Acórdão nº 02214/11.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Março de 2016
Magistrado Responsável | Rog |
Data da Resolução | 18 de Março de 2016 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: A Área Metropolitana do Porto veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL do acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 24.09.2013, que indeferiu a reclamação apresentada contra o despacho saneador-sentença, de 12.07.2012, que julgou procedente a acção administrativa especial interposta pelo Ministério Público para declaração de nulidade da deliberação de 29.1.2010 da Junta Metropolitana do Porto, quanto aos seus pontos n.ºs 1 e 3 - A) e B), e em que foram indicados como Contra-Interessados a Junta Metropolitana do Porto; o Presidente da Comissão Executiva Metropolitana do Porto; o 1.º Vice-Presidente da Comissão Executiva Metropolitana do Porto; e o 2.º Vice-Presidente da Comissão Executiva Metropolitana do Porto.
O Ministério Público contra-alegou, defendendo a manutenção do acórdão recorrido.
Por acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte, de 20.11.2014, foi negado provimento a este recurso jurisdicional.
Em revista, o Supremo Tribunal Administrativo veio a declarar, por acórdão de 04.11.2015, nulo o acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte, de 20.11.2014, por não se ter pronunciado sobre a questão, suscitada em sede de recurso jurisdicional, da inimpugnabilidade do acto impugnado.
Cumpre, pois, em cumprimento do decidido pelo Supremo Tribunal Administrativo prolatar novo acórdão suprindo a apontada nulidade.
* I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: I. O presente recurso tem por objecto a impugnação do Acórdão proferido pelo Tribunal a quo que indeferiu a reclamação apresentada, ao abrigo do artigo 27.º, n.º 2 do CPTA, contra o despacho saneador-sentença que julgou procedente a acção administrativa especial, anulando a deliberação da Junta Metropolitana do Porto, datada de 29-01-2010, quanto aos seus pontos n.º 1 e n.º 3, alíneas a) e b), com fundamento num alegado vício de incompetência relativa por falta de lei habilitante e consequente violação do artigo 35.º, n.º 1 do CPA.
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A Recorrente não se conforma com o teor do Acórdão e do despacho saneador-sentença proferidos pelo Tribunal a quo, porquanto a Deliberação da Junta Metropolitana do Porto pela qual foram delegadas competências no Presidente e Vice-Presidentes da Junta Metropolitana e no Presidente da Comissão Executiva é perfeitamente válida e eficaz por existir lei habilitante para o efeito e por terem sido cumpridas todas as formalidades legais aplicáveis.
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Conclui-se que a deliberação de delegação de competências cumpre integralmente o princípio da juridicidade, da certeza e segurança jurídica, e do controlo político-administrativo da actividade financeira metropolitana e demais princípios jurídico-administrativos, tendo o seu fundamento, além do mais, nos princípios da autonomia administrativa e da desconcentração administrativa.
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A delegação de competências em causa nos presentes autos configura matéria integrada no foro das relações internas entre órgãos de uma mesma pessoa colectiva (= «reserva de administração»), V. Inexistindo, portanto, qualquer interesse ou fundamento bastante, à luz do ordenamento jurídico português, para submeter tal questão à jurisdição administrativa, sendo, ipso facto, inimpugnável judicialmente o citado acto de delegação.
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Conclui-se ainda que os princípios da segurança e certeza jurídica impõem, em qualquer caso, a manutenção da deliberação na ordem jurídica portuguesa, na medida em que a sua anulação porá em risco sério a subsistência dos actos de autorização de despesa praticados ao abrigo da mesma, podendo, nessa medida, causar prejuízos sérios tanto ao interesse público local (da Recorrente e dos municípios que constituem o seu substrato) como ao interesse privado (os contraentes privados e utentes).
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Para além disso, a entrada em vigor da Lei n.º 75/2013, de 12-09, determinou importantes alterações no modelo organizativo das áreas metropolitanas, encontrando-se actualmente, na sequência das últimas eleições autárquicas, em instalação os novos órgãos metropolitanos, VIII. Pelo que tudo aconselha a manutenção, na ordem jurídica portuguesa, da deliberação da Junta Metropolitana.
Sem prescindir.
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Salvo o devido respeito, conclui-se que incorrem o Acórdão e o despacho saneador-sentença proferidos pelo Tribunal a quo, em erro de julgamento de Direito, por errada interpretação e aplicação do regime da delegação de competências no âmbito das áreas metropolitanas.
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O objecto do presente recurso consiste, portanto, na apreciação da validade (rectius, juridicidade) dos pontos n.º 1 e n.º 3, alíneas a) e b) da Deliberação da Junta Metropolitana do Porto, datada de 29-01-2010, supra identificada, através da qual este órgão delegou competências no presidente e vice-presidentes da Junta Metropolitana (ponto 1 da deliberação) e no presidente da Comissão Executiva (alíneas a) e b) do ponto 3).
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O Tribunal a quo parte de uma concepção errada do modelo de organização e de repartição de competências no âmbito da Área Metropolitana do Porto e do instituto da delegação de competências, designadamente em matéria de autorização da realização de despesas, previsto na Lei n.º 46/2008, de 27-08 e no Decreto-Lei n.º 197/99, de 08-06, o que inquina toda a sua argumentação.
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Conclui-se que a Área Metropolitana do Porto é uma pessoa colectiva de direito público, de tipo cooperativo (= associação administrativa), cujo substrato assenta na associação obrigatória (imposta por lei ao abrigo do artigo 236.º, n.º 3 da Constituição) de municípios integrados na NUTS III do Grande Porto e de Entre Douro e Vouga (cfr. artigo 2.º da Lei n.º 46/2008, de 27 de Agosto), com âmbito de actuação territorialmente delimitado, integrada na Administração autónoma local, mais precisamente na administração indirecta de cada um dos municípios associados.
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Conclui-se que a Área Metropolitana do Porto foi desenhada pelo legislador português à imagem (jurídico-organizativa) dos municípios, sendo-lhe aplicável o regime geral da Administração local, bem como, subsidiariamente, o regime jurídico dos municípios, por força de um princípio geral de equiparação (regime comum das áreas metropolitanas = regime comum dos municípios), bem como das normas dos artigos 7.º da Lei n.º 46/2008 e 30.º dos Estatutos da Área Metropolitana do Porto.
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As áreas metropolitanas são designadas pelo legislador, em vários diplomas legais, como entidades equiparadas a autarquias locais, designadamente para efeito de aplicação do artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 197/99, vigorando, pois, um princípio geral de equiparação que determina, nomeadamente, a aplicação subsidiária, às áreas metropolitanas, do regime jurídico-organizativo dos municípios ou, pelo menos, fundamenta a aplicação analógica desse mesmo regime.
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A Junta Metropolitana do Porto é o órgão executivo da Área Metropolitana, com competência para a autorização da realização de despesas com locação e aquisição de bens e serviços sem limite (cfr. artigo 18.º, n.º 1, alínea b) do DL 197/99), como foi defendido no douto parecer da CCDRN (junto como documento 3 com a contestação), bem como no artigo 9.º da petição inicial do Ministério Público, e com a concordância do Tribunal a quo.
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São bem conhecidas as deficiências e insuficiências do regime jurídico das áreas metropolitanas constante da Lei n.º 46/2008, principalmente no que se refere à estruturação dessas entidades (= modelo orgânico) e à determinação e repartição interorgânica das competências.
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A delegação de competências assume-se assim, em particular no domínio metropolitano, como um mecanismo estruturante cuja função e utilidade residem, sobretudo, em permitir (1) descongestionar a Junta Metropolitana, sem a mesma perder os necessários poderes de controlo e orientação da gestão administrativa e financeira, os quais, aliás, são mesmo reforçados pelos poderes decorrentes da relação de delegação (= orientação reforçada + avocação de competência + revogação dos actos do delegado – artigo 39.º do CPA); (2) garantir, pela via da desconcentração, uma gestão mais célere, eficiente e eficaz, bem como a unidade de objectivos; (3) o controlo e rigor financeiro, garantido pelos presidentes das câmaras municipais (que contribuem para a formação do património e finanças metropolitana), os quais são dotados de legitimidade democrática, o que reforça o controlo e as garantias dos administrados (munícipes).
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O princípio geral em matéria de delegação intersubjectiva interorgânica de competências no Direito Administrativo português consta do artigo 35.º do CPA.
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Para além disso, temos ainda de considerar as várias normas da Lei n.º 46/2008 que prevê uma ampla faculdade de delegação de competências, designadamente nos artigos 14.º, n.º 4, 15.º, n.º 2, 17.º, n.º 1, alínea b) e n.º 4, 18.º, n.º 1, alíneas c) e g) e 18.º, n.º 2.
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Ao contrário do que sustenta o Tribunal a quo, a regra geral em matéria de delegação de competências é a de que, se uma norma permitir a delegação de competências de um órgão noutro órgão ou agente, isto significa que aquele poderá delegar neste todas as competências que a lei não proibir expressamente, sendo este o sentido que deve ser atribuído à norma do artigo 18.º, n.º 1 alínea g) da Lei n.º 46/2008.
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No domínio da delegação de competências em matéria de autorização da realização de despesas, temos por certo que o artigo 29.º do DL 197/99 tem aplicação subsidiária às áreas metropolitanas por força de um princípio geral de equiparação, bem como em razão dos artigos 7.º da Lei n.º 46/2008, e 30.º dos Estatutos da Área Metropolitana do Porto, XXII. Ou, pelo menos, por analogia (cfr. artigo 10.º do Código Civil).
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Tendo em atenção o carácter manifestamente insuficiente e deficiente da regulação das áreas metropolitanas e o princípio geral da equiparação acima exposto (regime comum das áreas metropolitanas = regime comum...
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