Acórdão nº 01579/05.6BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelCristina Travassos Bento
Data da Resolução28 de Janeiro de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. Relatório M..., Ldª, com o NIPC 5…, com sede em …, Santa Maria da Feira, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra as liquidações adicionais de IVA referentes ao ano de 2001.

A recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: 1) Os actos tributários impugnados estão inquinados do vício de falta de fundamentação, pois as razões e afirmações aduzidas pela Autoridade Tributária no Relatório da Inspeção Tributária e, posteriormente, dadas como provadas na integra pela Juíza do Tribunal “a quo”, são de tal forma vagas, genéricas e não concretas, que não podem de forma alguma, fundamentar os actos tributários.

2) Com efeito, o Tribunal “a quo” atendeu somente aos factos alegados pela Administração Fiscal, designadamente, aos contantes do Relatório da Inspecção Tributária, não relevando a prova testemunhal produzida, a qual é exaustiva na demonstração dos factos alegados pela impugnante, conforme se alcança da respectiva inquirição das testemunhas.

3) Na verdade, a Meritíssima Juíza “a quo” não carreou para o elenco dos factos qualquer dos elementos declarados pelas testemunhas, os quais, contrariam, inapelavelmente, o sentido da decisão proferida, pois, não basta dizer que “não foram relevados, por serem contraditórios com o que consta do RIT.” 4) Na verdade, a Douta Sentença recorrida apoia-se exclusivamente nos factos alegados pela Administração Fiscal e baseia a sua decisão apenas nesses factos.

5) O absoluto desconhecimento a que a Sentença recorrida vota, substancialmente, os factos alegados pela impugnante, menospreza os princípios do inquisitório e do contraditório, contidos nos artigos 58º da Lei Geral Tributária e 8º do Regime Complementar do Procedimento da Inspeção Tributária.

6) Meras e genéricas afirmações, tais como “é um vendedor de papel tal como o próprio assumiu, após diligências por nós efectuadas”, sem referir ou indicar quais as diligências efectuadas e sem juntar um Auto de Declarações dessa pessoa, não consubstanciam uma correcta fundamentação (página 24 do Relatório), além do que tais diligências, a terem existido, teriam necessariamente de ser notificadas à Impugnante, aqui recorrente (artigo 45º, nº 1 do C.P.P.T.).

7) Do mesmo modo, a afirmação de que “Do exposto resulta a convicção segura (?)” de que todas as facturas são falsas/fictícias, consubstancia, também, uma fundamentação incompleta ou inexistente, por esta estar desacompanhada de documentos de prova ou prova testemunhal que a comprove (artigo 115º, nº 2 do C.P.P.T.).

8) Por fim, a afirmação contida no final da página 6 do Relatório de que “tal conclusão é corroborada pelo próprio C..., que confirma que a sua atividade se tem resumido à venda de “faturas falsas””, não consubstancia uma fundamentação correta e válida, pois nem sequer foram tomadas declarações ao sujeito passivo acompanhadas de testemunhas que as comprove.

9) É que, nos termos do nº 2 do artigo 115º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, o Relatório da Inspeção Tributária não goza de especial relevo probatório desacompanhado de outros elementos de prova. Daí que as afirmações do Senhor Inspector Tributário H…, desacompanhadas de documentos de prova, carecem de valor.

10) O que a Administração Tributária fez, sem qualquer fundamentação, foi apenas e só, considerar que a impugnante, ora recorrente, não podia deduzir o IVA suportado nas faturas por ela postas em causa por as considerar simuladas, nos termos do nº 3 do artigo 19º do Código do IVA, ano de 2001, no valor de 133.994,33 €.

11) Ora, como se verifica no Relatório, as conclusões nele contidas não são suportadas por factos retirados de documentos e elementos respeitantes à impugnante e que permita dizer que entre a impugnante e o emitente das facturas em causa, tenha sido feito um acordo simulatório com vista a enganar terceiro (artigo 240º do Código Civil, aplicável por força das alíneas a) e d) do artigo 2º da L.G.T.

12) Pelo que, deste modo, é evidente e notório que a Administração Tributária não conseguiu provar os pressupostos de facto que a legitimaram a corrigir as liquidações de IVA, ano 2001, e isto, porque todas as faturas em causa titulam operações efetuadas pela impugnante, ora recorrente.

13) A dedutibilidade fiscal dos custos depende apenas e só de uma relação justificada com a actividade produtiva da empresa, ou seja, o critério para aferir da dedutibilidade dos custos é simplesmente a sua correlação com a obtenção dos proveitos (nº 1 do artigo 23º do Código do IRC).

14) Por imperativo do nº 1 do artigo 74º da L.G.T., a prova dos factos constitutivos dos direitos cabe a quem os invoque e, neste caso, e em primeiro lugar, à Administração Tributária.

15) Portanto, era à Administração Tributária (actual Autoridade Tributária e Aduaneira) a quem competia e compete a prova que o sujeito passivo “não comprou e vendeu as mercadorias a que se referem as facturas” que afirmou serem falsas, o que não logrou provar.

16) A Juíza “a quo” deve conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e cuja apreciação não tenha ficado prejudicada, sob pena de, não o fazendo, a Sentença ficar ferida de nulidade (artigo 125º do C.P.P.T. e 660º, nº 2 e 668º, nº 1, alínea d) do C.P.C.).

17) A Meritíssima Juíza “a quo”, não apreciou todas as questões postas em crise pela impugnante, ora recorrente, e aquelas que apreciou, fê-lo, salvo o devido respeito, de forma não fundamentada, sem conseguir dar respostas através dos factos e fundamentos de direito, o que só por si conduz ao vicio da nulidade da sentença recorrida.

18) Ora, em face da materialidade vertida no probatório e que constitui a declaração formal fundamentadora do acto de liquidação impugnado, o juízo formulado pela Administração Tributária no que concerne à falsidade das facturas, não se pode considerar como pertinente e adequado, pois, os elementos indiciários apontados pela Administração Tributária não têm qualquer suporte documental, pelo que não permitem inferir de qualquer simulação das operações subjacentes àquelas facturas.

19) Assim, todos os alegados indícios constantes no Relatório e reproduzidos na Douta Sentença recorrida, nem sequer são índices suficientes, sérios e objectivos (carecem de prova) para conduzir à desconsideração dos custos titulados pelas facturas emitidas, pois que, 20) Fazer pagamentos em numerário era em 2001 uma prática comum e normal, não sendo índice de que não houve transacção, pois que, em abstracto, é possível o pagamento de mercadorias em dinheiro de forma legitima (Nesse sentido, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 28-01-2010, processo nº 04871/04 – Viseu).

21) E, o facto de o sujeito passivo emitente não possuir estrutura empresarial não é índice nenhum, uma vez que para transaccionar cortiça não é necessário ter uma estrutura empresarial, nem capacidade produtiva, pois não se está a falar de produção de rolhas, mas de transações comerciais, bastando ao fornecedor alugar uma carrinha ou camião e descarregar a mercadoria “Cortiça” nas instalações da impugnante ou numa caldeira, ou o impugnante se deslocar no seu camião ao fornecedor de cortiça.

22) Assim, tais factos alegados pela Administração Tributária e por esta mobilizados para o cumprimento do dever de fundamentação material do acto impugnado não constituem sequer indícios de que as facturas em causa não titulam verdadeiras operações, não permitindo suportar, objectivamente e à luz das regras da experiência comum, as conclusões a que chegou a Administração Tributária e o Tribunal “a quo”, nas quais assenta a decisão de corrigir a matéria tributável da impugnante, aqui recorrente, e está na base das liquidações impugnadas.

23) Quanto ao facto de o emitente das facturas em causa ser indiciado como contribuinte não declarante também não releva como indicio de falsidade das facturas. Na verdade, o que interessa é saber se as transacções tituladas nas facturas ocorreram efectivamente, independentemente de o emitente daquelas cumprir ou não as suas obrigações fiscais, podendo ser não declarante e, não obstante, vendeu mercadoria (cortiça) à impugnante, aqui recorrente.

24) Assim, a Administração Tributária não cumpriu o ónus probatório que sobre si impendia no sentido da fundamentação que a lei exige para legitimar a correcção da matéria tributável declarada, correcção essa que se afigura, assim, desconforme com a lei.

25) Pelo que, a Meritíssima Juíza “a quo” ao dar como provado a inexistência de transacções comerciais, com base em alegados indícios, que se demonstra que nem indícios são, e muito menos sérios, de que as facturas em causa não titulam verdadeiras operações, salvo o devido respeito, a juíza “a quo” decidiu mal e sem qualquer fundamentação concreta, segura e objectiva.

26) O que a Administração Tributária faz ao longo de todo o Relatório é imputar ao contribuinte, impugnante e aqui recorrente, no procedimento tributário e até o próprio Tribunal “ a quo”, à posteriori, o ónus da prova de que as facturas não são falsas, quando, por imperativo do nº 1 do artigo 74º da Lei Geral Tributária, é à Administração Tributária que lhe competia e compete fazer a prova, uma vez que está em causa uma liquidação adicional de IVA com referência ao ano de 2001, já em plena vigência da Lei Geral Tributária.

27) Assim, a Douta Sentença recorrida apoiou-se exclusivamente em meras suposições vagas e subjectivas ou presunções alegadas pela Inspecção Tributária e baseou a sua decisão apenas nisso, quando presunções ou suposições não são provas, na mais completa violação do Princípio da Legalidade (artigo 55º da L.G.T.) pressuposto da sua actuação a que está subordinada e ainda do nº 2 do artigo 104º da Constituição...

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