Acórdão nº 00707/07.1BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Julho de 2016

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução15 de Julho de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO MAMG, casada, residente na Rua …, intentou acção administrativa especial contra o Instituto da Segurança Social, I.P., através da qual impugna o despacho proferido, em 15 de Novembro de 2006, pela Directora do Núcleo de Identificação de Beneficiários e Registo de Remunerações do Centro Distrital de Segurança Social de Braga, que lhe indeferiu o pedido de prestações de desemprego apresentado em 01/06/2006.

Pediu a anulação do acto administrativo consubstanciado naquele despacho e que a Entidade Ré seja condenada a deferir-lhe a concessão das prestações de desemprego, “reconstituindo a situação que existiria se o acto impugnado não tivesse sido praticado”.

Por decisão proferida pelo TAF de Braga foi julgada procedente a acção, anulado o acto impugnado e condenado o Réu a deferir o pedido de prestações de desemprego apresentado pela Autora no dia 01 de Junho de 2006.

Desta vem interposto recurso.

Nas alegações o ISS, I.P. formulou as seguintes conclusões: A.

A decisão proferida nos autos padece de erros de julgamento. Senão vejamos: B.

Em sede de contestação, o Réu, ora Recorrido apenas sustentou como questões prévias a ineptidão da petição inicial e, caso assim não se entendesse, a inimpugnabilidade do ato praticado em 12/01/2007, por entender ser este o ato que estava a ser alvo de impugnação.

C.

Porém, como decorre do também despacho saneador, foi julgada não verificada a ineptidão da petição inicial e a impugnabilidade do referido despacho, D.

sendo que, no que à impugnabilidade do ato diz respeito, daquele despacho resulta que o ato que a Autora impugnou, e que é impugnável, é a decisão de 15/11/2006.

E.

Em sede de despacho saneador, o Tribunal não se pronunciou quanto à tempestividade da ação, questão que, de resto, não foi suscitada, F.

o mesmo sucedendo na decisão final, embora nesta o Tribunal tenha dado como provado que a petição inicial deu entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga em 24/04/2007 – cfr nº 16 dos factos provados – e que o ato estava inquinado de vício suscetível de anulação.

G.

Ora, constatando-se que a Autora impugnou o ato praticado em 15/11/2006, que a ação só deu entrada no Tribunal em 24/04/2007, que o mesmo era passível de anulação, como foi decidido a final, e que o artº 58º, 2, b) do CPTA estipula que a impugnação de atos anuláveis tem lugar no prazo de três meses, a sentença proferida deveria ter verificado, e não verificou, se a petição era tempestiva e, não sendo, como até se constata, ter absolvido o Réu, ora Recorrente, da instância, face à caducidade do direito de ação, que constitui uma excepção dilatória de conhecimento oficioso.

H.

E não se diga que esta questão da tempestividade só podia ter sido apreciada em sede de despacho saneador. Na verdade, I.

afirmar isto seria premiar uma das partes, a Autora, pela omissão do próprio Tribunal. Além disso, J.

o nº 2 do artº 87º do CPTA apenas impede a arguição, e consequente decisão, de exceções após o saneador, sendo que no caso em apreço não se trata de exceção que tenha sido suscitada. Por outro lado, K.

a total omissão de apreciação da tempestividade da ação não pode ter um tratamento diferente, por mais gravoso para o Réu, daquele que resulta do disposto do nº 4 do artº 595º do CPC, isto é, a possibilidade de relegar para decisão final a decisão sobre as exceções que o estado do processo não permita ainda conhecer.

L.

Aliás, como escrevem Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira sobre o artº 87º do CPTA, “O nº 2 terá, assim, de ser articulado com a al. a) do nº 1, referindo-se às questões que obstem ao conhecimento do objeto do processo que sejam detetáveis no momento em que o juiz se prepare para exercer a competência prevista neste preceito”.

M.

E, como é sabido, por vezes, a decisão sobre a existência de um pressuposto processual só é possível no momento da apreciação do mérito, pela sua complexidade ou pela íntima conexão com problemas de fundo, em que haja vícios que importem não a anulabilidade, mas a nulidade do ato, com consequências na decisão relativa à tempestividade.

Sem prescindir, N.

ainda que a exceção em causa devesse ter sido apreciada e decidida no despacho saneador, então este é o momento para se recorrer desse despacho, exatamente por não ter apreciado tal exceção, violando o artº 87º, 1, a) do CPTA. Na verdade, O.

de acordo com o previsto no artº 142º, 5 do CPTA, a decisão, ou melhor, a omissão de decisão do despacho saneador é recorrível com a decisão a final, pois este não pôs termo ao processo e a sua subida a final não o torna inútil, razão pela qual apenas é recorrível com o recurso que venha a ser interposto da decisão final.

P.

Veja-se, neste sentido, o Ac do TCA Sul, de 2/04/2009, Proc 01527/06, disponível em www.dgsi.pt que refere: “o despacho que decidiu inexistirem questões prévias, porque não pôs termo ao processo e a não subida imediata de recurso dele interposto não o torna completamente inútil, não era imediatamente recorrível, só o podendo ser no âmbito do recurso que venha a ser interposto da decisão final.” Q.

No mesmo sentido, Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 1ª ed., pág. 708 “Entre os despachos interlocutórios que têm subida diferida e se encontram, como tal, abrangidos pela primeira parte do nº 5, contam-se os despachos que, na fase de saneamento do processo, julguem improcedente uma questão prévia (cfr. artº 87º, 1, a) e 2, no que concerne à ação administrativa especial”.

Ainda sem prescindir, R.

e como se decidiu no Ac RC, de 8/11/2011, disponível em www.dgsi.pt, ao Tribunal ad quem é sempre lícita a apreciação de qualquer questão de conhecimento oficioso ainda que esta não tenha sido decidida ou sequer colocada na instância recorrida. Estas questões constituem um objeto implícito do recurso, que torna lícita a sua apreciação na instância correspondente, sem prejuízo do direito ao contraditório, o que se requer.

Sem prescindir, mesmo que se entenda que não se verifica a caducidade do direito da ação, o que não se concede mas que por mera hipótese de patrocínio se coloca, sempre se dirá que: S.

A sentença menosprezou a data do registo à renúncia à gerência por parte da Autora face a uma carta simples entregue em mão da qual consta a mesma renúncia, T.

bem como a data de registo da dissolução da sociedade da qual a Autora, como sócia, na ausência de outros gerentes nomeados, mantinha a qualidade de gerente.

U.

A decisão não tem em conta que são milhares os beneficiários inscritos na base de dados do Réu que, ao longo da sua vida, alteram a sua qualificação, isto é, e por exemplo, passam de trabalhadores por conta de outrem para membros de órgãos estatutários ou vice versa, ou cumulam ambas as situações, ou passam para trabalhadores independentes, etc, etc.

V.

E é - e só pode ser -, a cada um dos beneficiários, neste caso, a Autora, ora Recorrida, que cabe o ónus de informar e provar perante o ISS, IP/Centro Distrital de Braga o facto que origina a alteração à sua qualificação, que no caso é a renúncia da Autora à gerência e dissolução da sociedade, atempadamente.

W.

Nunca um bom pai de família, dentro da sua razoabilidade, pode aceitar alterar a qualificação da Autora, isto é, cessando a sua qualificação como membro de órgão estatutário, em 30/06/1998, com base numa carta simples entregue em mão, quando a renúncia à gerência apenas foi registada em 28/04/2006, isto é, passados quase oito anos… X.

Só se pode aceitar alterar a qualificação na data da decisão ou deliberação se o registo desta ocorreu dentro do prazo legal. Com efeito, Y.

é facto notório que “fabricar” uma carta simples com tal conteúdo, com o objectivo final de receber subsídio de desemprego é obviamente fácil e altamente lesivo do Estado.

Z.

Ainda se fosse uma ata lavrada por escritura pública, até se podia, eventualmente, considerar este título meio de prova suficiente, mas assim, decididamente, não.

AA.

Afinal, não se trata de uma situação sujeita a registo obrigatório?! BB.

Se não fosse sujeito a registo obrigatório, aí sim, com a exigência do registo o ora Recorrente estaria a ser como se diz em linguagem corrente “mais papista que o papa”.

CC.

Agora, sendo sujeito a registo obrigatório (cfr art 15º, 1 do Código do Registo Comercial), atentas as funções e objetivos deste, só com o mesmo é que o Réu podia e pode alterar as qualificações dos beneficiários que estão identificados como gerentes.

DD.

Repare-se que, em sentido oposto, também só com a apresentação do registo da Autora como gerente é que a mesma foi qualificada como gerente na base de dados do ISS, IP, EE.

não havendo qualquer impedimento para, posteriormente, a mesma cumular a qualificação de membro de órgão estatutário com a trabalhador por conta de outrem. Além disso, FF.

não é verdade que o atraso no registo da renúncia à gerência não lhe possa ser imputado, GG.

até porque a Autora não era uma pessoa estranha à sociedade, antes sendo sócia da mesma, HH.

tendo também participado na assembleia geral sociedade realizada em 31/12/1998… Acresce que, II.

o ISS, IP / Centro Distrital de Braga é um terceiro de boa-fé cujos direitos os efeitos do registo da visam salvaguardar, registo este que constitui a única prova legalmente admissível que atribuiu segurança e transparência jurídica nos procedimentos de qualificação dos beneficiários, alcançando soluções iguais em situações iguais.

JJ.

Veja-se o que o Supremo Tribunal de Justiça refere quanto ao registo comercial no Acórdão de 15/03/2012, Proc 954/06 in www.dgsi.pt: “O registo comercial visa publicitar a situação jurídica dos comerciantes e sociedades comerciais, de modo a garantir a segurança do comércio jurídico. Apenas são oponíveis a terceiros os factos sujeitos a registo após a data do respetivo registo, sendo que a noção de terceiros para efeitos de registo comercial não coincide com a noção...

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