Acórdão nº 00106/15.1BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 22 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelLu
Data da Resolução22 de Setembro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: IR, id. nos autos, interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF de Viseu, que julgou parcialmente procedente acção administrativa comum por si intentada contra N... – Concessionária de Auto-Estradas, SA, a qual, por sua vez, interpôs recurso subordinado, ao qual aderiram as intervenientes O... - Operação e Manutenção de Auto-estradas, SA, e ACE ....

O autor/recorrente discorda do decidido, oferecendo em recurso as seguintes conclusões: 1- Em face do supra exposto, a Sentença recorrida viola, por errada interpretação ou aplicação do Direito, pelo que, deu origem a uma sentença errada, injusta e ilegal que cumpre revogar; 2- Dos factos provados resultou a obrigação das RR de indemnizarem o Autor dos danos sofridos pelo descrito acidente; 3- Ficou provado que o Autor esteve 20 dias privado do uso do seu veículo automóvel que usava e usa, diariamente nas suas deslocações profissionais e pessoais; 4- O Autor viu assim, a sua rotina e vida profissional e pessoal profundamente afectada e limitada; 5- A falta do veículo com aquelas características causou-lhe graves prejuízos na sua vida profissional e pessoal; 6- Um veículo com aquelas características - Jaguar 3.0 - de que o Autor era proprietário, no mercado de aluguer tem uma tarifa diária nunca inferior a € 201,75; 7- Atribuição do valor de €40,00 não satisfaz minimamente as necessidades de conforto, segurança e bem-estar que uma viatura, com as características daquele, proporcionam ao Autor; 8- A situação deste acidente causou ao Autor chatices, aborrecimentos, incómodos canseiras e despesas, as quais merecem tutela judicial.

Apresentaram contra-alegações a ré N... e a interveniente O..., pugnando pelo não provimento.

A ré N... - com posterior adesão das intervenientes O... e ACE -, interpôs recurso subordinado, concluindo: I. O Douto Tribunal a quo andou mal ao considerar, ainda que parcialmente, procedente a acção.

  1. Conforme resultou provado na Douta Sentença, mais propriamente nos factos provados 18) a 25) e 27), a Recorrente, através da Ré O... cumpriu com todas as obrigações que sobre si impendiam, resultantes do contrato de concessão celebrado com o Estado Português (Documentos n.°s 1 e 2, juntos com a contestação da Recorrente), motivo pelo qual, nenhuma obrigação de indemnizar lhe poderia ser assacada.

  2. Conforme resulta da própria Sentença em crise, a responsabilização da Recorrente encontrava-se dependente da falta de cumprimento das suas obrigações contratuais. E essas foram cumpridas e, por conseguinte, levadas à matéria de facto provada da Douta Sentença.

  3. Assim, tendo, por um lado, o Douto Tribunal a quo dado como provado o cumprimento das obrigações da Recorrente, não poderia, um passo à frente, considerar haver responsabilidade e condenar ao pagamento de qualquer indemnização, seja a que título for.

  4. Ao decidir deste modo, fez o Douto Tribunal a quo enfermar em nulidade a Decisão proferida, motivo pelo qual, a Douta Sentença de 1.ª Instância terá de ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente do pedido.

    Mais, VI. Refere a Douta Sentença que, para ilidir a presunção de culpa que sobre si impendia, cabia à, aqui, Recorrente identificar, segundo critérios de razoabilidade e de experiência, os pontos da infra-estrutura em que a introdução do canídeo poderia ter ocorrido e descrever os comportamentos que adoptou para, em relação aos pontos sensíveis, prevenir acidentes.

  5. Ora, quanto a este último segmento, os referidos comportamentos resultam, sobejamente, evidenciados nos factos provados 18) a 25) e 27) da Douta Sentença.

  6. Quanto à identificação dos pontos por onde o canídeo poderia ter entrado, de igual modo, a Recorrente deu cumprimento a tal imposição.

  7. É que, conforme resulta do facto provado 26) da Douta Sentença, "próximo do local do acidente Km 111,500 existe o nó de Bigome situado ao Km 115,200 no sentido Sul-Norte e ao Km 114,300, no sentido Norte-Sul.", sendo ambos pontos por onde o canídeo se podia ter introduzido na A24, em particular por a A24, ser, originalmente, uma SCUT, o que importa que, os seus pontos de entrada e saída não se encontrem vedados por qualquer forma.

  8. Do exposto, resulta evidente ter a Recorrente, sem qualquer margem para dúvida, logrado ilidir qualquer presunção que sobre si impendesse, motivo pelo qual, deveria ter sido totalmente absolvida do pedido. Ademais, E sem prescindir, XI. Igualmente andou mal o Douto Tribunal a quo ao considerar que, nenhuma culpa podia ser imputada ao condutor do veículo.

  9. Resulta do facto provado 27) que: "Na zona do km 111,500 existe sinalização vertical (do tipo A19b) a alertar para o perigo de surgimento de animais, situados ao Km 113,005 e ao Km 116,495, nos sentidos de trânsito Norte-Sul e Sul-Norte, respectivamente.".

  10. Ao Kml 11,500 (local do acidente), o limite de velocidade era de 100 km/h, facto aceite pelo A.

  11. O A. confessou - confissão que foi aceite pela Recorrente para não mais poder ser retirada - que, o veículo circulava a uma velocidade de cerca de 120krn/h.

  12. Assim sendo, resulta evidente que, a conclusão da Douta Sentença, a tal propósito, está incorrecta.

  13. De facto, tendo, por um lado, a condutora do veículo passado por um sinal de trânsito que alertava para o perigo de surgimento de animais e, ainda assim, imprimido uma velocidade à viatura acima do limite estabelecido para o local, resulta evidente que a condutora da viatura acidentada tem responsabilidade, e responsabilidade exclusiva, pelo acidente ocorrido.

  14. Por tal, também por aqui resulta evidente nenhuma responsabilidade poder ser assacada à Recorrente pela produção do acidente, devendo, em consequência, a mesma ser totalmente absolvida do pedido formulado.

    Sem prescindir, Acresce que, XVIII. Considerou o Douto Tribunal a quo ser de atribuir ao Recorrido, a título de privação do uso do veículo, um montante total de 800,00€, decisão com a qual se discorda.

  15. De acordo com o artigo 562.° do Código Civil, quem estiver obrigado à reparação de um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação.

  16. Como tal, a alegação e prova, pelo lesado, da existência de um dano constitui pressuposto essencial à atribuição de qualquer quantia indemnizatória.

  17. Sucede que, nada existe nos autos que permita concluir que o Recorrido tenha sofrido qualquer dano, não bastando, para o efeito, a simples imobilização da viatura por um determinado período.

  18. Assim, face à ausência de factualidade demonstrativa de danos efectivos que, para o Recorrido, tenham decorrido da dita imobilização, nenhuma quantia indemnizatória lhe poderia ter sido atribuída.

  19. É que, não só o dano é pressuposto da obrigação de indemnizar, como é medida dessa mesma obrigação. Por isso, igualmente nos termos do artigo 562.° do CC, se deverá atender, para efeitos de cálculo indemnizatório, à situação patrimonial do lesado, ou seja, aos prejuízos decorrentes da lesão e por si suportados.

  20. Ora, não só o Recorrido não alegou danos que pudessem servir de suporte à condenação da Recorrente, como falhou em apresentar a medida, sempre essencial, para a determinação da peticionada quantia indemnizatória.

  21. Ora, conforme decidiram os M.I. Juízos Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça, a 04.10.2007, relativamente a pretensão idêntica: "( ... )face ao nosso ordenamento jurídico, a mera privação do uso de um veículo automóvel, isto é, sem qualquer repercussão negativa no património do lesado, ou seja, se dela não resultar um dono específico, emergente ou na vertente de lucro cessante, é insusceptível de fundar a obrigação de indemnização no quadro da responsabilidade civil.".

  22. A atribuição de uma indemnização relativa à imobilização do veículo, nos termos em que o fez o Douto Tribunal a quo, resultou numa confusão entre os conceitos de ilícito e dano, o que não se pode admitir.

  23. Assim, nunca poderia ter sido julgada, ainda que, apenas, parcialmente, procedente a pretensão do Recorrido e, ao ter tal sucedido, errou o Mui Douto Tribunal a quo, erro que deverá ser corrigido por V/Exas., Colendos Desembargadores, revogando este segmento da decisão em crise e substituindo-a por outra que determine a absolvição do pedido da Recorrente.

    Sem prescindir, Caso não se atenda a tudo quanto se deixou exposto, O que, aqui, se avança por mera diligência de patrocínio, XXVIII. Sempre se dirá que, face à violação, por parte da condutora do veículo acidentado, das normas estradais, cabia ao Douto Tribunal a quo temperar a responsabilidade que considerava caber à Recorrente com a culpa do lesado, prevista no art. 570.° do Código Civil, XXIX. Não tendo feito, violou o Douto Tribunal a quo o art. 570.º do Código Civil, em particular o seu n.° 2.

  24. Por tal, caso, por mera hipótese de raciocínio, se considere haver alguma responsabilidade da Recorrente, terá esta de considerar-se excluída, por aplicação do disposto no art. 570.º, n.° 2, do Código Civil, o que, desde já, se requer a V/Exas., ou, em última instância, reduzida, nos termos do art. 570.°, n.° 1, do CC.

    Sempre sem prescindir, Ainda se dirá que, XXXI. Caso, por mera hipótese académica - que, neste momento, se aventa apenas para a bondade do presente raciocínio -, se considerasse haver lugar ao pagamento de qualquer montante, a título de privação do uso (o que não se concede), sempre o valor diário de 40,00€, encontrado pelo Douto Tribunal a quo, se reporta de excessivo.

  25. De facto, conforme resulta do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proc.n.° 438/11.8TBTND.C1, indicado pelo Recorrido/Autor, nas suas alegações: "Recorrendo aos critérios jurisprudenciais que têm vindo a ser seguidas em casos como o do autos em que a indemnização devida ao lesado pela paralisação diária de um veículo deverá ser ponderada à luz de critérios de equidade - de que constituem exemplos o Ac. do STJ de 09.03.2010, em que o...

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