 25.º do ECDU); (2) os professores visitantes (artigo 30.º), os professores convidados (artigo 31.º), os assistentes convidados (artigo 32.º), os leitores (artigo 33.º) e os monitores (artigo 33.º - A) são contratados a termo certo.
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Ora, nos termos do disposto no artigo 33.º, n.º 1, do ECDU, os leitores são contratados a termo certo e em regime de dedicação exclusiva, de tempo integral ou de tempo parcial, nos termos da lei e de regulamento a aprovar por cada instituição de ensino superior", pelo que, a Ré não podia ter celebrado com o Autor um contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado sob pena de violação do ECDU e de colocar em causa a sua finalidade principal: formação de professores universitários, mediante uma a carreira docente mais digna e mais aliciante que passa por dar aos docentes a possibilidade de se valorizarem dentro das próprias Universidades, constatando-se, de facto, em Portugal, uma enorme carência de docentes universitários qualificados, porquanto o crescimento dos quadros docentes universitários que se verificou nos últimos dez anos foi efetivamente conseguido, sobretudo, à custa do recrutamento de numerosos assistentes, o que teve como consequência o aumento exagerado da proporção destes relativamente aos professores.
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Com o ECDU o legislador impôs a contratação por tempo indeterminado de professores catedráticos, associados e auxiliares - depois de darem provas da sua qualidade - em detrimento da contratação de professores visitantes, professores convidados, assistentes convidados, monitores e leitores, por ter a qualidade das Universidades Portuguesas decrescido por força de um aumento de contratação destes últimos relativamente aos primeiros; para tanto, o ECDU estabelece um regime de contratação próprio, especial e muito distinto do previsto quer no RCTF, quer na LCTFP: enquanto que a regra no ECDU é a contratação a termo certo para o caso dos professores visitantes, professores convidados, assistentes convidados, monitores e leitores, a regra prevista no RCTFP e na LCTFP é a contratação por tempo indeterminado; em reforço desta interpretação, que é a correta, até do ponto de vista sistemático, de organização do ECDU, o regime de contratação dos professores visitantes, professores convidados, assistentes convidados, leitores e monitores encontra-se numa secção própria com o seguinte título: Pessoal especialmente contratado.
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São estas especificidades que justificam, por exemplo, a não aplicação das normas constantes nos artigos 57.º e 58.º da LGTFP - que obrigam à colocação no contrato da indicação do motivo justificativo do termo estipulado, sob pena de o mesmo ser nulo e de gerar responsabilidade civil, disciplinar e financeira dos dirigentes máximos dos órgãos ou serviços que o tenha celebrado (artigo 63.º da LGTFP) - aos contratos dos professores visitantes, professores convidados, assistentes convidados, monitores e leitores, celebrados no âmbito do ECDU.
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Ora, a consagração legal da compensação por caducidade do contrato de trabalho a termo certo tem como ratio a obtenção de um efeito dissuasor de utilização pelas entidades públicas empregadoras da modalidade do contrato de trabalho por termo certo, evitando-se o trabalho precário e pugnando-se pela segurança no emprego; assim, só faz sentido indemnizar o trabalhador pela sujeição a uma vinculação precária (o que também constitui uma forma de dissuasão desta modalidade de contratação), nos casos em que as partes (maxime o empregador) têm a faculdade de escolher o modo de contratação, o que não acontece no caso vertente em que, no caso do contrato de trabalho como leitor têm que ser, impreterivelmente, celebrados a termo.
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Carece então de sentido a aplicação das normas contidas nos artigos 12.º da Lei 35/2014, 293.º da LGTFP e 252.º do RCTFP - compensação por caducidade - aos contratos dos professores visitantes, professores convidados, assistentes convidados, monitores e leitores, celebrados no âmbito do ECDU; neste sentido decidiu o Supremo Tribunal de Justiça: Tratando-se dum contrato a termo especial, pois a contratação dum docente começa, obrigatoriamente, por assumir a modalidade de contrato a termo, não lhe é aplicável o regime geral do artigo 388/2 do Código do Trabalho de 2003, pelo que não tem o trabalhador direito à compensação de caducidade do contrato que decorra de declaração do empregador no termo do prazo, por a razão de ser da consagração deste direito ter sido a de obter um efeito dissuasor no recurso pelas empresas ao contrato de trabalho com duração determinada.
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Ao decidir, como decidiu, a sentença recorrida violou as normas vertidas nos artigos. 12.º da lei n.º 35/2014, de 20 de junho, 252.º do RCTFP, 293.º da LGTFP, 10.º do código civil e 33.º do ECDU.
Caso assim não se entenda e se decida que há lugar à...
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