Acórdão nº 02115/15.1BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelJoaquim Cruzeiro
Data da Resolução17 de Junho de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1 – RELATÓRIO E... (Portugal) - Sociedade Europeia de Restaurantes Lda.

vem interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 7 de Março de 2016, e que julgou improcedente a acção no âmbito do contencioso pré-contratual que intentou contra o Município de Vila Nova de Gaia com as contra-interessadas melhor identificadas nos autos, e onde era solicitado que: a) Anulando-se a deliberação do Réu de data que a Autora não sabe precisar mas seguramente anterior a 7 de Julho de 2015, nos termos da qual se decidiu adjudicar à G... - Companhia Geral de Restaurantes e Alimentação SA o Concurso Público n.º 26/2015-DCPA, para a Aquisição da Prestação de Serviços de Cantinas Escolares; b) Em consequência, anulando-se todos os actos subsequentes ao mesmo, designadamente o contrato que entretanto tenha sido celebrado em execução daquele; e c) Condenando-se o Réu a emitir novo Relatório Final no qual readmita a proposta da E..., e em que se avalie e classifique, fundamentadamente, as propostas dos concorrentes admitidos, propondo-se a adjudicação dos serviços à proposta da E....

Em alegações a recorrente concluiu assim: A. O tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao decidir julgar a acção intentada pela E... improcedente. Recorde-se que a presente acção tinha em vista: i) a anulação da deliberação camarária que decidiu adjudicar à G... o Concurso n.º 26/2015-DCPA, ii) a anulação de todos os actos subsequentes à adjudicação, designadamente o contrato que veio a ser celebrado entre o Município de Vila Nova de Gaia e a G... e iii) a condenação do Reú, Município de Vila Nova de Gaia, a readmitir a proposta da E... e, consequentemente, a adjudicar a proposta de fornecimento por esta apresentada; B. O Tribunal a quo fixou as questões a decidir em saber se, por um lado, os custos que formam o preço poderiam ser arredondados às centésimas, e se, por outro lado, a proposta poderia apresentar rubricas a custo zero; C. Conforme se viu o Tribunal mal andou ao ter considerado que a regra do arredondamento não se aplica aos custos e encargos uma vez que resulta da própria redacção no ponto 11, alínea b.1), conjugado com o corpo normativo da alínea b) que o preço unitário da refeição e valor unitário da refeição são utilizados como sinónimos fazendo com que seja lógico aplicar-se-lhes a regra do arredondamento; D. O Tribunal também andou mal ao ter pugnado pela impossibilidade de apresentação de custos nulos relativamente a encargos com matéria-prima não alimentar, substituição e manutenção de equipamentos, reposição de palamenta e encargos gerais e lucros enquanto componentes do custo do almoço, uma vez que as peças concursais, i.e., o Programa do Concurso e o Caderno de Encargos, não determinam valores mínimos a apresentar com estes custos, razão pela qual os concorrentes são livres de apresentar os valores que entendam; E. Por todo o exposto, é mais do que evidente que o recurso intentada pela E... deve ser julgado procedente, devendo o respectivo erro de julgamento ser corrigido pelo Tribunal ad quem.

O Recorrido contra-alegou tendo apresentado as seguintes conclusões: A - O arredondamento incide apenas sobre o preço unitário global da refeição, não sobre as parcelas que o decompõem; B - A proposta da recorrente não cumpria o Programa de Concurso em matéria não sujeita a concorrência pelo que a sua exclusão se impunha; C - Para que seja possível a comparação das propostas, estas têm que apresentar valores positivos, ainda que baixos, em todos os itens em que se decompõe o preço; D - Não são admitidos valores nulos quando há custos efectivamente suportados e ainda que estes sejam absorvidos pela estrutura, até para evitar que haja propostas abaixo do preço de custo, o que seria ilegal; E - Não pode este Tribunal decidira pela adjudicação do concurso à recorrente pois a sua proposta não foi avaliada quanto à qualidade; A contra-interessada G...- Companhia Geral de Restaurantes e Alimentação SA contra-alegou tendo apresentado as seguintes conclusões: 1. O ponto 11. do Programa do Concurso exige que a matéria-prima alimentar corresponda, no mínimo, a uma determinada percentagem do valor global da refeição.

  1. A identificada norma concursal contém, pois, aspectos da execução do contrato a celebrar não submetidos à concorrência, aos quais a entidade adjudicante pretende que os concorrentes se vinculem (cf. artigo 57º n.º 1 al. c) do CCP).

  2. A interpretação não pode ter apenas em conta a letra da norma.

  3. Há que ter em conta as regras de interpretação vertidas no artigo 9º do Código Civil e, por conseguinte, não apenas o elemento literal, mas também o elemento teleológico, o elemento sistemático e o elemento histórico.

  4. Atentas as necessidades específicas dos destinatários das refeições objecto do presente concurso (crianças), é particularmente premente o cumprimento escrupuloso das disposições técnicas dos documentos concursais, através da confecção e preparação de refeições de qualidade e de alto índice calórico, com respeito pelas componentes, variedade e capitações prescritas.

  5. Daí que, para garantir a qualidade das refeições fornecidas, a entidade adjudicante tenha exigido o cumprimento de uma determinada percentagem de valor de matéria-prima alimentar por referência ao valor global da refeição.

  6. O Programa separa, claramente, o preço unitário global por refeição, e, após discriminação dos custos da refeição, o valor global unitário desses custos.

  7. «valor global» e «preço global» são conceitos diferentes.

  8. «valor global» é reportado aos custos e não ao preço.

  9. A permissão do arredondamento reporta-se apenas ao preço.

  10. Se a matéria-prima alimentar tem que corresponder a uma determinada percentagem do valor global da refeição, então a mesma deve ser aferida em função da soma dos custos e não em função do preço global porque só assim é que se garante que as refeições tenham a qualidade pretendida pela entidade adjudicante, objectivo que seria frustrado com a sua comparação com o preço final após arredondamento redundando num valor de matéria-prima inferior ao valor mínimo exigido.

  11. Pelo que, como bem concluiu o tribunal a quo, «a proposta da Autora violou o ponto 11 do programa do Concurso bem como o disposto no artigo 70º, n.º 2-b) do Código dos Contratos Públicos» (cfr., no mesmo sentido, a sentença de 3 de Março de 2016, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, no processo n.º 2090/15.2BEPRT junta sob o documento n.º 1).

  12. Não padecendo, por conseguinte, a sentença recorrida do erro de julgamento que a recorrente lhe imputa.

  13. Exigindo o Programa do Concurso que a matéria-prima alimentar corresponda a uma determinada percentagem mínima do somatório dos custos da refeição, os valores dos custos suportados, ainda que não venham a ser repercutidos no preço, têm que ser considerados no valor global da refeição para efeitos de apuramento do valor exigido para a matéria-prima alimentar, sob pena de se desvirtuar por completo aquela exigência concursal e comprometer a qualidade das refeições.

  14. Se o Programa do Concurso exige a indicação de determinados custos, é evidente que os mesmos não podem ter o valor de zero porquanto, sendo custos, então têm que ter um valor superior a 0.

  15. Conclui-se, assim, que o tribunal a quo não cometeu o erro de julgamento que lhe vem imputado pela recorrente.

    O Ministério Público, notificado ao abrigo do disposto no artº 146º, nº 1, do CPTA, não se pronunciou nos autos.

    As questões suscitadas e a decidir resumem-se em determinar: — se ocorre erro de julgamento, pelo Tribunal a quo ao ter decidido que a proposta da Autora, ora recorrente, violou o disposto no artigo 70º n.º 2 b)e c) do CCP.

    Cumpre decidir.

    2– FUNDAMENTAÇÃO 2.1 – DE FACTO Na decisão sob recurso ficou assente, e permanece não impugnado, o seguinte quadro factual: A)O Réu, mediante Anúncio de procedimento n.º 1356/2015, publicado no Diário da República, Parte L, de 6 de março de 2015, procedeu à abertura de um concurso destinado à Aquisição de Prestação de Serviços de Cantinas Escolares, sendo o critério de adjudicação o da proposta economicamente mais vantajosa.

    B)O Programa do Concurso estabelecia no seu ponto 11, o seguinte: «11 Documentos da Proposta Sob pena de exclusão, a proposta é constituída pelos seguintes: a) Declaração do concorrente de aceitação do conteúdo do Caderno de Encargos, elaborada em conformidade com o modelo constante do Anexo A ao presente Programa do Concurso; b) Proposta de preço unitário global por refeição, arredondado à centésima (se for o caso), indicado por algarismos e extenso, não incluindo o IVA, explicitando a taxa legal aplicável, acompanhada de nota justificativa que especifique obrigatoriamente os seguintes parâmetros: b.1) Almoço: a) Custo da matéria-prima alimentar – obrigatoriamente, igual ou superior a 50% do valor global da refeição; b) Custo da matéria-prima não alimentar; c) Encargos com pessoal dos refeitórios: salários, remunerações adicionais, encargos sociais, seguros, medicina no trabalho, subsídio de férias e Natal, de acordo com o Anexo F; d) Encargos com a substituição e manutenção dos equipamentos e reposição da palamenta; e) Encargos gerais e lucros; f) Valor global unitário por refeição Almoço; g) Proposta de valor global anual refeição almoço e para o prazo total possível de execução do contrato (3 anos).

    b.2) Suplemento: a) Custo da matéria-prima alimentar – obrigatoriamente, igual ou superior a 78% do valor global do suplemento; b) Custo da matéria-prima não alimentar; c) Encargos com pessoal: salários, remunerações adicionais, encargos sociais, seguros, medicina no trabalho, subsídio de férias e Natal, de acordo com o Anexo F.1; d) Encargos gerais e lucros; e) Valor global unitário por suplemento; f) Proposta de valor global anual suplemento e para o prazo total possível de execução do contrato (3 anos)...

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