Acórdão nº 02417/15.7BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução19 de Fevereiro de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RSLON veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 27.11.2015, que indeferiu a providência cautelar deduzida contra o Ministério da Administração Interna para a suspensão de eficácia do acto pelo qual lhe foi aplicada a pena disciplinar de demissão.

Invocou para tanto, em síntese, que a decisão recorrida errou, por errada interpretação e aplicação ao caso concreto, o disposto nas alíneas a), ou subsidiariamente, b) do n.º1 e no n.º2, do artigo 120º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos; isto porque é evidente a procedência da pretensão a deduzir no processo principal, dado que face, ao disposto nos artigos 6.º, n.º 6, da Lei n.º 58/2008 de 9 de Setembro e da alínea d), do n.° 2, do artigo 133.°, do Código do Procedimento Administrativo, estamos perante um acto manifestamente ilegal, a punição disciplinar por uma infracção cujo procedimento prescreveu; em todo o caso, ainda que não fosse evidente esta providência sempre se verificaria uma situação de facto consumado ou de prejuízos de difícil reparação e os demais requisitos para a procedência do pedido de suspensão da eficácia do acto.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Ministério Público neste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Notificado deste parecer, o Recorrente veio reiterar, no essencial, o teor das suas alegações.

* I - São estas as conclusões das alegações e que definem o objecto do presente recurso: 1ª - O Tribunal a quo não se debruça sobre os fundamentos do periculum in mora, no caso concreto.

  1. - A decisão de demissão acarreta, efectivamente, a impossibilidade de o requerente poder contribuir para o seu sustento, agora que se encontra em situação de liberdade condicional e procura retomar o curso normal da sua vida enquanto cidadão consciente das suas obrigações.

  2. - O acto impugnado ao impossibilitar que o requerente possa recuperar o rendimento do seu trabalho irá, com certeza, dificultar o seu processo de ressocialização agora iniciado.

  3. - Os danos que o não decretamento da providência cautelar causará ao requerente serão de difícil reparação e irão juntar-se a uma injusta condenação penal.

  4. - O Tribunal a quo não se debruça sobre o essencial da “aparência do direito” invocada pelo requerente e fundamenta a sua decisão em normas que não se aplicam ao caso concreto.

  5. - Ao invés do Tribunal a quo se pronunciar sobre a duração máxima do procedimento disciplinar, que é o que está em causa, o Tribunal a quo vem pronunciar-se sobre a prescrição do direito de instauração do procedimento disciplinar.

  6. - O Tribunal a quo, explanando o regime de prescrição de instauração do procedimento criminal estabelecido no Código Penal, conclui que “como desde a prática da infracção (25/07/2008) até à decisão (25/06/2015) decorreram seis anos e onze meses, não se encontram perfeitos os dez anos necessários para que ocorresse a prescrição do procedimento disciplinar.” 8ª - O requerente não invoca a prescrição do direito à instauração do procedimento disciplinar, mas sim a violação do prazo máximo de duração do procedimento disciplinar, que é um prazo bem diferente e que pretende salvaguardar o direito do arguido de ter uma decisão célere acerca dos factos de que vem acusado disciplinarmente. Já depois de iniciado o procedimento disciplinar.

  7. - O Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública não remete para o Código Penal ou para o Código do Processo Penal a fixação do prazo máximo de duração do procedimento disciplinar, como o faz para o prazo de prescrição de instauração do procedimento disciplinar, quando estamos perante infracções disciplinares que constituem ilícito penal.

  8. - Pelo que, nos termos do artigo 66.º do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública, em caso de omissão, a primeira instância a que se recorre é o Estatuto Disciplinar, fixado na Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro.

  9. - O processo disciplinar que aplica ao requerente pena de demissão encontra-se prescrito, já que decorreram mais de 18 meses entre o início do mesmo e a sua decisão final.

  10. - Após a entrada em vigor do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro, dezoito meses é o prazo a ter em conta conforme acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27.09.2011, processo 43/11.9YFLSB.

  11. - O Estatuto é aplicável a todos os trabalhadores que exercem funções públicas, independentemente da modalidade de constituição do respectivo vínculo, dispondo-se no seu artigo 6.º, n.º 6, que o “procedimento disciplinar prescreve decorridos 18 meses contados da data em que foi instaurado quando, nesse prazo, o arguido não tenha sido notificado da decisão final.” 14ª - Contados os 18 meses sobre a data de instauração do procedimento de inquérito que faz parte integrante do procedimento disciplinar, a decisão final do referido procedimento teria que ter sido proferida e notificada ao requerente até 27 de Julho de 2010, o que não aconteceu.

  12. - O procedimento disciplinar prescreveu nos termos referidos, dado que nos termos do artigo 66.º, do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública, se aplicam, subsidiariamente, ao procedimento disciplinar instaurado ao requerente as disposições vertidas no Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local.

  13. - Estão, assim, criadas as condições para que se produza o juízo de prognose que revele a probabilidade de ser dada razão ao requerente na causa principal e, deste modo, assegurar a utilidade da sentença a proferir no processo.

  14. - O acto que determinou a demissão do requerente padece do vício de violação de lei, nos termos conjugados dos artigos 6.º, n.º 6, da Lei n.º 58/2008 de 9 de Setembro e da alínea d), do n.° 2, do artigo 133.°, do Código do Procedimento Administrativo, pelo que estamos perante um acto manifestamente ilegal.

  15. - Torna-se, assim, evidente a existência de fumus boni iuris do pedido a formular no processo principal, devendo por isso ser adoptada a providência aqui solicitada, ao abrigo do disposto na alínea a), do n.º 1 do artigo 120.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

  16. -No caso de se entender de forma diferente, mesmo assim deve ser decretada a providência ao abrigo da alínea b), do n.º 1 do artigo 120.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, por ter ficado provada a existência de fundado receio da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e não é manifesta a falta de fundamento da pretensão a formular nesse processo.

*II – Matéria de facto.

O recorrente insurge-se contra as conclusões tiradas pelos Tribunal a quo sobre o pressuposto do periculum in mora ou a produção de prejuízos de difícil reparação sem por em causa, em rigor, o julgamento da matéria de facto indiciada.

Deveremos assim dar como indiciariamente provada a seguinte matéria de facto, com relevo:

  1. O autor foi alistado como Agente da Polícia de Segurança Pública em 14 de Novembro de 2005, encontrando-se ao serviço no dia 25 de Julho de 2008 em patrulhamento automóvel nas ruas de Lisboa, onde deteve um cidadão de nacionalidade alemã e o conduziu para a Esquadra (vide processo administrativo e fls. 259).

  2. O requerente foi alvo de um processo disciplinar instaurado a 27 de Janeiro de 2009, o qual foi precedido de um processo de Averiguações iniciado a 30 de Julho de 2008 (fls. 2 e 219 do processo administrativo).

  3. Em 06 de Fevereiro de 2009, foi dado início à instrução do processo disciplinar, notificada ao arguido (ora requerente) em 19 de Fevereiro de 2009, inquiridas duas testemunhas no dia 25 de Fevereiro de 2009, ouvido o arguido em 11 de Março de 2009 (fls. 224, 225, 253, 245, 246, 267 do processo administrativo).

  4. Em 17 de Dezembro de 2010, o instrutor propõe que o processo disciplinar seja suspenso, ao abrigo do artigo 37.º, n.ºs 1 e 3 do Regulamento Disciplinar da PSP, a aguardar a conclusão do processo-crime que se encontrava pendente nos serviços do Ministério Público junto do DIAP de Lisboa; o qual obteve Despacho concordante do Ministro da Administração Interna, em 25 de Junho de 2010, notificado ao Arguido em 02 de Agosto de 2010 (fls. 321, 325 e 332 do processo administrativo).

  5. Em 28 de Abril de 2010, pelo Ministério Público foi proferida acusação contra o arguido (ora requerente) da prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, um crime de coacção grave e um crime de abuso de poder (fls. 337 a 347 do processo administrativo).

  6. Em 12 de Julho de 2011, foi proferido acórdão pela 5.ª Vara Criminal de Lisboa, que condenou o requerente na prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, de um crime de coacção grave e de um crime de abuso de poder, aplicando, em cúmulo jurídico, a pena única de quarto anos e três meses de prisão; do qual foi interposto recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, que manteve a pena aplicada conforme acórdão proferido em 17 de Outubro de 2012, tendo transitado em julgado em 15 de Janeiro de 2013 (fls. 355 a 374, e 391 a 406 e 407 do processo administrativo).

  7. Mediante despacho do Ministro da Administração Interna proferido a 11 de Fevereiro de 2013, foi determinado o...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT