Acórdão nº 02694/15.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução18 de Março de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório JMBAP e GJFCMS, com os sinais nos autos, inconformados com a decisão proferida no TAF do Porto, em 15 de Dezembro de 2015, através da qual foi indeferida a requerida providência cautelar apresentada contra a Município do Porto, consubstanciada no pedido de suspensão dos atos que determinaram a desocupação das parcelas de terreno identificadas, vieram em 7 de Janeiro de 2016 apresentar Recurso Jurisdicional, no qual concluíram (Cfr. Fls 115 a 126 Procº físico): “a) Parte a sentença recorrida da ideia da exigência de dois requisitos para o decretamento das providências cautelares conservatórias, como é o caso da suspensão de eficácia de atos administrativos, sendo o primeiro o do fumus non malus iuris, que julga verificado, e sendo o segundo o do periculum in mora que julga não verificado.

b) Conhece ainda a sentença da verificação de um terceiro requisito, qual seja, a não superioridade dos interesses públicos afetados relativamente aos interesses particulares acautelados, que também julga não verificado.

c) Quanto ao primeiro requisito, estando nós em face de um Despacho Saneador/Sentença, mais do que a prova – que ainda se não produziu toda, nem tinha que produzir – importa para a decisão a alegação.

d) Diz a sentença recorrida que se alegou vagamente o risco de lesão irreparável dos interesses dos Requerentes/Recorrentes, apenas a ele se referindo os arts. 43.º e 44.º do requerimento inicial, que transcreve e) Acontece que o disposto nesses artigos – e também no subsequente art. 45.º - constituiu conclusão fáctica e jurídica do que atrás se alegara.

f) E o que atrás se alegara foi que os Requerentes/Recorrentes sempre exerceram a posse sobre os terrenos em questão à vista de toda a gente e, designadamente, da Requerida/Recorrida – cfr. arts. 3.º, 10.º, 11.º, 12.º, 13.º, 14.º, 36.º, 37.º, 38.º, 42.º, 43.º, 44.º e 45.º do requerimento inicial.

g) E caracterizaram tal posse através do facto de cuidarem o terreno – cfr. art. 3.º do requerimento inicial – que estava inculto – e assim assegurarem para os mesmos, confinantes com suas casas, condições de salubridade pública – cfr. art- 11.º do requerimento inicial, bem como de o delimitarem, de o ajardinarem, cultivarem e manterem o jardim que ali fizeram, integrando-o fisicamente no terreno de sua propriedade – cfr. arts. 12.º e 13.º do requerimento inicial, como tudo demonstraram com as fotografias que juntaram como docs. nºs 13 e 14 h) Também do facto de um seu vizinho, em situação em tudo idêntica, utilizar correspondente terreno como acesso a garagem, tendo até para o efeito, rampa devidamente licenciada pela Recorrida – cfr. arts. 16.º e 17.º do requerimento inicial.

i) E de serem tratados pela própria Recorrida como proprietários dos terrenos em causa – cfr. art. 15.º do requerimento inicial.

j) Por tudo o que estariam em condições de adquirir os terrenos por usucapião – conforme alegaram no art. 35.º do requerimento inicial.

k) E assim se compreende a alegação dos Recorrentes nos trechos citados pelo Mmo. Juiz a quo – o prejuízo irreparável com a execução do ato administrativo é a destruição da propriedade dos Requerentes, dos jardins que edificaram nos terrenos possuídos e da sua integração física nos prédios que adquiriram.

l) O que se reconduz a uma situação de facto consumado, como se alegou nos arts 44.º e 45.º do requerimento inicial.

m) E o que, para este efeito, como aí também se alegou e como decorre da lei, é equivalente ao prejuízo irreparável.

n) Verifica-se, assim, ao contrário do decidido, o segundo requisito exigido pela lei para o decretamento da providência cautelar, ao menos em termos de alegação e até de princípio de prova.

o) Agora, quanto ao terceiro requisito, não são os Requerentes que têm que demonstrar que o prejuízo para si decorrente da execução do ato administrativo é superior ao interesse público afetado pelo decretamento da suspensão da sua eficácia, é o contrário.

p) É à Recorrida que cabe o ónus de alegação e prova de que determinado e concreto interesse público na execução do ato administrativo é justificadamente superior ao interesse particular que se pretende acautelar, como decorre do teor literal da lei – cfr. art. 120.º n.º 2 e 5 do CPTA, e como o entende a melhor doutrina e jurisprudência de que no texto se citaram exemplos.

q) No caso, como a Requerida/Recorrida nada alegou nesse sentido, tanto bastaria para não poder decidir-se, como se decidiu, pela não verificação deste terceiro requisito do decretamento da providência.

r) Sempre se dirá, porém, que se alegou que os terrenos em causa constam como sendo do domínio público municipal para a instalação de jardins já desde 1958 – cfr. arts. 6.º e 21.º do requerimento inicial, como se alegou que nunca nada fez a Requerida no sentido desse ajardinamento – cfr. art. 5.º, 6.º e 31.º do requerimento inicial, como se alegou que a Requerida edificou quase paredes meias com os terrenos em causa o maior parque urbano do país que, amplamente, ajardinou – cfr. arts. 23.º, 31.º e 38.º do requerimento inicial – e o que coloca seriamente em causa a suposta pretensão da Requerida/Recorrida criação de jardins públicos nas parcelas de terreno que pretende “expropriar” aos Requerentes/Recorrentes, como se alegou que os Requerentes, por si e seus ante possuidores, há bem mais de 40 anos que possuem os terrenos em causa, como os vêm possuindo, neles instalando e mantendo os jardins de uso particular que integraram nos prédios que adquiriram – cfr. arts. 3.º, 10.º, 11.º, 12.º, 13.º, 14.º, 36.º, 37.º, 38.º, 42.º, 43.º, 44.º e 45.º do requerimento inicial, e como se alegou que a Requerida, não só sempre contemporizou com essa situação, como sempre tratou os Requerentes/Recorrentes como proprietários desse terreno – cfr. art. 15.º, 16.º, 17.º, 31.º, 32.º, 36.º, 37.º e 38.º do requerimento inicial.

s) Assim, mesmo que se entendesse que fosse ónus dos Requerentes alegar e demonstrar que o interesse que pretendem acautelar não é superior ao interesse público na execução imediata do ato administrativo ter-se-ia que considerar que esse ónus se cumpriu.

t) E, logo, que se verifica também o terceiro requisito para o decretamento da providência.

u) Por tudo o que, ao contrário do decidido, não pode a providência deixar de ser decretada.

v) Tendo a sentença recorrida violado o art. 120.º n.º 1 al. b), 2 e 5 do CPTA.

TERMOS EM QUE DEVE REVOGAR-SE A SENTENÇA RECORRIDA E ORDENAR-SE A SUA SUBSTITUIÇÃO POR OUTRA QUE DECRETE A PROVIDÊNCIA CAUTELAR REQUERIDA,COMO O IMPÕE O DIREITO E A JUSTIÇA” O Recurso veio a ser admitido por Despacho de 11 de Janeiro de 2016 (Cfr. Fls. 134 Procº físico).

O Município do Porto veio a apresentar as suas Contra-alegações de Recurso em 29 de Janeiro de 2016, nas quais concluiu (Cfr. Fls. 156 a 166 Procº físico): “A. A douta sentença proferida pelo tribunal a quo e ora colocado em crise pela Recorrente é, a nosso ver, justa, bem fundamentada e inatacável, demonstrando uma aplicação exemplar das normas jurídicas, maxime do disposto no artigo 120º do CPTA.

B. Para sustentar o recurso, defendem os Recorrentes que a sentença proferida pelo tribunal a quo viola o disposto no artigo 120º, nº 1, alínea b), nº 2 e nº 5 do CPTA (versão anterior a 2 de Dezembro de 2015, aplicável ao caso em apreço).

C. Os Recorrentes expressam o entendimento de que se verifica in casu a existência de periculum in mora – artigo 120º, nº 1 alínea b) do CPTA - e que o seu interesse enquanto particulares é, neste caso, superior ao interesse público, colocando por conseguinte em crise a ponderação de interesses prevista no nº 2 do artigo 120 do CPTA. Contudo, os argumentos apresentados pelos Recorrentes não abalam, nem beliscam, a justeza da sentença proferida pelo tribunal a quo.

D. A presente providência cautelar tem como fito a suspensão da eficácia do ato administrativo, proferido pela Direção Municipal de Finanças e Património, através do qual intima os Recorrentes a desocuparem, no prazo de 20 dias, os terrenos descritos no ofício I/172940/15/CMP e I/173724/15/CMP, sitos na Rua de M..., nesta cidade do Porto.

E. Importa assim analisar os dois requisitos para o decretamento de providências cautelares acima enunciados e que consubstanciam o “sumo” do recurso em apreço.

F. Para além do requisito do fumus boni iuris ou fumus malus iuris – que no caso em apreço o tribunal a quo entendeu não ser evidente a procedência ou a improcedência da ação administrativa principal anulatória - ter-se-á ainda que verificar a existência, ou não, de um outro pressuposto que a lei define para a procedência da providência requerida: o periculum in mora.

G. Importa, na verdade, averiguar se “os factos concretos alegados pelo requerente inspiram o fundado receio de que, se a providência for recusada, se tornará depois impossível, no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente, proceder à reintegração, no plano dos factos, da situação conforme à legalidade” (e aqui estaremos perante uma situação de facto consumado).

H. Ou se “os factos concretos alegados pelo requerente inspiram o fundado receio de que, se a providência for recusada, essa reintegração no plano dos factos será difícil” (e aqui estaremos perante a existência de prejuízos de difícil reparação) – cfr. Mário Aroso de Almeida in “O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos”, pág. 291).

I. Na verdade, “ocorre uma situação de facto consumado previsto no artº120º nº1 al. b) do CPTA quando, a não ser deferida a...

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