Acórdão nº 00707/14.5BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Setembro de 2017
Magistrado Responsável | Cristina Travassos Bento |
Data da Resolução | 28 de Setembro de 2017 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório C…, Lda, com o NIPC 5…, melhor identificada nos autos, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que julgou improcedente a Impugnação Judicial, por si, deduzida, contra as liquidações adicionais de IRC referentes aos exercícios de 2011 e 2012.
A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: “1. A Recorrente preenche o requisito previsto na alínea d) do nº1 do artigo 2º. do Decreto-Lei nº 55/2008; 2. A sociedade C…, Lda foi constituída na data de 21 de Fevereiro de 2008, tem a sua sede em Cinfães e tem como objeto social, a prestação de “serviços de clínica médico e oftalmológica”.
-
A recorrente exerce a sua atividade unicamente através do seu sócio e único gerente Dr J…, que é médico oftalmologista.
-
A prestação dos serviços prestados pela Recorrente só pode ser feita por profissional com competência técnico-profissional adquirida pela Universidade através da obtenção de uma licenciatura em Medicina.
-
A constituição da sociedade Recorrente e a sua implementação, no exercício da medicina oftalmológica, numa área carenciada e com índice populacional reduzido, evidencia que é normal, era e é previsível que só, após muito tempo de prestação, com êxito, destes serviços, a Recorrente poderá ter ou vir a ter um quadro de pessoal, pelo menos plural.
-
As Entidades Governamentais, o Estado e o Legislador têm plenamente conhecimento da existência desta situação vivencial e, por tal, é que criaram os benefícios à interioridade previstos no artigo 43º do Estatuto dos Benefícios Fiscais - EBF.
-
A Lei enquadra o âmbito das possibilidades legais, consoante a sua estrutura, condição económica, âmbito de atividade, dimensão, opção do tipo de subsídio, que cada empresa pode ou não poder usufruir, e o disposto no número 2 deste artigo 43º aplica-se em função da opção concreta do benefício a que cada empresa se candidata.
-
O artigo 43º do EBF diz, objetivamente no seu n.º 1 - que as empresas que exerçam... uma atividade económica.., de prestação de serviços, são concedidos os benefícios fiscais, no caso da alínea b) deste nº 1 - “no caso de instalação de novas entidades ... a taxa ... é reduzida a 10% durante os primeiros cinco exercício de atividade”, as no caso da alínea c) do nº 2 - que é condição para as empresas usufruírem dos benefícios fiscais... “c) não terem salários em atraso”.
-
A Ficha Doutrinária da Autoridade Tributária e Aduaneira proferida no âmbito do processo 4/2013 da DSIRC, com Despacho da Directora de Serviços do IRC de 2013.01.19 diz no seu número 7 que “...o Regime dos Benefícios Fiscais à Interioridade, previsto no artigo 43º do EBF, pretendia fomentar determinados comportamentos nos agentes económicos, no caso em concreto, a constituição e instalação de novas entidades nas denominadas áreas beneficiárias do interior, através da redução da respetiva taxa de IRC para 10%”.
-
Conjugando-se o texto da alínea c) do nº 2 com os vários benefícios fiscais previstos no nº 1 deste artigo, nomeadamente o que respeita à alínea d) relativo aos encargos sociais obrigatórios, verifica-se que o que o legislador pretendeu com o texto da alínea c) do nº 2 do artigo 43º do EBF foi o de impedir que empresas com trabalhadores pudessem beneficiar deste tipo de benefício se tivessem salários em atraso.
-
A condição das empresas “não terem salários em atraso”, não implica nem exige, até pela interpretação a contrario sensu, que as empresas tenham que ter trabalhadores.
-
O legislador, com as condições do nº 2 do artigo 43º do EBF pretendeu somente garantir que as empresas que beneficiassem dos benefícios previstos no nº 1 deste artigo tivessem situação regularizada perante a administração fiscal, a segurança social e o respetivo município.
-
No caso concreto, o trabalhador da Recorrente C… é o próprio gerente da empresa que é médico oftalmologista, que tem a competência técnica especializada e especifica para a prática de atos médicos oftalmológicos e que, por ser gerente, mesmo que recebesse remuneração, não podia, porque é gerente, ter a categoria profissional de empregado e receber salário como empregado.
-
A Recorrente, nos anos de 2011 e 2012 exercia, como continua a exercer a sua atividade principal nas áreas beneficiárias, 15. o seu lucro tributável era e é determinado com recurso direto de avaliação ou de acordo com as regras aplicáveis ao regime simplificado de tributação, 16. tinha e tem situação tributária regularizada; 17. tinha e tem inexistência de salários em atraso; 18. As Declarações de rendimentos são assinadas por técnico oficial de contas; 19. A Recorrente não resultou de cisão efetuada a partir da data de publicação da Lei nº, 171/99, de 18-09, requisito que também cumpre.
-
Em nenhum momento se diz, no ponto nº 1 do artigo 43º que as empresas para obterem a redução a 10% da taxa de IRC são obrigadas a terem trabalhadores por conta de outrem.
-
Em nenhum momento, o artigo 43º do ERF exige ou impõe que uma empresa para usufruir dos benefícios previsto neste artigo seja obrigada a ter trabalhadores.
-
O legislador sabia e sabe que una empresa que se dedica ou vai dedicar à prestação de serviços técnico-profissionais exigentes, que requerem uma especialização qualificada de nível superior, num mercado principal limitado à área geográfica carenciada, poderá, na sua fase inicial, não precisar de trabalhadores, se os seus sócios e ou gerentes, forem esses profissionais; 23. A Recorrente tem direito a usufruir das regalias resultantes do incentivo à interioridade, porque a atribuição legal é feita pela negativa “inexistência de salários em atraso” e a Recorrente satisfaz este requisito, tal qual está formulado na alínea c) do nº. 2 do artigo 43º do EBF; 24. O que a Lei visa com a al. c) do nº 2 do artigo 43º do EBF, é evitar ou impedir que empresas que tenham salários em atraso com os seus trabalhadores, venham a beneficiar de incentivos fiscais, da Segurança Social ou de incentivos ao investimento.
-
Não é pressuposto da atribuição de incentivos fiscais à interioridade, a existência de trabalhadores numa empresa que exerce a sua atividade no interior, pois esta interpretação, a ser imposta, implica imediata e automaticamente, a prática de ato inconstitucional, porque é uma interpretação que defende quem tem mais poder económico e pretende mais lucros e, ao mesmo tempo, despreza e exclui quem, com o seu suor e dinâmica, de forma persistente e trabalhadora, procura angariar o sustento de si e do seu agregado familiar.
-
As correções impugnadas têm pressupostos errados e ilegais e o procedimento seguidos pela AT que conduzem às liquidações impugnadas e que as baseiam são manifestamente errados, ilegais e nulos, sendo consequentemente também ilegais e nulas as correções impugnadas.
-
A liquidação impugnada é ilegal e nula, ou, sem prescindir, anulável porque padece de vícios de violação de lei: - por erro quanto à interpretação que a AT faz quanto aos requisitos exigidos pelo n. 1 do artigo 43º do EBF; por erro quanto aos pressupostos legais e de facto para a Recorrente beneficiar da redução da taxa de IRC prevista na alínea b) do nº 1 do artigo 43º do EBF, - por erro quanto aos pressupostos para a fixação da taxa de IRC aplicada pela AT à Recorrente com referência aos exercícios de 2011 e 2012, - por erro de facto e de direito quanto ao procedimento administrativo que culminou nas correções impugnadas e quanto aos seus pressupostos legais e de facto, o que determina a ilegalidade de qualquer uma das correções impugnadas, - por falta ou erro dos pressupostos de facto e de direito para a correção da matéria tributável - por violação de direitos fundamentais e constitucionalmente consagrados da Recorrente, designadamente o direito à igualdade e o direito a pagar impostos cuja liquidação e cobrança se façam nos termos legais.
-
Encontram-se violados, no caso concreto, designadamente os seguintes princípios de Direito: Princípio da Legalidade; da Justiça, da Boa Fé, da tutela da Confiança, da Legalidade Tributária, da Proporcionalidade, da Proteção dos direitos e interesses dos cidadãos, da Igualdade, da Verdade material, da Tributação pelo rendimento real e Principio da Verdade material.
-
O Senhor Juiz a quo, na sua sentença, violou o Artigo 43º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, na sua redação do Decreto-Lei nº 108/2008 de 26-06, a Portaria nº 1117/2009 de 30 de Setembro, retificada pela Declaração de Retificação nº 79/2009, o artigo 3º, nº 2 do Estatuto dos Benefícios Fiscais – EBF.
Nestes termos e nos melhores de Direito, que V. Exªs sabiamente saberão suprir, deve ser dado provimento ao presente recurso e revogada a sentença proferida, com as consequências legais.
JUSTIÇA “ A recorrida, Fazenda Pública, não apresentou contra-alegações.
Remetidos os autos a este Tribunal Central Administrativo Norte, foram os mesmos com vista à Exma Procuradora-Geral Adjunta, que emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.
Colhidos os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos vem o processo à Conferência para julgamento.
I.1 Objecto do recurso - Questões a apreciar e decidir A questão suscitada pelo Recorrente delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões (nos termos dos artigos 660º, nº 2, 684º, nº s 3 e 4, actuais 608, nº 2, 635º, nº 4 e 5 todos do CPC “ex vi” artigo 2º, alínea e) e artigo 281º do CPPT) é a de saber se a sentença incorreu em erro do julgamento ao decidir que o benefício fiscal previsto no artigo 43.º, n.º 1, alínea a) do Estatuto dos Benefícios Fiscais está condicionado à criação de postos de trabalho.
II.
Fundamentação II.1. De Facto No Tribunal a quo, o julgamento da matéria de facto foi efectuado nos seguintes termos: Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos provaram-se os seguintes factos:
-
A...
-
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO