Acórdão nº 00937/15.2BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 12 de Maio de 2016
Magistrado Responsável | Vital Lopes |
Data da Resolução | 12 de Maio de 2016 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE 1 – RELATÓRIO J…, recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra que julgou improcedente a reclamação judicial do despacho de não admissão do crédito reclamado na execução fiscal n.º3050 200701008366 e apensos, que corre contra a sociedade “C…, Lda.”.
Com a interposição do recurso, o Recorrente apresentou alegações e formulou as seguintes «Conclusões: 1. O reclamante/credor e aqui ora Recorrente, nos presentes autos de execução fiscal, reclamou dentro do prazo legal os seus créditos.
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Fê – lo explicitando a factualidade de onde tais créditos eram provenientes.
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Constatou e provou que os créditos por si reclamados se traduziam em créditos laborais.
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O Reclamante/Recorrente alegou que clarificou e provou, em sede de reclamação de créditos, a proveniência dos créditos reclamados, porquanto apresentou certidão judicial comprovativa dessa natureza e do montante em dívida, pelo que se demonstra provado que goza de privilégio imobiliário especial, conforme o disposto no artigo 333.º, n.º 1 do CT.
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Provou, desse modo, ter legitimidade para reclamar o crédito no âmbito dos presentes autos.
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Decorre do artigo 333.º, n.º 1, alínea b) do CT, com a epígrafe «créditos reclamados», que os créditos dos trabalhadores emergentes de contrato de trabalho gozam de «privilégio imobiliário especial sobre o bem imóvel do empregador no qual o trabalhador presta a sua atividade».
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Assim, o privilégio imobiliário especial em causa apenas pode ser atribuído a créditos que tenham natureza laboral, ou seja, emergentes de uma relação laboral, como se dá in casu.
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O Recorrente fez prova de que prestou a sua atividade laboral num dos imóveis da executada, que o dito imóvel, objeto de penhora/venda, integra o património da Sociedade executada e que aquele se encontrava afeto à sua atividade empresarial, i.é., integrava a mesma atividade da sociedade.
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Da factualidade assente dos autos, dúvidas não existem que o Recorrente tinha uma relação contratual com a Sociedade executada desde 27 de setembro de 1995, como se infere do contrato de trabalho sem termo aludido nos factos provados.
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Deste contrato de trabalho resulta que o Recorrente foi admitido ao serviço da executada para desempenhar funções de 3.º Caixeiro, nas instalações da executada sita no Largo da Portagem, n.º 27, Coimbra e ainda nos locais onde o primeiro outorgante tenha trabalhos a efetuar, para os quais determine a intervenção do segundo".
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O Recorrente alega que, "quer o imóvel penhorado, quer o imóvel sito no Largo da Portagem, faziam parte do estabelecimento industrial da executada, de forma una e indivisível, onde era exercida a sua atividade produtiva, concentrando nesses espaços o local onde os trabalhadores prestavam a sua atividade".
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Tal declaração é de justificação perfeitamente aceitável tendo em conta que a fração penhorada é uma loja no r/c, destinada ao comércio da executada e que sempre existia a possibilidade de o recorrente para aí ser transferido, de acordo com o contrato de trabalho.
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Por outro lado, dúvidas não subsistem em como o imóvel em causa integrava o património da sociedade, dado que foi por ela adquirido, através de contrato de compra e venda regularmente celebrado, encontrando-se registado a seu favor na Conservatória do Registo Predial.
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Para além de tal imóvel integrar o património da Sociedade executada, também se encontrava afeto à atividade empresarial desta, não tendo qualquer outra ou distinta afetação.
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O Recorrente a partir de Dezembro de 1998 trabalhou sempre nas instalações da entidade empregadora, sitas no imóvel alvo da execução fiscal em apreço até à cessação da relação laboral.
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Por fim, conforme bem se refere no douto Acórdão proferido pelo STJ datado de 11/09/2012 e acima já citado: “Sob a invocação do princípio constitucional da igualdade, – art. 13ºda C.R. – não podem desproteger-se os trabalhadores que perdem os seus salários em caso de falência da entidade empregadora, sob pena de se conceder um injustificado “privilégio” a entidades também afetadas pelo colapso da empresa, mas seguramente com perspetivas menos severas, o que afrontaria o princípio da discriminação positiva. Quando existe uma situação socialmente dramática, como o desemprego e perda de remunerações salariais, sobretudo as vencidas, seria intolerável, num Estado de Direito, não se dotar de garantia sólida e exequível o direito à retribuição salarial, tutelando-o com sólida armadura jurídica.” 17. Acresce que no caso sub iudice estamos a tratar de salários e subsídios de Natal e de férias devidos ao Recorrente, ou seja, de direitos adquiridos na sua esfera jurídica e cuja preterição se revela atentatória dos bons costumes e do direito constitucionalmente vigente no nosso Ordenamento Jurídico.
TERMOS EM QUE deve o presente crédito laboral reclamado pelo recorrente ser declarado de natureza laboral e gozando de privilégio imobiliário especial, conforme estatuído no artigo 333º, nº1, alin. b) do C. Trabalho, devendo a sentença a quo ser revogada e substituída por outra que proceda à requalificação do crédito vencido, liquido e exigível, à sua graduação e inclusão como privilegiado na lista de créditos reconhecidos já constante dos autos, julgando procedente o presente recurso e fazendo – se, assim, a tão costumada JUSTIÇA!».
O recurso foi admitido como subida imediata e efeito devolutivo.
A Recorrida não apresentou contra-alegações.
O Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu mui douto e sustentado parecer concluindo que não deve ser dado provimento ao recurso.
Com dispensa dos vistos legais (artigos 36.º, n.º2, do Código de Processo dos Tribunais Administrativos e 657.º, n.º4, do Código de Processo Civil), cumpre agora apreciar e decidir, visto que nada a tal obsta.
2 – DO OBJECTO DO RECURSO Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões das alegações apresentadas pelo Recorrente, a questão que importa conhecer reconduz-se a saber se a sentença incorreu em erro de julgamento ao concluir que o reclamante não fez prova dos pressupostos legais de que depende o reconhecimento do privilégio creditório a que alude o art.º333.º, n.º1 alínea b), do Código do Trabalho.
3 – DA MATÉRIA DE FACTO Em sede factual, deixou-se consignado na sentença recorrida: «Com interesse para a decisão, julgo provados os seguintes factos: 1.
A sociedade por quotas «C…, Lda» tem sede na Rua…, 3000 Coimbra e, como objeto social, a...
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