Acórdão nº 00146/13.5BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 23 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelJoaquim Cruzeiro
Data da Resolução23 de Setembro de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1 – RELATÓRIO JSA vem interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, datada de 9 de Abril de 2014, que julgou improcedente a acção administrativa especial interposta contra a Direcção Regional de Agricultura e Pescas do Centro deve ser entendida como interposta contra o actual JSA, nos termos do artigo 10º, n.º 4, do CPTA, e onde era solicitado que devia ser anulado o acto administrativo praticado e condenado à prática de acto conforme a legalidade.

Em alegações o recorrente concluiu assim: I. Veio julgada improcedente a acção administrativa especial intentada pelo aqui recorrente indeferindo-se os argumentos invocados, designadamente, a violação do direito de propriedade e da reserva da intimidade da vida privada; a violação do direito de demarcação do A.; a violação do caso julgado e a litispendência; a invocada inexistência de lesão para a actividade agrícola; a violação do Regime da Reserva Agrícola Nacional – erro nos pressupostos de facto; o vício de forma por falta ou obscuridade de fundamentação; e o invocado Direito de necessidade e o estado de necessidade desculpante; II. O acto administrativo, ora em crise, consubstancia-se no facto de, alegadamente, o aqui A. ter procedido à “construção de muro em terrenos de Reserva Agrícola Nacional, sem licenciamento ou comunicação prévia”.

III. A Constituição da República Portuguesa estatui, no seu capítulo dedicado aos Direitos, Liberdade e garantias pessoais, art.º 26.º, que a todos é reconhecido o direito à reserva da intimidade da vida privada; IV. Estatuindo, ainda, no seu art.º 62.º, o Direito à propriedade privada.

V. O que o A. pretendeu com a construção do muro divisório foi, não mais que, proteger o seu Direito à reserva de intimidade e Direito de propriedade, evitando que ambos fossem devassados pelo proprietário do terreno contiguo, como melhor se explicará infra.

VI. O Código Civil, nos seus artigos 1353.º a 1355.º, é claro ao estabelecer que é direito do proprietário demarcar a sua propriedade, podendo obrigar os donos dos prédios confinantes a concorrerem para a demarcação das estremas entre o seu prédio e os deles; VII. O A., respeitando os limites, quer da sua propriedade, quer dos prédios confinantes, procedeu à demarcação dos limites das propriedades; VIII. Por outro lado, a decisão administrativa admite claramente que tendo sido acusado da infracção nos termos dos artigos 24.º e 39.º do Decreto-Lei 73/2011 de 31 de Março – utilização não agrícola de solos integrados na RAN sem comunicação – o A. foi da mesma ABSOLVIDO.

IX. Ora, tendo já ocorrido o trânsito em julgado da decisão final no processo de contra-ordenação n.º 156/2010, assim se fazendo caso julgado e; X. Assim, não existe, nem foi condenado, pela prática de qualquer contra-ordenação; XI.

Fazendo subsumir a pretendida ordem de reposição à prática de uma infracção no âmbito da qual foi absolvido torna-a manifestamente nula por ilegal e contra legem! XII. No caso aplica-se o princípio “non bis in idem”, pelo que não poderão tais factos serem duplamente submetidos a apreciação judicial.

XIII. Assim, verifica-se que os mesmos factos, já foram julgados em sede de processo contra-ordenacional e foi absolvido, o que constitui excepção que determina a nulidade da decisão de reposição.

XIV. Sem prescindir, verifica-se que a obra em causa nos presentes autos reveste, nos termos do disposto no novo Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, em vigor desde Março de 2008, o carácter de obra de escassa relevância urbanística.

XV. Ora, as obras em causa são, ÚNICA E EXCLUSIVAMENTE, muros de protecção e vedação do prédio do ora recorrente, que não atingem na globalidade da sua extensão a altura de 1,20 metros, nem confinam com a via pública; XVI. Estas aludidas obras tratam-se de meros arranjos exteriores dentro dos limites legalmente fixados que beneficiam da isenção de licença camarária.

XVII. Na verdade, são muros de vedação para efeitos de protecção da propriedade, que caso contrário veria em perigo a sua própria propriedade, colocando em risco a sua segurança e do seu património.

XVIII. Pelo que, considerando-se as obras em causa como incluídas no conceito de obras de escassa relevância urbanística, nunca se poderá verificar qualquer violação no âmbito do decreto-Lei 73/2011 de 31 de Março.

XIX. Fazendo subsumir a pretendida ordem de reposição à prática de uma infracção no âmbito da qual foi absolvido torna-a manifestamente nula por ilegal e contra legem! XX. Por outro lado, quanto à violação do Regime da Reserva Agrícola Nacional – erro nos pressupostos de facto - a decisão sustenta-se em PSEUDO-considerações trazidas pela R., quando deveria estar suportada por elementos inexistentes no processo, como testes à impermeabilização dos solos, à real influência dos muros no escoamento das Àguas, etc.; XXI. Sustentar uma decisão em um só adverbio - “naturalmente” – vai contra todos os canones jurídico legais postulados pela CRP, art.º 205.º, n.º 1.

XXII. Acresce que, a decisão em sede administrativa vem justificada pelo facto de a alegada construção se inserir numa zona que estará em Reserva Agrícola Nacional.

XXIII. Ora, o A. DESCONHECIA e DESCONHECE tal facto sendo que este tem informação de que tal imóvel estará integrado numa área de expansão urbana e se não está incluída no PDM (Plano Director Municipal), existe a legítima expectativa de o vir a ser, já que ali têm implantada a sua casa e o vizinho também está a construir um imóvel E MUROS.

XXIV. Existindo ainda a informação de que tal imóvel estará integrado numa área de expansão urbana e se não está incluída no PDM (Plano Director Municipal), existe a legítima expectativa de o vir a ser.

XXV. No mesmo terreno está implantado um imóvel sua propriedade, pelo que mais não pretende o A. do que proteger com muros a sua propriedade.

XXVI. Pensava, e pensa, agir legitimamente e sem qualquer restrição, sendo que a obra em causa, quer a nível paisagístico, urbanístico, ecológico e ambiental em nada afecta a zona em causa.

XXVII. Os muros pretendidos demolira, não provocam qualquer prejuízo, nem danos, quer à envolvente paisagística, quer aos vizinhos, quer à via pública, como aliás resulta dos factos provados em sede de processo contra-ordenacional.

XXVIII. Mais, os terrenos ora limitados pelo muro constituem não mais que o quintal da casa dos seus proprietários, encontrando-se funcionalmente ligado à mesma, para consumo exclusivo dos mesmos e não verdadeiros terrenos agrícolas de produção.

XXIX. Mais se constata que confrontando com esse mesmo terreno está o dos seus vizinhos, que aí construíram uma casa e os respectivos muros, em altura ainda superior à do ora recorrente.

XXX. De facto, ao contrário do que vem referido NÃO EXISTE nem a impermeabilização do solo, já que o terreno mantém a sua superfície cultivável, nem nenhum material foi colocado sobre o mesmo; XXXI. As obras não reduzem a superfície do solo disponível, já que com este ou outro tipo de vedação (que vem sugerido), o imóvel mantém a mesma superfície cultivável, já que os bordos (correspondentes à implantação dos muros de tamanho inferior a 0,20 m), não são áreas cultuáveis.

XXXII. Do mesmo modo, não existe qualquer prejudicialidade na drenagem natural dos solos, acumulação de águas, nem infertilização e destruição dos recursos naturais.

XXXIII. E, ainda que existisse - QUE NÃO EXISTE - qualquer eventual dificuldade de drenagem de águas, a mesma poderá ser colmatada apenas com a abertura de furos que permitam tal drenagem; XXXIV. Sem que tal represente a necessidade de destruição dos muros.

XXXV. Sempre sem prescindir, a decisão administrativa padece de insuficiência na fundamentação, na medida em que conceitos tais como “impermeabilização do solo; redução da superfície do solo disponível; prejudicialidade na drenagem natural dos solos, acumulação de águas; infertilização e destruição dos recursos naturais” são meramente teóricos; XXXVI. não é alegado, nem provado, a existência ou verificação de quaisquer factos que provem que tal tenha sucedido, porque não sucederam.

XXXVII. Neste sentido, não resulta da decisão de reposição do solo que tenham sido justificados os factos nem as circunstâncias que consubstanciam a infracção, a necessidade de reposição ou a verificação daqueles conceitos.

XXXVIII. A simples menção daqueles conceitos, sem a alegação da forma ou em que medida ficaram os mesmos prejudicados não pode, por si só, configurar, sem mais, a fundamentação da decisão da pretendida reposição.

XXXIX.

Assim, fica viciada a decisão que ora se coloca em crise por falta de fundamentação da mesma, fundamentação essa que é imposto por lei, pelo que enferma de nulidade, que se arguiu e legitimada a presente acção.

XL. Finalmente, constituiu entendimento do Tribunal “a quo” que o invocado direito de necessidade ou estado de necessidade desculpante não afecta a validade do acto impugnado.

XLI. Contudo não pode ser esse o entendimento sufragado sob pena de se retirar todo e qualquer sentido prático aos institutos do Direito/Estado de necessidade.

XLII. A actuação do recorrente insere-se num contexto EXCLUIDOR DA CULPA no ilícito eventualmente praticado, no alcance do que dispõe o art.º 34.º do CPenal, já que apenas pretendeu – E CONSEGUIU – afastar o perigo que se propagava sobre a sua propriedade, ao mesmo tempo que se reúnem os pressupostos cumulativos da actuação da norma, tal como a circunstância de o impugnante tentar proteger interesses próprios, existindo óbvia superioridade da defesa da sua propriedade, em face da violação das disposições legais infringidas, por outro, e, finalmente, ser passível de imposição à Câmara Municipal o sacrifício desta entidade valor em face da salvaguarda daqueles superiores direitos. Assim, XLIII. o recorrente tem aí instalado o seu domicílio, e as suas culturas; XLIV. Sendo que o vizinho confinante se...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT