Acórdão nº 00015/11.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Janeiro de 2018
Magistrado Responsável | Pedro Vergueiro |
Data da Resolução | 11 de Janeiro de 2018 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.
RELATÓRIO M... - Gestão Imobiliária, S.A.
, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 16-05-2017, que julgou improcedente a pretensão pela mesma deduzida na presente instância de IMPUGNAÇÃO, relacionada com a liquidação oficiosa de IRC de 2007, no valor total de € 66.288,99, pedindo a sua anulação.
Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 141-155), as seguintes conclusões que se reproduzem: “ (…) FALTA DE AUDIÇÃO PRÉVIA 1. A Impugnante foi notificada, no dia 21.06.2010 do Projecto de Relatório da Inspecção Tributária (PRIT), para exercer o direito de audição.
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Do PRIT resultava que a AT pretendia efectuar uma correcção à matéria tributável, com fundamento num documento que designou por “recibo em papel A-4”.
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Junto do PRIT não vinha qualquer cópia desse documento.
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A Impugnante, para cabal exercício do seu direito de defesa enviou, por fax, no dia 30.06.2010, um requerimento à Direcção Geral de Finanças solicitando o envio do tal documento e a prorrogação do prazo para a audição prévia.
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A AT face a tal requerimento, respondeu por carta datada de 7.07.2010, recebida em 8.07.2010, enviando cópia do documento e dando prazo até ao dia 9.07.2010 para exercer a audição prévia.
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A AT entendeu que a Impugnante tinha razão e que devia ter acesso ao documento para exercer a sua defesa.
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No entanto, deu-lhe apenas dois dias para apresentar a sua defesa.
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A AT teve um comportamento censurável e manifestamente contraditório, pois se por um lado dá razão à contribuinte quanto à necessidade do envio do documento, por outro retira-lhe qualquer hipótese de defesa ao conceder-lhe dois dias para exercer a audição prévia.
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Ora, com tal actuação a AT impediu a normal audição prévia da Impugnante o que corresponde, em sentido amplo, a uma verdadeira falta de audição prévia.
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Consequentemente, o procedimento de liquidação subsequente à acção inspectiva tributária, padece de vício de forma, por falta de audição prévia da impugnante, nos termos do art.60º/1 - a) e e) da Lei Geral Tributária e art.º 60.º do RCPIT.
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A actuação da AT não teve presente os princípios constitucionais da proporcionalidade, da justiça e da boa-fé, prescritos no art. 268º da Constituição da República.
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Consequentemente, na falta de audição prévia, imputável à AT, o relatório da inspecção e as subsequentes liquidações, ora impugnadas, devem ser anuladas, por preterição de formalidade essencial.
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Sendo certo que o art.º 60.º da LGT e o art.º 60.º do RCPIT com a interpretação que lhes foi dada na sentença recorrida violam os artigos 266.º e 268.º da Constituição, sendo por isso inconstitucionais, o que, desde já, se invoca.
RECURSO DO JULGAMENTO DA MATÉRIA DE FACTO COM REAPRECIAÇÃO DA PROVA GRAVADA 14. A decisão sobre a matéria de facto, foi incorreta no que diz respeito aos seguintes pontos: - Deve ser rectificado o ponto 16 da matéria de facto dada por provada na sentença; - Devem ser dados por provados os factos alegados no artigo 37.° da petição inicial, - bem como os factos constantes da alínea A) dos factos não provados na sentença.
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Impõe-se rectificar o ponto 16 da matéria de facto provada, fazendo constar do mesmo o dia 21.06.2010 em substituição do dia 16.06.2010, como data de notificação.
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Tal data para a notificação é assumida pela AT, conforme resulta do documento 5 junto com a petição inicial, onde a AT afirma “o contribuinte considera-se notificado do projecto de relatório no passado dia 21 Junho de 2010” e, também, na página 15 do Relatório de Inspecção Tributária, junto aos autos, a AT, volta a afirmar, “considerando-se notificado em 2010/06/21”.
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A matéria de facto constante do art.º 37.º da petição inicial deve ser dada por provada.
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Para prova desses factos a Impugnante juntou com a petição inicial os documentos 9, 10 e 11 e produziu prova testemunhal através do depoimento da testemunha C..., gravado através do sistema integrado de gravação digital disponível na aplicação informática em uso no tribunal, de 00:19:00 a 00:43:30.
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Ora da análise daqueles documentos e do depoimento da testemunha resulta que o cheque recebido pela “G..., Lda” foi por esta endossado à “F... - SGPS, S.A.”, devendo tais factos ser dados por provados.
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Os factos constantes da alínea A) da matéria de facto dada por não provada na sentença deveriam ter sido dados por provados.
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Face aos documentos 9, 10 e 11 juntos da petição inicial e ao depoimento da testemunha C..., gravado através do sistema integrado de gravação digital disponível na aplicação informática em uso no tribunal, de 00:19:00 a 00:43:30, deve ser dado por provado que aquele cheque foi endossado pela “G…, Lda” à “F..., SGPS, S.A.” para saldar créditos que esta última detinha sobre aquela.
DECISÃO DE DIREITO 22. Mesmo que se entenda não alterar a decisão da matéria de facto, a decisão de fundo terá, inevitavelmente, que ser outra.
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Está cabalmente provado nos autos que o montante de € 248.900,00 não foi recebido pela Impugnante.
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Aquele montante foi pago à “G..., Lda, que passou a respectiva factura e recibo, lançando esse proveito na sua contabilidade (Cf. os pontos 9, 10, 13, 14 da matéria de facto provada).
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A AT nenhuma prova faz para demonstrar que assim não foi, limitando-se a tributar por “presunção”, assente em juízos conclusivos e não sustentada em factos.
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A impugnante goza da presunção de veracidade da sua contabilidade e das declarações fiscais apresentadas à AT (art.° 75.° da LGT).
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Se a AT pretendia colocar em causa as declarações da Impugnante, cabia-lhe o ónus de provar os factos constitutivos do direito a tributar e consequentemente a exigir o pagamento da liquidação adicional (art.º 74.º da LGT).
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Ora, a AT nenhuma prova produziu nestes autos, limitando-se a juntar o relatório de inspecção.
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A Impugnante provou que não recebeu aquela quantia, mas mesmo que assim não fosse, da prova produzida nestes autos resultaria, no mínimo, fundada dúvida sobre a existência e quantificação dos factos tributários alegados pela AT no aludido relatório.
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Assim sendo, a decisão sempre teria que ser favorável à impugnante, conforme preceitua o n.º 1 do art.º 100.º do CPPT.
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Sendo certo que a liquidação impugnada consubstancia ostensivamente uma dupla tributação do recebimento daquela quantia, uma vez que a G…, que a efectivamente recebeu e lançou na sua contabilidade esse proveito, foi tributada por tal e a AT pretende agora tributar a Impugnante pelo recebimento da mesma quantia.
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Consequentemente, deve a liquidação impugnada ser anulada.
Termos em que a sentença recorrida deve ser revogada e julgada procedente a impugnação anulando-se as liquidações impugnadas.” A Recorrida Autoridade Tributária e Aduaneira não apresentou contra-alegações.
O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.
Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.
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DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que as questões suscitadas resumem-se, em suma, em analisar o invocado erro de julgamento da matéria de facto, a descrita violação do direito de audiência prévia e ainda ponderar da bondade da correcção efectuada em função da realidade que envolve a operação em causa.
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FUNDAMENTOS 3.1.
DE FACTO Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte: “… Factos Provados: 1. A M... - Gestão Imobiliária, S.A., iniciou a actividade em 15 de Outubro de 2003, dedicando-se à compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim, empreendimentos imobiliários, construção civil, gestão e promoção imobiliária e locação de imóveis, estando enquadrada no regime geral de tributação para efeito de IR (cfr. certidão de fl. 69 do suporte físico do processo e teor do doc. de fl. 20 do PA).
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Em 26 de Fevereiro de 2007, foram nomeados para o Conselho de Administração da M... – Gestão Imobiliária, S.A., Carlos..., P… e S…, para o quadriénio 2007/2010 (cfr. certidão de fls. 69 e ss do proc. físico).
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No exercício de 2007, a F..., SGPS, S.A., detinha 25% do capital social da M... - Gestão Imobiliária, S.A., 80% do capital social da T…, Lda. e 80% do capital social da G..., Lda. (teor do doc. de fl. 77 do suporte físico do processo).
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No processo de apreensão de bens/liquidação do activo n.º 633-D/2002, em que era falida a sociedade L…, Lda, que correu termos no 3º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Guimarães, por M... – Gestão Imobiliária, S.A., foi apresentada proposta para compra dos seguintes prédios: - prédio urbano, sito no lugar…, composto por um “edifício de rés-do-chão e pequeno sótão com a área de 2.410 m2”, e logradouro com a área de 540 m2, descrito na Conservatória do Registo Predial de Guimarães sob o nº 0…, freguesia da Polvoreira e inscrito na matriz sob o nº 6…; - prédio misto, sito no lugar…, composto por 2 casas, uma de rés-do-chão com a área de 47 m2, outra de rés-do-chão com a área de 67 m2 e pelo Campo do Pombal 3.379 m2, descrito na Conservatória do Registo Predial de Guimarães sob o nº 0…, freguesia da Polvoreira e inscrito na matriz sob os nºs 6…, 6… urbanos e rústico omisso (cfr. teor do doc. de fls. 47 e 48 do PA).
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Em 7 de Março de 2007, no processo referido em 4., foi realizada Abertura de Propostas, tendo sido aceite a proposta apresentada por M... – Gestão Imobiliária, S.A., pelo valor de € 626.100,00 (certidão de fls. 47 e doc. de fls. 44 do PA).
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Em 5 de Setembro de 2007, teve lugar a assembleia geral da M... – Gestão...
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