Acórdão nº 01010/16.1BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução18 de Novembro de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: O Ministério da Educação veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 24.08.2016, pela qual foi julgada procedente a providência cautelar intentada por AMS para suspensão da eficácia do despacho do Ministro da Educação e Ciência, de 7.4.2016, que aplicou ao Requerente a sanção disciplinar de suspensão graduada em 50 dias.

Invocou para tanto, em síntese, que a decisão recorrida incorreu em erro ao julgar verificados todos os requisitos para o decretamento da providência, já que, no seu entender, não se verifica a aparência do bom direito, dado que o acto punitivo aqui em apreço é válido e irrepreensível, e, por outro lado, não se verifica qualquer risco de produção de um facto consumados ou prejuízos de difícil reparação.

O Recorrido contra-alegou defendendo a manutenção da sentença recorrida.

O Ministério Público neste Tribunal emitiu parecer também no sentido de ser negado provimento ao recurso.

*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.

*I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: A) A decisão a quo laborou em erro, ao considerar que a não adopção da providência, com exceção dos efeitos remuneratórios, levaria a uma perda total da utilidade da decisão final a proferir no processo principal.

B) Mas na verdade assim não sucede, porquanto se o Requerente vier a obter ganho de causa no processo principal não será apenas o vencimento que será reposto, mas o mesmo sucederá, designadamente, quanto à antiguidade e à contagem de tempo de serviço.

C) Por conseguinte, o indeferimento da providência quando muito levará apenas a uma perda parcial da utilidade, caso o processo principal vier a ser julgado procedente, mas nunca a uma perda total.

D) O indeferimento da providência está assim muito longe de poder gerar uma situação de facto consumado que acarrete a impossibilidade total ou significativa da reintegração da situação jurídica do Requerente conforme ao Direito.

E) A eventual perda parcial da utilidade que o não decretamento da providência possa causar não assume uma gravidade tal que permita dar como demonstrado o periculum in mora legalmente exigido.

F) No que concerne ao fumus boni iuris a decisão a quo laborou em manifesto erro, pois baseou a probabilidade da pretensão do Requerente no processo principal vir a ser julgada procedente, sobretudo no facto de ter extraído dos documentos coisas diferentes daquilo que neles se encontra escrito, ter lido nos documentos o que não está lá escrito e de não ter considerado que o uso dos veículos do PVE de serviços gerais só é lícito se destinado a satisfazer as necessidades de transporte, normais e rotinadas, do serviço.

G) Com efeito, tendo o trabalhador arguido requerido na sua defesa ao instrutor do processo disciplinar que este consultasse e acedesse ao mapa de convite do secretariado, aos boletins de itinerário e à agenda do Outlook, a decisão a quo considerou que o pedido em causa era para que o instrutor juntasse aos autos os referidos documentos e considerou essa não junção uma nulidade insuprível.

H) Ora, salvo o devido respeito e melhor opinião, não nos parece que as expressões consultar (“consultadas”) e aceder (“acedidas”), referidas pelo arguido na sua Defesa, possam “claramente” ser interpretadas como sendo sinónimas de juntar (“juntos” e “junção”), como a decisão a quo refere, sobretudo se tivermos em consideração que o Arguido, ora Recorrido, é professor de Português e a Defesa foi subscrita pela sua ilustre mandatária.

I) Se a intenção do Arguido era a de que os referidos documentos fossem juntados ao processo disciplinar, certamente não teria usado as expressões que utilizou e se acaso o pedido formulado tivesse sido para que os documentos fossem juntados ao processo disciplinar, seguramente que teria visto a sua pretensão realizada.

J) A decisão a quo considerou não ser nada vago e genérico o pedido formulado pelo Arguido, para que o instrutor consultasse os referidos documentos, destinados a ver justificadas “muitas das viagens descritas nos artigos 1.º e 2.º da acusação”, sem mais, nomeadamente sem identificar, ainda que título de exemplo, uma única viagem que fosse e sem facultar qualquer elemento adicional que pudesse ajudar na identificação das viagens que poderiam ser justificadas.

K) Atendendo a que as viagens constantes do artigo 1.º da Nota de Culpa foram consideradas prescritas e as referenciadas no artigo 2.º, ainda que apenas hipoteticamente pudessem ter resultado de deslocações assimiláveis como sendo destinadas a satisfazer as necessidades de transporte normais e rotinadas dos serviços, também foram disciplinarmente desconsideradas, não houve em relação a elas qualquer necessidade de proceder à consulta dos referidos documentos.

L) E as viagens do artigo 2.º da Nota de Culpa, que foram consideradas como geradores de responsabilidade disciplinar, foram apenas aquelas que nem sequer hipoteticamente poderiam ter resultado da satisfação das necessidades de transporte, normais e rotinadas, do serviço, logo também facilmente se percebia que as mesmas não poderiam dizer respeito a “deslocações oficiais e previamente agendadas”, referidas no pedido formulado pelo Arguido ao instrutor, pelo que de acordo com as regras da vida e da experiência comum também não se afigurou necessário proceder à consulta dos mencionados documentos.

M) Importará atender que a Lei refere que os veículos de serviços gerais destinam-se a satisfazer as necessidades de transporte, normais e rotinadas, dos serviços, alínea b) do n.º 1 do artigo 8.º do DL n.º 170/2008, de 26.08, e não apenas para satisfazer as necessidades de transporte dos serviços; N) Na sequência de o ora Recorrido ter arguido a violação do disposto no artigo 219.º/3 da LTFP, devido a não ter sido feita a consulta ao mapa de convite do secretariado, aos boletins de itinerário e à agenda do Outlook, procedeu a Entidade Requerida à junção aos autos dos referidos documentos.

O) Como se pode constatar, os referidos documentos não contêm nada que satisfizesse as finalidades enunciadas pelo Arguido nos artigos 25.º e 26.º da sua Defesa.

P) Contudo, a decisão a quo considerou que a hora de regresso que consta no boletim itinerário do mês de Julho de 2013, relativa à deslocação efectuada pelo Recorrido no dia 20.07.2013, era a “previsível” (quando assim não sucede) e mercê do raciocínio especulativo que desenvolveu, considerou ser a “junção essencial à plenitude do direito de defesa do Requerente”.

Q) Ora, o que se regista no boletim itinerário é o dia e a hora da partida, o dia e a hora do regresso e o trajecto efectuado e não as horas previsíveis ou prováveis em que tal ocorre.

R) No boletim itinerário do mês de Julho de 2013 encontra-se registada uma deslocação efectuada no dia 30.07.2013 e o documento em causa refere que o mesmo foi gerado informaticamente em 10-10-2013 às 14:19, portanto ambas as ocorrências verificaram-se posteriormente à data em que a deslocação do dia 20.07.2013 foi realizada, pelo que é incompreensível a ideia de que a hora de regresso assinalada era a previsível.

S) O que consta no referido boletim itinerário é que no dia 20.07.2013 o ora Recorrido se deslocou a Braga, para o Concerto da Orquestra Sinfónica do Conservatório de Música Calouste Gulbenkian, tendo efectuado o seguinte trajecto: “Viana do Castelo (SMM) - Braga (São José de São Lázaro) - Viana do Castelo (SMM)”, com partida às 19:30 H e regresso às 23:30 H.

T) Portanto, a ilação que a consulta/análise ao boletim itinerário de Julho permite extrair, na parte que para aqui interessa, é que no dia 20.07.2013 o Arguido chegou a Viana do Castelo, vindo de Braga, às 23:30 H.

U) Acresce que as viagens do dia 21.07.2013 não foram as únicas que relevaram disciplinarmente, pelo que, sem conceder, ainda que essas viagens se considerassem lícitas, sobrariam ainda as restantes 27 ou 28 viagens… V) Das viagens consideradas indevidas ou abusivas e que geraram responsabilização disciplinar, a sua quase totalidade foram realizadas de Esposende para a Póvoa e/ou da Póvoa para Esposende, as quais, segundo o ora Recorrido, tiveram como finalidade a deslocação deste para casa do seu amigo CAPB, que reside na Póvoa do Varzim, e/ou para que o trabalhador, ora Recorrido, fosse buscar e/ou levar esse seu amigo a sua casa, para ambos trabalharem juntos em informática, em prol do serviço - DSRN (em casa do Recorrido ou na casa do amigo).

W) Contudo, ainda que tais viagens tivessem tido a declarada finalidade, as mesmas não se enquadram nem podem ser subsumidas como tendo sido destinadas a satisfazer as necessidades de transporte, normais e rotinadas, do serviço.

X) Daí que o uso de veículos do PVE para a sua realização só pode ser tido como abusivo ou indevido e constituiu infracção disciplinar, pela que a sanção aplicada ao Recorrido é absolutamente lógica e compreensível.

* II – Matéria de facto.

O Tribunal recorrido deu como indiciariamente provados os seguintes factos, sem reparos nesta parte.

  1. Na sequência de participação de VASVF, por despacho de 16.4.2014 do Inspector-Geral de Educação e Ciência, foi instaurado ao Requerente o processo de inquérito n.º 10.06/00056/SC/14, no qual foi nomeado instrutor, Vi...F, e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – cfr. documentos 1 e seguintes do processo instrutor apenso aos autos.

  2. Por despacho de 2.1.2015 do Secretário de Estado do Ensino e da Administração Escolar foi instaurado o processo disciplinar NUP 10.07/00119/RL/15 ao Requerente – cfr. documento de fls. 4 e seguintes do processo instrutor apenso aos autos.

  3. Por despacho de 13.7.2015 foi nomeado Vi...F instrutor – cf. documento de fls. 3 do processo disciplinar.

  4. Foram juntos ao processo disciplinar: - Os “Mapas de Utilização – Veículos de Serviços Gerais” dos...

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