Acórdão nº 03134/15.3BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 20 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelJoaquim Cruzeiro
Data da Resolução20 de Maio de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam no Tribunal Central Administrativo Norte: 1 – RELATÓRIO VABRF vem interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, datada de 30 de Dezembro de 2015, e que indeferiu a providência cautelar intentada contra a Junta de Freguesia de Gondufe e a Fábrica da I... de S. MG, tendo como contra-interessado JCA – Construção Unipessoal Lda, e onde era requerido: “…que julgue procedente por provada a presente providência cautelar e, em consequência decrete o embargo das obras de construção da supradita casa Mortuária e seus anexos”… Em alegações o recorrente concluiu assim: 1. Na presente providência cautelar, vem requerido o Embargo judicial de obra nova, obra esta consubstanciada nos trabalhos de recuperação do rés-do-chão, do edifício sito na Rua de São MG, e tendente à sua utilização como Casa Mortuária.

  1. Portanto, a questão a decidir passa por aferir da verificação dos requisitos legais de que dependerá o decretamento do embargo judicial de obra nova.

  2. A providência cautelar consubstanciada no embargo de obra nova mostra-se, em abstracto, legalmente admissível no domínio do contencioso administrativo, como resulta aliás expressamente do disposto no art.º 112º, n.º2, do CPTA, do qual resulta a possibilidade de o interessado lançar mão das providências especificadas no Código de Processo Civil.

  3. O embargo da obra nova constitui justamente umas das providências cautelares especificadas no CPC, havendo de convocar a disciplina aí constante de molde a aferir dos pressupostos do decretamento da providência (art.º 1º do CPTA).

  4. Nos termos do disposto no art.º 397º, n.º1, do Código de Processo Civil, “Aquele que se julgue ofendido no seu direito de propriedade, singular ou comum, em qualquer outro direito real ou pessoal de gozo ou na sua posse, em consequência de obra, trabalho ou serviço novo que lhe cause ou ameace causar prejuízo, pode requerer, dentro de 30 dias a contar do conhecimento do facto, que a obra, trabalho ou serviço novo que lhe cause ou ameace causar prejuízo, pode requerer, dentro de 30 dias a contar do conhecimento do facto, que a obra, trabalho ou serviço seja mandado suspender imediatamente”.

  5. Como refere António Santos Abrantes Geraldes, “Temas da Reforma do Processo Civil, IV Volume”, 3ª edição revista e actualizada, Almedina, Coimbra, Maio, de 2006, pág. 242, “o embargo de obra nova é uma providência cautelar com funções preventivas ou conservatórias, na medida em que através da mesma se pretende obter a estabilização da situação de facto, até que seja resolvido o litígio principal”.

  6. No que concerne aos requisitos, tendo em conta o estatuído no art.º 397º, n.º1, do CPC, já transcrito, constituem requisitos para o decretamento da providência: (i) que o requerente seja titular de um direito de propriedade, de qualquer outro direito real ou pessoal de gozo ou de posse; (ii) que o requerente se julgue ofendido no seu direito em consequência de obra, trabalho ou serviço novo; (iii) que a obra, trabalho ou serviço novo cause ou possa causar prejuízos ao requerente.

  7. Em relação ao primeiro dos requisitos, refere o Cons. Abrantes Geraldes (Aut. Cit., pág. 250), “… o embargo de obra nova tem como objectivo defender o interessado quando este seja prejudicado no seu património, senão protegê-lo de todos os efeitos reflexos causados através da ofensa dos seus direitos materiais. Pode ser requerido quando tenha sido afectado o direito de propriedade, outro real pessoal de gozo ou a posse formal, já não quando os actos, mesmo que ilícitos, apenas afectem o interessado na esfera dos seus direitos de personalidade”.

  8. Relativamente ao segundo dos pressupostos enunciados, o decretamento do embargo pressupõe que a obra ou os trabalhos em curso já tenham ofendido, o direito a que o Requerente se arroga, não bastando, ao contrário do que é regra no procedimento cautelar comum, a existência de um justo receio de ocorrência de lesão dos direitos do requerente (Idem, pág. 249).

  9. Finalmente, cumpre também evidenciar – acompanhado, mais uma vez, o Insigne Autor – que o embargado deverá ser dirigido contra uma obra nova, somente podendo ser embargadas “… obras que impliquem uma modificação substancial de uma coisa e se não traduzam em meras modificações superficiais ou na mera reconstrução de uma situação preexistente”.

  10. Feito que está o enquadramento jurídico-dogmático de que depende a apreciação da retensão formulado pelo Requerente, cumpre regressar ao concreto da situação trazida a juízo pelas partes, em ordem a dirimir o presente conflito.

  11. Analisado o Requerimento inicial, constata-se que, em parte substancial do articulado, o Requerente procura fundar a procedência do embargo nos eventuais efeitos que poderão advir da utilização do prédio em referência nos autos como Casa Mortuária, utilização esta contra a qual se tem insurgido o Requerente.

  12. Ora, como foi posto em evidência, o embargo de obra nova, enquanto providência cautelar de natureza conservatória, tem como pressuposto indissociável, a existência de uma lesão (ou ameaça de lesão) à esfera jurídica do Requerente, lesão essa que terá de radicar nos próprios trabalhos da obra, e cuja paralisação é solicitada ao Tribunal, não se situando dentro do perímetro da relevância jurídica eventuais prejuízos ou lesões que possam vir a ocorrer em resultado da posterior e concreta utilização que vier a ser dada ao imóvel, após a conclusão dos respectivos trabalhos de obra.

  13. Portanto, tudo quanto resulta alegado pelo Requerente relativamente a hipotéticos prejuízos, incómodos e transtornos emergentes do espaço em referência como casa mortuária, mostra-se totalmente irrelevante para efeitos do decretamento do embargo, e por inexistir qualquer correlação entre os trabalhos de obra e a eventual utilização que venha a ser dada ao espaço sob intervenção.

  14. Feita esta delimitação, restará, então, com relevância para análise, o indagar dos eventuais prejuízos para a esfera jurídica do Requerente (recorde-se que somente será relevante o que tenha sido alegado pelo Requerente relativamente à sua própria esfera jurídica, e posto não ter este legitimidade para actuar em nome de terceiros que, porventura, se possam sentir lesados com a construção).

  15. Neste enfoque, e percorrido todo o discurso vertido do requerimento inicial, constata-se que o Requerente não reside em local que se situe nas imediações do local onde as obras foram iniciadas, sendo que as obras se encontram a ser realizadas num edifício independente das demais construções existente nas imediações, não se mostrando consubstanciada qualquer violação da concreta esfera jurídica do Requerente que porventura possa resultar dos trabalhos em curso.

  16. Por outro lado, cumpre também evidenciar que, dentro do conceito de novidade da obra ficou explicitado, os trabalhos em causa nos presentes autos não se subsumem ao conceito de obra nova passível de legitimar a procedência do presente embargo.

  17. Efectivamente, e como resulta do descrito dos trabalhos a realizar, está em causa uma mera recuperação do rés-do-chão do edifício conhecido como residência paroquial, trabalhos consubstanciados na limpeza e reparação de paredes exteriores, como reparação e substituição das caixilharias existentes, procedendo-se também à execução de alguma paredes interiores de compartimentação, bem como à recuperação e melhoria dos interiores, por forma a adequá-los à finalidade a que tal espaço se destina, tratando-se assim de trabalhos de simples adaptação e melhoria do existente (e limitadas à uma fracção do edifício em causa – o seu rés-do-chão), trabalhos estes que pela sua natureza e finalidade, não apresentam a novidade indispensável que os permitam qualificar como uma verdadeira obra nova passível de legitimar uma reacção cautelar, por via do embargo de obra nova.

  18. Pelo exposto, e atenta a falta de fundamentos juridicamente atendíveis que permitam a procedência da pretensão do Requerente, restará, então, julgar totalmente improcedente a presente providência cautelar, o que aqui vai decidido.

  19. O Recorrente entende que se encontram reunidos os requisitos para o embargo judicial de obra nova; 21. Determina o CPC, aqui aplicável por força do CPTA que são necessários 3 requisitos para que seja decretada a providência Cautelar de embargo da obra nova; 22.

    i) O início de uma obra no sentido lato (“obra trabalho ou serviço novo”) ii) Ofensa dum direito real ou pessoal, de gozo, ou da posse, em consequência dessa obra.

    iii) O Prejuízo ou ameaça de prejuízo.

  20. O Exmo. Juiz do Tribunal “A Quo” fundamentou a sua decisão quanto ao requisito n.º 2.º e n.º 3.º mencionado no artigo 22.º deste articulado, em síntese no seguinte: “Feita esta delimitação, restará, então, com relevância para análise, o indagar dos eventuais prejuízos para a esfera jurídica do Requerente (recorde-se que somente será relevante o que tenha sido alegado pelo Requerente relativamente à sua própria esfera jurídica, e posto não ter este legitimidade para actuar em nome de terceiros que, porventura, se possam sentir lesados com a construção).

    Neste enfoque, e percorrido todo o discurso vertido do requerimento inicial, constata-se que o Requerente não reside em local que se situe nas imediações do local onde as obras foram iniciadas, sendo que as obras se encontram a ser realizadas num edifício independente das demais construções existente nas imediações, não se mostrando consubstanciada qualquer violação da concreta esfera jurídica do Requerente que porventura possa resultar dos trabalhos em...

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