Acórdão nº 00318/11.7BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 20 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelH
Data da Resolução20 de Maio de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO Recorrente: Município de Vila Nova de Poiares Recorrido: F... companhia de Seguros, SA Vem interposto recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra que, na acção administrativa comum para efectivação de responsabilidade civil extracontratual, condenou o Réu ora Recorrente a pagar à Autora ora Recorrida a quantia de €7.524,00, acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.

O objecto do recurso é delimitado pelas seguintes conclusões da respectiva alegação(1): “a) No que toca à matéria de facto demonstra-se que alguns dos factos dados por provados vão para além do razoável, e subverte-se a base instrutória pela resposta dada, e por outro lado, levando em consideração os factos alegados e a prova feita, também outros factos deviam ter sido dados por provados; b) Violaram-se assim os artigos 264º, 511º, 513º, 653º e 659º todos do Cód. Proc. Civil; c) O Município contestou a acção quer por impugnação quer por excepção e não obstante caber à Autora a prova dos factos que pudessem sustentar o seu direito, aquele tem o direito de alegar e provar a culpa do lesado através do evento cometido pelo comissário ou representante, por força do artigo 571º do CC; d) E de facto o Município alegou e provou factos demonstrativos da culpa do lesado, como se pode ver pelo conteúdo dos itens 8 a 14 e 18 a 21 relativos à matéria de facto constantes da base instrutória, acima transcritos nestes itens, e ainda o que consta do Auto de Participação de Acidente de Viação que se dão aqui por reproduzidos.

e) Pelo que se demonstra que a sentença é nula e de nenhum efeito, além do mais, em virtude de os fundamentos factuais estarem em oposição com a decisão e violar a al. c) do nº 1 do artigo 668º do CPC; f) Daqueles conteúdos resulta à evidência que o acidente foi consequência de uma opção tomada pelo condutor do veículo com a matrícula ...BG-..., que deixou de circular pelo lado direito da via e passou a circular pelo centro da mesma, sem que tivesse qualquer impedimento de circular pelo seu lado direito, que se encontrava livre, com uma velocidade exagerada para as condições da via e do tempo que fazia.

g) Com esta atitude o condutor daquela viatura, violou, por vontade própria, além do mais os artigos 13º e 24º, nº 1 do Código da Estrada.

h) Pois ao voluntariamente circular fora do lado direito da via, sem nada que o justificasse, e por esse facto foi embater numa tampa de saneamento que estava elevada, provocando os danos apurados.

i) Perante esta realidade, provada pelo Município fica demonstrado o ilícito comportamento do condutor e com ele ficou ilidida a culpa do Município, além do mais porque esta se presumia e provada a culpa da lesada.

j) Pelo que o Tribunal fez errada interpretação na aplicação das normas, pois por força dos artigos 570º, 571º e 572º a responsabilidade pelo acidente cabe na sua totalidade à lesada e por isso, o Município não está obrigado a indemnizar, e responder pelo direito de regresso em relação à seguradora.

Por todas estas razões deve ser dado provimento ao recurso e, o Município ser absolvido do pedido e em consequência revogada a condenação, que foi decretada nestes autos, ficando este totalmente afastado de tal condenação, assim como nas custas.

PORQUE ASSIM SE FARÁ JUSTIÇA”.

O Recorrido contra-alegou, em termos que se dão por reproduzidos, e, tendo elaborado conclusões, aqui se vertem: “1ª Contrariamente ao que sufraga o recorrente não se verifica erro de julgamento, o recorrente “ensaia” a ideia de querer ver modificada a decisão e matéria de facto, mas a verdade é que nesta capítulo e intenção não cumpre o ónus que lhe incumbia de especificar os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e os concretos meios de prova que porventura impusessem nos seus pontos de vista, decisão de facto diversa daquela que vem assente e que é de todo imodificável.

  1. O recorrente nem de longe nem de perto alegou e provou factos demonstrativos da culpa do lesado, e subsiste perante a matéria de facto dada por demonstrada, a presunção da sua culpa, presunção essa que não elidiu.

  2. Não se verifica, na sentença, qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão, na medida em que existe perfeita consonância entre os fundamentos que são apontados na sentença e a lógica e consequente decisão, e existe plena perfeição no silogismo judiciário que foi tirado, valendo por dizer que a decisão / conclusão é o corolário lógico das premissas / fundamentos invocados em sede de alicerce subsuntivo.

  3. A única e exclusiva causa da ocorrência reside no facto do tampo e aro se encontrarem desalojados da sua loca natural que é a conduta do saneamento onde deveriam estar solidamente grudados, e a obrigação estradal plasmada no artº 13º do CE é, no caso, totalmente despicienda.

5º A douta sentença fez correcta interpretação e aplicação do que vem disposto nos artigos 684,3 e 689/1 do CPC; 264º, 511º, 513º, 653º e 659º do CPC; artigo 571º do CC; 668/1 alínea c) do CPC ; 13º e 14º no 1 do CE; artigos 570º, 571º e 572º todos do CC.

São termos em que e nos melhores de direito deve o recurso vir a ser julgado totalmente improcedente e não provado devendo manter-se na íntegra e sem qualquer alteração ou modificação a douta sentença.

Só assim decidindo se fará justiça!”.

O Ministério Público, notificado ao abrigo do disposto no artº 146º, nº 1, do CPTA, pronunciou-se fundamentadamente, em termos que se dão por reproduzidos, pelo não provimento do recurso.

As questões suscitadas(2) e a decidir(3), se a tal nada obstar, resumem-se em determinar se a decisão recorrida errou no julgamento dos pressupostos de facto e nos de direito, nos planos que adiante pontualmente se identificarão.

Cumpre decidir.

II – FUNDAMENTAÇÃO II.1 – OS FACTOS ASSENTES NA DECISÃO RECORRIDA A matéria de facto fixada pela instância a quo é a seguinte: A – Com data de 21 de Outubro de 2009, foi elaborado pelo Posto da Guarda Nacional Republicana de Vila Nova de Poiares um auto de “participação de acidente de viação”, registado sob o n.º 65/09 (Doc. n.º 2 anexo à P.I.).

Dos depoimentos prestados na audiência de discussão e julgamento resultaram provados os seguintes factos: 1.

A Autora no exercício da sua actividade seguradora celebrou com ISPF, residente em …, um contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel, titulado pela apólice n.º 751...., tendo por objecto o veículo automóvel ligeiro, misto, marca Citroen, modelo Berlingo, 1,9 D 600 Club, com a matrícula ...BG-...; 2. O contrato referido no ponto anterior mantinha a sua validade e eficácia em 21/10/2009; 3. O referido contrato de seguro abrangia também a cobertura de Danos Próprios emergentes de choque, colisão ou capotamento; 4. Os danos próprios cobertos estavam limitados ao montante de € 7.794,00; 5. A propriedade do veículo encontrava-se registada a favor da referida ISPF que detinha a sua direcção efectiva, circulando com ele, detendo as respectivas chaves, introduzia combustível, ordenava consertos e revisões, pagando os respectivos preços, prémios de seguro e impostos; 6. No dia 21 de Outubro de 2009, pelas 03h45m o veículo seguro circulava no arruamento da zona industrial de Vila Nova de Poiares, no sentido Cabouco – Entroncamento, ou seja, Risca Silva-Entroncamento de Poiares; 7. No referido dia e hora o veículo referido nos pontos anteriores era conduzido por CMSM; 8. O tempo estava chuvoso e o piso encontrava-se molhado; 9. O condutor apercebeu-se da existência de algo na estrada; 10. Para se desviar tentou passar com o meio da viatura sobre o objecto; 11. No momento em que passou sobre o objecto o condutor apercebeu-se de uma pancada na parte inferior do veículo; 12. O condutor não conseguiu controlar a direcção do veículo; 13. O Citroen foi embater contra o muro de vedação do parque da Empresa Poiarense de Madeiras, situado do lado esquerdo, tendo em conta o sentido de marcha do veículo; 14. Depois de embater no muro o Citroen fez um “pião” imobilizando-se no meio da rua; 15. O objecto solto na via era uma tampa de saneamento; 16. A referida tampa encontrava-se elevada em relação ao piso da estrada; 17. Em consequência da elevação danificou o “carter” do veículo, vincando-o; 18. Eram visíveis vestígios de óleo na via, no local do embate, no dia 25 seguinte; 19. A roda traseira do lado direito do veículo foi arrancada; 20.

A caixa de saneamento está instalada na localização assinalada no documento referido na matéria assente; 21. O veículo podia passar em qualquer dos sentidos, pelo lado direito da via, sem necessidade de passar por cima das tampas de saneamento; 22. A tampa de saneamento e o respectivo aro ficaram soltos a cerca de 2,5 metros da berma direita, atento o sentido de marcha do veículo; 23. O embate do veículo danificou o muro e da rede de vedação, da Empresa Poiarense de Madeiras; 24. O Muro era feito de blocos de cimento, com a altura de 0,80 m e a rede tinha um metro de altura; 25. A Autora pagou à Empresa Poiarense de Madeiras a quantia de € 1.080,00, valor da reparação do muro; 26. Para reparar o veículo, gastava-se em mão de obra de chaparia e mecânica € 1.657,50; 27. Em mão de obra de pintura € 540,00; 28. Em material de pintura € 550,00; 29. Em Peças e material diverso € 5.000,00; 30. Aos valores supra referidos acrescia ainda IVA à taxa de 20%; 31. O veículo foi avaliado na quantia de € 7.153,00; 32. Ao abrigo da cobertura facultativa de danos próprios a...

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