Acórdão nº 00796/08.1BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 29 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelPaula Moura Teixeira
Data da Resolução29 de Setembro de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO Os Recorrentes J… e M…, melhor identificados nestes autos, interpuseram recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga de 15.01.2008, em que julgou improcedente a impugnação judicial da liquidação de Imposto de Selo n° 303787 e 303788, no valor global de € 5 345,00.

Os Recorrentes não se conformaram com a decisão tendo interposto o presente recurso formularam nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem: “(...) I. Aos recorrentes, como a todos quantos necessitam de efectivar registo de prédios omissos na Conservatória, foi imposto, por condicionalismos e circunstâncias exógenas, a obrigação de levar a registo o seu direito de propriedade sobre os imóveis identificados porque, embora não exista uma obrigatoriedade directa do registo predial, o artigo 9º do Código respectivo, no seu nº 1, impõe uma obrigatoriedade indirecta do mesmo, dado que a celebração de determinados negócios jurídicos, por título formal válido, só é possível se se comprovar deter registo a favor.

  1. Em muitos casos os actuais proprietários dos prédios não dispõem de título que prove o seu direito, ou o direito de outrem na cadeia de transmissões intermédias, a partir do último titular inscrito, sendo certo que estas dificuldades de efectivação de registo abrangem praticamente todo o mundo rural português III. Possibilitando aos cidadãos a efectivação de registo, nas situações de inexistência de títulos ou meios de os comprovar, não só para as finalidades de ordem pública consagradas no artigo 1º do C. Reg Predial, mas para permitir a prática de actos relativos aos imóveis de que são proprietários, a lei veio introduzir um expediente que consiste no instituto da justificação de posse.

  2. Os recorrentes, como todo e qualquer cidadão em idênticas situações, têm o direito de levar a registo os prédios de que são proprietários, para todos os efeitos públicos que essa situação jurídica permite e impõe.

  3. Não podem, por razões tributárias gravosas, desproporcionadas e injustas face a situações similares (como o da aquisição de habitação permanente que beneficia de isenção de IMT ou redução dentro dos limites previstos no EBF) ser impedidos do exercício de um direito consagrado na lei, aliás anterior à agora e aqui em apreciação.

  4. As razões tributárias gravosas, como as que estão em causa, conduzem a denegação de justiça, violação do direito de acesso à justiça, incompreensível desproporção entre os que são donos sem título e os que adquirem habitação nova, ou entre os que necessitam do registo e os que dele podem prescindir.

  5. Há desproporção manifesta e discriminação clara entre os que são obrigados a efectivar registo por serem donos actuais e os que, por exemplo, podem beneficiar o falecimento de um anterior proprietário, situação em que com uma simples habilitação de herdeiros efectuam todos os registos necessários dos prédios omissos.

  6. Tudo conduz a considerar que, na tributação em apreço e em todas as idênticas manifesta-se, além do mais, evidente violação do princípio da justiça material.

  7. A tributação em imposto do selo, como a versada nos presentes autos, viola os princípios da proporcionalidade e da justiça material.

  8. A usucapião de que fala o CIS não pode contrariar o conceito, requisitos e princípios que estão, tradicional e enraizadamente, inseridos no ordenamento jurídico nacional: a usucapião é um modo originário de aquisição de direitos reais; pressupõe sempre um litígio, real ou aparente (uma contraposição de interesses jurídicos); é criada ou declarada apenas por decisão judicial; uma vez actuada, retroage ao momento do início da posse.

  9. A escritura de justificação de posse é meramente declarativa do direito, com vista ao recurso ao expediente previsto nos art.s 89º/1, do Cód. Notariado, e 116º/1, do Cód. Reg. Predial, é um acto de natureza probatória, que permite harmonizar a situação jurídica com a registral, não é constitutiva de direitos, na acepção civilista onde se insere o ramo dos direitos reais.

  10. De qualquer forma, uma vez actuada, a aquisição retroage à data do início da posse (art. 1317º/c e, como aplicação deste, art. 1722º/2b)).

  11. Retroagindo ao início da posse nunca poderia incidir qualquer imposto, atentas as regras aplicáveis da prescrição.

  12. Está a ser feita, e não pode sê-lo, uma leitura errada, porque centrada na mera literalidade, do artigo 1º, nº 3 – al. a), do artigo 2º, nº 2 –al. b) e do artigo 5º al. r), todos do CIS.

  13. A usucapião tal como é percebida na lei civil não é susceptível de incidência de imposto do selo, sob pena de se estar perante violação total do consagrado no artigo 11º da LGT, que impõe, no seu nº 2, que “sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer directamente da lei.” XVI. Os ramos do Direito Tributário de mais ampla tradição civilística, como os impostos sobre transmissão de bens e os impostos sobre as sucessões, estão assentes em conceitos do Direito privado.

  14. Não pode o poder jurisdicional remendar erros do legislador com recurso a interpretação enunciativa, extrapolando completamente os contornos desta e pactuando com falhas inultrapassáveis patentes na letra da lei e implícitos no seu espírito, sob pena de violação de princípios e regras constitucionais, consagradas nos artigos 103º e 104º da CRP.

  15. A leitura e interpretação do previsto nos artigos 1º/ nº 3 – al. a), 2º/ nº 2 –al. b) e 5º al. r), do CIS só podem ser feitas à luz do que ficou escrito no preâmbulo do diploma em aplicação: o imposto do selo incide, na falta de outro modelo mais apropriado e moderno de tributação, sobre as operações que, constituindo a revelação de rendimento ou riqueza, por qualquer motivo não sejam abrangidas or outro tipo de tributação...

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